No dia 16 de janeiro de 2023 o Papa Francisco encontrou-se com a Confederação das Confrarias das Dioceses da Itália. Embora as Confrarias ou Irmandades (associações de fiéis leigos que promovem uma determinada devoção) não sejam tão comuns no Brasil, reproduzimos aqui seu discurso, que se aplica à piedade popular como um todo.
Em seu discurso, com efeito, Francisco retoma basicamente sua homilia no Dia das Confrarias e da Piedade Popular no Ano da Fé (2013).
Papa Francisco
Discurso à Confederação das Confrarias das Dioceses da Itália
Sala do Consistório
Segunda-feira, 16 janeiro de 2023
Caros irmãos e irmãs, bom dia e bem vindos!
Estou
contente por encontrar-vos. Agradeço ao Presidente, Dr. Rino Bisignano, e a Dom
Michele Pennisi, Assistente Eclesiástico Nacional, assim como aos membros do
Conselho Diretivo da Confederação das Confrarias
das Dioceses da Itália, aos Coordenadores e aos Assistentes Regionais aqui
presentes.
Fundada
no ano 2000, no contexto do Grande Jubileu, vossa Confederação trabalha já há
mais de vinte anos para acolher, sustentar e coordenar a riquíssima e variada
presença das Confrarias nas Dioceses da Itália. Agora vos preparais para
celebrar, daqui a dois anos, o vosso 25º aniversário no contexto de outro
Jubileu, o de 2025, que tem como tema “Peregrinos da esperança”. Estamos nos preparando
para este momento forte da vida da Igreja, e vós sois uma realidade muito
significativa nesta preparação e depois na celebração.
Em
primeiro lugar, por sua presença capilar no território nacional e pela
quantidade de pessoas que envolveis, com cerca de com cerca de três mil e
duzentas Confrarias inscritas - e tantas outras existentes, mas não inscritas -
e dois milhões de membros; e a estes se soma a comunidade ampliada de familiares
e amigos que se unem às suas atividades. É um quadro impressionante, que recorda
o que disse o Concílio Vaticano II sobre a natureza e a missão dos leigos na
Igreja, ou seja, que sois “chamados por Deus para contribuir, quase de dentro
como fermento, para a santificação do mundo” (Constituição Dogmática Lumen
gentium, n. 31).
O vosso “fermento” está bem presente no tecido eclesial e social italiano, e deve ser mantido vivo, para que possa fermentar toda a massa. Recomendava-o São João Paulo II em 1984, quando dizia: « Hoje a urgência da evangelização exige que também as Confrarias participem de modo mais intenso e direto na obra que a Igreja realiza para levar a luz, a redenção e a graça de Cristo aos homens do nosso tempo» (Jubileu das Confrarias no Ano Santo da Redenção, 01 de abril de 1984). No contexto da nova evangelização, a piedade popular constitui, com efeito, uma poderosa força de anúncio que tem muito a oferecer aos homens e às mulheres do nosso tempo (cf. Exortação Apostólica Evangelii gaudium, n. 126). Aqui me refiro à Evangelii gaudium, mas, sobre a piedade popular, aquele que continua a ser o texto mais forte, que ajuda tanto, é o de São Paulo VI, na Evangelii nuntiandi. É bom voltar sempre a esse testo, que esclareceu bem o lugar da piedade popular na vida da Igreja. A Evangelii nuntiandi ainda hoje é atual: é uma Exortação Apostólica profética, que ajuda, que nos faz andar avante!
Por isso vos
encorajo a cultivar com empenho criativo e dinâmico a vossa vida associativa e a
vossa presença caritativa, que se baseiam no dom do Batismo e que comportam um
caminho de crescimento sob a guia do Espírito Santo. Deixai-vos animar pelo
Espírito e caminhai: como fazeis nas procissões, fazei-o em toda a vossa
vida de comunidade. A riqueza e a memória da vossa história nunca se tornem
para vós causa de fechamento em si mesmos, de celebração nostálgica do passado,
de fechamento para o presente ou de pessimismo para o futuro; sejam, ao
contrário, um forte estímulo a reinvestir hoje em vosso patrimônio espiritual,
humano, econômico, artístico, histórico e também folclorístico, abertos aos sinais
dos tempos e às surpresas de Deus. Foi com esta fé e com esta apertura que aqueles
que vos precederam deram origem outrora às vossas fraternidades. Sem esta fé e esta
abertura, não nos encontraríamos aqui hoje, tão numerosos, para dar graças ao Senhor
por tanto bem recebido e realizado! Com tantas Confrarias!
