Nas últimas semanas, o site Vatican News publicou uma série
de quatro textos comentando e aprofundando o discurso proferido pelo Papa
Francisco aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional, no dia 24 de
agosto de 2017, que nós publicamos aqui há exatamente um ano.
Estas postagens foram intercaladas pelos textos sobre a
História do Movimento Litúrgico, que igualmente já publicamos aqui.
30 de maio de 2018
Na edição de hoje deste nosso espaço memória histórica,
vamos recordar alguns pontos destacados pelo Papa Francisco em 24 de agosto de
2017, ao dirigir-se aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional, por
ocasião dos 50 anos da Constituição Sacrosanctum
Concilium.
Por ocasião do aniversário de 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium, o Papa Francisco
disse ao grupo de Liturgia da Conferência Episcopal da Itália que a reforma na
Liturgia, proposta pelo Concilio, não pode retroceder, tem que avançar, e que
há muito que realizar no Povo de Deus.
Na Sala Paulo VI, o Papa fez um discurso aos participantes
na 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália, em 24 de agosto de 2017, recordando
as etapas de todo o movimento litúrgico, que culminaram na compilação da
Constituição Sacrosanctum Concilium.
Papa Francisco resgata na história da Igreja as origens da
reforma litúrgica. Na verdade o movimento litúrgico, anterior ao concilio,
começou 200 anos antes. Papa Francisco disse assim em agosto desse ano: “Penso
em São Pio X que dispôs uma reorganização da música sacra e a restauração
celebrativa do domingo, e instituiu uma comissão para a reforma geral da
liturgia, ciente de que isto teria comportado «um trabalho quer grande quer
diuturno; e por isso - como ele mesmo reconhecia - é necessário que passem
muitos anos, antes que este, por assim dizer, edifício litúrgico [...]
reapareça de novo esplendoroso na sua dignidade e harmonia, quando tiver sido
como que limpo da desolação do envelhecimento”.
O projeto reformador - segundo palavras do próprio Papa
Francisco - foi retomado por Pio XII com a Encíclica Mediator Dei (1947) e com a instituição de uma comissão de estudo;
também ele tomou decisões concretas acerca da versão do Saltério, da atenuação
do jejum eucarístico, do uso da língua viva no Ritual (1955), da importante
reforma da Vigília Pascal e da Semana Santa. Deste impulso, a exemplo de outras
nações, surgiu na Itália o Centro de Ação Litúrgica, guiado por Bispos
cuidadosos do povo a eles confiado e animado por estudiosos que amavam a Igreja
e a pastoral litúrgica.
Pio XII, em 1947 - quase 20 anos antes do concilio Vaticano
II - dizia assim na Encíclica Mediator
Dei, no número 46: “Em verdade, não poucas são as causas pelas quais se
explica e desenvolve o progresso da sagrada liturgia durante a longa e gloriosa
história da Igreja. Assim, por exemplo, uma formação mais certa e ampla da
doutrina católica sobre a encarnação do Verbo de Deus, sobre os sacramentos,
sobre o sacrifício eucarístico, e sobre a virgem Maria Mãe de Deus, contribuiu
para a adoção de novos ritos, por meio dos quais a luz, mais esplendidamente
brilhante na declaração do magistério eclesiástico, veio a refletir melhor e
mais claramente nas ações litúrgicas para unir-se com maior facilidade à mente
e ao coração do povo cristão”.
Também nessa Encíclica, Pio XII já falava da participação
consciente dos fiéis na liturgia: “É necessário, pois, veneráveis irmãos, que
todos os fiéis tenham por seu principal dever e suma dignidade participar do
santo sacrifício eucarístico, não com assistência passiva, negligente e
distraída, mas com tal empenho e fervor que os ponha em contato íntimo com o
sumo sacerdote, como diz o Apóstolo: ‘Tende em vós os mesmos sentimentos que
Jesus Cristo experimentou’, oferecendo com ele e por ele, santificando-se com
ele (Mediator Dei, 73)”.
