Com sua Catequese n. 24 sobre Jesus Cristo, o Papa São João Paulo II concluiu sua reflexão sobre Jesus como revelador da Trindade.
Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO
24. Jesus Cristo, revelador da
Trindade
João Paulo II - 19 de agosto de
1987
1. As Catequeses sobre Jesus
Cristo encontram seu núcleo neste tema central que brota da Revelação: Jesus
Cristo, o homem nascido da Virgem Maria, é o Filho de Deus. Todos
os Evangelhos e os outros livros do Novo Testamento atestam esta verdade cristã
fundamental, que buscamos explicar nas Catequeses anteriores, desenvolvendo seus
vários aspectos. O testemunho evangélico constitui a base do
Magistério solene da Igreja nos Concílios, o qual se reflete nos Símbolos da fé
(sobretudo no Símbolo Niceno-Constantinopolitano) e também, naturalmente, no
constante ensinamento ordinário da Igreja, na sua Liturgia, na oração e na vida
espiritual por ela promovida e guiada.
2. A verdade sobre Jesus Cristo Filho
de Deus constitui o ponto chave da autorrevelação de Deus, mediante
o qual se desvela o inefável mistério de um Deus único na Santíssima Trindade. Com
efeito, segundo a Carta aos Hebreus, quando Deus, “nestes dias, que são
os últimos, falou-nos por meio do Filho” (Hb 1,2), desvelou a
realidade da sua vida íntima - daquela vida na qual Ele permanece em absoluta unidade
na divindade e, ao mesmo tempo, é Trindade, isto é, divina
comunhão de três Pessoas. Desta comunhão dá testemunho direto o Filho que “saiu
do Pai e veio ao mundo (cf. Jo 16,28). Somente Ele. O Antigo
Testamento, quando Deus “falou... pelos profetas” (Hb 1,1), não conhecia
este mistério íntimo de Deus. Certamente alguns elementos da revelação
veterotestamentária constituíam a preparação para a revelação evangélica;
contudo, só o Filho podia introduzir-nos neste mistério. Pois “a Deus, ninguém
jamais o viu”: ninguém conheceu o mistério íntimo da sua vida. Somente o
Filho: “o Filho Unigênito, que está no seio do Pai, foi quem o revelou” (Jo 1,18).
Trindade (José de Ribera) |
3. Ao longo das Catequeses
anteriores consideramos os principais aspectos desta revelação, graças à qual a
verdade sobre a filiação divina de Jesus Cristo aparece a nós com plena clareza.
Concluindo agora este ciclo de meditações, convém recordar alguns
momentos, nos quais, junto à verdade sobre a filiação divina do Filho do homem,
Filho de Maria, se revela o mistério do Pai e do Espírito Santo.
O primeiro, cronologicamente, é já
o momento da anunciação em Nazaré. Segundo o anjo, com efeito, quem deve
nascer da Virgem é o Filho do Altíssimo, o Filho de Deus. Com estas palavras, Deus
é revelado como Pai e o Filho de Deus é apresentado como aquele que deve nascer
por obra do Espírito Santo: “O Espírito Santo descerá sobre ti...” (Lc 1,35).
Assim, a narração da anunciação encerra o mistério trinitário: Pai e Filho e Espírito
Santo.
Tal mistério está presente também na
teofania ocorrida durante o batismo de Jesus no Jordão, quando o Pai, através
de uma voz do alto, dá testemunho do Filho “amado”, e esta é acompanhada pelo Espírito
“que desceu como pomba e pousou sobre Jesus” (cf. Mt 3,16). Esta
teofania é como uma confirmação “visual” das palavras do profeta Isaías, às quais
Jesus fez referência em Nazaré, ao dar início à sua atividade messiânica:
“O Espírito do Senhor está sobre mim, pois Ele me ungiu... me enviou...” (Lc
4,18; cf. Is 61,1).
4. Depois, durante seu ministério, encontramos
as palavras com as quais o próprio Jesus introduz seus ouvintes no
mistério da divina Trindade, entre as quais está a “alegre declaração” que encontramos
nos Evangelhos de Mateus e de Lucas. A chamamos “alegre” porque,
como lemos no texto de Lucas, “naquela hora, Jesus exultou no Espírito Santo”
(Lc 10,21) e disse: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra,
porque escondeste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos
pequeninos. Sim, ó Pai, assim foi o teu agrado. Tudo me foi entregue por meu
Pai e ninguém conhece o Filho, senão o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o
Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11,25-27; Lc
10,21-22).
