São Gregório Magno
Sermão sobre o filho pródigo
“O filho pródigo recebeu o
anel quando uniu a si, mediante a fé, a Igreja tirada da gentilidade”
Disse o pai a seus servos: Trazei depressa a primeira túnica
para vestir meu filho. A primeira túnica é a veste abençoada da inocência, que
nosso primeiro pai, Adão, recebeu, tendo sido criado com sabedoria pela mão de
Deus, e depois a perdeu sendo enganado pelo demônio. E assim, após nossos
primeiros pais terem pecado conheceram que estavam nus, e como pessoas que
haviam perdido aquela glória da imortalidade, revestiram-se de peles de animais
mortais. Pelos servos aos quais o Pai deu esta ordem, entendemos todos os
santos pregadores: estes trouxeram a primeira veste, quando com sua santa
doutrina não só converteram os homens, mas também mostraram claramente que,
guardando a devida justiça em suas obras, seriam sublimados a tanta graça, que
não seriam apenas cidadãos dos anjos, mas também herdeiros de Deus e
co-herdeiros de Jesus Cristo.
E colocai o anel no seu dedo. Este é o costume que, com
o anel, sejam seladas as coisas íntimas; e assim, pelo anel podemos entender o
selo da fé, com a qual se selam no coração dos fiéis todas as coisas que da
parte de Deus lhes são prometidas. Também é costume que a esposa confirme com
um anel a fidelidade com seu esposo, e assim podemos entender por este anel a
graça que Cristo nosso Redentor dá para a Igreja, sua Esposa. E diremos, então,
que o filho pródigo recebeu o anel quando uniu a si, mediante a fé, a Igreja
tirada da gentilidade. E com razão se põe o anel na mão, para mostrar que, com
as obras, se confirmará a fé, e com a fé as obras.
E sandálias nos pés. Pelos sapatos entende-se o ofício da pregação, porque
assim o afirma a Sagrada Escritura quando diz: Quão formosos são os pés dos
mensageiros da paz, e que pregam o bem; e o glorioso Apóstolo confirmando isto,
escrevendo de Éfeso, diz: Tende, irmãos, os pés calçados, e estai preparados
para a pregação do Santo Evangelho. Diremos, pois, que voltando o filho pródigo
à misericórdia do pai, adornam-lhe os pés e as mãos. Adornam-lhe as mãos para
ensinar a nós e a todos os fiéis que vivamos com obras de justiça; e os pés
para que, levando em consideração o exemplo dos santos, trabalhemos para
caminhar ao céu.
Trazei um novilho gordo e matai-o. Por este novilho gordo
entende-se o próprio Filho de Deus, Jesus Cristo, nosso Senhor e Redentor:
porque na verdade, para a nossa alma, sua carne é de uma gordura e virtude
espiritual de tão abundante graça, que se nos dispusermos a recebê-la, muito
nos confortará no caminho em que peregrinamos, pois só ela foi capaz de apagar
os pecados do mundo inteiro. Mandou, pois, trazer o novilho e matar-lhe, na
mesma ocasião em que ordenou que os mistérios de sua vida santíssima e de sua
Morte e Paixão fossem publicados pelos santos Apóstolos. Porque parece que este
novilho santíssimo acabou de ser sacrificado para alguém, quando de novo volta
a crer nele; e então é comido, quando é recebido sacramentalmente na alma
limpa, quando se faz memória de sua Paixão com alma limpa.
Este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi
encontrado.
Deveis observar que disse “comamos”, falando em plural, por onde podemos
entender que da carne santíssima deste novilho tão santo, não só come o filho
que estava morto e reviveu, perdido e foi achado, mas também comeu o pai e os
criados da casa. Nisto se vê que nossa conversão e saúde é a alegria do Pai
celestial, e sua alegria é o perdão de nossos pecados. E este gozo não é só do
Pai soberano, mas também do Filho e do Espírito Santo, porque a obra, a alegria
e o amor da Santíssima Trindade é una.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 571-572. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
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