18 de julho de 2018
Temos dedicado diversos programas deste nosso espaço à
reforma litúrgica, suas raízes e à Constituição Sacrosanctum Concilium, promulgada pelo Papa Paulo VI no dia 4 de
dezembro de 1963, no final da segunda sessão conciliar, e definida pelo Papa
Francisco como “bom fruto da árvore da Igreja”, ao dirigir-se em 24 de agosto
de 2017 aos participantes da Semana Litúrgica Italiana. O Papa enfatizou na
ocasião que “a Liturgia é vida para todo o povo”, “não uma ideia a ser
compreendida” e “sem a presença real do mistério de Cristo, não há qualquer
vitalidade litúrgica”.
Por ocasião do aniversário do 50 anos da Constituição Sacrosanctum Concilium, o Papa
Francisco, na Sala Paulo VI, fez um discurso aos Participantes na 68ª Semana
Litúrgica Nacional – na Itália, em 24 de agosto de 2017, recordando aspectos
importantes da preparação do movimento litúrgico para a elaboração da
Constituição Sacrosanctum Concilium.
O Concílio Vaticano II - diz o Papa Francisco - fez madurar
depois, como bom fruto da árvore da Igreja, a Constituição sobre a Sagrada
Liturgia Sacrosanctum Concilium (SC),
cujas linhas de reforma geral respondiam às necessidades reais e à esperança
concreta de uma renovação: desejava-se uma liturgia viva para uma Igreja toda
vivificada pelos mistérios celebrados. Tratava-se de expressar de maneira
renovada a vitalidade perene da Igreja em oração, tendo o cuidado de que “os
cristãos não entrem neste mistério de fé como estranhos ou espectadores mudos,
mas participem na ação sagrada, consciente, ativa e piedosamente, por meio duma
boa compreensão dos ritos e orações” (SC, 48).
O Papa lembrou o rumo traçado pelo Concílio que encontrou
forma, segundo o princípio do respeito da tradição sadia e do progresso
legítimo (cf. SC, 23), nos livros litúrgicos promulgados pelo Beato Paulo VI,
bem recebidos pelos próprios Bispos que participaram no Concílio, e já há quase
50 anos universalmente em uso no Rito Romano. A aplicação prática, guiada pelas
Conferências Episcopais nos respectivos países, ainda está a decorrer, pois não
é suficiente reformar os livros litúrgicos para renovar a mentalidade. Papa Francisco
lembrou de que a mentalidade também precisa ser reformada, não só os ritos ou
livros.
Disse ainda que “os livros reformados nos termos dos
decretos do Vaticano II desencadearam um processo que requer tempo, recepção
fiel, obediência prática, atuação celebrativa sábia por parte, primeiro, dos
ministros ordenados, mas também dos outros ministros, dos cantores e de todos
os que participam na liturgia. Na realidade, sabemo-lo bem, a educação
litúrgica dos padres, bispos e fiéis é um desafio a ser enfrentado sempre de
novo. O próprio Paulo VI, um ano antes da morte, dizia aos Cardeais reunidos em
Consistório: «Chegou o momento, agora, de abandonar definitivamente os
fermentos desagregadores, igualmente perniciosos num sentido e noutro, e de
aplicar integralmente nos seus justos critérios inspiradores, a reforma por Nós
aprovada em aplicação aos votos do Concílio». E hoje ainda é preciso trabalhar
neste sentido, em particular redescobrindo os motivos das decisões tomadas com
a reforma litúrgica, superando leituras infundadas e superficiais, resseções
parciais e práticas que a desfiguram”.
Papa Francisco diz que depois deste magistério e, após este
longo caminho podemos afirmar com certeza e com autoridade magistral que a
reforma litúrgica é irreversível. A reforma na Liturgia, proposta pelo
Concílio, não pode retroceder, tem que avançar, e que há muito que realizar no
Povo de Deus – disse Papa Francisco na mensagem aos participantes da 68ª Semana
Litúrgica Nacional na Itália.
08/08/2018
Em 24 de agosto de 2017, o Papa Francisco encontrou-se com
os participantes da 68ª Semana Litúrgica nacional Italiana, onde recordou
alguns aspectos importantes da renovação litúrgica, destacando com veemência
que a reforma do Concílio não pode retroceder. Em seu pronunciamento, entre
outros, Francisco resgatou as origens da reforma litúrgica na Igreja. Vale destacar,
que esta tem suas origens no movimento litúrgico, que teve início 200 anos
antes do Concílio Vaticano II.
