quarta-feira, 2 de maio de 2018

O Mistério Pascal: centro da Liturgia

Continuando as postagens sobre “Dez aspectos da renovação litúrgica do Concílio Vaticano II”, publicada pelo site Vatican News, trazemos aqui dois textos sobre a centralidade do Mistério Pascal na Liturgia:


No nosso espaço Memória Histórica – 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a falar sobre a reforma litúrgica, abordando na edição de hoje o tema “Mistério Pascal na renovação litúrgica”
Temos dedicado uma série de programas à renovação litúrgica trazida pelo Concílio Vaticano II. Em particular, neste tempo pascal, dedicamos nossos dois últimos programas à valorização da Vigília Pascal. Nesta quarta-feira da segunda semana da Páscoa, Padre Gerson Schmidt nos propõe uma reflexão sobre o tema “O mistério Pascal na Renovação Litúrgica”:
“Na oportunidade anterior, falamos da Vigília Pascal. Hoje, falamos do ponto mais relevante da liturgia. É o ponto-alvo, o target, o centro de tudo: o Mistério Pascal. O Mistério Pascal não está contido somente na Santa Missa, mas em todas as liturgias, em todos os sacramentos e sacramentais.
Diz assim o Catecismo da Igreja Católica a respeito do Mistério Pascal: “Para os fiéis bem-dispostos, quase todo acontecimento da vida é santificado pela graça divina que flui do mistério pascal da paixão, morte e ressurreição de Cristo, do qual todos os sacramentos e sacramentais adquirem sua eficácia” (CIC, 1670).
Como o sol atrai para sua órbita todos os astros, o Mistério Pascal atrai todas as ações litúrgicas e toda a vida da Igreja. É do mistério pascal que todas as atividades da Igreja recebem sua eficácia. Todos os acontecimentos da nossa vida recebem efusão da vitória de Cristo sobre a morte.
No número 61 da Sacrosanctum Concilium, diz assim: “A liturgia dos sacramentos e dos sacramentais permite que a graça divina, que promana do mistério pascal da paixão, morte e ressurreição de Cristo, do qual recebem a sua eficácia todos os sacramentos e sacramentais, santifique todos os acontecimentos da vida dos fiéis que os recebem com a devida disposição”.
No número 05 da SC reza assim:  (...) Esta obra da redenção humana e da perfeita glorificação de Deus, que tem o seu prelúdio nas maravilhas divinas operadas no povo do Antigo Testamento, completou-a o Cristo Senhor, especialmente pelo mistério pascal de sua sagrada paixão, ressurreição dos mortos e gloriosa ascensão; por este mistério, Cristo “morrendo, destruiu a nossa morte e, ressurgindo, deu-nos a vida” (Anáfora da Páscoa). Pois, do lado de Cristo agonizante sobre a cruz nasceu “o admirável sacramento de toda a Igreja”.
Interessante essa frase que repetimos: do lado de Cristo agonizante sobre a cruz nasceu “o admirável sacramento de toda a Igreja”. De fato, a Igreja nasce do lado aberto de Cristo. Somos filhos do coração traspassado de Cristo, que morto, ressuscita glorioso para nossa santificação.
Os liturgistas Ione Buyst e Dom Manoel João Francisco comentam que na época do Concílio foi uma grande novidade usar o termo “Mistério Pascal” como conceito fundamental para a Eucaristia. Muitos padres conciliares estranharam essa expressão, pois até então somente a paixão e morte de Jesus eram consideradas “memórias” da graça da salvação. A eucaristia era entendida simplesmente como sacrifício expiatório, um memorial. Não se podia entender essa linguagem da Missa como atualização concreta para nós hoje do Mistério da Paixão, morte e ressurreição de Cristo". 


