sábado, 2 de abril de 2016

Homilia: II Domingo da Páscoa - Ano C

 Santo Agostinho
Sermão 88
Nossa fé tem grande mérito

Vossa santidade sabe tão bem quanto eu que nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo é o médico de nossa salvação eterna, e que assumiu a enfermidade de nossa natureza, para que nossa enfermidade não fosse sempiterna. Assumiu, na verdade, um corpo mortal, para nele matar a morte. E se é verdade que foi crucificado por nossa debilidade - como diz o Apóstolo -, vive agora pela força de Deus.
Do mesmo Apóstolo são essas palavras: Já não morre mais, a morte já não tem domínio sobre Ele. Tudo isso é bem conhecido de vossa fé. Porém, devemos também saber que todos os milagres que realizou nos corpos têm por objetivo fazer-nos chegar ao que nem passa nem terá fim. Devolveu aos cegos os mesmos olhos que um dia a morte haveria de fechar; ressuscitou a Lázaro, que novamente deveria morrer. E tudo quanto fez pela salvação dos corpos, não os fez para torná-los imortais, se bem que tivesse a intenção de conceder também aos corpos, ao final dos tempos, a salvação eterna. Mas como as maravilhas invisíveis não eram cridas, quis, através de ações visíveis e temporais, alçar a fé para as coisas invisíveis.
Então, que ninguém diga, irmãos, que atualmente nosso Senhor Jesus Cristo já não realiza os milagres que fazia antes e, em consequência, preferisse os primeiros tempos da Igreja aos presentes; pois em certo lugar o próprio Senhor coloca aos que creem sem ver acima dos que creram por terem visto. Na verdade, a fé dos discípulos era na época de tal modo vacilante que, mesmo vendo ao Mestre Ressuscitado, necessitaram apalpar-lhe parar crer.
Não lhes bastou vê-lo com os próprios olhos: quiseram apalpar com as mãos seu corpo e as cicatrizes das feridas recentes; até o ponto de que o discípulo que tinha duvidado, tão prontamente como tocou e reconheceu as cicatrizes, exclamou: Meu Senhor e meu Deus! Aquelas cicatrizes eram as credenciais d’Aquele que tinha curado as feridas dos demais.
O Senhor não podia ressuscitar sem as cicatrizes? Sem dúvida, mas sabia que no coração de seus discípulos ficavam feridas que haveriam se ser curadas pelas cicatrizes conservadas em seu corpo. E o que respondeu o Senhor ao discípulo que, reconhecendo-o por seu Deus, exclamou: Meu Senhor e meu Deus? Disse-lhe: Crestes porque me vistes? Bem-aventurados os que creram sem terem visto.
A quem ele chamou de bem-aventurados, irmãos, senão a nós?  E não somente a nós, mas a todos os que venham depois de nós. Porque, não muito tempo depois, tendo-se apartado de seus olhos mortais para fortalecer a fé em seus corações, todos os que doravante crerão nele, crerão sem ver-lhe, e sua fé teve grande mérito: para conquistar essa fé, mobilizaram unicamente seu piedoso coração, e não o coração e a mão comprovadora.


Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 596-597. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.

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