Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira,
7 de Outubro de 2015
A Família (29): O espírito
familiar
Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Há poucos dias começou o Sínodo
dos Bispos sobre o tema «A vocação e missão da família na Igreja e no mundo
contemporâneo». A família que caminha na vereda do Senhor é fundamental no
testemunho do amor de Deus e por isso merece toda a dedicação da qual a Igreja
é capaz. O Sínodo é chamado a interpretar, hoje, esta solicitude e este cuidado
da Igreja. Acompanhemos todo o percurso sinodal antes de tudo com a nossa
oração e atenção. E neste período as catequeses serão reflexões inspiradas por
alguns aspectos da relação - que podemos dizer indissolúvel! - entre a Igreja e
a família, com o horizonte aberto para o bem de toda a comunidade humana.
Um olhar atento à vida
quotidiana dos homens e das mulheres de hoje demonstra imediatamente a
necessidade que há, em toda a parte, de uma vigorosa injeção de espírito
familiar. Com efeito, o estilo das relações - civis, econômicas, jurídicas,
profissionais, de cidadania - parece muito racional, formal, organizado, mas
também muito «desidratado», árido, anônimo. Às vezes torna-se insuportável. Não
obstante deseje ser inclusivo nas suas formas, na realidade abandona à solidão
e ao descarte um número cada vez maior de pessoas.
Eis por que razão a família abre
à sociedade inteira uma perspectiva muito mais humana: abre os olhos dos filhos
para a vida - e não apenas a vista, mas também todos os outros sentidos -
representando uma visão da relação humana edificada sobre a livre aliança de
amor. A família introduz na necessidade de vínculos de fidelidade, sinceridade,
confiança, cooperação e respeito; encoraja a programar um mundo habitável e a
crer nos relacionamentos de confiança, até em condições difíceis; ensina a
honrar a palavra dada, o respeito pelas pessoas na sua individualidade, a
partilha dos limites pessoais e dos outros. E todos nós estamos conscientes da
insubstituibilidade da atenção familiar aos membros mais pequeninos, mais
vulneráveis, mais feridos e inclusive mais desastrados nos comportamentos da
sua vida. Na sociedade, quem pratica estas atitudes, assimilou-as a partir do
espírito familiar, certamente não da competição nem do desejo de
auto-realização.
Pois bem, mesmo ciente de tudo
isto, não se dá à família o devido peso - reconhecimento e apoio - na
organização política e econômica da sociedade contemporânea. Gostaria de dizer
algo mais: a família não só não recebe um reconhecimento adequado, mas não gera
ulterior aprendizagem! Às vezes poder-se-ia dizer que, com toda a sua ciência e
técnica, a sociedade moderna ainda não é capaz de traduzir estes conhecimentos em
formas melhores de convivência civil. Não só a organização da vida comum se
encalha cada vez mais numa burocracia totalmente alheia aos vínculos humanos
fundamentais, mas até o costume social e político dá frequentemente sinais de
degradação - agressividade, vulgaridade, desprezo... - que estão muito abaixo
do limite de uma educação familiar até mínima. Nesta conjuntura, os extremos
opostos desta brutalização das relações - ou seja, a obtusidade tecnocrática e
o familismo amoral - unem-se e alimentam-se reciprocamente. Este é um paradoxo!
Hoje, neste ponto exato, a
Igreja identifica o sentido histórico da sua missão a respeito da família e do
autêntico espírito familiar: começando por uma atenta revisão de vida, que se
refere a si mesma. Poder-se-ia dizer que o «espírito familiar» é uma carta
constitucional para a Igreja: assim o cristianismo deve parecer e deve ser.
Está escrito claramente: «Vós que estáveis longe - diz são Paulo - [...] já não
sois hóspedes nem peregrinos, mas concidadãos dos santos e membros da família
de Deus» (Ef 2,17.19). A Igreja é e deve ser a família de Deus.
Quando chamou Pedro a segui-lo,
Jesus disse-lhe que o levaria a tornar-se «pescador de homens»; e para isto é
preciso um novo tipo de rede. Poderíamos dizer que hoje as famílias são uma das
redes mais importantes para a missão de Pedro e da Igreja. Esta não é uma rede
que aprisiona! Pelo contrário, liberta das águas negativas do abandono e da
indiferença, que afogam muitos seres humanos no mar da solidão e da
indiferença. As famílias sabem bem o que é a dignidade do sentir-se filhos, não
escravos nem estrangeiros, nem sequer só um número de bilhete de identidade.
A partir daqui, da família,
Jesus recomeça a sua passagem entre os seres humanos, para os persuadir que
Deus não se esqueceu deles. Daqui Pedro adquire vigor para o seu ministério.
Daqui a Igreja, obedecendo à palavra do Mestre, sai para pescar no lago
convicta de que, se o fizer, a pesca será milagrosa. Possa o entusiasmo dos
Padres sinodais, animados pelo Espírito Santo, fomentar o impulso de uma Igreja
que abandona as velhas redes, voltando a pescar com confiança na palavra do seu
Senhor. Oremos intensamente por isto! Aliás, Cristo prometeu e encoraja-nos: se
nem sequer os maus pais deixam de dar o pão aos filhos famintos, muito menos
Deus deixará de infundir o Espírito em quantos - mesmo imperfeitos como são -
lho pedirem com insistência apaixonada (cf. Lc 11,9-13)!
Fonte: Santa Sé
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