segunda-feira, 18 de junho de 2012

Homilia do Papa Bento XVI na Hora Média em Milão

Visita Pastoral à Arquidiocese de Milão
VII Encontro Mundial das Famílias
Celebração da Hora Média
Meditação do Papa Bento XVI
Catedral de Milão
Sábado, 2 de junho de 2012

Amados Irmãos e Irmãs!
Recolhamo-nos em oração, respondendo ao convite do Hino ambrosiano da Hora Terça: «É a hora terça. O Senhor Jesus sobe ultrajado à cruz». É uma referência clara à obediência amorosa de Jesus à vontade do Pai. O mistério pascal deu início a um tempo novo: a morte e a ressurreição de Cristo recriam a inocência da humanidade e nela fazem brotar a alegria. De fato, o hino prossegue: «Daqui inicia a época da salvação de Cristo - Hinc iam beata tempora coepere Christi gratia». Reunimo-nos na Basílica-Catedral, nesta Sé, que é deveras o coração de Milão. Daqui o pensamento alarga-se à vastíssima Arquidiocese ambrosiana, que nos séculos e também em tempos recentes deu à Igreja homens insignes na santidade de vida e no ministério, como santo Ambrósio e são Carlos, e alguns Pontífices de relevância ímpar, como Pio XI e o Servo de Deus Paulo VI, e os Beatos Cardeais Andrea Carlo Ferrari e Alfredo Ildefonso Schuster.
Sinto-me feliz por estes momentos convosco! Dirijo um afetuoso pensamento de saudação a todos e a cada um em particular, e gostaria de o fazer chegar de modo especial a quantos estão doentes ou são muito idosos. Saúdo com profunda cordialidade o vosso Arcebispo, Cardeal Angelo Scola, e agradeço-lhe as suas amáveis palavras; saúdo com afeto os vossos Pastores eméritos, Cardeais Carlo Maria Martini e Dionigi Tettamanzi, com os outros Cardeais e Bispos presentes.
Vivemos neste momento o mistério da Igreja na sua expressão mais alta, a da oração litúrgica. Os nossos lábios, os nossos corações e as nossas mentes, na oração eclesial, fazem-se intérpretes das necessidades e dos anseios de toda a humanidade. Com as palavras do Salmo 118 suplicamos ao Senhor em nome de todos os homens: «Inclinai o meu coração para os vossos preceitos... Venham sobre mim, Senhor, as vossas graças». A oração quotidiana da Liturgia das Horas constitui uma tarefa essencial do ministério ordenado na Igreja. Também através do Ofício divino, que prolonga no dia o mistério central da Eucaristia, os presbíteros estão unidos de modo particular ao Senhor Jesus, vivo e activo no tempo. O Sacerdócio: que dom precioso! Vós, queridos Seminaristas que vos preparais para o receber, aprendei a apreciá-lo desde já e vivei com compromisso o tempo precioso no Seminário! O Arcebispo Montini, durante as Ordenações de 1958 dizia quanto segue nesta Catedral: «Começa a vida sacerdotal: um poema, um drama, um mistério novo... fonte de meditação perpétua... sempre objeto de redescoberta e de admiração; [o Sacerdócio] - disse - é sempre novidade e beleza para quem a ele dedica o pensamento amoroso... é reconhecimento da ação de Deus em nós» (Homilia para a Ordenação de 46 Sacerdotes, 21 de Junho de 1958).
Se Cristo, para edificar a sua Igreja, se entrega nas mãos do sacerdote, este por sua vez deve entregar-se a Ele sem reservas: o amor ao Senhor Jesus é a alma e a razão do ministério sacerdotal, assim como foi a premissa para que Ele entregasse a Pedro a missão de apascentar o próprio rebanho: «Simão... tu amas-Me mais do que estes?... Apascenta as minhas ovelhas (Jo 21,15)». O Concílio Vaticano II recordou que Jesus «permanece sempre o princípio e a fonte da unidade de vida dos presbíteros. Os sacerdotes, portanto, alcançarão a unidade da sua vida unindo-se a Cristo no conhecimento da vontade do Pai e na doação de si mesmos pelo rebanho que lhes é confiado. Fazendo assim as vezes do Bom Pastor, encontrarão no próprio exercício da caridade pastoral o vínculo da perfeição sacerdotal, que conduz à unidade de vida e de ação» (Decr. Presbyterorum Ordinis, 14). Precisamente sobre esta questão se expressou: nas diversas ocupações, de hora em hora, como encontrar a unidade da vida, a unidade do ser sacerdote precisamente desta fonte de amizade profunda com Jesus, do ser interior juntamente com Ele. E não há oposição entre o bem da pessoa do sacerdote e a sua missão: aliás, a caridade pastoral é um elemento unificador de vida que começa a partir de uma relação cada vez mais íntima com Cristo na oração para viver o dom total de si mesmo pelo rebanho, de modo que o Povo de Deus cresça na comunhão com Deus e seja manifestação da comunhão da Santíssima Trindade. Com efeito, cada uma das nossas ações tem como finalidade conduzir os fiéis à união com o Senhor e deste modo fazer crescer a comunhão eclesial para a salvação do mundo. Os três elementos: união pessoal com Deus, bem da Igreja, bem da humanidade na sua totalidade, não são coisas distintas ou opostas, mas uma sinfonia da fé vivida.
