quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 28

Concluindo a 1ª parte das suas Catequeses sobre Jesus Cristo, centrada na Pessoa de Jesus, o Papa São João Paulo II dedicou cinco encontros à formulação dogmática da fé em Cristo (nn. 45-49).

Para acessar a postagem que serve de Introdução e índice das Catequeses, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

IV. A formulação dogmática da fé em Jesus Cristo

45. A fé em Jesus Cristo na primeira comunidade cristã
João Paulo II - 02 de março de 1988

1. A fé é a resposta do homem à palavra da Revelação divina. As Catequeses sobre Jesus Cristo que estamos desenvolvendo no âmbito do presente ciclo, fazem referência aos Símbolos da fé, especialmente ao Símbolo Apostólico e ao Niceno-Constantinopolitano. Com a ajuda deles, a Igreja exprime e professa a fé que se formou em seu seio desde o princípio, como resposta à palavra da Revelação de Deus em Jesus Cristo. Ao longo de todo o ciclo dessas Catequese temos recorrido a esta palavra, para extrair a verdade sobre o próprio Cristo nela revelada. Jesus de Nazaré é o Messias anunciado na antiga aliança. O Messias (isto é, o Cristo), verdadeiro homem (o “Filho do homem”), é, em sua mesma pessoa, Filho de Deus, verdadeiro Deus. Essa verdade sobre Ele emerge do conjunto das suas obras e palavras, que culminam definitivamente no acontecimento pascal da Morte na cruz e da Ressurreição.

Jesus instrui os Doze Apóstolos

2. Este conjunto vivo de dados da Revelação (a autorrevelação de Deus em Jesus Cristo) se encontra com a resposta da fé, primeiramente entre aqueles que foram testemunhas diretas da vida e do magistério do Messias, aqueles que “viram e ouviram...” e cujas mãos “tocaram” a realidade corpórea do Verbo da vida (cf. 1Jo 1,1); e, em seguida, nas gerações de crentes em Cristo que se sucederam permanecendo na comunidade da Igreja. Como se formou a fé da Igreja em Jesus Cristo? A este problema queremos dedicar as próximas Catequeses. Buscaremos especialmente ver como se formou e se expressou esta fé no início da Igreja, ao longo dos primeiros séculos, que tiveram uma importância particular para a formação da fé da Igreja, porque representam o primeiro desenvolvimento da Tradição viva que provém dos Apóstolos.

3. Antes de tudo é necessário notar que todos os testemunhos escritos sobre este tema provêm do período que se seguiu à partida de Cristo desta terra. Certamente se vê refletido e impresso nesses documentos o conhecimento direto dos acontecimentos definitivos: a Morte na cruz e a Ressurreição de Cristo. Ao mesmo tempo, porém, esses testemunhos escritos dizem respeito a toda a atividade de Jesus, antes, a toda a sua vida, começando por seu nascimento e infância. Vemos, além disso, que esses documentos testemunham um fato: que a fé dos Apóstolos - e com ela a fé da primeiríssima comunidade da Igreja - se formou já na etapa pré-pascal da vida e do ministério de Cristo, para manifestar-se com força definitiva depois de Pentecostes.

4. Uma expressão particularmente significativa deste fato é a resposta de Pedro à pergunta que Jesus fez aos Apóstolos nos arredores de Cesareia de Filipe: “Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?”. E a seguir: “E vós, quem dizeis que Eu sou?”. E eis a resposta: “Tu és o Cristo (o Messias), o Filho do Deus vivo” (Mt 16,13-16). Assim soa a resposta registrada por Mateus. No texto dos outros Evangelhos Sinóticos se fala do “Cristo” (Mc 8,29) ou do “Cristo de Deus” (Lc 9,20), expressões às quais corresponde também o “Tu és o Santo de Deus” de João (Jo 6,69). Em Mateus a resposta tem a forma mais completa: Jesus de Nazaré é o Cristo, isto é, o Messias, o Filho de Deus.

5. Encontramos a mesma expressão desta  originária da Igreja  nas primeiras palavras do Evangelho segundo Marcos: “Início do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1,1). Sabemos que o evangelista era estreitamente ligado a Pedro. A mesma fé a encontramos em seguida em todo o ensinamento do Apóstolo Paulo, o qual, desde o momento da sua conversão, “começou a proclamar nas sinagogas que Jesus é o Filho de Deus” (At 9,20). E depois, em suas Cartas, expressava a mesma fé de diversos modos (cf. Gl 4,4; Rm 1,3-4; Cl 1,15-18; Fl 2,6-11; e também Hb 1,14). Podemos dizer, pois, que na origem desta fé da Igreja estão os príncipes dos Apóstolos, Pedro e Paulo.

6. Também o Apóstolo João, autor do último Evangelho, escrito depois dos outros, o conclui com as famosas palavras com as quais atesta que esse foi escrito “para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que crendo tenhais a vida em seu nome” (Jo 20,31). Porque “todo aquele que confessa que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele, e ele em Deus” (1Jo 4,15). Assim, também a sua voz autorizada nos faz conhecer o que se acreditava e se professava sobre Jesus Cristo na Igreja primitiva.

