Orígenes
Comentário ao Cântico dos Cânticos
“Jesus
foi tentado pelo diabo para que a Igreja aprendesse que se chega a Cristo
através de muitas tribulações e tentações”
A vida dos
mortais está cheia de laços insidiosos, cheia de uma rede de enganos estendidos
ao gênero humano por aquele audacioso caçador, que, segundo o Senhor, é chamado
Nemrod. E quem é o verdadeiro caçador atrevido senão o diabo, que ousou
rebelar-se até mesmo contra Deus? De fato, os laços das tentações e as
armadilhas das emboscadas são chamados redes do diabo. E como o inimigo tinha
estendido estas redes por toda parte, e tinha caçado nelas a quase todos nós,
foi necessário que se apresentasse alguém forte e poderoso o suficiente para
rompê-las, deixando assim o caminho livre aos seus seguidores.
Portanto, o
próprio Salvador, antes de chegar à união nupcial com a Igreja, é tentado pelo
diabo, para, vencidas as redes das tentações, vê-la através delas e através
delas chamá-la a si, ensinando-a claramente e manifestando que a Cristo se
chega não pelo ócio e os deleites, mas através de muitas tribulações e
tentações.
Na realidade,
não houve nenhum outro capaz de superar estas redes, pois, como está descrito, todos pecaram; e novamente a Escritura
diz: Não há no mundo alguém tão honrado
que faça o bem sem nunca pecar. E de novo: Ninguém está limpo de pecado, nem sequer um só dia.
Em consequência,
nosso Senhor e Salvador, Jesus, é o único que não cometeu pecado, porém o Pai o fez expiar nossos pecados, para que, numa condição pecadora como a nossa, e
fazendo-se vítima pelo pecado condenasse o pecado. Aproximou-se, pois, a
estas redes, mas ele foi o único que não caiu enredado nelas; ao contrário,
derrotadas e destruídas, deu à sua Igreja a coragem de pisotear os laços,
caminhar sobre as redes e proclamar com entusiasmo: Nossa vida foi salva como um pássaro do laço do caçador; a cilada se
rompeu e escapamos.
E quem foi que
rompeu a armadilha? O único que não pôde ser retido nela, pois mesmo que
morreu, morreu porque quis e não como nós, forçados pelas exigências do pecado.
Ele é o único que esteve livre dentre os mortos. E porque esteve livre entre os
mortos, por isso mesmo, vencido o que tinha domínio sobre a morte, libertou aos
que eram escravos da morte. E não só ressuscitou a si mesmo dentre os mortos,
mas suscitou a vida aos escravos da morte, e os sentou no céu junto com ele.
Pois, ao subir Cristo ao alto levando cativos consigo, levou não somente as
almas, mas ressuscitou também os corpos, como o testemunha o Evangelho: Muitos corpos de santos que tinham morrido
ressuscitaram, e apareceram a muitos e entraram na cidade santa do Deus
vivo, em Jerusalém.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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