Gostaria
de convidar-vos a articular o vosso caminho segundo três linhas fundamentais: evangelicidade,
eclesialidade e missionariedade. Eu resumiria estas indicações da
seguinte forma: caminhar nos passos de Cristo; caminhar juntos;
caminhar anunciando o Evangelho.
Antes de tudo,
caminhar nos passos de Cristo. Exorto-vos a cultivar a centralidade de
Cristo na vossa vida, na escuta diária da Palavra de Deus. Isto é muito
importante: a proximidade ao Evangelho. Nós devemos ler o Evangelho todos os
dias. Eu vos aconselho: tomai um pequeno Evangelho e levai-o no bolso ou na bolsa
e durante o dia, quando tiverdes um pouco de tempo, lede alguma coisa. Um
pequeno trecho todos os dias. Fazer crescer o Evangelho, fazer crescer o
coração. Contato físico com o Evangelho e depois contato espiritual.
Exorto-vos, pois, a cultivar a centralidade de Cristo organizando e
participando regularmente de momentos de formação, na frequência assídua aos
Sacramentos, em uma intensa vida de oração pessoal e litúrgica. As vossas
antigas tradições litúrgicas e devocionais sejam animadas por uma vida
espiritual intensa, com fervor, e pelo empenho concreto da caridade. E não
tenhais medo de atualizá-las em comunhão com o caminho da Igreja, para que
possam ser um dom acessível e compreensível para todos, no contexto em que
viveis e trabalhais, e um estímulo a aproximar-se da fé também para os que
estão longe.
Segundo: caminhar
juntos. A história das Confrarias oferece à Igreja uma experiência secular
de sinodalidade, que se exprime através de instrumentos comunitários de
formação, de discernimento e de deliberação, e através de um contato vivo com a
Igreja local, com os Bispos e com as Dioceses. Os vossos conselhos e as vossas assembleias
- como vos pediu o amado Papa Bento XVI - nunca se reduzam a encontros puramente
administrativos e particularísticos (cf. Discurso à Confederação das
Confrarias das Dioceses da Itália, 10 de novembro de 2007), mas sejam
sempre e antes de tudo lugares de escuta de Deus e da Igreja, de diálogo
fraterno, caracterizado por um clima de oração de caridade sincera. Só assim poderão
ajudar-vos a ser realidades vivas e a encontrar novos caminhos de serviço e de evangelização.
E isto
nos leva à terceira dimensão do vosso caminho: caminhar anunciando o
Evangelho, testemunhando a vossa fé e cuidando dos vossos irmãos,
especialmente das novas pobrezas do nosso tempo, como muitos de vós têm demonstrado
neste tempo de pandemia. Estudai bem quais são as novas pobrezas. Nós talvez
não saibamos, mas são tantas, as novas pobrezas. Nesse sentido, a história das
Confrarias tem um grande patrimônio carismático. Não percais essa herança! Conservai
vivo o carisma do serviço e da missão, respondendo com criatividade e coragem
às necessidades do nosso tempo.
Evangelicidade, eclesialidade e missionariedade: estas, caros irmãos e irmãs, são as três palavras que vos confio hoje. E gostaria de concluir renovando o convite a que sejais “missionários do amor e da ternura de Deus, missionários da misericórdia de Deus, que sempre nos perdoa, sempre espera por nós e nos ama tanto!» (Dia das Confrarias e da Piedade Popular no Ano da Fé, 05 de maio de 2013).
A Virgem
Maria, que com tantos títulos venerais como vossa Mãe, vos guarde e guie
sempre. Abençoo de coração a vós, a todos os coirmãos e coirmãs e as vossas famílias.
E vos peço: não esqueçais de rezar por mim. Obrigado!
Tradução livre nossa a partir do original italiano divulgado no site da Santa Sé.
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