7. Jesus de Nazaré é o Filho de Deus. Esta é a verdade fundamental da fé em Cristo (Messias), formada entre os Apóstolos a partir das obras e das palavras do seu Mestre no período pré-pascal. Depois da Ressurreição a fé se consolidou ainda mais profundamente e encontrou expressão nos testemunhos escritos.

E, contudo, é um fato significativo que a confissão: “Verdadeiramente este era Filho de Deus” (Mt 27,54), a ouçamos também, aos pés da cruz, dos lábios do centurião romano, isto é, de um pagão (cf. Mc 15,39). Naquela hora suprema, que mistério de graça e de inspiração divina atuava nos ânimos tanto de israelitas como de pagãos: em uma palavra, de homens!

8. Depois da Ressurreição, um dos Apóstolos, Tomé, faz uma confissão que se refere ainda mais diretamente à divindade de Cristo. Ele, que não queria crer na Ressurreição, vendo diante de si o Ressuscitado, exclama: “Meu Senhor e meu Deus!” (Jo 20,28). Significativo nesta exclamação é não só o “meu Deus”, mas também o “meu Senhor”, posto que Senhor (“Kyrios) já na tradição veterotestamentária significava também “Deus”. Com efeito, toda vez que se lia na Bíblia o “inefável” nome próprio de Deus, Yahweh, esse era substituído por Adonai, equivalente a “meu Senhor”. Portanto, também para Tomé, Cristo é “Senhor”, isto é, Deus.

À luz desses múltiplos testemunhos apostólicos adquirem seu pleno sentido as palavras pronunciadas por Pedro no dia de Pentecostes, no seu primeiro discurso à multidão reunida em torno aos Apóstolos: “A esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o constituiu Senhor e Cristo” (At 2,36). Em outras palavras: Jesus de Nazaré, verdadeiro homem, que como tal sofreu a morte de cruz, não só é Messias esperado, mas é também “o Senhor” (Kyrios) e, portanto, o verdadeiro Deus.

9. “Jesus é Senhor... o Senhor... o Senhor Jesus”: essa confissão ressoa nos lábios do primeiro mártir, Estêvão, enquanto é apedrejado (cf. At 7,59-60). Ela ressoa frequentemente também no anúncio de Paulo, como podemos ver em muitas passagens das suas Cartas (cf. 1Cor 12,3; Rm 10,9; 1Cor 16,22-23; 8,6; 10,21; 1Ts 1,8; 4,15; 2Cor 3,18).

Na Primeira Carta aos Coríntios o Apóstolo afirma: Ninguém será capaz de dizer: ‘Jesus é Senhor!’, a não ser pelo Espírito Santo” (1Cor 12,3). Já Pedro, depois da sua profissão de fé em Cesareia, tinha ouvido de Jesus: “Não foi carne nem sangue que te revelaram isso, mas meu Pai” (Mt 16,17). Jesus tinha advertido: “Só o Pai conhece o Filho...” (cf. Mt 11,27). E só o Espírito da Verdade pode dar um testemunho adequado d’Ele (cf. Jo 15,26).

10. Podemos dizer, pois, que a fé em Cristo nos início da Igreja era expressa nessas duas palavras: Filho de Deus Senhor” (isto é, “Kyrios-Adonai”). Essa é a fé na divindade do Filho do homem. Neste sentido pleno, Ele e apenas Ele é o “Salvador”, isto é, o artífice e doador da salvação que só Deus pode conceder ao homem. Esta salvação consiste não só na libertação do mal e do pecado, mas também no dom de uma vida nova, de uma participação na vida do próprio Deus. Neste sentido “em nenhum outro há salvação” (At 4,12), segundo as palavras do Apóstolo Pedro em sua primeira evangelização.

A mesma fé encontra expressão em numerosos outros textos dos tempos apostólicos, como nos Atos (por exemplo, At 5,31; 13,23), nas Cartas Paulinas (Rm 10,9-13; Ef 5,23; Fl 3,20s; 1Tm 1,1; 2,3-4; 4,10; 2Tm 1,10; Tt 1,3s; 2,13; 3,6), nas Cartas de Pedro (1Pd 1,11; 2Pd 2,20; 3,18), de João (1Jo 4,14) e também de Judas (Jd 25). Esta encontra lugar também nos Evangelhos da infância (cf. Mt 1,21; Lc 2,11).

11. Podemos concluir: Jesus de Nazaré, que habitualmente chamava a si mesmo “Filho do homem”, é o Cristo (isto é, o Messias), é o Filho de Deus, é o Senhor (Kyrios), é o Salvador: esta é a fé dos Apóstolos, que está na base da Igreja desde o princípio.

A Igreja guardou esta fé com sumo amor e veneração, transmitindo-a às novas gerações de discípulos e seguidores de Cristo sob a direção do Espírito da Verdade. A Igreja ensinou e defendeu essa fé, procurando ao longo dos séculos não só conservar íntegro o seu conteúdo essencial revelado, mas aprofundá-lo constantemente e explicá-lo segundo as necessidades e as possibilidades dos homens. Esta é a tarefa que a Igreja é chamada a realizar até o momento da vinda definitiva do seu Salvador e Senhor.

Ícone dos Doze Apóstolos sustentando a Igreja

Tradução nossa a partir do texto italiano divulgado no site da Santa Sé (02 de março de 1988).

Confira nossa postagem sobre a relação entre os Apóstolos e os artigos do Creio clicando aqui.

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