Na edição de hoje deste nosso espaço, o padre Gerson Schmidt
– sacerdote incardinado na Arquidiocese de Porto Alegre – dá continuidade a
esta série de reflexões, falando sobre “a Liturgia que emana do sacerdócio de
Cristo”:
Papa Francisco, por ocasião do aniversário do 50 anos da
Constituição Sacrosanctum Concilium,
fez um discurso aos Participantes na 68ª Semana Litúrgica Nacional na Itália,
em 24 de agosto de 2017, recordando aspectos importantes da renovação litúrgica.
Fez memória recordando o caminho percorrido antes do Concílio. O tema dessa
semana litúrgica, na Itália, foi: «Uma Liturgia viva para uma Igreja viva». Em
cima do tema o Papa disse assim:
“A liturgia é «viva» em virtude da presença viva d’Aquele
que «morrendo destruiu a morte e ressuscitando nos restituiu a vida» (Prefácio Pascal,
1). Sem a presença real do mistério de Cristo, não há qualquer vitalidade
litúrgica. Assim como sem pulsações cardíacas não há vida humana, do mesmo modo
sem o coração pulsante de Cristo não existe qualquer ação litúrgica. Com
efeito, o que define a liturgia é a concretização, nos santos sinais, do
sacerdócio de Jesus Cristo, ou seja, a oferta da sua vida até estender os
braços na cruz, sacerdócio tornado presente de maneira constante através dos
ritos e das orações, maximamente no seu Corpo e Sangue, mas também na pessoa do
sacerdote, na proclamação da Palavra de Deus, na assembleia congregada em
oração em seu nome (cf. SC, 7)”.
Portanto, o Papa Francisco lembra que a liturgia emana do sacerdócio de
Cristo, oferecido uma vez por todas na cruz, que se perpetua agora nos sinais,
nos ritos, no sacerdócio, na Palavra Proclamada, na assembleia congregada,
convocada pela Palavra”.
Papa Francisco ainda recordou a visibilidade e centralidade
do altar. Disse ele: “Entre os sinais visíveis do Mistério invisível está o
altar, sinal de Cristo pedra viva, descartada pelos homens mas que se tornou
pedra angular do edifício espiritual no qual é oferecido ao Deus vivente o culto
em espírito e verdade (cf. 1Pd 2,4; Ef 2,20). Por isso, o altar, centro para o
qual nas nossas igrejas converge a atenção, é dedicado, ungido com o crisma,
incensado, beijado, venerado: para o altar se orienta o olhar dos orantes,
sacerdotes e fiéis, convocados para a santa assembleia em volta do mesmo; em
cima do altar é colocada a oferta da Igreja que o Espírito consagra como
sacramento do sacrifício de Cristo; do altar nos são distribuídos o pão da vida
e o cálice da salvação «para que, em Cristo, nos tornemos um só corpo e um só
espírito» (Oração Eucarística III)”.
Essa fala do Papa nos remete aqui a devida ordem do
presbitério e o devido decoro que cabe a ordenação das coisas do altar. A
Constituição Sacrosanctum Concilium
fala da reforma dos livros litúrgicos, mas também do “conjunto das coisas
externas que se referem ao culto sagrado, especialmente quanto à digna e
funcional construção das igrejas, à forma e edificação dos altares, à nobreza,
disposição e segurança do tabernáculo eucarístico, à conveniência e honra do
batistério, bem como à conveniente colocação das sagradas imagens, da decoração
e ornamentação. O que parecer convir menos à reforma da Liturgia, seja emendado
ou abolido; o que, porém, a favorecer, seja mantido ou introduzido” (SC, 128).
Não se improvisa um presbitério, mas se prevê as coisas
ordenadamente, com zelo. Quantos presbitérios hoje vemos tão desproporcionais,
tão cheio de imagens e folhagens, que impedem a centralidade do altar. Temos
que rever e sentir que o menos aqui é mais. Há, tantas vezes poluição, não
sonora, mas visual. Tudo distrai, tudo desfoca para o centro principal que é o
altar.
