segunda-feira, 29 de abril de 2013

Homilia do Papa no II Domingo da Páscoa

TOMADA DE POSSE DA CÁTEDRA DO BISPO DE ROMA
HOMILIA DO SANTO PADRE FRANCISCO
Basílica de São João de Latrão
II Domingo de Páscoa ou da Divina Misericórdia, 7 de abril de 2013

Com alegria, celebro pela primeira vez a Eucaristia nesta Basílica Lateranense, a Catedral do Bispo de Roma. Saúdo a todos vós com grande afecto: o caríssimo Cardeal Vigário, os Bispos Auxiliares, o Presbitério diocesano, os Diáconos, as Religiosas e os Religiosos e todos os fiéis leigos. Saúdo também ao Senhor Presidente da Câmara Municipal e sua esposa e às restantes Autoridades. Caminhamos juntos na luz do Senhor Ressuscitado.
1. Hoje celebramos o Segundo Domingo de Páscoa, designado também «Domingo da Divina Misericórdia». A misericórdia de Deus: como é bela esta realidade da fé para a nossa vida! Como é grande e profundo o amor de Deus por nós! É um amor que não falha, que sempre agarra a nossa mão, nos sustenta, levanta e guia.
2. No Evangelho de hoje, o apóstolo Tomé experimenta precisamente a misericórdia de Deus, que tem um rosto concreto: o de Jesus, de Jesus Ressuscitado. Tomé não se fia nos demais Apóstolos, quando lhe dizem: «Vimos o Senhor»; para ele, não é suficiente a promessa de Jesus que preanunciara: ao terceiro dia ressuscitarei. Tomé quer ver, quer meter a sua mão no sinal dos cravos e no peito. E qual é a reacção de Jesus? A paciência: Jesus não abandona Tomé relutante na sua incredulidade; dá-lhe uma semana de tempo, não fecha a porta, espera. E Tomé acaba por reconhecer a sua própria pobreza, a sua pouca fé. «Meu Senhor e meu Deus»: com esta invocação simples mas cheia de fé, responde à paciência de Jesus. Deixa-se envolver pela misericórdia divina, vê-a à sua frente, nas feridas das mãos e dos pés, no peito aberto, e readquire a confiança: é um homem novo, já não incrédulo mas crente.
Recordemos também o caso de Pedro: por três vezes renega Jesus, precisamente quando Lhe devia estar mais unido; e, quando toca o fundo, encontra o olhar de Jesus que, com paciência e sem palavras, lhe diz: «Pedro, não tenhas medo da tua fraqueza, confia em Mim». E Pedro compreende, sente o olhar amoroso de Jesus e chora... Como é belo este olhar de Jesus! Quanta ternura! Irmãos e irmãs, não percamos jamais a confiança na paciente misericórdia de Deus!
Pensemos nos dois discípulos de Emaús: o rosto triste, passos vazios, sem esperança. Mas Jesus não os abandona: percorre juntamente com eles a estrada. E não só; com paciência, explica as Escrituras que a Si se referiam e pára em casa deles partilhando a refeição. Este é o estilo de Deus: não é impaciente como nós, que muitas vezes queremos tudo e imediatamente, mesmo quando se trata de pessoas. Deus é paciente connosco, porque nos ama; e quem ama compreende, espera, dá confiança, não abandona, não corta as pontes, sabe perdoar. Recordemo-lo na nossa vida de cristãos: Deus sempre espera por nós, mesmo quando nos afastamos! Ele nunca está longe e, se voltarmos para Ele, está pronto a abraçar-nos.
Sempre me causa grande impressão a leitura da parábola do Pai misericordioso; impressiona-me pela grande esperança que sempre me dá. Pensai naquele filho mais novo, que estava na casa do Pai, era amado; e todavia pretende a sua parte de herança; abandona a casa, gasta tudo, chega ao nível mais baixo, mais distante do Pai; e, quando tocou o fundo, sente saudades do calor da casa paterna e regressa. E o Pai? Teria ele esquecido o filho? Não, nunca! Está lá, avista-o ao longe, tinha esperado por ele todos os dias, todos os momentos: sempre esteve no seu coração como filho, apesar de o ter deixado e malbaratado todo o património, isto é, a sua liberdade; com paciência e amor, com esperança e misericórdia, o Pai não tinha cessado um instante sequer de pensar nele, e logo que o vê, ainda longe, corre ao seu encontro e abraça-o com ternura – a ternura de Deus –, sem uma palavra de censura: voltou! Isto é a alegria do pai; naquele abraço ao filho, está toda esta alegria: voltou! Deus sempre espera por nós, não se cansa. Jesus mostra-nos esta paciência misericordiosa de Deus, para sempre reencontrarmos confiança, esperança! Um grande teólogo alemão Romano Guardini dizia que Deus responde à nossa fraqueza com a sua paciência e isto é o motivo da nossa confiança, da nossa esperança (cf. Glabenserkenntnis, Wurzburg 1949, p. 28). É uma espécie de diálogo entre a nossa fraqueza e a paciência de Deus – um diálogo, que, se entrarmos nele, nos dá esperança.
