Santo Irineu
Do Tratado contra as heresias
A
misericórdia de Deus
Por sua própria
misericórdia lhes perguntou, para que a acusação recaísse sobre a mulher, e a
interrogou novamente, para que ela por sua vez transferisse a culpa para a
serpente. De fato, ela declarou o que aconteceu: A serpente me seduziu e eu comi. Deus não interrogou a serpente,
porque conhecia muito bem ao príncipe da transgressão; mas primeiramente lançou
contra ela a maldição, de maneira que (só) em segundo lugar recaísse sobre o
homem uma repreensão. Pois Deus odiava ao que seduziu ao ser humano; mas pouco
a pouco sentiu misericórdia por aquele que tinha sido seduzido.
Por este motivo
“o expulsou do paraíso” e o afastou da “árvore da vida”. Não é que Deus
sentisse ciúmes pela árvore da vida, como alguns se atrevem a opinar; mas foi
ato de misericórdia afastá-lo para que não continuasse transgredindo, a fim de
que seu pecado não estivesse nele para sempre como um mal insaciável e sem
solução. Deste modo o impediu de continuar transgredindo o preceito, impôs-lhe
a morte e marcou um limite ao pecado ao colocar-lhe um fim na terra mediante a
dissolução da carne. Desta maneira o homem, ao morrer, deixaria de viver para o
pecado e começaria a viver para Deus.
Por isso Deus
colocou uma inimizade entre a serpente e a mulher e sua linhagem, à espreita
uma da outra, a segunda mordida ao calcanhar, mas com poder para esmagar a
cabeça do inimigo; a primeira, mordendo e matando e impedindo o caminho do homem,
até que veio a descendência
predestinada a esmagar a sua cabeça: este foi aquele que Maria deu à luz. Dele
diz o profeta: Caminharás sobre a
serpente e o basilisco, com teu pé esmagarás ao leão e ao dragão, indicando
que o pecado, que havia se estabelecido e expandido contra o homem, e que o
matava, seria aniquilado junto com a morte reinante; e que por ele seria
esmagado o leão que nos últimos tempos se lançaria contra o gênero humano, ou
seja, o anticristo, o dragão que é a
antiga serpente, e o ataria e submeteria ao poder do homem que tinha sido
vencido, para destruir todo o seu poder. Porque Adão tinha sido vencido, e do
qual se tinha arrebatado toda vida.
Assim, vencido
novamente o inimigo, Adão pôde receber de novo a vida; pois a morte, a última inimiga, foi vencida,
que antes tinha em seu poder ao homem. Por isso, libertado o homem, acontecerá
o que está escrito: A morte foi devorada
pela vitória. Onde está, ó morte, tua vitória? Onde está, ó morte, teu
aguilhão? Isto não poderia ter-se dito se não houvesse sido libertado
aquele sobre o qual a morte dominou ao princípio. Porque a salvação deste
consiste na destruição da morte. E a morte foi destruída quando o Senhor deu
vida ao homem, quero dizer, a Adão.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 406-407. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
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