Recentemente o Papa Francisco promulgou o Motu Proprio Magnum Principium ("O grande princípio"), que modifica o cân. 838 do Código de Direito Canônico, um dos mais importantes sobre a Liturgia. Especificamente, o Motu Proprio altera algumas normas referentes à tradução dos textos litúrgicos.
Segue o texto do documento na íntegra e duas notas explicativas que o acompanham, publicadas pela própria Santa Sé:
Sumo Pontífice Francisco
Carta Apostólica em Forma de
«Motu Proprio» “Magnum Principium”
Com a qual modificou o cân. 838 do Código de
Direito Canônico
O importante
princípio, confirmado pelo Concílio Ecuménico Vaticano II, segundo o
qual a oração litúrgica, adaptada à compreensão do povo, possa ser assimilada,
exigiu uma importante tarefa, confiada aos Bispos, de introduzir a língua
vulgar na liturgia e de preparar e aprovar as versões dos livros litúrgicos.
A Igreja Latina
estava ciente do enorme sacrifício da perda parcial da própria língua, usada em
todo o mundo ao longo dos séculos, mas contudo abriu de bom grado a porta para
que as versões, como partes dos próprios ritos, se tornassem voz da Igreja que
celebra os mistérios divinos, juntamente com a língua latina.
Ao mesmo tempo,
especialmente depois das várias opiniões expressas de modo claro pelos Padres
Conciliares relativamente ao uso da língua vulgar na liturgia, a Igreja estava
ciente das dificuldades que se poderiam apresentar em relação a esta matéria.
Por um lado, era preciso unir o bem dos fiéis de qualquer idade e cultura e o
seu direito a uma participação consciente e ativa nas celebrações litúrgicas com
a unidade substancial do Rito Romano; por outro, as mesmas línguas vulgares
muitas vezes só de maneira progressiva teriam podido tornar-se línguas
litúrgicas, esplendorosas não diversamente do latim litúrgico por elegância de
estilo e pela gravidade dos conceitos a fim de alimentar a fé.
Era isto que
visavam algumas Leis litúrgicas, Instruções, Cartas circulares, indicações e
confirmações dos livros nas línguas vernáculas emanadas pela Sé Apostólica já
na época do Concílio, e isto tanto antes como depois das leis estabelecidas no
Código de Direito Canónico. Os critérios indicados foram e permanecem em linha
geral úteis e, na medida do possível, deverão ser seguidos pelas Comissões
litúrgicas como instrumentos adequados a fim de que, na grande variedade de
línguas, a comunidade litúrgica possa alcançar um estilo expressivo adequado e
congruente com cada uma das partes, mantendo a integridade e a fidelidade
cuidadosa, sobretudo na tradução de alguns textos de maior importância em cada
livro litúrgico.
O texto litúrgico,
enquanto sinal ritual, é meio de comunicação oral. Mas para os crentes que
celebram os ritos sagrados, também a palavra é um mistério: com efeito, quando
são proferidas as palavras, em particular quando se lê a Sagrada Escritura,
Deus fala aos homens, o próprio Cristo no Evangelho fala ao seu povo que, por
si ou através do celebrante, com a oração responde ao Senhor no Espírito Santo.
A finalidade das
traduções dos textos legislativos e dos textos bíblicos, para a liturgia da
palavra, é anunciar aos fiéis a palavra de salvação em obediência à fé e
exprimir a oração da Igreja ao Senhor. Com este objetivo é preciso comunicar
fielmente a um determinado povo, através da sua língua, o que a Igreja
pretendeu comunicar a outro por meio da língua latina. Mesmo se a fidelidade
nem sempre pode ser julgada por simples palavras mas no contexto de toda a ação
da comunicação e segundo o próprio género literário, contudo alguns termos
peculiares devem ser considerados também no contexto da íntegra fé católica, dado
que cada tradução dos textos litúrgicos deve ser congruente com a sã doutrina.
Não nos devemos
admirar que, durante este longo percurso de trabalho, tenham surgido
dificuldades entre as Conferências Episcopais e a Sé Apostólica. Para que as
decisões do Concílio acerca do uso das línguas vulgares na liturgia possam ser
válidas também no futuro, é extremamente necessária uma constante colaboração
cheia de confiança recíproca, vigilante e criativa, entre as Conferências
Episcopais e o Dicastério da Sé Apostólica que exerce a tarefa de promover a
sagrada Liturgia, ou seja, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos
Sacramentos. Por isso, a fim de que a renovação de toda a vida litúrgica
continue, pareceu oportuno que alguns princípios transmitidos desde o tempo do
Concílio sejam reafirmados e postos em prática de maneira mais clara.
