sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Homilia do Papa: Missa em Palermo

Visita Pastoral do Papa Francisco à Diocese de Palermo por ocasião do 25º aniversário da Morte do Beato Pino Puglisi
Celebração da Santa Missa na Memória Litúrgica do Beato Pino Puglisi
Homilia do Santo Padre
Palermo, Foro Itálico
Sábado, 15 de setembro de 2018

Hoje Deus fala-nos de vitória e de derrota. São João, na primeira leitura, apresenta a fé como «a vitória que venceu o mundo» (1Jo 5,4), enquanto que no Evangelho apresenta a frase de Jesus: «Quem ama a sua vida perdê-la-á» (Jo 12,25).
Esta é a derrota: perde quem ama a própria vida. Porquê? Certamente não porque se deve aborrecer a vida: a vida deve ser amada e defendida, é o primeiro dom de Deus! O que leva à derrota é amar a própria vida, isto é, amar o que é seu. Quem vive para o que é seu perde, é um egoísta, dizemos nós. Pareceria o contrário. Quem vive para si, quem multiplica os seus negócios, quem tem sucesso, quem satisfaz plenamente as suas necessidades aos olhos do mundo é considerado vencedor. A publicidade martela-nos com esta ideia - a ideia de procurar o que é próprio, o egoísmo - mas Jesus não concorda e inverte-a. Segundo Ele, quem vive para si não só perde algo, mas também a vida inteira; enquanto que quem se doa a si mesmo encontra o sentido da vida e vence.
Portanto, é preciso escolher: amor ou egoísmo. O egoísta pensa em cuidar da própria vida e apega-se às coisas, ao dinheiro, ao poder, ao prazer. Então o diabo tem as portas abertas. O diabo “entra pelos bolsos”, se fores apegado ao dinheiro. O diabo faz acreditar que tudo corre bem mas na realidade o coração anestesia-se com o egoísmo. O egoísmo é uma anestesia muito forte. Este caminho acaba sempre mal: no fim ficamos sozinhos, com o vazio dentro. O fim dos egoístas é triste: vazios, sozinhos, circundados apenas por quantos querem herdar. É como o grão de trigo do Evangelho: se ficar fechado em si permanece sozinho debaixo da terra. Ao contrário, se se abrir e morrer, dará muito fruto na superfície.
Mas vós poderíeis dizer-me: doar-se, viver para Deus e pelos outros é uma grande canseira por nada, mas a realidade do mundo é outra: para ir em frente servem grãos de trigo, dinheiro e poder. Mas é uma grande ilusão: o dinheiro e o poder não libertam o homem, escravizam-no. Vede: Deus não exerce o poder para resolver os nossos males nem os do mundo. O seu caminho é sempre o do amor humilde: só o amor liberta dentro, dá paz e alegria. Por isso o verdadeiro poder, o poder segundo Deus, é o serviço. É Jesus quem o diz. E a voz mais forte não é a que grita mais. A voz mais forte é a oração. E o maior sucesso não é a própria fama, como o pavão, não. A maior glória, o maior sucesso é o próprio testemunho.
Queridos irmãos e irmãs, hoje somos chamados a escolher de que parte estar: viver para si - com a mão fechada [faz o gesto] -ou doar a vida - a mão aberta [faz o gesto]. Só doando a vida derrotamos o mal. Um preço alto, mas só assim [se derrota o mal]. O padre Pino ensina isto: não vivia para se mostrar, não vivia de apelos antimáfia, nem sequer se contentava com não fazer nada de mal, mas semeava o bem, tanto bem. A sua parecia uma lógica fracassada, e parecia vencedora a lógica do porta-moedas. Mas o padre Pino tinha razão: a lógica do deus dinheiro é sempre fracasso. Olhemos para dentro de nós. Ter estimula sempre a querer: tenho uma coisa e quero imediatamente outra, e depois outra e cada vez mais, sem fim. Quanto mais tens mais queres: é uma péssima dependência. É uma péssima dependência. É como uma droga. Quem se enche de coisas rebenta. Ao contrário, quem ama reencontra-se a si mesmo e descobre como é bom ajudar, como é bom servir; encontra a alegria interior e o sorriso exterior, como aconteceu com o padre Pino.
Há vinte e cinco anos, como hoje, quando morreu no dia do seu aniversário, coroou a sua vitória com o sorriso, com aquele sorriso que não deixou dormir de noite o seu algoz, o qual disse: «Havia uma espécie de luz naquele sorriso». O padre Pino era inerme, mas o seu sorriso transmitia a força de Deus: não um clarão ofuscante, mas uma luz suave que escava dentro e ilumina o coração. É a luz do amor, da doação, do serviço. Precisamos de muitos sacerdotes do sorriso. Precisamos de cristãos do sorriso, não porque levam as coisas a sério, mas porque são ricos apenas da alegria de Deus, pois creem no amor e vivem para servir. É doando a vida que se encontra a alegria, porque há mais alegria em dar do que em receber (cf. At 20,35). Então gostaria de vos perguntar: também vós quereis viver assim? Quereis dar a vida, sem esperar que os outros deem o primeiro passo? Quereis fazer o bem sem esperar nada em troca, sem esperar que o mundo se torne melhor? Amados irmãos e irmãs, quereis arriscar por este caminho, arriscar pelo Senhor?
