quinta-feira, 12 de maio de 2022

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Introdução 2

Dando continuidade às Catequeses introdutórias do Papa São João Paulo II sobre o Creio, trazemos aqui suas reflexões nn. 3-4.

Para acessar a postagem introdutória a essa série, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
INTRODUÇÃO GERAL

3. A preparação catequética à vida sacramental
João Paulo II - 19 de dezembro de 1984

1. Na Audiência passada falamos da catequese em relação com a instituição do catecumenato tal como se formou no período mais antigo da história da Igreja. Quando, em seguida, tornou-se cada vez mais universalmente estabelecido o uso de administrar o Batismo às crianças pouco depois do nascimento, a instituição do catecumenato em sua forma primitiva começou a desaparecer. Como já mencionamos, esse se conservou onde se preparam os adultos para o Batismo: assim, o tempo do catecumenato permanece como um período de catequese particularmente intensa, unida à “iniciação” ao mysterium do Batismo e a toda a vida sacramental, e a uma gradual introdução dos catecúmenos na vida da comunidade eclesial.
O costume de conferir o Batismo às crianças pouco depois do nascimento se desenvolveu como expressão de fé viva das comunidades e, antes de tudo, das famílias e dos pais, os quais, tendo crescido eles mesmos na fé, desejavam este dom para seus filhos o antes possível depois do nascimento. Este costume, como se sabe, se manteve constantemente na Igreja, como sinal do amor preveniente de Deus. Os pais pedem o Batismo para seus filhos recém-nascidos, comprometendo-se a educá-los de maneira cristã. Para dar a este compromisso uma expressão ainda mais completa, pedem a outras pessoas, os chamados padrinhos, que se empenhem em ajudar-lhes - e em caso de necessidade a substituir-lhes - a educar o neo-batizado na fé da Igreja.

A fonte dos sete sacramentos

Esta prática, tão comum, tem uma importância eminente para o problema da catequese. A educação de uma criança batizada na fé da Igreja não pode levar-se a cabo sem uma catequese sistemática. O que no caso do Batismo dos adultos está contido no programa do catecumenato antes da admissão ao sacramento, na nova situação passa a acontecer depois do próprio Batismo, no período no qual o pequeno cristão esteja em condições de receber uma instrução sobre as verdades cristãs de fé e de moral, inserindo-se gradualmente nas sucessivas etapas da vida sacramental da Igreja. Deste modo, por um lado mantém-se a relação particular da catequese com o Batismo - relação destacada desde o principio, desde o dia de Pentecostes - e por outro lado a catequese, transferida ao período sucessivo ao Batismo com base no compromisso dos pais e dos padrinhos, é estendida, pode-se dizer, a toda a vida do cristão.

2. Poderíamos dizer então que esta vida se transforma, em certo sentido, em um “segundo catecumenato”? Se por “catecumenato” entendemos a instituição vinculada à preparação propriamente dita ao Batismo, então naturalmente tal modo de falar pode ter no máximo um sentido metafórico. Se, por outro lado, “catecumenato” significa não tanto a mencionada instituição, mas a  disponibilidade interior para perseverar na fé e amadurecer nela, então a expressão “segundo catecumenato” possui um sentido mais que pertinente. A catequese, com efeito, responde a uma necessidade da fé: à necessidade de professá-la, de permanecer e de crescer nela.
Os compromissos que os pais e padrinhos assumem durante o Batismo de um recém-nascido referem-se antes de tudo ao período da infância e da adolescência. De fato, quando o Batismo não foi precedido pela catequese como introdução ao mistério de Cristo, então essa deverá estar mais intensamente presente na preparação para os outros sacramentos da Iniciação Cristã (Eucaristia e Confirmação), assim como na preparação para o sacramento da Penitência.
Mas tampouco os outros momentos da vida cristã devem ser excluídos do empenho catequético (catequese permanente). Particularmente no momento da escolha do estado de vida não pode faltar uma catequese a respeito do sacramento do Matrimônio. Quando se trata do sacramento do Sacerdócio todo o sistema de formação no Seminário é também em certo sentido uma “grande catequese”. O mesmo vale, a seu modo, para o noviciado e as sucessivas etapas de formação no caso da vocação religiosa. Várias formas de exercícios espirituais, e também as funções penitenciais introduzidas depois do Concílio Vaticano II [1], podem ser uma catequese do sacramento da Penitência. Existem também várias possibilidades de catequese em relação ao sacramento da Unção dos Enfermos.

3. Uma vez que a vida sacramental dos cristãos constitui um constante e imediato chamado à catequese - a uma catequese mais intensa e com um objetivo mais preciso -, é preciso dizer que a abertura para a catequese instaurada pelo Batismo tende não só a uma catequese ocasional, mas sobretudo à catequese sistemática, que os Padres da Igreja chamavam “instrução cristã”. Não se trata aqui de adquirir a ciência “da religião” (neste caso, a religião cristã), mas sobretudo de um aprofundamento global nos conteúdos da fé, do que está compreendido na Palavra que Deus revela e é ensinado sistematicamente pela Igreja, em seu Magistério e em sua vida.
A catequese nasce da fé e está a serviço da fé. Por isso mesmo ela deve acompanhar toda a vida do cristão, em conformidade com as diversas etapas do caminho da vida, com as diversas tarefas e compromissos, com as múltiplas situações pelas quais esse caminho se desenrola. Trata-se de fazer com que a “palavra que sai da boca de Deus" (cfMt 4,4) chegue constantemente ao homem e “não volte vazia” (cfIs 55,11), mas que se revele sempre fecunda nos vários aspectos da vida humana.