Sem dúvida, deve-se
prestar atenção à utilidade e ao bem dos fiéis, e não se deve esquecer o
direito e o encargo das Conferências Episcopais que, juntamente com as Conferências
Episcopais de regiões que têm a mesma língua e com a Sé Apostólica, devem
garantir e estabelecer que, salvaguardada a índole de cada língua, seja dado
plena e fielmente o sentido do texto original e que os livros traduzidos, até
depois das adaptações, resplandeçam sempre pela unidade ao Rito Romano.
Para tornar mais
fácil e frutuosa a colaboração entre a Sé Apostólica e as Conferências
Episcopais neste serviço que deve ser prestado aos fiéis, disponho, com a
autoridade a mim confiada, que a disciplina canónica atualmente vigente no cân.
838 do C.I.C. seja tornada mais clara, para que, segundo quanto expresso na
Constituição Sacrosanctum concilium, em particular
nos artigos 36 §§ 3.4, 40 e 63, e na Carta Apostólica Motu Proprio Sacram Liturgiam, n. IX, seja mais
clara a competência da Sé Apostólica acerca das traduções dos livros litúrgicos
e das adaptações mais profundas, entre as quais se podem incluir também
eventuais novos textos a serem inseridos neles, estabelecidos e aprovados pelas
Conferências Episcopais.
Neste sentido, no
futuro o cân. 838 será lido como segue:
Cân. 838 - § 1.
Regular a sagrada liturgia depende unicamente da autoridade da Igreja: isto
compete propriamente à Sé Apostólica e, por norma de direito, ao Bispo diocesano.
§ 2. É da
competência da Sé Apostólica ordenar a sagrada liturgia da Igreja universal,
publicar os livros litúrgicos, rever [1] as
adaptações aprovadas segundo a norma do direito da Conferência Episcopal, assim
como vigiar para que as normas litúrgicas sejam fielmente observadas em toda a
parte.
§ 3. Compete às Conferências Episcopais preparar fielmente as versões
dos livros litúrgicos nas línguas correntes, convenientemente adaptadas dentro
dos limites definidos, aprová-las e publicar os livros litúrgicos, para as
regiões de sua pertinência, depois da confirmação da Sé Apostólica.
§ 4. Ao Bispo diocesano na Igreja a ele confiada compete, dentro dos
limites da sua competência, estabelecer normas em matéria litúrgica, as quais
todos devem respeitar.
Por consequência devem ser interpretados quer o art. 64 § 3 da
Constituição Apostólica Pastor bonus quer
as outras leis, em particular as que estão contidas nos livros litúrgicos,
acerca das suas versões. De igual modo disponho que a Congregação para o Culto
Divino e a Disciplina dos Sacramentos modifique o próprio “Regulamento” com
base na nova disciplina e ajude as Conferências Episcopais a desempenhar a sua
tarefa e se comprometa a promover cada vez mais a vida litúrgica da Igreja
Latina.
Quanto deliberado com esta Carta apostólica em forma de “motu proprio”,
ordeno que tenha vigor firme e estável, não obstante qualquer coisa contrária
mesmo se digna de especial menção, e que seja promulgado através da publicação
em L’Osservatore Romano, entrando em vigor a 1 de outubro de 2017,
e publicado nas Acta Apostolicae Sedis.
Dado em Roma, junto de São Pedro a 3 de setembro de 2017 quinto do meu
Pontificado.
Francisco
[1] Na
versão italiana do C.I.C., comumente em uso, o verbo “recognoscere” é traduzido por “autorizar”, mas a Nota
explicativado Pontifício Conselho para a interpretação dos Textos
Legislativos esclareceu que a recognitio «não é uma aprovação
genérica e breve e muito menos uma simples “autorização”. Trata-se, ao
contrário, de um exame ou revisão atenta e pormenorizada...» (28 de abril de
2006).
Nota sobre o cânone 838 à
luz de fontes conciliares e pós-conciliares
Por ocasião da
publicação do Motu Proprio Magnum principium, com o qual o Papa
Francisco estabelece algumas variações nos parágrafos 2 e 3 do cânone 838
do Código de Direito Canónico, o Secretário da
Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos oferece na
seguinte Nota um comentário das fontes que estão na base de tais parágrafos,
considerando a formulação até agora em vigor e a nova.
