Eusébio de Cesareia
Tratado sobre a Solenidade da Páscoa
Com
razão nestes dias transbordamos de alegria, como se já estivéssemos com o
Esposo
Estes são os
novos ensinamentos, antigamente envoltos em símbolos, porém trazidos recentemente
a plena luz. E também nós inauguramos cada ano esta solenidade com alguns
períodos cíclicos de preparação. Assim, antes da festa e como preparação para
ela, nos exercitamos nas práticas quaresmais, à imitação dos santos Moisés e
Elias, repetindo a mesma festa ano após ano. Empreendido deste modo o caminho
para Deus, cingimos cuidadosamente a cintura com o cíngulo da temperança e,
protegendo cautelosamente os passos de nossa alma, iniciamos, bem calçados, a
carreira de nossa vocação celestial; e usando a vara da palavra divina e
somente o poder intercessor da oração para repelir aos inimigos, com toda a
alegria e decisão nos aventuramos pela senda que nos leva ao céu, fazendo-nos
passar das coisas desta terra às celestiais, da vida mortal à imortalidade.
Desta forma,
realizada felizmente esta “passagem”, nos espera outra solenidade ainda maior,
solenidade que os judeus chamam de Pentecostes e que é imagem do Reino dos
céus. De fato, afirma Moisés: A partir do
dia em que metas a foice na messe, contarás sete semanas, e da nova colheita
apresentarás ao Senhor pães novos. Com esta figura profética se
simbolizava: pela messe, a vocação dos gentios, e pelos pães novos, as almas
oferecidas a Deus pelos méritos de Cristo, assim como as igrejas integradas pelos
pagãos, e por este motivo se organizam os máximos festejos frente ao acatamento
de Deus, rico em misericórdia. Pois, arrecadados pelas racionais foices dos
apóstolos, todas as igrejas da terra congregadas como feixes na eira, formando
um só corpo pelo concorde sentir da fé, temperados com o sal das doutrinas e
mandatos divinos, regenerados pela água e o fogo do Espírito Santo, somos
ofertados por Cristo como pães festivos, agradáveis e gratos a Deus.
Assim,
confrontados com os proféticos símbolos de Moisés com a autenticidade de uma
realidade rica de santos efeitos, aprendemos a celebrar uma solenidade mais
jubilosa que a que nos foi transmitida, como se já estivéssemos reunidos com
nosso Salvador, como se já gozássemos de seu reino. Por este motivo, durante
estas festas não nos é permitido nenhuma prática ascética, mas antes nos
estimula a apresentar a imagem do descanso que esperamos desfrutar no céu. Por
esta razão nem nos ajoelhamos na oração, nem nos afligimos com o jejum. Pois a
quem foi concedida a graça de ressuscitar em Deus, não parece oportuno que
sigam prostrando-se por terra; nem que os libertos das paixões sofram o mesmo
que aqueles que ainda são escravos de seus apetites.
Por isso, depois
da Páscoa e ao término de sete semanas, celebramos a Festa de Pentecostes; da
mesma forma que anteriormente a Festa da Páscoa, e durante o período de seis
semanas, aguentamos varonilmente as práticas quaresmais. Pois o número seis é,
por assim dizer, um número que significa atividade e eficácia. Por esta razão
se diz que Deus criou em seis dias todas as coisas. Com razão, pois, as fadigas
que supuseram a preparação da primeira solenidade lhes seguem as sete semanas
preparatórias da segunda solenidade, na qual se concede um longo período de
descanso, simbolizado pelo número sete.
Portanto,
considerando os santos dias de Pentecostes como uma imagem do futuro descanso,
não sem razão nossas almas transbordam de alegria, e também condescendemos com
nosso corpo, concedendo-lhe um respiro, como se já estivéssemos com o Esposo.
Portanto, não nos está permitido jejuar.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp. 339-340. Para adquiri-lo no site da Editora Vozes, clique aqui.
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