São
João Damasceno
Homilia III sobre a Dormição da
Santíssima Mãe de Deus
“Aproxima-te, ó Mãe, de teu Filho”
Aproxima-te,
ó Mãe, de teu Filho, aproxima-te e participa do poder régio daquele que,
nascido de ti, contigo viveu na pobreza! Ascende, ó Soberana, ascende! Já não
vale a ordem dada a Moisés: “Sobe e morre...” (Dn 31, 48) Morre, sim, mas
eleva-te pela própria morte!
Entrega
tua alma às mãos de teu Filho e devolve à terra o que é da terra, pois mesmo
isso será carregado por ti.
Erguei
vossos olhos, Povo de Deus, alçai vosso olhar! Eis em Sião a arca do Senhor
Deus dos exércitos, à qual vieram pessoalmente prestar assistência os
apóstolos, tributando seu derradeiro culto ao corpo que foi princípio de vida e
receptáculo de Deus. Imaterialmente e invisivelmente os anjos o cercam com
respeito, como servidores da Mãe de seu Senhor. O próprio Senhor lá está,
onipresente, ele que tudo enche e abraça, que na verdade não está em lugar
algum porque nele tudo está como na causa que tudo criou e tudo encerra.
Eis
a Virgem, filha de Adão e Mãe de Deus: por causa de Adão entrega seu corpo à
terra, mas por causa de seu Filho eleva a alma aos tabernáculos celestes!
Santificada seja a Cidade santa, que acolhe mais essa bênção eterna! Que os
anjos precedam a passagem da divina morada e preparem seu túmulo, que o fulgor
do Espírito a decore! Preparai aromas para embalsamar o corpo imaculado e
repleto de delicioso perfume! Desça uma onda pura a fim de haurir a bênção da
fonte imaculada da bênção! Alegre-se a terra de receber o corpo e exulte o
espaço pela ascensão do espírito! Soprem as brisas, suaves como o orvalho e
cheias de graça! Que toda a criação celebre a subida da Mãe de Deus: os grupos
de jovens em sua alegria, a boca dos oradores em seus panegíricos, o coração
dos sábios em suas dissertações sobre essa maravilha, os velhos de veneráveis
cãs em suas contemplações. Que todas as criaturas se associem nessa homenagem,
que ainda assim não seria suficiente. Todos, pois, deixemos em espírito este
mundo com aquela que dele parte. Sim, todos, pelo fervor do coração, desçamos
com a que desce à sepultura e ali nos coloquemos. Cantemos hinos sacros e
nossas melodias se inspirem nas palavras: “Ave, cheia de graça, o Senhor é
contigo!” Permanece na alegria, tu que foste predestinada a ser Mãe de Deus.
Permanece na alegria, tu que foste eleita antes dos séculos por um desígnio de
Deus, germe divino da terra, habitação do fogo celeste, obra-prima do Espírito
Santo, fonte de água viva, paraíso da árvore da vida, ramo vivo que portas o
divino fruto, donde fluem o néctar e a ambrosia, rio de aromas do Espírito,
terra produtora da divina espiga, rosa resplandecente da virgindade, donde
emana o perfume da graça, lírio da veste real, ovelha que geras o Cordeiro de
Deus que tira o pecado do mundo, instrumento de nossa salvação, superior às
potências angélicas, serva e Mãe!
Vinde,
enfileiremo-nos em torno ao túmulo imaculado para dali sorvermos a divina
graça! Vinde, abracemos em espírito o corpo virginal. Entremos no sepulcro e
morramos nele, rejeitando as paixões da carne, vivendo uma vida sem
concupiscência e sem mácula. Escutemos os hinos divinos, cantados
imaterialmente pelos anjos. Entremos para adorar, aprendamos a conhecer o
mistério inaudito: como esse corpo foi elevado às alturas, arrebatado ao céu,
como a Virgem foi posta junto de seu Filho acima dos coros angélicos, de sorte
que nada se interpusesse entre Mãe e Filho.
Fonte: GOMES, Cirilo Folch. Antologia dos Santos Padres. São Paulo: Paulinas, 1979, p. 446-447.
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