O texto hodierno
Até agora assim
recitam os dois seguintes parágrafos do cân. 838:
§ 2. «Apostolicae
Sedis est sacram liturgiam Ecclesiae universae ordinare, libros liturgicos
edere eorumque versiones in linguas vernaculas recognoscere, necnon advigilare
ut ordinationes liturgicae ubique fideliter observentur».
§ 3. «Ad
Episcoporum conferentias spectat versiones in linguas vernaculas, convenienter
intra limites in ipsis libris liturgicis definitos aptatas, parare easque
edere, praevia recognitione Sanctae Sedis».
Para o § 2, as
referências são o n. 21 da Instrução Inter Oecumenici (26 de setembro
de 1964) e o cân. 1257 do C.D.C. de 1917.
Para o § 3, são
a Sacrosanctum Concilium n. 22 § 2 e n.
36 §§ 3-4; S. Congr. pro Sacramentis et Cultu Divino, Epist. Decem iam
annos (5 de junho de 1976); S. Congr. pro Doctrina Fidei, Ecclesiae pastorum (19 de março de
1975), art. 3.
Apesar das fontes
terem valor indicativo e não serem completas, podem-se fazer algumas anotações
a propósito.
Antes de tudo
acerca do § 2 do cân. 838. O n. 21 da Instrução Inter Oecumenici pertence
ao cap. I, VI. De competenti auctoritate in re liturgica (na
Const. art. 22) e recita: «Apostolicae Sedis est tum libros liturgicos
generales instaurare atque approbare, tum sacram Liturgiam in iis quae
universam Ecclesiam respiciunt ordinare, tum Acta et deliberationes
auctoritatis territorialis probare seu confirmare, tum eiusdem auctoritatis
territorialis propositiones et petitiones accipere». Parece clara uma
pressuposta igualdade entre o verbo “recognoscere” usado no § 2 do cân. 838 e a
expressão “probare seu confirmare” usada na Inter Oecumenici. Esta última
expressão foi desejada pela Comissão litúrgica do Concílio Vaticano II para
substituir a terminologia derivante do verbo “recognoscere” (“actis
recognitis”), com referência ao cân. 250 § 4 (cf. cân. 304 § 2) do C.D.C. de
1917, como foi explicado aos Padres conciliares na Relatio e por eles
votado no n. 36 § 3 da Sacrosanctum Concilium na forma «actis
ab Apostolica Sede probatis seu confirmatis». Pode-se notar ainda que o n. 21
da Inter Oecumenici diz respeito a todos os atos das autoridades
territoriais, enquanto neste ponto o Código o aplica especificamente às
«interpretationes textum liturgicorum», matéria que a Inter
Oecumenici trata explicitamente no n. 40.
Acerca do § 3 do
cân. 838, a referência à Sacrosanctum Concilium n. 22 § 2 é
pertinente. Para a referência com a Sacrosanctum Concilium n. 36 §§ 3-4 (o
§ 3 trata «de usu et modo linguae vernaculae statuere, actis ab Apostolica Sede
probatis seu confirmatis» e o § 4 da «conversio textus latini in linguam
vernaculam in Liturgia adhibenda, a competenti auctoritate ecclesiastica
territoriali, de qua supra, approbari debet») é evidente que, para a tradução,
não se pede uma probatio seu confirmatio, nem uma recognitio em
estreito sentido jurídico, como exige o cân. 455 § 2.
A vicissitude em
relação a um trecho do Motu Proprio Sacram Liturgiam n. IX (25 de janeiro
de 1964), que pela reação dos Padres Conciliares foi emendado na Acta
Apostolicae Sedis, parece que não foi considerada adequadamente. Quando o Sacram Liturgiam foi publicado em
L’Osservatore Romano de 29 de janeiro de 1964, lia-se: «... populares
interpretationes, a competente auctoritate ecclesiastica territoriali
propositas,[1] ab
Apostolica Sede esse rite recognoscendas [2] atque
probandas». Mas na Acta Apostolicae Sedis foi adotada a terminologia
conciliar: «...populares interpretationes, a competente auctoritate
ecclesiastica territoriali conficiendas et approbandas esse, ad normam art. 36,
§§ 3 et 4; acta vero huius auctoritatis, ad normam eiusdem art. 36, § 3, ab
Apostolica Sede esse rite probanda seu confirmanda». [3] Portanto,
o Motu Proprio Sacram Liturgiam distinguia a
aprovação das traduções como tais por parte das autoridades territoriais com um
decreto que as tornava obrigatórias, e o facto que tal ato devia ser «probatus
seu confirmatus» pela Sé Apostólica. Deve-se notar ainda que o Sacram Liturgiam acrescenta: «Quod ut
semper servetur praescribimus, quoties liturgicus quidam textus latinus a
legitima, quam diximus, auctoritate in linguam vernaculam convertetur».[4] A
prescrição refere-se aos dois momentos distintos, ou seja, o conficere et
approbare uma tradução e o ato de a tornar obrigatória com a publicação do
livro que a contém.
