Viagem Apostólica ao Panamá
Santa
Missa de Encerramento da 34ª Jornada Mundial da Juventude
Homilia
do Papa Francisco
Campo
São João Paulo II - Metro Park (Panamá)
Domingo,
27 de janeiro de 2019
«Todos os que estavam na sinagoga
tinham os olhos fixos n’Ele. Começou, então, a dizer-lhes: “Cumpriu-se hoje
esta passagem da Escritura, que acabais de ouvir” » (Lc 4,20-21).
O Evangelho apresenta-nos, assim, o
início da missão pública de Jesus. Apresenta-o na sinagoga que o viu crescer,
circundado por conhecidos e vizinhos e talvez até por algum dos seus
«catequistas» de infância que lhe ensinou a lei. Momento importante na vida do
Mestre quando Ele - a criança que se formara e crescera dentro daquela
comunidade - levantou-se e tomou a palavra para anunciar e realizar o sonho de
Deus. Uma palavra até então proclamada apenas como promessa do futuro, mas que,
na boca de Jesus, só podia ser pronunciada no presente, tornando-se realidade:
«Cumpriu-se hoje».
Jesus revela o agora de
Deus, que vem ao nosso encontro para nos chamar, também a nós, a tomar parte no
seu agora, no qual «anunciar a Boa-Nova aos pobres», «proclamar a
libertação aos cativos e, aos cegos a recuperação da vista», «mandar em
liberdade os oprimidos» e «proclamar um ano favorável da parte do Senhor»
(Lc 4,18-19). É o agora de Deus que, com
Jesus, se faz presente, se faz rosto, carne, amor de misericórdia que não
espera situações ideais ou perfeitas para a sua manifestação, nem aceita
desculpas para a sua não-realização. Ele é o tempo de Deus que torna justos e
oportunos todos os espaços e situações. Em Jesus, começa e faz-se vida o futuro
prometido.
Quando? Agora. Mas nem todos aqueles
que lá o ouviram, se sentiram convidados ou convocados. Nem todos os seus
vizinhos de Nazaré estavam prontos para acreditar em alguém que conheciam e
tinham visto crescer e que os convidava a realizar um sonho há muito aguardado.
Antes, pelo contrário! Diziam: «Mas não é o filho de José?» (Lc 4,22).
A nós, também pode suceder o mesmo. Nem
sempre acreditamos que Deus possa ser tão concreto no dia-a-dia, tão próximo e
real, e menos ainda que Se faça assim presente agindo através de alguém
conhecido, como um vizinho, um amigo, um parente. Nem sempre acreditamos que o
Senhor nos possa convidar a trabalhar e meter as mãos na massa juntamente com
Ele no seu Reino de forma tão simples mas incisiva. Custa aceitar que «o amor
divino se tornou concreto e quase experimentável na história com todas as suas
vicissitudes ásperas e gloriosas» (Bento XVI, Audiência Geral, 28 se setembro de 2005).
E não é raro comportarmo-nos como os
vizinhos de Nazaré, quando preferimos um Deus à distância:
magnífico, bom, generoso, bem desenhado, mas distante e sobretudo que não
incomode, um Deus «domesticado». Porque um Deus próximo no dia-a-dia, um Deus
amigo e irmão pede-nos para aprendermos proximidade, presença diária e,
sobretudo, fraternidade. Ele não quis manifestar-se de modo angélico ou
espetacular, mas quis oferecer-se a nós com um rosto fraterno e amigo, concreto,
familiar. Deus é real, porque o amor é real; Deus é concreto, porque o amor é
concreto. E é precisamente esta «dimensão concreta do amor aquilo que constitui
um dos elementos essenciais da vida dos cristãos» (Bento XVI, Homilia, 01 de março de 2006).
Também nós podemos correr os mesmos
riscos que os vizinhos de Nazaré, quando, nas nossas comunidades, o Evangelho
se quer fazer vida concreta e começamos a dizer: «Mas, estes jovens, não são
filhos de Maria, de José, não são irmãos de..., parentes de...? Não são aquelas
crianças que nós ajudamos a crescer? É melhor que se calem! Como podemos
acreditar neles? E este ali... não é o que partia sempre os vidros com a bola?»
E, assim, uma pessoa que nascera para ser profecia e anúncio do Reino de Deus
acaba domesticada e empobrecida. Querer domesticar a Palavra de Deus é uma
tentação de todos os dias.