15/08/2018
Temos dedicado alguns programas deste nosso espaço ao
discurso do Papa Francisco aos participantes da 68ª Semana Litúrgica Nacional,
realizada em 24 de agosto de 2017. Na última quarta-feira, falamos que “sem a
presença real do mistério de Cristo, não há qualquer vitalidade litúrgica” e
recordamos outro aspecto abordado pelo Santo Padre, “a visibilidade e
centralidade do altar”. No programa de hoje, padre Gerson Schmidt, que tem nos
acompanhado neste percurso dos documentos do evento conciliar, nos traz a
reflexão “Liturgia, ação do povo fiel”:
Finalmente ainda queremos destacar mais um ponto, quando
Sumo Pontífice Papa Francisco realizou no discurso aos participantes na 68ª
Semana Litúrgica Nacional na Itália, em 24 de agosto de 2017.
O Papa lembrou a etimologia da palavra Liturgia, liturgein – que significa ação do povo:
“A liturgia é vida para todo o povo da Igreja. Com efeito, por sua natureza, a
Liturgia é ‘popular’ e não clerical, sendo - como ensina a etimologia - uma
ação para o povo, mas também do povo. Como recordam tantas orações litúrgicas,
é a ação que o próprio Deus cumpre a favor do seu povo, mas também a ação do
povo que ouve Deus que fala e reage louvando-o, invocando-o, acolhendo a fonte
inexaurível de vida e de misericórdia que flui dos santos sinais.
A Igreja em oração congrega todos aqueles que têm o coração
à escuta do Evangelho, sem rejeitar ninguém: são convocados pequenos e grandes,
ricos e pobres, crianças e idosos, sadios e doentes, justos e pecadores – tal
qual já dizia São Justino da apologia que fez eucaristia nos primeiros séculos,
que está descrita na Catecismo.
À imagem da ‘multidão imensa’ que celebra a Liturgia no
santuário do céu (cf. Ap 7,9), a assembleia litúrgica supera, em Cristo,
qualquer limite de idade, raça, língua e nação.
O alcance ‘popular’ da Liturgia recorda-nos que ela é
inclusiva e não exclusiva, promotora de comunhão com todos sem todavia
homologar, pois chama cada um, com a sua vocação e originalidade, a contribuir
para edificar o corpo de Cristo: «A Eucaristia não é um sacramento ‘para mim’,
é o sacramento de muitos que formam um só corpo, o santo povo fiel de Deus».
Por conseguinte, não devemos esquecer que é antes de tudo a liturgia que
expressa a pietas de todo o povo de
Deus, prolongada depois por piedosos exercícios e devoções que conhecemos com o
nome de piedade popular, que devemos valorizar em harmonia com a liturgia”.
A celebração eucarística, portanto, não é uma ação isolada,
do sacerdote a Deus, para cumprir um preceito ou sacrifício meritório. A
Constituição Sacrosanctum Concilium,
nos números 33-34 lembra isso, nesses termos: “Embora a Sagrada Liturgia seja
principalmente culto da majestade divina, é também grande fonte de instrução
para o povo fiel. Efetivamente, na liturgia Deus fala ao seu povo, e Cristo
continua a anunciar o Evangelho. Por seu lado, o povo responde a Deus com o
canto e a oração. Mais, as orações dirigidas a Deus pelo sacerdote que preside
à comunidade na pessoa de Cristo, são rezadas em nome de todo o povo santo e de
todos os que estão presentes” (SC, 33-34).
Vale a pena repetir as incisivas palavras do Papa de que a
Liturgia é “inclusiva e não exclusiva, promotora de comunhão com todos sem todavia
homologar, pois chama cada um, com a sua vocação e originalidade, a contribuir
para edificar o corpo de Cristo. A Eucaristia não é um sacramento ‘para mim’, é
o sacramento de muitos que formam um só corpo, o santo povo fiel de Deus”.
Aliás, se lemos a Sacrossanctum
Concilium, a palavra “povo” aparece inúmeras vezes, destacando essa
preocupação dos padres conciliares na Liturgia como ação sacramental para o
santo povo de Deus, num grande Corpo único de Cristo que celebra e caminha para
o Pai.
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