3. Gostava de sublinhar outro elemento: a paciência de Deus deve encontrar em nós a coragem de regressar a Ele, qualquer que seja o erro, qualquer que seja o pecado na nossa vida. Jesus convida Tomé a meter a mão nas suas chagas das mãos e dos pés e na ferida do peito. Também nós podemos entrar nas chagas de Jesus, podemos tocá-Lo realmente; isto acontece todas as vezes que recebemos, com fé, os Sacramentos. São Bernardo diz numa bela Homilia: «Por estas feridas [de Jesus], posso saborear o mel dos rochedos e o azeite da rocha duríssima (cf. Dt 32, 13), isto é, posso saborear e ver como o Senhor é bom» (Sobre o Cântico dos Cânticos 61, 4). É precisamente nas chagas de Jesus que vivemos seguros, nelas se manifesta o amor imenso do seu coração. Tomé compreendera-o. São Bernardo interroga-se: Mas, com que poderei contar? Com os meus méritos? Todo «o meu mérito está na misericórdia do Senhor. Nunca serei pobre de méritos, enquanto Ele for rico de misericórdia: se são abundantes as misericórdias do Senhor, também são muitos os meus méritos» (ibid., 5). Importante é a coragem de me entregar à misericórdia de Jesus, confiar na sua paciência, refugiar-me sempre nas feridas do seu amor. São Bernardo chega a afirmar: «E se tenho consciência de muitos pecados? “Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5, 20)» (ibid., 5). Talvez algum de nós possa pensar: o meu pecado é tão grande, o meu afastamento de Deus é como o do filho mais novo da parábola, a minha incredulidade é como a de Tomé; não tenho coragem para voltar, para pensar que Deus me possa acolher e esteja à espera precisamente de mim. Mas é precisamente por ti que Deus espera! Só te pede a coragem de ires ter com Ele. Quantas vezes, no meu ministério pastoral, ouvi repetir: «Padre, tenho muitos pecados»; e o convite que sempre fazia era este: «Não temas, vai ter com Ele, que está a tua espera; Ele resolverá tudo». Ouvimos tantas propostas do mundo ao nosso redor; mas deixemo-nos conquistar pela proposta de Deus: a proposta d’Ele é uma carícia de amor. Para Deus, não somos números; somos importantes, antes, somos o que Ele tem de mais importante; apesar de pecadores, somos aquilo que Lhe está mais a peito.
Depois do pecado, Adão sente vergonha, sente-se nu, sente remorso por aquilo que fez; e todavia Deus não o abandona: se naquele momento começa o exílio longe de Deus, com o pecado, também já existe a promessa do regresso, a possibilidade de regressar a Ele. Imediatamente Deus pergunta: «Adão, onde estás?» Deus procura-o. Jesus ficou nu por nós, tomou sobre Si a vergonha de Adão, da nudez do seu pecado, para lavar o nosso pecado: pelas suas chagas, fomos curados. Recordai-vos do que diz São Paulo: De que poderei eu gloriar-me senão da minha fraqueza, da minha pobreza? É precisamente sentindo o meu pecado, olhando o meu pecado que posso ver e encontrar a misericórdia de Deus, o seu amor, e ir até Ele para receber o seu perdão.
Na minha vida pessoal, vi muitas vezes o rosto misericordioso de Deus, a sua paciência; vi também em muitas pessoas a coragem de entrar nas chagas de Jesus, dizendo-Lhe: Senhor, aqui estou, aceita a minha pobreza, esconde nas tuas chagas o meu pecado, lava-o com o teu sangue. E sempre vi que Deus o fez: Deus acolheu, consolou, lavou e amou.
Amados irmãos e irmãs, deixemo-nos envolver pela misericórdia de Deus; confiemos na sua paciência, que sempre nos dá tempo; tenhamos a coragem de voltar para sua casa, habitar nas feridas do seu amor deixando-nos amar por Ele, encontrar a sua misericórdia nos Sacramentos. Sentiremos a sua ternura maravilhosa, sentiremos o seu abraço, e ficaremos nós também mais capazes de misericórdia, paciência, perdão e amor.


Fonte: Santa Sé

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