No dia 02 de junho de 1989 o Papa João Paulo II (†2005) celebrou a Missa da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus no Centro Esportivo «Idrettsbygget» da Universidade Técnica de Trondheim (Noruega) durante sua Viagem Apostólica ao país.
Durante a celebração, que reuniu os fiéis da Noruega Central, um grupo de crianças recebeu a primeira Comunhão, como o Papa destaca em sua homilia, meditando as leituras da Solenidade para o Ano C (Ez 34,11-16; Sl 22; Rm 5,5b-11; Lc 15,3-7).
Viagem Apostólica a Noruega, Islândia, Finlândia, Dinamarca e Suécia
Celebração Eucarística
Homilia do Papa João Paulo II
Centro Esportivo «Idrettsbygget», Universidade Técnica de Trondheim (Noruega)
Sexta-feira, 02 de junho de 1989
Caros irmãos e irmãs da Noruega Central!
1. Estou verdadeiramente contente de celebrar a Solenidade do
Sagrado Coração convosco, aqui em Trondheim. Viestes das comunidades de Alesund,
Molde, Kristiansund, Levanger e Trondheim.
Muitos de vós contribuíram com muito trabalho para que esse dia
fosse um sucesso. Estou feliz com isso e agradeço a todos!
Viestes, como os peregrinos de outrora, a esta venerável cidade de
Nidaros (agora Trondheim, às relíquias de Santo Olaf, que anunciou uma nova era
de Cristianismo e de unificação nesta terra, embora não tenha vivido o
suficiente para poder ver os frutos do seu trabalho. Seu filho - Magnus, o Bom
- construiu a primeira igreja de madeira neste lugar, que rapidamente se tornou
uma meta de peregrinação. Já em 1060 se celebrava uma Liturgia em honra de
Santo Olaf até mesmo em Northumberland, na Grã-Bretanha. Também na Igreja
Ortodoxa a memória de Santo Olaf é muito venerada: à sua intercessão foi
atribuída a sobrevivência da Guarda Imperial de Constantinopla em um momento de
perigo, quando, sob o Imperador Aleixo, enfrentou os búlgaros em batalha.
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Imagem do Bom Pastor com o Coração em destaque (Basílica de São Lourenço fora dos muros, Roma) |
A Eucaristia foi um ponto central para as inumeráveis pessoais que
vieram aqui ao longo dos séculos. Na Eucaristia recebemos Cristo, que instituiu
este sacramento para poder permanecer conosco e viver em nós. Poderia haver dom
maior? Cristo redimiu o mundo com o sacrifício do seu Corpo e do seu Sangue.
Fazendo isso, Ele nos deu o alimento e a bebida para a vida eterna. Este
alimento sacramental, sob as espécies do pão e do vinho, realmente “restaura as
nossas almas”. Com efeito, Ele nos guia pelo caminho da fé, da esperança e da
caridade todos os dias da nossa vida, para que possamos “viver na casa do
Senhor”.
“O Senhor é o meu pastor, não me falta coisa alguma” (Sl 22,1).
A Liturgia de hoje coloca essas palavras do salmista nos lábios
das crianças que receberão a primeira Comunhão nesta Missa. É particularmente
apropriado que elas rezem hoje com essas maravilhosas palavras, quando nosso
Senhor e Salvador prepara uma mesa eucarística para elas pela primeira vez. As
palavras “o Senhor é o meu pastor” expressam uma esperança iluminada que elas
podem repetir todas as vezes que receberem Jesus, o pão da vida.
2. As leituras da Escritura da Missa de hoje nos propõem a figura
do Bom Pastor. Os profetas do Antigo Testamento usam esta imagem para poder
falar de Deus que libertou o povo eleito, Israel, da escravidão do Egito e lhe
demonstrou particular amor. Deus é o pastor que cuida das suas ovelhas,
vigiando-as para que não se percam. Ele nutre o seu rebanho, buscando “prados
verdejantes” para que possam pastar bem. Ele até mesmo encontra lugares
tranquilos para que possa repousar. Com solicitude amorosa Ele cuida de todo o
rebanho, não apenas de todas as ovelhas, mas também de cada uma
individualmente. Ele se preocupa com o bem-estar de cada cordeiro e de cada
ovelha que lhe foram confiados. Esta é a imagem do Bom Pastor assim como o
profeta Ezequiel a apresenta na 1ª leitura (Ez 34,11-16).