Graças a esta “exultação de Jesus no
Espírito Santo”, somos introduzidos nas “profundezas de Deus” - nas “profundezas”
que só o Espírito sonda (cf. 1Cor 2,10): na íntima unidade da
vida de Deus, na inescrutável comunhão das Pessoas.
5. Estas palavras, relatadas por Mateus
e Lucas, harmonizam-se perfeitamente com muitas afirmações de Jesus que
encontramos no Evangelho de João, como vimos nas Catequeses anteriores.
Sobre todas elas domina a afirmação de Jesus que revela sua unidade com o Pai:
“Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30). Esta afirmação é retomada e desenvolvida
na oração sacerdotal (Jo 17) e em todo o discurso com o qual
Jesus, no Cenáculo, prepara os Apóstolos para sua partida através dos acontecimentos
pascais (Jo 14–16).
6. E precisamente aqui, na ótica desta
“partida”, Jesus pronuncia as palavras que de maneira definitiva revelam o
mistério do Espírito Santo e a relação que El mantém com o Pai e o Filho. O
Cristo que diz: “Eu estou no Pai e o Pai está em mim” (Jo 14,10),
anuncia ao mesmo tempo aos Apóstolos a vinda do Espírito Santo e afirma: este é
“o Espírito da verdade, que procede do Pai” (Jo 15,26).
Jesus acrescenta que “rogará ao Pai” para que este Espírito da verdade seja
dado aos discípulos, para que “permaneça com eles para sempre” como
“Consolador” (cf. Jo 14,16). E assegura aos Apóstolos: “O
Pai enviará o Espírito Santo em meu nome” (cf. Jo 14,26).
Tudo isso, conclui Jesus, acontecerá depois da sua partida durante os acontecimentos
pascais, mediante a Cruz e a Ressurreição: “Se Eu for, o enviarei a vós”
(Jo 16,7).
7. “Naquele dia sabereis que Eu
estou no Pai...” (cf. Jo 14,20), afirma ainda Jesus, ou seja, por
obra do Espírito Santo se esclarecerá plenamente o mistério da unidade do Pai e
do Filho: “Eu no Pai e o Pai em mim”. Tal mistério, com efeito, só pode ser
esclarecido pelo Espírito, que “sonda as profundezas de Deus” (cf. 1Cor 2,10),
onde na comunhão das Pessoas é constituída a unidade da vida divina em Deus. Assim
se ilumina também o mistério da Encarnação do Filho em relação aos fiéis
e à Igreja, também por obra do Espírito Santo. Diz, pois, Jesus: “Naquele dia (quando
os Apóstolos receberem o Espírito da verdade) conhecereis (não só) que Eu estou
em meu Pai, (mas também que) vós (estais) em mim e Eu em vós”
(Jo 14,20). A Encarnação é, portanto, o fundamento da nossa filiação
divina por meio de Cristo, é a base do mistério da Igreja como corpo de Cristo.
8. Aqui é importante notar que a
Encarnação, embora diga respeito diretamente ao Filho, é “obra” de Deus
Uno e Trino (cf. IV Concílio Lateranense). Testemunha-o já o próprio conteúdo
da anunciação (cf. Lc 1,26-38). E depois, mediante todo
o seu ensinamento, Jesus foi “abrindo perspectivas inacessíveis à razão humana”
(como lemos na Gaudium et Spes, 24): aquelas da vida íntima de Deus Uno na
Trindade do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Finalmente, cumprida sua missão
messiânica, Jesus, ao deixar definitivamente os Apóstolos no 40º dia depois
da Ressurreição, realizou até o fim o que havia anunciado: “Como o Pai me
enviou, Eu também vos envio” (Jo 20,21). Com efeito, lhes diz: “Ide,
pois, e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e
do Filho e do Espírito Santo...” (Mt 28,19).
Nestas palavras conclusivas do Evangelho,
e antes do início do caminho da Igreja no mundo, Jesus Cristo entregou-lhe a
verdade suprema da sua revelação: a indivisível Unidade da Trindade.
Desde então a Igreja, maravilhada e
adorante, pode confessar com o evangelista João na conclusão do Prólogo do Quarto
Evangelho, sempre com íntima comoção: “A Deus, ninguém jamais o viu. O Filho
Unigênito, que está no seio do Pai, foi quem o revelou” (Jo 1,18).
Trindade (Guercino) |
Tradução nossa a partir do texto
italiano divulgado no site da Santa Sé (19 de agosto de 1987).
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