Jubileu da Vida Consagrada
Homilia do Papa Leão XIV
Praça de São Pedro
Quinta-feira, 09 de outubro de 2025
Foi celebrada a Missa da quinta-feira da XXVII semana do Tempo Comum (ano ímpar).
«Pedi e
recebereis; procurai e encontrareis; batei e vos será aberto» (Lc 11,9).
Com estas palavras Jesus nos convida a dirigirmo-nos com confiança ao Pai,
sejam quais forem as nossas necessidades.
Escutamo-las
enquanto celebramos o Jubileu da Vida Consagrada, que vos trouxe
aqui em tão grande número e de tantas partes do mundo - religiosos e
religiosas, monges e contemplativas, membros de institutos seculares e do Ordo Virginum, eremitas e membros de «novos institutos» -, vindos a Roma para
viver juntos a peregrinação jubilar, para confiar a vida à Misericórdia da qual
vos comprometestes ser sinal profético através da profissão religiosa, porque
viver os votos é abandonar-se como crianças nos braços do Pai.
«Pedir»,
«procurar», «bater» - os verbos da oração usados pelo evangelista Lucas - são
para vós atitudes familiares, habituados que estais, dóceis à ação de Deus, a
pedir sem exigir, praticando os conselhos evangélicos. Não por acaso o Concílio
Vaticano II fala dos votos como de um meio útil «para poder recolher frutos
mais abundantes da graça batismal» (Constituição Dogmática Lumen
gentium, n. 44). Com efeito, «pedir» é reconhecer, na pobreza, que tudo é
dom do Senhor e de tudo se deve dar graças; «procurar» é abrir-se, na
obediência, à descoberta quotidiana da via a seguir no caminho da santidade,
segundo os desígnios de Deus; «bater» é pedir e oferecer aos irmãos, com
coração casto, os dons recebidos, esforçando-se por amar a todos com respeito e
gratuidade.
Podemos
interpretar neste sentido as palavras que Deus dirige ao profeta Malaquias na 1ª
leitura. Ele chama os habitantes de Jerusalém de “minha propriedade” e diz ao
profeta: «Terei compaixão deles, como um pai se compadece do filho» (Ml 3,17).
São expressões que nos recordam o amor com que o Senhor, chamando-nos, nos
precedeu, e constituem para vós, em particular, uma ocasião para recordar a
gratuidade da vossa vocação, desde a origem das Congregações a que pertenceis
até o momento presente, desde os primeiros passos do vosso percurso pessoal até
este instante. Todos nós estamos aqui porque, em primeiro lugar, Ele nos
desejou e nos escolheu desde toda a eternidade.
«Pedir»,
«procurar», «bater» significa também olhar para trás, para a própria
existência, trazendo à mente e ao coração o que o Senhor realizou, ao longo dos
anos, para multiplicar os talentos, para aumentar e purificar a fé, para tornar
mais generosa e livre a caridade. Por vezes isso aconteceu em circunstâncias
alegres, outras vezes por caminhos mais difíceis de compreender, talvez
passando até pelo misterioso crisol do sofrimento; porém, sempre abraçados por
aquela bondade paterna que caracteriza a sua ação em nós e através de nós, para
o bem da Igreja (cf. Lumen gentium, n. 43).