E também a vós, queridos jovens, pode
acontecer o mesmo, sempre que pensais que a vossa missão, a vossa vocação e até
a vossa vida é uma promessa mas que vale só para o futuro, nada tem a ver com o
presente. Como se ser jovem fosse sinónimo de «sala de espera» para quem
aguarda que chegue o seu turno. E, enquanto este não chega, inventam para vós
ou vós próprios inventais um futuro higienicamente bem embalado e sem
consequências, bem construído e garantido com tudo «bem assegurado». Não
queremos oferecer-vos um futuro de laboratório! É a «ficção» da alegria, não a
alegria do dia de hoje, do concreto, do amor. E assim, com esta «ficção» da
alegria, vos «tranquilizamos», vos adormentamos para não fazerdes barulho, para
não estorvardes demasiado, não colocardes interrogativos a vós mesmos e a nós,
para não vos pordes em discussão a vós próprios e a nós; e «entretanto» os
vossos sonhos perdem altitude, tornam-se rasteiros, começam a adormentar-se e
ficam «ilusões» pequenas e tristes (cf. Francisco, Homilia do Domingo de Ramos,
25 de março de 2018), só porque consideramos ou considerais que o
vosso agora ainda não chegou; que sois demasiado jovens para
vos envolverdes no sonho e construção do amanhã. E, assim, continuamos a
adiar-vos... E sabeis uma coisa? Muitos jovens gostam disso. Por favor,
ajudemo-los para que não gostem, que reajam, que queiram viver o «agora» de
Deus.
Um dos frutos do Sínodo recente foi a
riqueza de nos podermos encontrar e, sobretudo, escutar. A riqueza da escuta
entre gerações, a riqueza do intercâmbio e o valor de reconhecer que precisamos
uns dos outros, que devemos esforçar-nos por promover canais e espaços onde nos
comprometamos a sonhar e construir o amanhã, já hoje. Não isoladamente, mas
unidos, criando um espaço em comum: um espaço que não nos é oferecido de
prenda, nem o ganhamos na loteria, mas um espaço pelo qual deveis lutar vós
também. Vós, jovens, deveis lutar pelo vosso espaço hoje, porque a vida é hoje.
Ninguém te pode prometer um dia do amanhã: a tua vida é hoje, o teu desafio é
hoje, o teu espaço é hoje. Como estás a responder a isto?
Vós, queridos jovens, não sois o
futuro. Gostamos de dizer-vos: «Sois o futuro...» Mas não é verdade! Vós sois o
presente! Não sois o futuro de Deus; vós, jovens, sois o agora de Deus.
Ele convoca-vos, chama-vos nas vossas comunidades, chama-vos nas vossas cidades,
para irdes à procura dos avós, dos adultos; para vos erguerdes de pé e,
juntamente com eles, tomar a palavra e realizar o sonho que o Senhor sonhou
para vós.
Não amanhã; agora! Pois, onde agora
está o teu tesouro, aí está também o teu coração (cf. Mt 6,21);
e, aquilo que vos apaixona, conquistará não apenas a vossa imaginação, mas
envolverá tudo. Será aquilo que vos faz levantar de manhã e incita nos momentos
de cansaço, aquilo que vos abrirá o coração enchendo-o de maravilha, de alegria
e de gratidão. Senti que tendes uma missão e apaixonai-vos por ela, tudo
dependerá disto (cf. Pedro Arrupe S.J., Nada és más
práctico). Poderemos ter tudo; mas, queridos jovens, se falta a paixão do
amor, faltará tudo! A paixão do amor hoje! Deixemos que o Senhor nos faça
enamorar e nos leve para o amanhã!
Para Jesus, não há um «entretanto», mas
um amor de misericórdia que quer penetrar no coração e conquistá-lo. Ele quer
ser o nosso tesouro, porque Jesus não é um «entretanto» na vida nem uma moda
passageira: é amor de doação que convida a doar-se.
É amor concreto, de hoje, próximo,
real; é alegria festiva que nasce da opção de participar na pesca miraculosa da
esperança e da caridade, da solidariedade e da fraternidade frente a tantos
olhares paralisados e paralisadores por causa dos medos e da exclusão, da
especulação e da manipulação.
Irmãos, o Senhor e a sua missão não são
um «entretanto» na nossa vida, qualquer coisa de passageiro, não são apenas um
Jornada Mundial da Juventude: são a nossa vida de hoje e para todo o caminho!
Ao longo de todos estes dias, como um
fundo musical, acompanhou-nos de modo especial o «faça-se» de Maria. Ela não Se
limitou a acreditar em Deus e nas suas promessas como algo possível, mas
acreditou em Deus e teve a coragem de dizer «sim» para participar neste agora do
Senhor. Possais vós, de igual modo, sentir que tendes uma missão, deixar-vos
apaixonar… e o Senhor decidirá tudo.
E como sucedeu na sinagoga de Nazaré, o
Senhor, no meio de nós, dos seus amigos e conhecidos, de novo Se ergue de pé,
toma o livro e diz-nos: «Cumpriu-se hoje esta passagem da Escritura, que
acabais de ouvir» (Lc 4,21).
Queridos jovens, quereis viver em
concreto o vosso amor? O vosso «sim» continue a ser a porta de entrada para que
o Espírito Santo conceda um novo Pentecostes à Igreja e ao mundo. Assim seja.
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