O padre Pino, ele sim, sabia que arriscava, mas sabia sobretudo que o verdadeiro perigo na vida é não arriscar, é ir vivendo entre confortos, tentativas e atalhos. Deus nos livre de viver em descida, contentando-nos com meias-verdades. As meias-verdades não satisfazem o coração, não fazem o bem. Deus nos livre de uma vida pequena, que roda à volta dos “cepos”. Nos livre de pensar que tudo corre bem se para mim tudo corre bem, e o outro que se arranje. Nos livre de pensar que somos justos se nada fazemos para contrastar a injustiça. Quem nada faz para contrastar a injustiça não é um homem, uma mulher justo. Nos livre de nos considerarmos bons unicamente porque não fazemos nada de mal. “É bom - dizia um santo - não praticar o mal. Mas é mau não praticar o bem” [S. Alberto Hurtado]. Senhor, concedei-nos o desejo de praticar o bem; de procurar a verdade detestando a falsidade; de escolher o sacrifício, não a preguiça; o amor, não o ódio; o perdão, não a vingança.
A vida dá-se aos demais, a vida dá-se aos outros, não se tira. Não se pode crer em Deus e odiar o irmão, tirar a vida com o ódio. A primeira leitura recorda isto: «Se alguém disser: “eu amo a Deus” mas odiar a seu irmão, é mentiroso» (1Jo 4,20). Um mentiroso, porque desmente a fé que diz ter, a fé que professa Deus-amor. Deus-amor repudia qualquer violência e ama todos os homens. Por isso a palavra ódio deve ser cancelada da vida cristã; pois não se pode crer em Deus e subjugar o irmão. Não se pode crer em Deus e ser mafioso. Quem é mafioso não vive como cristão, porque blasfema com a vida o nome de Deus-amor. Hoje precisamos de homens e mulheres de amor, não de homens e mulheres de honra; de serviço, não de opressão. Precisamos de caminhar juntos, não de correr atrás do poder. Se a ladainha mafiosa é: “Tu não sabes quem eu sou”, a cristã é: “Eu preciso de ti”. Se a ameaça mafiosa é: “Tu vais pagar”, a prece cristã é: “Senhor, ajudai-me a amar”. Portanto, aos mafiosos digo: mudai, irmãos e irmãs! Deixai de pensar em vós mesmos e no vosso dinheiro. Tu sabes, vós sabeis, que “o sudário não tem bolsos”. Nada podeis levar convosco. Convertei-vos ao verdadeiro Deus de Jesus Cristo, amados irmãos e irmãs! A vós, mafiosos, digo: se não fizerdes isto, perdereis a vossa própria vida e será a pior das derrotas.
Hoje o Evangelho termina com o convite de Jesus: «Se alguém quiser servir-me, siga-me» (v. 26). Mas siga, isto é, ponha-se a caminho. Não se pode seguir Jesus com as ideias, é preciso lançar mãos à obra. «Se cada um fizer alguma coisa, muito pode ser feito», repetia o padre Pino. Quantos de nós põem em prática estas palavras? Hoje, diante dele questionemo-nos: o que posso fazer? Que posso fazer pelos outros, pela Igreja, pela sociedade? Não esperes que a Igreja faça algo por ti, começa tu. Não esperes que a sociedade o faça, começa tu! Não penses em ti mesmo, não fujas da tua responsabilidade, escolhe o amor! Sente a vida do teu povo em necessidade, ouve o teu povo. Receai a surdez de não ouvir o vosso povo. Este é o único populismo possível: ouvir o teu povo, o único “populismo cristão”: ouvir e servir o povo, sem bradar, acusar ou suscitar conflitos.
Assim fez o padre Pino, pobre entre os pobres da sua terra. No seu quarto, a cadeira onde estudava estava partida. Mas a cadeira não era o centro da vida, pois ele não estava sentado a repousar, mas vivia a caminho para amar. Eis a mentalidade vencedora. Eis a vitória da fé, que nasce da doação diária de si. Eis a vitória da fé, que leva o sorriso de Deus pelas estradas do mundo. Eis a vitória da fé, que nasce do escândalo do martírio. «Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos» (Jo 15,13). Estas palavras de Jesus, escritas no túmulo do padre Puglisi, recordam a todos que dar a vida foi o segredo da sua vitória, o segredo de uma vida boa. Hoje, queridos irmãos e irmãs, escolhamos também nós uma vida boa. Assim seja.


Fonte: Santa Sé

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