quarta-feira, 14 de outubro de 2015

XXIX Catequese do Papa sobre a Família

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 7 de Outubro de 2015
A Família (29): O espírito familiar

Amados irmãos e irmãs, bom dia!
Há poucos dias começou o Sínodo dos Bispos sobre o tema «A vocação e missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo». A família que caminha na vereda do Senhor é fundamental no testemunho do amor de Deus e por isso merece toda a dedicação da qual a Igreja é capaz. O Sínodo é chamado a interpretar, hoje, esta solicitude e este cuidado da Igreja. Acompanhemos todo o percurso sinodal antes de tudo com a nossa oração e atenção. E neste período as catequeses serão reflexões inspiradas por alguns aspectos da relação - que podemos dizer indissolúvel! - entre a Igreja e a família, com o horizonte aberto para o bem de toda a comunidade humana.
Um olhar atento à vida quotidiana dos homens e das mulheres de hoje demonstra imediatamente a necessidade que há, em toda a parte, de uma vigorosa injeção de espírito familiar. Com efeito, o estilo das relações - civis, econômicas, jurídicas, profissionais, de cidadania - parece muito racional, formal, organizado, mas também muito «desidratado», árido, anônimo. Às vezes torna-se insuportável. Não obstante deseje ser inclusivo nas suas formas, na realidade abandona à solidão e ao descarte um número cada vez maior de pessoas.
Eis por que razão a família abre à sociedade inteira uma perspectiva muito mais humana: abre os olhos dos filhos para a vida - e não apenas a vista, mas também todos os outros sentidos - representando uma visão da relação humana edificada sobre a livre aliança de amor. A família introduz na necessidade de vínculos de fidelidade, sinceridade, confiança, cooperação e respeito; encoraja a programar um mundo habitável e a crer nos relacionamentos de confiança, até em condições difíceis; ensina a honrar a palavra dada, o respeito pelas pessoas na sua individualidade, a partilha dos limites pessoais e dos outros. E todos nós estamos conscientes da insubstituibilidade da atenção familiar aos membros mais pequeninos, mais vulneráveis, mais feridos e inclusive mais desastrados nos comportamentos da sua vida. Na sociedade, quem pratica estas atitudes, assimilou-as a partir do espírito familiar, certamente não da competição nem do desejo de auto-realização.
Pois bem, mesmo ciente de tudo isto, não se dá à família o devido peso - reconhecimento e apoio - na organização política e econômica da sociedade contemporânea. Gostaria de dizer algo mais: a família não só não recebe um reconhecimento adequado, mas não gera ulterior aprendizagem! Às vezes poder-se-ia dizer que, com toda a sua ciência e técnica, a sociedade moderna ainda não é capaz de traduzir estes conhecimentos em formas melhores de convivência civil. Não só a organização da vida comum se encalha cada vez mais numa burocracia totalmente alheia aos vínculos humanos fundamentais, mas até o costume social e político dá frequentemente sinais de degradação - agressividade, vulgaridade, desprezo... - que estão muito abaixo do limite de uma educação familiar até mínima. Nesta conjuntura, os extremos opostos desta brutalização das relações - ou seja, a obtusidade tecnocrática e o familismo amoral - unem-se e alimentam-se reciprocamente. Este é um paradoxo!
Hoje, neste ponto exato, a Igreja identifica o sentido histórico da sua missão a respeito da família e do autêntico espírito familiar: começando por uma atenta revisão de vida, que se refere a si mesma. Poder-se-ia dizer que o «espírito familiar» é uma carta constitucional para a Igreja: assim o cristianismo deve parecer e deve ser. Está escrito claramente: «Vós que estáveis longe - diz são Paulo - [...] já não sois hóspedes nem peregrinos, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus» (Ef 2,17.19). A Igreja é e deve ser a família de Deus.
Quando chamou Pedro a segui-lo, Jesus disse-lhe que o levaria a tornar-se «pescador de homens»; e para isto é preciso um novo tipo de rede. Poderíamos dizer que hoje as famílias são uma das redes mais importantes para a missão de Pedro e da Igreja. Esta não é uma rede que aprisiona! Pelo contrário, liberta das águas negativas do abandono e da indiferença, que afogam muitos seres humanos no mar da solidão e da indiferença. As famílias sabem bem o que é a dignidade do sentir-se filhos, não escravos nem estrangeiros, nem sequer só um número de bilhete de identidade.
A partir daqui, da família, Jesus recomeça a sua passagem entre os seres humanos, para os persuadir que Deus não se esqueceu deles. Daqui Pedro adquire vigor para o seu ministério. Daqui a Igreja, obedecendo à palavra do Mestre, sai para pescar no lago convicta de que, se o fizer, a pesca será milagrosa. Possa o entusiasmo dos Padres sinodais, animados pelo Espírito Santo, fomentar o impulso de uma Igreja que abandona as velhas redes, voltando a pescar com confiança na palavra do seu Senhor. Oremos intensamente por isto! Aliás, Cristo prometeu e encoraja-nos: se nem sequer os maus pais deixam de dar o pão aos filhos famintos, muito menos Deus deixará de infundir o Espírito em quantos - mesmo imperfeitos como são - lho pedirem com insistência apaixonada (cf. Lc 11,9-13)!


Fonte: Santa Sé

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