E isto nos
leva a uma segunda reflexão sobre Deus como plenitude e sentido da nossa vida: para
vós, para nós, o Senhor é tudo, sendo-o de várias maneiras: como Criador e
fonte da existência, como amor que chama e interpela, como força que impulsiona
e anima à doação. Sem Ele nada existe, nada tem sentido, nada tem valor, e o
vosso «pedir», «procurar» e «bater», tanto na oração como na vida, diz respeito
também a esta verdade. A esse respeito, Santo Agostinho descreve com imagens
belíssimas a presença de Deus na sua existência. Ele fala de uma luz que vai
além do espaço, de uma voz que não é arrebatada pelo tempo, de um sabor que a voracidade
não estraga, de uma fome que a saciedade nunca apaga, e conclui: «Eis o que
amo, quando amo o meu Deus» (Confissões, 10, 6). São palavras de um
místico, mas muito próximas também da nossa experiência, manifestando a
necessidade de infinito que habita no coração de cada homem e mulher deste
mundo. Precisamente por isso a Igreja vos confia a tarefa de ser, com o vosso
despojamento de tudo, testemunhas vivas da primazia de Deus na vossa
existência, ajudando do melhor modo possível também os irmãos e irmãs que
encontrais a cultivar semelhante amizade.
Além disso, a
história ensina-nos que de uma experiência autêntica de Deus brotam sempre
generosos impulsos de caridade, como aconteceu na vida dos vossos fundadores e
fundadoras, homens e mulheres enamorados do Senhor e, por isso, prontos a
tornar-se, dos modos e nos campos mais diversos, «tudo para todos» (1Cor 9,22),
sem distinções.
É verdade que
ainda hoje, como no tempo do profeta Malaquias, há quem diga: «É coisa inútil servir
a Deus» (Ml 3,14). É um modo de pensar que conduz a uma autêntica
paralisia da alma, contentando-se com uma vida feita de momentos fugazes, de
relações superficiais e intermitentes, de modas passageiras: tudo coisas que
deixam no coração um vazio. Para ser verdadeiramente feliz, o ser humano não
precisa disso, mas de experiências de amor consistentes, duradouras, sólidas, e
vós, com o exemplo da vossa vida consagrada, como as árvores frondosas que cantamos
no Salmo responsorial (cf. Sl 1,3), podeis espalhar
pelo mundo o oxigênio desta forma de amar.
Há, porém,
uma última dimensão da vossa missão sobre a qual gostaria de me deter. Ouvimos
o Senhor dizer aos habitantes de Jerusalém: «Nascerá o sol da justiça, trazendo
salvação em suas asas» (Ml 3,20a), convidando-os a esperar no
cumprimento do seu destino que vai além do tempo presente. Isto remete para a
dimensão escatológica da vida cristã, que nos quer empenhados no mundo, mas ao
mesmo tempo constantemente orientados para a eternidade. É, para vós, um
convite a alargar o «pedir», o «procurar» e o «bater» da oração e da vida ao
horizonte eterno que transcende as realidades deste mundo, orientando-as para o
domingo sem ocaso, quando toda a humanidade entrar no repouso de Deus (cf.
Missal Romano, Prefácio dos Domingos do Tempo Comum IX). A este
respeito, o Concílio Vaticano II confia-vos uma tarefa específica, ao dizer que
os consagrados são chamados de modo particular a ser testemunhas dos “bens
futuros” (cf. Lumen gentium, n. 44).
Queridos
irmãos e irmãs, o Senhor, a quem destes tudo, vos retribuiu com tal beleza e
riqueza que gostaria de vos exortar a valorizá-las e cultivá-las, recordando,
para concluir, algumas palavras de São Paulo VI. Escrevia ele aos religiosos:
«Conservai a simplicidade dos “mais pequeninos” do Evangelho. Esforçai-vos por
encontrá-la em uma relação interior e o mais cordial possível com Cristo, ou
nos contatos diretos com os vossos irmãos. Conhecereis então “o alvoroço da
alegria, pela ação do Espírito Santo”, próprio daqueles que são introduzidos
nos segredos do Reino. Não procureis entrar a fazer parte daqueles “sábios e
prudentes”, (...) para os quais esses segredos estão escondidos. Sede
verdadeiramente pobres, mansos, famintos de santidade, misericordiosos, puros
de coração, aqueles graças aos quais o mundo conhecerá a paz de Deus» (Exortação
Apostólica Evangelica testificatio, 29 de junho de 1971, n. 54).
Fonte: Santa Sé.
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