4. Transmitir o dom integral da fé
João Paulo II - 09 de janeiro de 1985

1. Já recordamos que a catequese é obra da Igreja que difunde a boa-nova no mundo e busca aprofundar a sua vida sacramental com um melhor conhecimento do mistério de Cristo.
Com a catequese, assim como com toda obra de evangelização, a Igreja busca responder às questões mais essenciais do homem, aquelas que cada um se faz ou que mais cedo ou mais tarde se fará ao longo da sua existência. De onde vem o homem? Por que existe? Quais são as suas relações com Deus e com o mundo invisível? Como deve comportar-se para alcançar o propósito da sua vida? ¿Por que está submetido ao sofrimento e à morte, e qual é a sua esperança?
A estas questões a catequese dá a resposta de Deus. Ela quer fazer compreender uma doutrina que não é simplesmente o fruto de determinadas investigações pessoais, mas a verdade comunicada à humanidade mediante a Revelação divina. Portanto, ao comunicar a verdade da salvação, a catequese se preocupa em evidenciar as perguntas fundamentais suscitadas no coração humano e em demostrar como Deus as respondeu em sua Revelação com um dom de verdade e de vida que supera as expectativas mais profundas do homem (cf1Cor 2,6-9). Sua tarefa consiste em dar as certezas fundamentas na autoridade da Revelação.

2. Longe de suscitar dúvidas ou confusões sobre as questões nela consideradas, a catequese tende, pois, a iluminar a inteligência e reforçá-la com sólidas convicções. Claro que, com as respostas que fornece, ela introduz mais profundamente o espírito humano no mistério da Revelação; este mistério ilumina a mente, ainda que, enquanto estamos na vida terrena, não dissipe toda a escuridão. Não se pode entender todo, mas aquilo que se compreende é suficiente para indicar as verdades fundamentais e o sentido da vida.
Frequentemente as fórmulas dos catecismos, com uma série de perguntas e respostas, expressam, de maneira concreta e prática, a estrutura fundamental da catequese, que pode ser definida como o confronto entre a pergunta do homem e a resposta de Deus [2]. É verdade que a pergunta do homem já está inspirada e iluminada pela graça divina, e que, por outro lado, a resposta de Deus é formulada com os limites e imperfeições da linguagem humana. Mas se trata verdadeiramente de interrogações próprias do homem, interrogações às quais a catequese porta a luz divina.
Isto significa que, sem deixar de estar atenta ao lado humano dos problemas, a catequese não se limita a reflexões de caráter humano, nem a investigações de ordem filosófica, psicológica ou sociológica, nem ao esforço de enunciar simplesmente os preâmbulos da Revelação. A catequese é consciente do seu dever de expor e fazer compreender a verdade revelada, a qual não está em seu poder reduzir ou atenuar. Ela procura adaptar o seu ensinamento à capacidade daqueles que o recebem, mas não possui o direito de alterar ou suprimir uma parte da verdade que o próprio Deus quis comunicar aos homens.

3. Vale a pena recordar aqui o que destaquei na Exortação Apostólica Catechesi tradendae sobre a integridade do conteúdo da catequese: “Para que a oblação da sua fé seja perfeita, aquele que se faz discípulo de Cristo tem direito a receber a ‘palavra da fé’ não mutilada, falsificada ou diminuída, mas completa e integral, em todo o seu rigor e vigor. Trair de alguma forma a integridade da mensagem é esvaziar perigosamente a própria catequese e comprometer os frutos que dela Cristo e a comunidade eclesial têm direito a esperar” (n. 30).
Pode acontecer que a mensagem pareça difícil de fazer compreender ou aceitar. No mundo circulam muitas ideias contrárias à doutrina evangélica e, inclusive, algumas possuem uma atitude de oposição a tudo aquilo que se ensina em nome da Igreja. Diante das resistências que encontra, aquele que se dedica à catequese poderia ser tentado a recuar, a não expor a mensagem cristã em toda a sua verdade e com todas as suas exigências de vida, e a limitar-se a alguns pontos mais facilmente admissíveis. Nesse caso o catequista deve recordar-se de que está encarregado de um ensinamento que o supera: deve esforçar-se a propô-lo como o recebeu (cf. 1Cor 11,23); deve sobretudo ser consciente de que em sua missão catequética dispõe de uma força divina que o torna capaz de transmitir a sua fé, e que no coração dos seus ouvintes o Espírito Santo fará  penetrar a palavra na medida em que esta é fiel à verdade que deve expressar.

4. O problema da catequese é um problema de fé. Na origem da Igreja, quem pensaria que o pequeno número dos discípulos de Jesus poderia empreender a obra de evangelização e de catequese de toda a humanidade? E foi justamente o que aconteceu: a mensagem cristã desde o princípio conseguiu penetrar na mentalidade de um grande número de homens. Aquilo que a graça realizou então e depois ao longo dos séculos, ela continua a realizar também hoje.
A catequese conta, portanto, com a força da graça para transmitir às crianças e aos adultos o dom integral da fé. Todo catequista tem o encargo de comunicar a mensagem cristã na íntegra, e recebe do próprio Cristo a capacidade de cumprir plenamente esta sua missão.

A pregação de Pedro no dia de Pentecostes: início da Catequese na Igreja
(Benjamin West)

Notas:

[1] O Papa refere-se provavelmente às celebrações comunitárias previstas no Ritual da Penitência, promulgado em sua edição típica em 1973 [Nota do autor deste blog].

[2] Vale recordar que o Catecismo da Igreja Católica só seria publicado em 1992. Em 2008, por sua vez, seria publicado o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, utilizando o recurso das perguntas e respostas [Nota do autor deste blog].

Tradução nossa a partir do texto italiano divulgado no site da Santa Sé (19 de dezembro de 1984 e 09 de janeiro de 1985).

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