O Papa Francisco
abriu a XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos no último dia 03 de
outubro. Esta Assembleia, que se conclui no próximo dia 28, tem como tema “Os
jovens, a fé e o discernimento vocacional”.
Recentemente foi
publicado pela Santa Sé o Instrumentum
laboris (Instrumento de trabalho) que está servindo de base para as
discussões dos Padres Sinodais. Embora o tema da Liturgia não seja o mais
abordado no documento, ele ocupa sem dúvidas um papel importante, considerando
que a Liturgia é “a fonte e o ápice de toda a ação da Igreja” (Sacrosanctum Concilium, n. 10).
Diante disto, apresentamos aqui uma síntese das reflexões sobre a
Liturgia, os Sacramentos e a piedade popular presentes no documento. Dos seus
214 parágrafos, 14 fazem referência, direta ou indireta, a um destes temas.
No capítulo II da I
parte há duas menções à Liturgia: nn. 30 e 32. Primeiramente, no n. 30, que
reflete sobre “Espiritualidade e
religiosidade” (nn. 29-30), após tecer uma crítica a um modelo de
cristianismo que apresenta a santidade como algo além das capacidades humanas,
quase que inalcançável, “os jovens
católicos pedem propostas de oração e momentos sacramentais que possam
compreender a sua vida quotidiana” (n. 30).
Ainda neste
capítulo, o tema da Liturgia reaparece dois parágrafos à frente (n. 32), quando
se apresenta o tema “Os jovens na vida da
Igreja” (nn. 31-33). Neste parágrafo se recordam algumas atividades
eclesiais onde os jovens encontram certo espaço. Dentre elas mencionam-se “a animação da catequese e da Liturgia” e “a piedade popular”, que “continua a ser um importante acesso à fé
para as jovens gerações, que encontram no corpo, na afetividade, na música e no
canto importantes canais de expressão” (n. 32). Há uma referência positiva
ainda a encontros como a Jornada Mundial da Juventude, na qual estão presentes
também momentos de celebração.
Missa da JMJ 2013 no Rio de Janeiro |
No capítulo V da I
parte há também duas menções ao tema da Liturgia: nn. 69 e 72. No n. 69, que
apresenta o pedido dos jovens por “uma
Igreja mais relacional” (nn. 68-70), há uma afirmação muito importante: o
tema da Liturgia “retorna com frequência” nas contribuições dos jovens para o
Sínodo. Citamos o parágrafo na íntegra:
“Os jovens mais envolvidos na vida da Igreja expressaram vários pedidos
específicos. Retorna com frequência o
tema da Liturgia, a qual eles gostariam que fosse viva e próxima, enquanto
muitas vezes não permite experimentar «nenhum sentido de comunidade ou de
família enquanto Corpo de Cristo» (RP 7), e
das homilias, que muitos consideram inadequadas para acompanhá-los no
discernimento de sua situação à luz do Evangelho. «Os jovens são atraídos pela
alegria, que deveria ser um sinal distintivo da nossa fé» (RP 7), mas muitas
vezes as comunidades cristãs parecem não ser capazes de transmitir” (n. 69 - RP refere-se às conclusões da Reunião
Pré-Sinodal).
O n. 72, por sua
vez, recolhe “a palavra dos seminaristas
e dos jovens religiosos”. Foram três as constatações apresentadas por este
grupo: pedem uma Igreja mais fraterna, mais espiritual e mais coerente. Do
segundo pedido deriva a referência à Liturgia, que citamos na íntegra:
“Há, depois, uma exigência de
espiritualidade, de uma Igreja em cujo centro há a oração e a intimidade com
Deus. Em algumas partes do mundo há uma espontânea abertura à
transcendência; em outras, dominadas por um ‘humanismo exclusivo’, o pedido à
Igreja é que seja mística, capaz de abrir vislumbres de transcendência na vida
de homens e mulheres. Por isso alguns veem
a Liturgia como uma ocasião de profecia” (n. 72).
No capítulo IV da
II parte, dedicado ao tema do acompanhamento, há uma referência à Liturgia,
mais especificamente ao sacramento da Reconciliação. No n. 126, após salientar
a diferença entre acompanhamento espiritual e sacramento da Reconciliação, o
documento destaca a importância deste: “o
encontro no sacramento com a misericórdia de Deus é, porém, indispensável para
prosseguir no caminho” (n. 126).
Papa Francisco atende confissões na JMJ 2013 |
No capítulo II da III parte há apenas uma referência indireta à
Liturgia: o n. 162 apresenta a importância que a música ocupa na vida dos
jovens. Como esta ocupa igualmente um papel importante nas celebrações
litúrgicas, julgamos correto mencionar aqui este parágrafo.
O documento alerta para a “necessidade
de cuidar do canto e da música dentro da vida e do caminho de fé da comunidade”.
Ou seja, a música que se executa na Liturgia deve ser expressão da fé que se
celebra. Os próprios jovens advertem que “as
propostas que imitam as linguagens musicais contemporâneas mais comerciais não
favorecem a reflexão e a escuta interior”. O parágrafo menciona ainda a
atração de alguns jovens pelo canto gregoriano e pelos cantos das tradições
cristãs orientais.
O capítulo
III da III parte é o bloco que apresenta mais referências à Liturgia: são sete
ao todo (nn. 178; 183-184; 187-189; 192), metade das referências do documento.
Uma experiência familiar de Igreja
Primeiramente, no
n. 178, que apresenta a proposta de “uma
experiência familiar de Igreja”, os jovens pedem que também na Liturgia
transpareça a imagem da Igreja como família.