A referência
cruzada com a Epist. Decem iam annos da S. Congregatio pro
Sacramentis et Cultu Divino é pertinente, mas deve-se notar que nunca usa o
termo “recognoscere” mas só “probare, confirmare, confirmatio”.
Quanto
ao Ecclesiae pastorum da S. Congregatio pro Doctrina Fidei, art. 3
(composto de três números), só o n. 1 se refere à nossa questão e recita: «1.
Libri liturgici itemque eorum versiones in linguam vernaculam eorumve partes ne
edantur nisi de mandato Episcoporum Conferentiae atque sub eiusdem vigilantia,
praevia confirmatione Apostolicae Sedis». O n. 2 concerne às reedições, e o n.
3 aos livros de oração. Contudo, deve-se notar que às Conferências Episcopais
se atribuem a vigilância e o mandato, enquanto à Sé Apostólica a “praevia
confirmatio” acerca do livro que se edita, e não precisamente uma “recognitio”
da versão, como ao contrário recita o cân. 838.
O texto novo
Com a modificação
decidida pelo Motu Proprio Magnum principium, os §§
2 e 3 do cân. 838 recitam:
§ 2. «Apostolicae
Sedis est sacram liturgiam Ecclesiae universae ordinare, libros liturgicos
edere, aptationes, ad normam iuris a Conferentia Episcoporum approbatas,
recognoscere, necnon advigilare ut ordinationes liturgicae ubique fideliter
observentur».
§ 3. «Ad
Episcoporum Conferentias spectat versiones librorum liturgicorum in linguas
vernaculas fideliter et convenienter intra limites definitos accommodatas
parare et approbare atque libros liturgicos, pro regionibus ad quas pertinent,
post confirmationem Apostolicae Sedis edere».
O § 2 agora diz
respeito às “aptationes” (já não se nomeiam as “versiones”, matéria do § 3),
isto é, textos e elementos que aparecem na editio typica latina, assim
como as “profundiores aptationes” contempladas pela Sacrosanctum Concilium n. 40 e
reguladas pela Instrução Varietates legitimae sobre a liturgia romana
e a inculturação (25 de janeiro de 1994); aprovadas pela Conferência Episcopal,
as “aptationes” devem ter a “recognitio” da Sé Apostólica. A referência é
à Sacrosanctum Concilium n. 36 § 3. O §
2 modificado conserva, entre as suas fontes, o cân. 1257 do CDC de 1917, e
acrescenta a referência à Instrução Varietates legitimae que trata da
aplicação dos nn. 39 e 40 da Sacrosanctum Concilium, para a qual se
exige uma verdadeira “recognitio”.
O § 3 refere-se às
“versiones” dos textos litúrgicos que, é especificado melhor, devem ser feitas
“fideliter” e aprovadas pelas Conferências Episcopais. A referência é à Sacrosanctum Concilium n. 36 § 4 e
também à analogia com o cân. 825 § 1 acerca da versão da Sagrada Escritura.
Tais versões são editadas nos livros litúrgicos, depois de ter recebido a “confirmatio”
da Sé Apostólica, como disposto pelo Motu Proprio Sacram Liturgiam, n. IX.
A formulação
anterior no § 3 do cân. 838: «intra limites in ipsis libris liturgicis
definitos aptatas», devedora da Sacrosanctum Concilium n. 39 («Intra
limites in edititionibus typicis librorum liturgicorum statutos... aptationes
definire»), concernente às “aptationes” e não às “versiones” das quais agora
trata este parágrafo, é apresentada com a expressão «intra limites definitos
accommodatas», utilizando a terminologia do n. 392 do Institutio Generalis
Missalis Romani; isto permite fazer oportuna distinção em relação às
“aptationes” nomeadas no § 2.
