São João Crisóstomo
Discurso 3 contra os judeus
Jejuamos
por nossos pecados, pois vamos aproximar-nos dos sagrados mistérios
Por que jejuamos
durante estes quarenta dias? No passado, muitos se aproximavam dos sagrados mistérios
temerariamente e sem nenhuma preparação, especialmente nestes dias em que
Cristo entregou-se a si próprio. Por esse motivo, os Padres, conscientes do
prejuízo que podia se derivar dessa aproximação irresponsável aos mistérios,
julgara oportuno prescrever quarenta dias de jejum, de orações, de escuta da
Palavra de Deus e de assembleias, para que todos, diligentemente purificados
pela oração, a esmola, o jejum, as vigílias, as lágrimas, a confissão e demais
obras, possamos aproximar-nos dos sagrados mistérios com a consciência limpa,
conforme nossa capacidade receptiva. A experiência nos diz que, com esta
decisão unânime, asseguraram, inclusive para os tempos vindouros, algo
grandioso e maravilhoso, conseguindo fazer-nos chegar à habitual observância do
jejum.
De fato, ainda
que durante o ano todo nós não nos cansamos de pregar e proclamar o jejum,
ninguém presta atenção às nossas palavras. Por outro lado, apenas anunciando a
Quaresma, ainda que ninguém incentive, ainda que ninguém exorte, até o mais negligente
se reanima e acolhe as exortações e os estímulos que nos faz este mesmo tempo
quaresmal.
Portanto, se
alguém te pergunta por que jejuas, não digas que é pela Páscoa, nem sequer que
é pela cruz. De fato, não jejuamos nem pela Páscoa nem pela cruz, mas por causa
de nossos pecados, pois vamos aproximar-nos dos sagrados mistérios. Ademais, a
Páscoa não é motivo de jejum ou de luto, mas de alegria e júbilo.
Finalmente, a
cruz tomou sobre si o pecado, foi expiação pelo mundo inteiro e reconciliação de
um ódio entranhado, abriu as portas do céu, devolveu a amizade aos que antes
eram inimigos, nos fez subir ao céu, colocou a nossa natureza à direita do
trono, e nos concedeu outros bens inumeráveis. Por isso não devemos chorar e
afligir-nos por todas estas coisas, mas sim rejubilar-nos e alegrar-nos. O
próprio São Paulo disse: Deus me livre de
gloriar-me a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo. E novamente: A prova de que Deus nos ama é que Cristo
morreu por nós quando ainda éramos pecadores.
Neste mesmo
sentido se expressa claramente São João: Deus
tanto amou o mundo. Como o amou? Recusando-se perder todas as outras
coisas, ergueu uma cruz. Depois de ter dito: Deus tanto amou o mundo, acrescentou: que entregou a seu Filho único para que o crucificassem, para que não pereça nenhum dos que creem
nele, mas tenham a vida eterna. Portanto, se a cruz é motivo de amor e de
glorificação, não digamos que nos afligimos por ela. Nunca, jamais choremos
pela cruz, mas por nossos pecados. Por isso é que jejuamos.
Fonte: Lecionário Patrístico Dominical, pp.
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