O “estilo familiar da Igreja” refere-se “à
qualificação das celebrações, porque na Liturgia se manifesta o estilo de uma
Igreja convocada por Deus para ser sua família” (n. 178). O mesmo parágrafo
afirma que ”em meio a uma vida
barulhenta e caótica, muitos jovens pedem à Igreja que seja uma casa espiritual”
(ibid).
À escuta e em diálogo com o Senhor
O nn. 183-184
apresentam o tema da espiritualidade. O n. 183 inicia elencando algumas
práticas que favorecem “a escuta e o
diálogo com Deus”: dentre elas destacam-se os “dias de retiro e exercícios espirituais”, os quais incluem os
momentos de celebração, e as “peregrinações
nacionais e diocesanas, experiências partilhadas de oração”. Ligado ao tema das peregrinações
aparece a referência aos santuários,
espaços privilegiados do encontro com Deus e da vivência da piedade popular.
O n. 184, por sua
vez, continua a reflexão acerca da espiritualidade, salientando sua dimensão
comunitária: “na qualidade espiritual da vida comunitária
encontram-se grandes oportunidades para aproximar os jovens da fé e da Igreja”. A
celebração litúrgica, que é sempre ação comunitária, deve ser, antes de tudo,
ação espiritual, pois a Liturgia é oração.
Adoração Eucarística na JMJ 2013 |
O gosto e a beleza da Liturgia
Os nn. 187-189
contêm as principais reflexões sobre a Liturgia presentes no Instrumentum laboris, portanto,
reproduzimo-los na íntegra na sequência.
Primeiramente, o n.
187 destaca a sensibilidade dos jovens à qualidade da Liturgia e
particularmente das homilias, destacando que eles não vêm à igreja buscar algo
que podem encontrar fora dela, mas buscam uma experiência autêntica:
“Uma Conferência Episcopal afirma que os jovens «não vêm à igreja para encontrar
algo que poderiam obter em outros lugares, mas buscam uma experiência religiosa
autêntica e até radical». Muitas respostas ao Questionário indicam que os jovens são sensíveis à qualidade da Liturgia.
De forma provocativa, a RP afirma que «os cristãos professam um Deus vivo, mas
não obstante a isso, encontramos celebrações e comunidades que parecem mortas»
(RP 7). No que se refere à linguagem e à qualidade das homilias, uma CE aponta
que «os jovens sentem falta de uma sintonia com a Igreja», e acrescenta:
«Parece que não compreendemos o vocabulário e, portanto, também as necessidades
dos jovens». Informações valiosas a esse respeito encontram-se na Evangelii Gaudium, nn. 135-144”
(n. 187).
O n. 188 trata da
relação entre Liturgia e fé (para usar o célebre axioma: lex orandi, lex credendi, isto é, a lei da oração é a lei da fé),
destaca a centralidade da Eucaristia e incentiva a pastoral dos ministrantes
(coroinhas e “acólitos”):
“Considerando que «a fé tem uma estrutura
sacramental» (Lumen Fidei, n. 40),
algumas Conferências Episcopais pedem que se desenvolva o vínculo genético
entre fé, sacramentos e Liturgia na concepção de percursos das pastorais
juvenis, a partir da centralidade da
Eucaristia «fonte e centro de toda a vida cristã» (LG 11) e «fonte e coroa
de toda a evangelização» (Presbyterorum
ordinis, 5). Tantas CE garantem que onde
a Liturgia e a ars celebrandi são bem-feitas há
sempre uma presença significativa de jovens ativos e partícipes.
Considerando que na sensibilidade juvenil não são os conceitos que falam, mas
as experiências, não as noções, mas as relações, algumas CE observam que as celebrações eucarísticas e outros
momentos litúrgicos – frequentemente considerados pontos de chegada – podem tornar-se um lugar e uma ocasião para
um renovado primeiro anúncio aos jovens. As Conferências Episcopais de
alguns países testemunham a eficácia da ‘pastoral
dos ministrantes’ para fazer com que os jovens experimentem o espírito da Liturgia;
contudo, será oportuno refletir sobre como oferecer uma adequada formação
litúrgica a todos os jovens” (n. 188).
Por fim, o n. 189
traz o tema da piedade popular, diretamente ligada à Liturgia:
“Também merece atenção o tema da piedade popular que em vários contextos
oferece aos jovens um acesso privilegiado à fé, tanto por estar relacionada à
cultura e às tradições locais, como por valorizar a linguagem do corpo e dos
afetos, elementos que dificilmente encontram espaço na Liturgia” (n. 189).
Via Sacra na JMJ 2013: exemplo de piedade popular |
Nutrir
a fé na catequese
O n. 192, que
compõe a reflexão sobre a catequese (nn. 190-193) destaca a relação intrínseca
entre Catequese e Liturgia, sugerindo valorizar o “caminho da beleza” (via
pulchritudinis), propondo aos jovens valorizar “o imenso patrimônio artístico e arquitetônico da Igreja” e “o encanto da Liturgia da Igreja em todos os
seus aspectos e ritos” (n. 192).
Na conclusão do
documento, toda ela centrada no tema da santidade, destaca-se no n. 213,
intitulado “A juventude, um tempo para a
santidade”, “o valor educativo dos sacramentos da
Eucaristia e da Reconciliação” (n. 213). Recomenda-se aos jovens, por fim,
contemplar o exemplo dos santos jovens, muitos deles celebrados ao ritmo da
Liturgia. “Na santidade de inúmeros jovens, a Igreja reconhece a graça de Deus
que impede e acompanha a história de cada pessoa” (ibid).
Fonte: Instrumentum laboris do Sínodo 2018
Apoio: Santa Inês Paramentos
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