Papa Francisco
Mensagem Urbi et Orbi de Natal
Domingo, 25 de dezembro de 2022
Queridos irmãos e irmãs de Roma e do mundo inteiro, feliz Natal!
Que o Senhor Jesus, nascido da Virgem Maria, traga a todos vós o amor de
Deus, fonte de confiança e esperança, juntamente com o dom da paz, que os anjos
anunciaram aos pastores de Belém: «Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos
homens do seu agrado» (Lc 2,14).
Neste dia de festa, voltemos o olhar para Belém. O Senhor vem ao mundo
numa gruta e é recostado numa manjedoura para os animais, porque os seus pais
não conseguiram encontrar hospedagem, apesar de estar quase na hora de Maria
dar à luz. Vem entre nós no silêncio e escuridão da noite, porque o Verbo de
Deus não precisa de holofotes nem do clamor das vozes humanas. Ele mesmo é a
Palavra que dá sentido à existência. Ele é a luz que ilumina o caminho. «O
Verbo era a Luz verdadeira que, ao vir ao mundo - diz o Evangelho -, a todo o
homem ilumina» (Jo 1,9).
Jesus nasce no meio de nós, é Deus-conosco. Vem para
acompanhar a nossa vida quotidiana, partilhar tudo conosco, alegrias e amarguras,
esperanças e inquietações. Vem como menino indefeso. Nasce no frio, pobre entre
os pobres. Carecido de tudo, bate à porta do nosso coração para encontrar calor
e abrigo.
Como os pastores de Belém, deixemo-nos envolver pela luz e saiamos para
ver o sinal que Deus nos deu. Vençamos o torpor do sono espiritual e as falsas
imagens da festa que fazem esquecer Quem é o Festejado. Saiamos do tumulto que
anestesia o coração induzindo-nos mais a preparar enfeites e presentes do que a
contemplar o Evento: o Filho de Deus nascido para nós.
Irmãos, irmãs, voltemo-nos para Belém, onde ressoa o primeiro choro do
Príncipe da paz. Sim, porque Ele mesmo - Jesus - é a nossa paz:
aquela paz que o mundo não se pode dar a si mesmo e Deus Pai concedeu-a à
humanidade enviando o seu Filho ao mundo. São Leão Magno tem uma frase que, na
sua concisão latina, bem resume a mensagem deste dia: «Natalis Domini,
Natalis est pacis» - «O Natal do Senhor é o Natal da paz» (Sermão 26,5).
Jesus Cristo é também o caminho da paz. Com a sua Encarnação,
Paixão, Morte e Ressurreição abriu a passagem de um mundo fechado, oprimido
pelas trevas da inimizade e da guerra, para um mundo aberto, livre para viver
na fraternidade e na paz. Irmãos e irmãs, sigamos este caminho! Mas, para o
podermos fazer, para sermos capazes de seguir os passos de Jesus, devemos
despojar-nos dos pesos que nos enredam e bloqueiam.
E quais são esses pesos? Que vem a ser este entulho que nos
sobrecarrega? Trata-se das mesmas paixões negativas que impediram o rei Herodes
e a sua corte de reconhecer e acolher o nascimento de Jesus, isto é, o apego ao
poder e ao dinheiro, o orgulho, a hipocrisia, a mentira. Estes pesos impedem de
ir a Belém, excluem da graça do Natal e fecham o acesso ao caminho da paz. Na
realidade, é com tristeza que devemos constatar como, enquanto nos é dado o
Príncipe da paz, ventos de guerra continuam a soprar, gelados, sobre a
humanidade.
Se queremos que seja Natal, o Natal de Jesus e da paz, voltemos o olhar
para Belém e o fixemos no rosto do Menino que nasceu para nós! E, naquele
rostinho inocente, reconheçamos o das crianças que, em todas as partes do
mundo, anseiam pela paz.
O nosso olhar se encha com os rostos dos irmãos e irmãs ucranianos que
vivem este Natal na escuridão, no frio ou longe das suas casas, devido à
destruição causada por dez meses de guerra. O Senhor nos torne disponíveis e
prontos para gestos concretos de solidariedade a fim de ajudar todos os que
sofrem, e ilumine as mentes de quantos têm o poder de fazer calar as armas e
pôr termo imediato a esta guerra insensata! Infelizmente, prefere-se ouvir
outras razões, ditadas pelas lógicas do mundo. Mas a voz do Menino, quem a
escuta?
