Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo
Homilia do Papa Francisco
Praça de São João de Latrão
Quinta-feira, 04 de junho de 2015
Ouvimos: na Ceia Jesus oferece o seu Corpo e
o seu Sangue mediante o pão e o vinho, para nos deixar o memorial do seu
sacrifício de amor infinito. E com este «viático» repleto de graça, os
discípulos dispõem de tudo o que é necessário para o seu caminho ao longo da
história, para estender o Reino de Deus a todos. Luz e força serão para eles o
dom que Jesus fez de si mesmo, imolando-se voluntariamente na cruz. E este Pão
de vida chegou até nós! Nunca termina a admiração da Igreja perante esta
realidade. Uma admiração que alimenta sempre a contemplação, a adoração e a
memória. Como no-lo demonstra um texto muito bonito da Liturgia de hoje, o
Responsório da segunda leitura do Ofício das Leituras, que reza assim: «Reconhecei
neste pão Aquele que foi crucificado; no cálice, o Sangue que jorrou do seu
lado. Tomai e comei o Corpo de Cristo, bebei o seu Sangue: porque agora sois
membros de Cristo. Para não vos desagregardes, comei este vínculo de comunhão;
para não vos aviltardes, bebei o preço do vosso resgate».
Existe um perigo, uma ameaça: desagregar-se,
aviltar-se. O que significa, hoje, este «desagregar-se», este «aviltar-se»?
Nós desagregamo-nos quando
não somos dóceis à Palavra do Senhor, quando não vivemos a fraternidade entre
nós, quando competimos para ocupar os primeiros lugares - os arrivistas -
quando não encontramos a coragem de dar testemunho da caridade, quando não
somos capazes de oferecer esperança. É assim que nos desagregamos. A Eucaristia
impede que nos desagreguemos, porque é vínculo de comunhão, cumprimento da
Aliança e sinal vivo do amor de Cristo, que se humilhou e se aniquilou para que
nós permanecêssemos unidos. Participando na Eucaristia e alimentando-nos dela,
somos inseridos num caminho que não admite divisões. Cristo presente no meio de
nós, no sinal do pão e do vinho, exige que a força do amor ultrapasse todas as
dilacerações e, ao mesmo tempo, que se torne comunhão inclusive com o mais
pobre, sustentáculo para quem é frágil, atenção fraterna a quantos têm
dificuldade de carregar o peso da vida quotidiana, e correm o perigo de perder
a própria fé.
Além disso, há outra palavra: o que
significa para nós, hoje, «aviltar-nos», ou seja, diluirmos a
nossa dignidade cristã? Significa deixar-nos contaminar pelas idolatrias do
nosso tempo: o aparecer, o consumir, o eu no centro de tudo; mas também o ser
competitivo, a arrogância como atitude vencedora, o nunca termos que admitir
que erramos, que temos necessidade. É tudo isto que nos avilta, que nos torna
cristãos medíocres, tíbios, insípidos, pagãos.
Jesus derramou o seu Sangue como preço e
lavacro, para que nós fôssemos purificados de todos os nossos pecados: para não
nos aviltarmos, fixemos o nosso olhar nele, saciemo-nos na sua fonte, a fim de
sermos preservados do risco da corrupção. E então experimentaremos a graça de
uma transformação: seremos sempre pobres pecadores, mas o Sangue de Cristo
libertar-nos-á dos nossos pecados, restituir-nos-á a nossa dignidade.
Livrar-nos-á da corrupção. Sem o nosso mérito, com humildade sincera,
conseguiremos levar aos irmãos o amor de nosso Senhor e Salvador. Seremos os
seus olhos, que vão à procura de Zaqueu e de Madalena; seremos as suas mãos,
que socorrem os enfermos no corpo e no espírito; seremos o seu Coração que ama
os necessitados de reconciliação, de misericórdia e de compreensão.
Deste modo a Eucaristia atualiza a Aliança
que nos santifica, que nos purifica e que nos põe em comunhão admirável com
Deus. Assim aprendemos que a Eucaristia não é uma recompensa para os bons, mas
constitui a força per os mais frágeis, para os pecadores. É o perdão, é o
viático que nos ajuda a ir em frente, a caminhar.
Hoje, festividade de Corpus Christi,
temos a alegria não só de celebrar este mistério, mas também de o louvar e
cantar pelas ruas da nossa cidade. A procissão que faremos no final da Missa
seja a manifestação do nosso reconhecimento por todo o caminho que Deus nos
permitiu percorrer através do deserto das nossas pobrezas, a fim de nos levar a
sair da nossa condição servil, alimentando-nos com o seu Amor mediante o
Sacramento do seu Corpo e do seu Sangue.
Daqui a pouco, enquanto caminharemos ao
longo das ruas, sintamo-nos unidos em comunhão com muitos dos nossos irmãos e
irmãs que não têm a liberdade de manifestar a sua fé no Senhor Jesus.
Sintamo-nos unidos a eles: entoemos cânticos com eles, louvemos juntamente com
eles, adoremos com eles. E veneremos no nosso coração aqueles irmãos e irmãs
aos quais foi pedido o sacrifício da própria vida em fidelidade a Cristo: o seu
sangue, unido ao Sangue do Senhor, seja penhor de paz e de reconciliação para o
mundo inteiro.
E não esqueçamos: «Para não vos
desagregardes, comei este vínculo de comunhão, e para não vos aviltardes, bebei
o preço do vosso resgate».
Fonte: Santa Sé.
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