Na plenitude dos tempos, Jesus confirmou e aperfeiçoou a visão
profética do Bom Pastor, sacrificando a própria vida pelas ovelhas (cf. Jo 10,11).
Isto se refere ao seu sacrifício na Cruz, através do qual Ele deu a sua vida
pela vida do mundo (cf. Jo 6,51) - por todos e por cada
um individualmente. São Paulo escreve a respeito: “Cristo morreu por nós quando
éramos ainda pecadores” (Rm 5,8). Com a sua morte, Cristo
ofereceu-se a si mesmo em sacrifício ao Pai e, através desse sacrifício
redentor, revelou o amor do Pai por nós. São Paulo ensina que fomos “justificados
pelo sangue de Cristo... fomos reconciliados com Deus pela morte do seu Filho; agora,
estando já reconciliados, seremos salvos por sua vida” (vv. 9-10). Este é o
mistério do amor de Deus pelas suas ovelhas, o seu infinito e imutável amor,
que o leva a ir em busca da ovelha perdida (cf. Lc 15,3-7).
Este mistério nos foi ulteriormente revelado na véspera da morte
de Cristo na Cruz, quando Ele instituiu o sacramento do seu Corpo e o seu
Sangue. A Eucaristia é o sacrifício do Calvário realizado sacramentalmente
sobre os nossos altares, razão pela qual o Filho de Deus Crucificado e Ressuscitado
está sempre vivo no meio de nós. E é precisamente a sua vida ressuscitada que
Ele deseja nos comunicar. Como verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Ele partilha
esta nova vida conosco na Eucaristia, quando o recebemos sob as aparências do
pão e do vinho.
3. Disseram-me que as ovelhas podem ser vistas pastar em toda a Noruega desde o início da primavera até o final do outono. Sem dúvida elas muitas vezes podem vagar por lugares perigosos, e se vão muito longe correm o risco de se perder ou caírem presas de outros perigos. Na nossa viagem através da vida também nós corremos o risco de perder-nos. Ouvimos tantas vozes contraditórias que nos chamam de um lado e de outro. Assim, hoje convém que cada um de nós se interrogue: onde estou realmente? Sou uma ovelha perdida que precisa ser reconduzida ao redil sobre os ombros do Bom Pastor? Ele busca-nos continuamente, chamando-nos de volta das estradas falsas e enganosas nas quais podemos nos perder. Ele continuamente chama-nos ao arrependimento: chama-nos a restabelecer a comunhão com Deus e com os outros quando pecamos, e a uma santidade cada vez maior enquanto membros da sua Igreja.
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Imagem do Bom Pastor com o Coração em destaque (Catedral Armênia de Lviv, Ucrânia) |
Através da conversão devemos também crescer no amor e no respeito
por todo o rebanho de Cristo. Comparada com outros lugares, a Noruega é um país
rico. O próprio nome “Trondheim” nos recorda isso: significa “riqueza da
terra”. Muitas pessoas veem com admiração vossa democrática sociedade. As
tendências sociais no vosso país atraem a atenção do mundo. Nesse contexto,
portanto, sois chamados a não esquecer as crianças, os enfermos, as pessoas com
deficiência e os idosos. Todos merecem e têm necessidade de ser amados assim
como Deus ama cada um de nós: isso constitui um tesouro do qual todos nos
beneficiamos. O melhor dom que podeis dar aos vossos filhos é um coração que
seja plenamente humano, um coração que seja sensível ao bem e ao mal. O melhor
dom que podeis dar aos enfermos, às pessoas com deficiência e aos idosos é o
respeito devido a eles enquanto filhos e filhas do mesmo Pai celestial. Eles
merecem o vosso tempo, a atenção e o amor de cada um de vós. O seu exemplo e a
sua plenitude enriquecerão as vossas vidas e as vidas de todos aqueles que se
aproximarem deles com solicitude compassiva.
