segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Homilia do Papa: Festa da Apresentação do Senhor 2015

Festa da Apresentação do Senhor
19º Dia Mundial da Vida Consagrada
Homilia do Papa Francisco
Basílica Vaticana
Domingo, 02 de fevereiro de 2015

Com os olhos da mente, fixemos o ícone da Virgem Mãe, Maria, que caminha com o Menino Jesus nos braços. Introdu-Lo no templo, introdu-Lo no povo, leva-O para encontrar o seu povo.

Os braços da Mãe são como que a «escada» pela qual o Filho de Deus desce até nós, a escada da condescendência de Deus. Ouvimo-lo na 1ª Leitura, tirada da Carta aos Hebreus: Cristo «teve de assemelhar-Se em tudo aos seus irmãos, para Se tornar um Sumo Sacerdote misericordioso e fiel» (Hb 2, 17). É duplo o caminho de Jesus: desceu, fez-Se como nós, para subir ao Pai juntamente conosco, fazendo-nos como Ele.

Podemos contemplar o âmago deste movimento, imaginando a cena evangélica de Maria que entra no templo com o Menino nos braços. Nossa Senhora caminha, mas o Filho caminha antes d’Ela. Ela leva-O, mas é Ele que A leva neste caminho de Deus que vem a nós para podermos ir até Ele.

Jesus percorreu a nossa própria estrada para nos indicar a via nova, um «caminho novo e vivo» (cf. Hb 10,20) que é Ele mesmo. E, para nós consagrados, esta é a única estrada, sem alternativa, que, em concreto, devemos percorrer com alegria e perseverança.

O Evangelho alude cinco vezes à obediência de Maria e José à «Lei do Senhor» (Lc 2,22.23.24.27.39). Jesus não veio para fazer a sua vontade, mas a vontade do Pai; e isso - disse Ele - era o seu «alimento» (Jo 4,34). Do mesmo modo, quem segue Jesus, abraça a via da obediência, imitando a «condescendência» do Senhor, abaixando-se e assumindo a vontade do Pai até ao aniquilamento e à humilhação de si mesmo (Fl 2,7-8). Para um religioso, progredir significa abaixar-se no serviço, isto é, fazer o mesmo caminho de Jesus, que «não considerou como uma usurpação ser igual a Deus» (Fl 2,6). Abaixar-se, fazendo-se servo; abaixar-se para servir.

E esta via toma a forma da regra, moldada segundo o carisma do fundador, sem esquecer que a regra insubstituível, para todos, é sempre o Evangelho. Depois o Espírito Santo, na sua criatividade infinita, exprime-o também nas várias regras de vida consagrada que nascem, todas, da «sequela Christi», isto é, deste caminho de abaixar-se servindo.

Através desta «lei», os consagrados podem alcançar a sabedoria, que não é uma aptidão abstrata mas é obra e dom do Espírito Santo. Um sinal evidente de tal sabedoria é a alegria. Sim, a alegria evangélica do religioso é consequência do caminho de abaixamento com Jesus… E, quando estivermos tristes, faremos bem se nos interrogarmos: «Como estamos a viver esta dimensão “kenotica”?».

Na narração da Apresentação de Jesus no Templo, a sabedoria é representada por dois anciãos, Simeão e Ana: pessoas dóceis ao Espírito Santo (aqui nomeado três vezes), conduzidas por Ele, animadas por Ele. O Senhor concedeu-lhes a sabedoria através dum longo caminho pela via da obediência à sua lei; obediência, que, por um lado, humilha e aniquila, mas, por outro, acende e guarda a esperança, fazendo-os criativos, porque estavam cheios de Espírito Santo. Os dois celebram uma espécie de Liturgia à volta do Menino que entra no Templo: Simeão louva o Senhor e Ana «prega» a salvação (Lc 2,28-32.38). Como no caso de Maria, também o velho Simeão toma o Menino nos seus braços, mas, na realidade, é o Menino que o agarra e conduz. Assim o exprime, de forma clara e concisa, a liturgia das primeiras Vésperas da Festa de hoje: «senex puerum portabat, puer autem senem regebat». Tanto Maria, mãe jovem, como Simeão, «avô» ancião, levam o Menino nos braços, mas é o próprio Menino que conduz a ambos.

É curioso notar que neste caso, criativos, não são os jovens mas os anciãos. Os jovens, como Maria e José, seguem a lei do Senhor pela via da obediência; os anciãos, como Simeão e Ana, vêem no Menino o cumprimento da Lei e das promessas de Deus. E são capazes de fazer festa: são criativos na alegria, na sabedoria. Mas é o Senhor que transforma a obediência em sabedoria, por acção do Espírito Santo.

Às vezes, Deus pode conceder o dom da sabedoria mesmo a um jovem inexperiente; basta que esteja disponível para percorrer a via da obediência e da docilidade ao Espírito. Esta obediência e docilidade não são qualquer coisa de teórico, mas trilham a lógica da encarnação do Verbo: docilidade e obediência a um fundador, docilidade e obediência a uma regra concreta, docilidade e obediência a um superior, docilidade e obediência à Igreja. Trata-se de docilidades e obediências concretas.

Através da perseverança no caminho da obediência, amadurece a sabedoria pessoal e comunitária e, assim, torna-se possível também adaptar as regras aos vários tempos: na realidade, a verdadeira «atualização» é obra da sabedoria, forjada na docilidade e na obediência.

robustecimento e a renovação da vida consagrada acontecem através de um grande amor à regra e também da capacidade de observar e escutar os anciãos da Congregação. Assim o «depósito», o carisma de cada família religiosa é guardado conjuntamente pela obediência e pela sabedoria. E, através deste caminho, somos preservados de viver a nossa consagração de maneira superficial, de forma desencarnada, como se fosse uma gnose que acabaria por reduzir a vida religiosa a um «caricatura»: uma caricatura na qual se realiza um seguimento sem renúncia, uma oração sem encontro, uma vida fraterna sem comunhão, uma obediência sem confiança e uma caridade sem transcendência.
Hoje também nós queremos, como Maria e como Simeão, tomar Jesus nos braços para que Ele Se encontre com o seu povo; mas de certeza só o conseguiremos, se nos deixarmos arrebatar pelo mistério de Cristo. Guiamos o povo para Jesus, se, por nossa vez, nos deixarmos guiar por Ele. Isto é o que devemos ser: guias guiados.

Que o Senhor, por intercessão de Maria nossa Mãe, de São José e dos Santos Simeão e Ana, nos conceda o que antes Lhe pedimos na oração da coleta: «apresentarmo-nos diante [d’Ele] plenamente renovados no espírito». Assim seja!


Fonte: Santa Sé.

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