O nosso tempo vive uma grave carestia de paz também em outras
regiões, em outros teatros desta “terceira guerra mundial”. Pensamos na Síria,
ainda martirizada por um conflito que passou para segundo plano, mas não
terminou; e pensamos na Terra Santa, onde nos últimos meses aumentaram as
violências e os confrontos, com mortos e feridos. Supliquemos ao Senhor para
que lá, na terra que O viu nascer, retomem o diálogo e a aposta na confiança
mútua entre palestinos e israelenses. Jesus Menino ampare as comunidades
cristãs que vivem em todo o Oriente Médio, para que se possa viver, em cada um
daqueles países, a beleza da convivência fraterna entre pessoas que pertencem a
crenças diferentes. De modo particular ajude o Líbano, para que possa,
finalmente, erguer-se com o apoio da Comunidade Internacional e com a força da
fraternidade e da solidariedade. A luz de Cristo ilumine a região do Sahel,
onde a convivência pacífica entre povos e tradições é transtornada por
confrontos e violências. Encaminhe para uma trégua duradoura no Iêmen e para a
reconciliação no Myanmar e no Irã, para que cesse completamente o
derramamento de sangue. E, no continente americano, inspire as autoridades
políticas e todas as pessoas de boa vontade a trabalharem para pacificar as
tensões políticas e sociais que afetam vários países; penso de modo particular na
população haitiana, que está a sofrer há tanto tempo.
Neste dia, em que sabe bem encontrar-se ao redor da mesa recheada, não
desviemos o olhar de Belém - que significa «casa do pão» - e pensemos nas
pessoas que padecem fome, sobretudo as crianças, enquanto diariamente se
desperdiçam quantidades imensas de alimentos e se gastam tantos recursos em
armas. A guerra na Ucrânia agravou ainda mais a situação, deixando populações
inteiras em risco de carestia, especialmente no Afeganistão e nos países do “Chifre
de África”. Toda guerra - sabemos bem - provoca fome e serve-se do próprio
alimento como arma, ao impedir a sua distribuição às populações já atribuladas.
Neste dia, aprendendo com o Príncipe da paz, empenhemo-nos todos - a começar
pelos que têm responsabilidades políticas - para que o alimento seja só
instrumento de paz. Enquanto saboreamos a alegria de nos reunirmos com os
nossos, pensemos nas famílias mais atribuladas pela vida e naquelas que, neste
tempo de crise econômica, atravessam dificuldades por causa do desemprego e
carecem do necessário para viver.
Queridos irmãos e irmãs, hoje como há dois mil anos Jesus, a luz
verdadeira, vem a um mundo achacado de indiferença - uma feia doença! - que não
O acolhe (cf. Jo 1,11); antes, rejeita-O como acontece
a muitos estrangeiros, ou ignora-O como fazemos nós muitas vezes com os pobres.
Hoje não nos esqueçamos dos numerosos deslocados e refugiados que batem à nossa
porta à procura de conforto, calor e alimento. Não nos esqueçamos dos
marginalizados, das pessoas sós, dos órfãos e dos idosos - a sabedoria de um
povo - que correm o risco de acabar descartados, dos presos que olhamos apenas
sob o prisma dos seus erros e não como seres humanos.
Irmãos e irmãs, Belém mostra-nos a simplicidade de Deus, que Se revela não aos sábios e entendidos, mas aos pequeninos, a quantos têm o coração puro e aberto (cf. Mt 11,25). Como os pastores, vamos também nós sem demora e deixemo-nos maravilhar pelo evento incrível de Deus que Se faz homem para nossa salvação. Aquele que é fonte de todo o bem faz-Se pobre (cf. São Gregório Nazianzeno, Discurso 45) e pede de esmola a nossa pobre humanidade. Deixemo-nos comover pelo amor de Deus e sigamos Jesus, que Se despojou da sua glória para nos tornar participantes da sua plenitude (cf. ibid.).
Feliz Natal para todos!
Fonte: Santa Sé.
Nenhum comentário:
Postar um comentário