Sinal luminoso desta caridade pastoral e de um coração indiviso são o celibato sacerdotal e a virgindade consagrada. Cantamos no hino de santo Ambrósio: «Se em ti nasce o Filho de Deus, conservas a vida sem culpas». «Acolher Cristo - Christum suscipere» é um tema que recorre com muita frequência na pregação do Santo Bispo de Milão; cito um excerto do seu Comentário a São Lucas: «Quem acolhe Cristo no íntimo da sua casa é saciado com as maiores alegrias» (Expos. Evangelii sec. Lucam, V, 16). O Senhor Jesus foi a sua grande atração, o tema principal da sua reflexão e pregação, e sobretudo a palavra de um amor vivo e confiante. Sem dúvida, o amor a Jesus é válido para todos os cristãos, mas adquire um significado singular para o sacerdote celibatário e para quem respondeu à vocação à vida consagrada: só e sempre em Cristo se encontram a nascente e o modelo para repetir quotidianamente o «sim» à vontade de Deus. «Com que vínculos Cristo é retido?» - perguntava santo Ambrósio, que com intensidade surpreendente pregou e cultivou a virgindade na Igreja, promovendo também a dignidade da mulher. À pergunta citada respondia: «Não com nós de cordas, mas com os vínculos do amor e com o afeto da alma» (De virginitate, 13, 77). E precisamente num célebre sermão às virgens ele disse: «Cristo é tudo para nós: se desejares curar as tuas feridas, Ele é médico; se estás angustiado pelo ardor da febre, Ele é fonte; se estás oprimido pela culpa, Ele é justiça; se precisas de ajuda, Ele é poder; se tens medo da morte, Ele é vida; se desejas o paraíso, Ele é o caminho; se tens horror às trevas, Ele é luz; se estás em busca de comida, Ele é alimento» (ibid., 16, 99).
Queridos Irmãos e Irmãs consagrados, agradeço-vos o vosso testemunho e encorajo-vos: olhai para o futuro com confiança, contando com a fidelidade de Deus, que nunca faltará, e o poder da sua graça, capaz de realizar sempre novas maravilhas, também em nós e conosco. As antífonas da segunda salmodia deste sábado levaram-nos a contemplar o mistério da Virgem Maria. De facto, nela podemos reconhecer o «gênero de vida virginal e pobre que Cristo Senhor escolheu para si e que a sua Virgem Mãe abraçou» (Lumen Gentium, 46), uma vida em obediência total à vontade de Deus.
O hino recordou-nos ainda as palavras de Jesus na Cruz: «Da glória do seu patíbulo, Jesus fala à Virgem: “Mulher, eis o teu filho”; “João, eis a tua mãe”». Maria, Mãe de Cristo, difunde e prolonga também em nós a sua maternidade divina, para que o ministério da Palavra e dos Sacramentos, a vida de contemplação e a atividade apostólica nas múltiplas formas perseverem, sem fraqueza e com coragem, ao serviço de Deus e para a edificação da sua Igreja.
Neste momento, apraz-me dar graças a Deus pela multidão de sacerdotes ambrosianos, de religiosos e religiosas que empregaram as suas energias ao serviço do Evangelho, chegando por vezes até ao extremo sacrifício da vida. Alguns deles foram propostos ao culto e à imitação dos fiéis também em tempos recentes: os Beatos sacerdotes Luigi Talamoni, Luigi Biraghi, Luigi Monza, Carlo Gnocchi, Serafino Morazzone; os Beatos religiosos Giovanni Mazzucconi, Luigi Monti e Clemente Vismara; e as religiosas Maria Anna Sala e Enrichetta Alfieri. Pela sua comum intercessão peçamos confiantes ao Dador de todos os dons que torne sempre fecundo o ministério dos sacerdotes, fortaleça o testemunho das pessoas consagradas, para mostrar ao mundo a beleza da doação a Cristo e à Igreja, e renove as famílias cristãs segundo o desígnio de Deus, para que sejam lugares de graça e de santidade, terreno fértil para as vocações ao sacerdócio e à vida consagrada. Amém. Obrigado!


Fonte: Santa Sé

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