São Cirilo de Alexandria
Comentário sobre o Evangelho de São João
Aquele
Cordeiro, aquela vítima imaculada, foi levado ao matadouro por todos nós
Temos de
explicar quem é esse que já está presente, e quais foram as motivações que
induziram ao que veio do céu a descer até nós. Diz, com efeito: Este é o cordeiro de Deus, cordeiro que
o profeta Isaías nos havia predito, dizendo: Como um cordeiro foi levado ao matadouro, como ovelha muda diante do
seu tosquiador; cordeiro este já prefigurado pela Lei de Moisés. Só que
naquele tempo a salvação era parcial, e não derramava sobre todos a sua
misericórdia: tratava-se de um tipo e de uma sombra. Agora, em vez disso,
aquele cordeiro - enigmaticamente prefigurado em outra época -, aquela vítima
imaculada, por todos é levada ao matadouro, a fim de que tire os pecados do
mundo, para derrubar ao exterminador da terra e abolir a morte morrendo por
nós, para cancelar a maldição que pesava sobre a humanidade, para anular, finalmente,
a antiga condenação: És pó e ao pó
retornarás, para que Ele seja o segundo Adão, não pertencente à terra, mas
ao céu, e se torne a origem de todo o bem da natureza humana, em solução da
morte que foi introduzida no mundo, em mediador da vida eterna, em causa de
retorno a Deus, em princípio da piedade e da justiça, e, finalmente, em caminho
para o Reino dos Céus.
E, em verdade,
um só cordeiro morreu por todos, preservando desta forma toda a grei dos homens
para Deus Pai; um por todos, para a todos submeter a Deus; um por todos, para
assim ganhar a todos; enfim, para que todos já
não vivam para si, mas para aquele que morreu e ressuscitou por eles.
Estando
verdadeiramente implicados em uma multidão de pecados, e sendo, em
consequência, escravos da morte e da corrupção, o Pai entregou ao seu Filho em
resgate por nós, um por todos, porque n’Ele todos subsistem e Ele é melhor do
que todos. Um morreu por todos, para que todos vivamos n’Ele.
A morte que
absorveu ao cordeiro degolado por nós, também n’Ele e com Ele necessitou
devolver a todos nós a vida. Todos nós estávamos em Cristo, que por nós e para
nós morreu e ressuscitou. De fato, abolido o pecado, quem podia impedir que
fosse também abolida a morte por Ele, consequência do pecado? Morta a raiz,
como pode salvar-se o caule? Morto o pecado, que justificação resta para a
morte? Portanto, exultantes de legítima alegria pela morte do cordeiro de Deus,
lacemos a provocação: Ó Morte, onde está
a tua vitória? Onde está, inferno, o
teu aguilhão?
Como em certo
lugar cantou o salmista: é tapada a boca
dos que proferem maldades, e doravante não poderá seguir acusando aos que pecam por fragilidade, porque Deus é o
que justifica. Cristo nos resgatou da maldição da Lei, tornando-se um maldito
por nós, para que nós nos encontremos libertos da maldição do pecado.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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