No nosso espaço Memória Histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II, vamos continuar a falar sobre a renovação litúrgica trazida pelo evento conciliar.
Até Pentecostes vivemos o Tempo Pascal, isto é, o período do Ano litúrgico que segue 50 dias após o Domingo de Páscoa. A palavra "Aleluia" é usada no final das antífonas, temos o Círio Pascal em todas as missas, fala-se da ressurreição e da vida eterna, do batismo, cantamos o Glória.
"Do lado de Cristo agonizante sobre a Cruz - afirma a Sacrosanctum Concilium - nasceu o admirável sacramento de toda a Igreja". Somos filhos do coração traspassado de Cristo, que morto, ressuscita glorioso para a nossa santificação. Assim, o Mistério Pascal, é o centro de tudo, de toda a liturgia, como vimos em nosso último programa.
Na edição desta quarta-feira, padre Gerson Schmidt - sacerdote incardinado na Arquidiocese de Porto Alegre - dá continuidade a este tema, nos trazendo a reflexão: "O Mistério Pascal atualiza-se no agora":
"Pe. Pedro Mosén Farnés foi um dos grandes liturgistas e expoentes do Concílio Vaticano II para trazer a renovação litúrgica proposta na Sacrosanctum Concilium – a Constituição pilar de toda a valorização e renovação dos sacramentos, o mais importante documento litúrgico de todos os tempos (Pedro Farnés faleceu em 24 de março de 2017, em Barcelona, com 91 anos de idade). Apontou diversas vezes que no centro de toda a liturgia está a Páscoa, a vigília Pascal por excelência e a Eucaristia é entendida como Mistério Pascal. O esplendor da Liturgia centrou-se no centro - o Mistério Pascal.
Em cada liturgia, entro nesse dinâmica renovadora dos sacramentos, que não são ritos exteriores e eu um mero expectador, da mesma forma como vou a um cinema. Posso até me envolver emocionalmente, mas sei que apenas sou um assistente, um mero expectador de um espetáculo até bonito e atraente, mas que não me envolve e não me transforma.
Na liturgia, o Mistério Pascal me ressuscita.  Por isso, a Constituição Dogmática Lumen Gentium, no número 03, fala dessa atualização na liturgia do Mistério Pascal em nossas vidas: “todas as vezes que se celebra no altar o sacrifício da cruz, pela qual Cristo, nossa páscoa, foi imolado, atualiza-se a obra da nossa redenção” (LG  03).
O Catecismo da Igreja Católica, renovado na perspectiva conciliar, fala que o mistério Pascal não é coisa do passado simplesmente, mas iluminador do hoje:
“Na liturgia da Igreja, Cristo significa e realiza principalmente seu mistério pascal. Durante sua vida terrestre, Jesus anunciava seu Mistério pascal por seu ensinamento e o antecipava por seus atos. Quando chegou sua hora, viveu o único evento da história que não passa: Jesus morre, é sepultado, ressuscita dentre os mortos e está sentado à direita do Pai “uma vez por todas” (Rm 6,10; Hb 7,27; 9,12). É um evento real, acontecido em nossa história, mas é único: todos os outros eventos da história acontecem uma vez e depois passam, engolidos pelo passado. O Mistério pascal de Cristo, ao contrário, não pode ficar somente no passado, já que por sua morte destruiu a morte, e tudo o que Cristo é, fez e sofreu por todos os homens participa da eternidade divina, e por isso abraça todos os tempos e nele se mantém presente. O evento da cruz e da ressurreição permanece e atrai tudo para a vida” (CIC, 1085)
Sobre essa atualização do Mistério da fé em nossas vidas, no agora de nossa história, o catecismo ainda é mais enfático, falando de uma Páscoa mística que não tem ocaso, que perdura ao longo de toda a história:
“Quando celebra o mistério de Cristo, há uma palavra que marca a oração da Igreja: hoje!, fazendo eco à oração que seu Senhor lhe ensinou e o apelo do Espírito Santo'. Este “hoje” do Deus vivo em que O homem é chamado a entrar é “a hora”; da Páscoa de Jesus que atravessa e leva toda a história: A vida estendeu-se sobre todos os seres, e todos ficam repletos de uma generosa luz; o Oriente dos orientes invadiu o universo, e aquele que era “antes da estrela da manhã” e antes dos astros, imortal e imenso, o grande Cristo brilha sobre todos os seres mais que o sol! É por isso que, para nós que cremos nele, se instaura um dia de luz, longo, eterno, que não se apaga: a páscoa mística' (CIC, 1165)".

[1] Palavra técnica inglesa que significa ponto-alvo, a finalidade, a meta a ser atingida.

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