4. Meus irmãos e irmãs, sei que muitos de vós, que viestes aqui
hoje para celebrar a vossa unidade na fé com o Sucessor de São Pedro, pertencem
a pequenas comunidades. Muitos de vós provavelmente vivem longe de uma igreja. Vós
experimentastes o que significa pertencer a uma minoria religiosa,
especialmente considerando que muitos católicos da Noruega Central provêm do
exterior. Aqueles entre vós que vieram de outros países podem sentir falta da
língua, da cultura e do modo de viver da sua pátria, e também da familiar
Igreja Católica com as suas orações, os seus hinos e as suas cerimônias. Porém,
quero dizer a cada um de vós que o Papa, o Pastor universal da Igreja, vos ama.
Ele vem em nome de Cristo, o Bom Pastor, e vós possuís um lugar especial no seu
coração. Ele admira a vossa fidelidade e a vossa perseverança. E hoje ele está
aqui para vos encorajar a colocar toda a vossa confiança no amor de Deus!
Colocai toda a vossa confiança no amor de Deus!
Àqueles de vós que sois noruegueses por nascimento e há gerações
compreendeis que os imigrantes também contribuem para a riqueza da nação:
segundo as melhores tradições deste país, destes aos vossos cidadãos a
possibilidade de começar de novo em liberdade, com todas as oportunidades que a
sociedade oferece. Deste modo, representais um nobre exemplo que os outros
devem seguir. As diferenças humanas enriquecem cada nível da sociedade, e por
isso encorajo toda a comunidade a continuar garantindo àqueles que se
estabeleceram no meio de vós um lugar real na sociedade, concedendo-lhes o
respeito e os direitos que vós mesmos possuís.
5. A Solenidade do Sagrado Coração de Jesus que hoje celebramos nos convida a ver e a amar Cristo em todas as pessoas e a refletir o seu amor por elas na nossa vida. Por gerações a Igreja rezou assim: “Jesus, manso e humilde de coração, fazei o nosso coração semelhante ao vosso”. Hoje desejo recordar esta oração familiar e recitá-la em vosso nome: Jesus, fazei o nosso coração semelhante ao vosso. E, fazendo isso, agradeço a Deus particularmente pelo exemplo dos Padres de Picpus, missionários do Sagrado Coração, que por mais de cinquenta anos ofereceram sacerdotes para esta região, frequentemente em condições muito difíceis. Caros irmãos: hoje, na vossa grande festa, vos exorto a continuar vosso ministério sacerdotal e vos ofereço a gratidão de toda a Igreja pela vossa generosidade e pelo vosso zelo.
Agradeço também as Irmãs das Congregações religiosas que de
maneira louvável demonstraram a todos o amor de Cristo, especialmente às
crianças, aos enfermos e aos idosos. O serviço que prestais é uma oração
vivente que pode ser compreendida por todos. Que o Bom Pastor continue a zelar
por vós e vos abençoe no vosso empenho.
6. Minhas palavras finais são dirigidas às crianças:
Queridas crianças que recebereis a primeira Comunhão, hoje é um
dia muito importante para vós. Recebereis pela primeira vez a sagrada Comunhão.
Estou surpreso ao ver de quantos lugares provindes. Muitos de vós falam não só
o norueguês, mas também o vietnamita, o polonês, o espanhol, o inglês ou outras
línguas. Vossos pais e os sacerdotes que vos instruíram me disseram que vos
preparastes muito bem. Este é um ótimo exemplo para os adultos de todo o mundo.
Vós demonstrais que todos pertencem à comunidade da Igreja.
Estamos aqui porque Jesus nos chamou. Vistes no exemplo do
publicano Zaqueu. Jesus quer celebrar uma festa conosco e quer dar-nos o melhor
de si: o seu Corpo e o seu Sangue.
A preparação para a primeira Comunhão vos fez muito felizes.
Permanecei unidos e continuai assim. Os vossos sacerdotes, os vossos pais e os
vossos companheiros mais velhos ficarão felizes de vos ajudar.
Desejo concluir com uma palavra aos vossos pais. Muitos de vós
ajudastes vossos filhos na sua preparação e vos agradeço do fundo do coração.
Agora vos peço que façais todo o possível para que vossos filhos se encontram
em casa na comunidade da Igreja.
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O Papa dá a Comunhão a uma criança |
Tradução nossa a partir do texto italiano. Fonte: Santa Sé.
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