quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Discurso do Papa à Faculdade Teológica Marianum de Roma

No último sábado, 24 de outubro, o Papa Francisco recebeu os professores e alunos da Pontifícia Faculdade Teológica “Marianum” de Roma, por ocasião dos 70 anos da sua fundação.

Eu seu discurso, o Santo Padre abordou alguns temas que tocam a Liturgia, como a piedade popular e a arte sacra, como podemos ver a seguir:

Discurso do Papa Francisco aos Professores e Alunos da Pontifícia Faculdade Teológica “Marianum” de Roma
Sala Paulo VI
Sábado, 24 de outubro de 2020

Caros irmãos e irmãs,
Saúdo-vos e vos felicito pelo 70º aniversário da fundação da vossa Faculdade Teológica! Obrigado, Padre Chanceler, por suas amáveis palavras. O Marianum, desde o seu nascimento, foi confiado ao cuidado dos Servos de Maria. Desejo, pois, que cada um de vós possa viver o serviço a exemplo de Maria, «a serva do Senhor» (Lc 1,38). Um estilo mariano, um estilo que trará grande benefício a teologia, a Igreja e a vós.
Poderíamos perguntar-nos: a Mariologia serve hoje à Igreja e ao mundo? Obviamente, a nossa resposta é “sim”. Ir à escola de Maria é ir a uma escola de fé e de vida. Ela, mestra porque discípula, ensina bem o “alfabeto” da vida humana e cristã. Porém, há outro aspecto, vinculado à atualidade. Vivemos no tempo do Concílio Vaticano II. Nenhum outro Concílio na história dedicou tanto espaço à Mariologia quanto aquele dedicado pelo capítulo VIII da Lumen Gentium, que conclui e em certo sentido resume toda a Constituição Dogmática sobre a Igreja. Isto nos diz que os tempos em que vivemos são tempos de Maria. Mas temos necessidade de redescobri-la segundo a perspectiva do Concílio. Como o Concílio trouxe à luz a beleza da Igreja voltando às fontes e tirando o “pó” que se havia depositado sobre ela ao longo dos séculos, assim também as maravilhas de Maria se podem descobrir melhor indo ao coração do seu mistério. Ali emergem dois elementos, bem evidenciados pela Escritura: ela é mãe e é mulher. Também a Igreja é mãe e mulher.

Mãe. Reconhecida por Isabel como a «mãe do Senhor» (Lc 1,43), a Theotokos (Mãe de Deus) é também mãe de todos nós. Com efeito, ao discípulo João, e nele a cada um de nós, o Senhor disse sobre a cruz: «Eis a tua mãe!» (Jo 19,27). Jesus, naquela hora salvífica, nos estava dando a sua vida e o seu Espírito; e não deixou que a sua obra se cumprisse sem dar-nos a sua Mãe, porque deseja que na vida caminhemos com uma mãe, mais ainda, com a melhor das mães (cf. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 285). São Francisco de Assis a amava justamente porque é mãe. Dele se escreveu que «circundava de indizível amor a Mãe do Senhor Jesus, pelo fato de que ela tornou nosso irmão o Senhor da Majestade» (S. Boaventura, Legenda major, 9,3: FF 1165). Maria tornou Deus nosso irmão e enquanto mãe pode tornar mais fraternos a Igreja e o mundo.
A Igreja tem necessidade de redescobrir o seu coração materno, que bate pela unidade; mas também o necessita a nossa Terra, para voltar a ser a casa de todos os seus filhos. Maria o deseja: «ela quer dar à luz um mundo novo, onde todos sejamos irmãos, onde haja lugar para cada descartado das nossas sociedades, onde resplandeçam a justiça e a paz» (Carta Encíclica Fratelli tutti, n. 278). Temos necessidade de maternidade, que gera e regenera a vida com ternura, porque só o dom, a cura e a partilha mantêm unida a família humana. Pensemos o mundo sem as mães: não haveria futuro. As vantagens e os lucros, por si sós, não dão futuro; pelo contrário, às vezes aumentam as desigualdades e as injustiças. As mães, em vez disso, fazem com que cada filho se sinta em casa e dão esperança.
O Marianum  é chamado agora a ser uma instituição fraterna, não só através do bom clima familiar que vos distingue, mas também abrindo novas possibilidades de colaboração com outros institutos, que ajudarão a alargar os horizontes e a permanecer em dia com os tempos. Às vezes há medo de abrir-se, pensando que se poderia perder a própria especificidade, mas quando alguém “se arrisca” para dar vida e gerar o futuro não se engana, porque faz como as mães. E Maria é mãe que ensina a arte do encontro e do caminhar juntos. É belo agora que, como uma grande família, confluam ao Marianum tradições teológicas e espirituais diferentes, que contribuam também ao diálogo ecumênico e inter-religioso.

Maria - este é o outro elemento essencial - é mulher. Talvez o dado mariológico mais antigo do Novo Testamento diz que o Salvador «nasceu de uma mulher» (Gl 4,4). No Evangelho, pois, Maria é a mulher, a nova Eva, que de Caná ao Calvário intervém para a nossa salvação (cf. Jo 2,4; 19,26). Por fim, é a mulher vestida de sol que cuida da descendência de Jesus (cf. Ap 12,17). Como a mãe faz da Igreja uma família, a mulher faz de nós um povo. Não é por acaso que a piedade popular busca naturalmente a Maria. É importante que a Mariologia acompanhe a piedade popular com atenção, a promova, às vezes a purifique, permanecendo sempre atenta aos “sinais dos tempos marianos” que percorrem a nossa época.
Entres estes sinais, está o próprio papel da mulher: essencial para a história da salvação, não pode deixar de ser essencial para a Igreja e para o mundo. Mas quantas mulheres não recebem a dignidade que lhes é devida! A mulher, que trouxe Deus ao mundo, deve poder trazer seus dons à história. Há necessidade do seu engenho e do seu estilo. Há necessidade dela a teologia, para que não seja abstrata e conceitual, mas delicada, narrativa, vital. A Mariologia, em particular, pode contribuir a levar à cultura, também através da arte e da poesia, a beleza que humaniza e infunde esperança. E está chamada a buscar espaços mais dignos para a mulher na Igreja, a partir da comum dignidade batismal. Porque a Igreja, como disse, é mulher. Como Maria, é mãe, como Maria.
O Padre (Marko Ivan) Rupnik fez um quadro, que parece ser um quadro de Maria, mas não é. Parece que Maria está em primeiro plano, mas, ao contrário, a mensagem é: Maria não está em primeiro plano. Ela recebe Jesus, e com as mãos, como degraus de uma escada, o faz descer. É a synkatabasis  de Cristo através de Maria: a condescendência. E Cristo se apresenta como o Menino, mas também como o Senhor, com a Lei na mão. Mas também como filho da mulher, frágil, segurando no manto de Maria. Esta obra do Padre Rupnik é uma mensagem. Quem é Maria para nós? Aquela que, para cada um de nós, faz descer Cristo: Cristo, plenitude de Deus; Cristo, homem que se fez frágil por nós. Vejamos Maria assim: aquela que faz Cristo entrar, que faz Cristo passar, que deu à luz Cristo, e que permanece sempre mulher. É tão simples... E peçamos que ela nos abençoe. Darei agora a bênção a todos vós, pedindo que sempre possamos ter em nós aquele espírito de filhos e de irmãos. Filhos de Maria, filhos da Igreja, irmãos entre nós.

Modelo de mosaico mencionado pelo Papa:
As mãos de Maria são os degraus pelos quais Cristo desce
"Ave, ó escada sublime por quem Deus nos veio!"


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