Portanto o § 3
aperfeiçoado continua a fundar-se na Sacrosanctum Concilium n. 22 § 2; n.
36 §§ 3 - 4; S. Congr. pro Sacramentis et Cultu Divino, Epist. Decem iam
annos (5 de junho de 1976); S. Congr. pro Doctrina Fidei, Ecclesiae pastorum (19 de março de
1975), art. 3, com o acréscimo da referência aos nn. 391 e 392
do Institutio Generalis Missalis Romani (ed. typica tertia), evitando
contudo o termo “recognoscere, recognitis”, de modo que o ato da Sé Apostólica
relativo às versões, preparadas pelas Conferências Episcopais com particular
fidelidade ao sentido do texto latino (ver o acréscimo do “fideliter”), não
possa ser equiparado à disciplina do cân. 455, mas incluído na ação de uma
“confirmatio” (como expressa tanto a Decem iam annos como a Ecclesiae pastorum, art. 3).
A “confirmatio” é
um ato de autoridade com o qual a Congregação para o Culto Divino e a
Disciplina dos Sacramentos ratifica a aprovação dos Bispos, deixando a
responsabilidade da tradução, presumidamente fiel, ao munus doutrinal
e pastoral da Conferência dos Bispos. Resumindo, realizada ordinariamente na
base da confiança, a “confirmatio” supõe uma positiva avaliação da fidelidade e
da congruência dos textos produzidos em relação ao texto típico latino, tendo
em conta sobretudo os textos de maior importância (por exemplo as fórmulas
sacramentais, que exigem a aprovação do Santo Padre, o Rito da Missa, as
orações eucarísticas e de ordenação, que requerem uma revisão esmerada).
Como recordado no Motu Proprio Magnum principium, as
mudanças do cân. 838, §§ 2 e 3, têm consequências no art. 64 § 3 da Constituição
Apostólica Pastor bonus, no Institutio Generalis
Missalis Romani e nos Praenotanda dos livros litúrgicos, nos
lugares que se ocupam da matéria das traduções e das adaptações.
Sábado 9 de setembro de 2017
[2] A Sacrosanctum Concilium no § 3 do art.
36 diz: “actis ab Apostolica Sede probatis seu confirmatis”.
Comentário do Secretário da Congregação para o Culto Divino e a
Disciplina dos Sacramentos, Arcebispo Arthur Roche
Uma chave de leitura
O Motu proprio “Magnum principium” muda a formulação de
algumas normas do Codex iuris canonici respeitantes à edição dos livros litúrgicos nas
línguas correntes. Com o Motu proprio Magnum principium, datado de 3 de
setembro de 2017 e que no próximo no dia 1 de outubro entrará em vigor, o Papa
Francisco introduziu algumas modificações ao texto do cânone 838. A explicação
dos motivos das variações é oferecida pelo próprio documento pontifício, que
recorda e expõe os princípios que estão na base da tradução dos textos
litúrgicos típicos em língua latina e as instâncias implicadas no delicado
trabalho. Sendo oração da Igreja, a liturgia é de facto regulada pela
autoridade eclesial.
Considerando a importância dos desafios, já os padres do
concílio Vaticano II tinham interpelado, neste âmbito, quer a Sé apostólica
quer as conferências episcopais (cfr. Sacrosanctum Concilium, nn. 36, 40 e
63). Com efeito, o grave compromisso de providenciar traduções litúrgicas foi
guiado por normas e por instruções específicas do dicastério competente, em
particular Comme le prévoit (25 de janeiro de 1969) e, depois
o Codex iuris canonici de 1983, da Liturgiam authenticam (28 de março
de 2001), ambos publicados, em fases diferentes, com o objetivo de responder a
problemas concretos evidenciados ao longo do tempo e suscitados pelo trabalho
complexo que a tradução dos textos litúrgicos comporta. Ao contrário,
relativamente ao âmbito da inculturação, a matéria foi regulada pela
instrução Varietates legitimae (25 de janeiro de 1994).
Considerada a experiência destes anos, agora - escreve o
Papa - «pareceu oportuno que alguns princípios transmitidos desde o período do
Concílio sejam reafirmados de forma mais clara e postos em prática». Portanto,
tendo em conta o caminho percorrido e olhando para o futuro, com base na
constituição litúrgica do Vaticano II Sacrosanctum Concilium, o Pontífice
quis especificar a disciplina em vigor introduzindo algumas variações ao cânone
838 do Codex iuris canonici.
A finalidade da modificação consiste em definir melhor os
papeis da Sé apostólica e das conferências dos bispos, chamadas a trabalhar em
diálogo entre eles, no respeito da própria competência, que é diferente e
complementar, relativamente à tradução dos livros típicos latinos, assim como
das eventuais adaptações, que podem dizer respeito aos textos e aos ritos. E
isto ao serviço da oração litúrgica do povo de Deus.
Em particular, na nova formulação do cânone em questão se
faz uma mais adequada distinção, relativamente ao papel da Sé apostólica, entre
o âmbito próprio da recognitio e o da confirmatio, no respeito
de quanto compete às conferências episcopais, tendo em conta a sua
responsabilidade pastoral e doutrinal, assim como os seus limites de ação.
A recognitio, mencionada no § 2 do cânone 838,
implica o processo de reconhecimento por parte da Sé apostólica das legítimas
adaptações litúrgicas, inclusive as “mais profundas”, que as conferências
episcopais podem estabelecer e aprovar para os seus territórios, nos limites
consentidos. Portanto, neste terreno de encontro entre liturgia e cultura, a Sé
apostólica é chamada a recognoscere, ou seja, a rever e avaliar estas
adaptações, em virtude da salvaguarda da unidade substancial do rito romano: a
referência nesta matéria são os números 39-40 de Sacrosanctum Concilium, e a sua
aplicação, nos modos indicados ou não nos livros litúrgicos, é regulamentada
pela instrução Varietates legitimae.
Ao contrário, a confirmatio - terminologia já
adotada no Motu proprio Sacram Liturgiam n. IX (25 de
janeiro 1964) - diz respeito às traduções dos textos litúrgicos que, de acordo
com a Sacrosanctum Concilium (n. 36 §
4), compete às conferências episcopais preparar e aprovar; o § 3 do cânone 838
especifica que as versões devem ser realizadas fideliter conforme os textos originais, tendo em conta deste
modo a preocupação principal da instrução Liturgiam authenticam. Com efeito,
evocando o direito e a responsabilidade da tradução confiada às conferências
episcopais, oMotu proprio recorda igualmente que as
mesmas conferências «devem fazer com que e, ao mesmo tempo, estabelecer que, ao
salvaguardar a natureza de cada língua, seja dado plena e fielmente o sentido
do texto original».
Portanto, a confirmatio da Sé apostólica não se
apresenta como uma intervenção alternativa de tradução, mas como um ato
autoritativo com o qual o dicastério competente ratifica a aprovação dos
bispos. Supondo obviamente uma avaliação positiva da fidelidade e da
congruência dos textos produzidos em relação à edição típica sobre a qual se
funda a unidade do rito, e tendo em conta sobretudo os textos de maior
importância, especialmente as fórmulas sacramentais, as orações eucarísticas,
as orações de ordenação, o rito da missa, e assim por diante.
A modificação do Codex iuris canonici comporta naturalmente um ajustamento do artigo 64 § 3 da constituição apostólica Pastor bonus, assim como da normativa em matéria de traduções. Isto implica a necessidade de corrigir alguns números do Institutio generalis missalis Romani e dos Praenotanda dos livros litúrgicos. A própria instrução Liturgiam authenticam, que deve ser apreciada pelas válidas atenções que reserva a este complicado trabalho e às suas implicações, quando pede a recognitio deve ser interpretada à luz da nova formulação do cânone 838. Por fim, o Motu proprio estabelece que também a Congregação para o culto divino e a disciplina dos sacramentos «modifique o próprio Regulamento com base na nova disciplina e ajude as Conferências Episcopais a levar a cabo a própria tarefa».
A modificação do Codex iuris canonici comporta naturalmente um ajustamento do artigo 64 § 3 da constituição apostólica Pastor bonus, assim como da normativa em matéria de traduções. Isto implica a necessidade de corrigir alguns números do Institutio generalis missalis Romani e dos Praenotanda dos livros litúrgicos. A própria instrução Liturgiam authenticam, que deve ser apreciada pelas válidas atenções que reserva a este complicado trabalho e às suas implicações, quando pede a recognitio deve ser interpretada à luz da nova formulação do cânone 838. Por fim, o Motu proprio estabelece que também a Congregação para o culto divino e a disciplina dos sacramentos «modifique o próprio Regulamento com base na nova disciplina e ajude as Conferências Episcopais a levar a cabo a própria tarefa».
Fonte: Santa Sé
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