Missa pelo cuidado da criação
Homilia do Papa Leão XIV
Borgo Laudato si’, Castel Gandolfo
Quarta-feira, 09 de julho de 2025
Foi celebrada a nova Missa pelo cuidado da criação com suas leituras (Cl 1,15-20; Sl 103; Mt 8,23-27) [1].
Neste lindo
dia, antes de tudo gostaria de convidar todos, começando por mim mesmo, a viver
o que estamos celebrando na beleza de uma “catedral”, que poderíamos dizer
“natural”, com as plantas e tantos elementos da criação que nos conduziram aqui
para celebrar a Eucaristia, que significa: dar graças ao Senhor.
Há muitos
motivos pelos quais queremos agradecer ao Senhor nesta Eucaristia: esta poderia
ser a primeira celebração com o uso do novo formulário da Santa Missa pelo
cuidado da criação, que é expressão do trabalho dos diferentes Dicastérios do
Vaticano.
A título
pessoal, agradeço a tantas pessoas aqui presentes, que trabalharam neste
sentido para a Liturgia. Como sabeis, a Liturgia representa a vida e vós sois a
vida deste Centro Laudato si’. Gostaria de vos agradecer neste momento,
nesta ocasião, por tudo o que fazem seguindo esta belíssima inspiração
do Papa Francisco, que deu esta pequena porção dos jardins precisamente
para continuar a tão importante missão relacionada com tudo o que conhecemos
após 10 anos da publicação da Laudato si’: a necessidade de cuidar
da criação, da casa comum.
Aqui é como
nas igrejas antigas dos primeiros séculos, que tinham uma pia batismal pela
qual era preciso passar para entrar na igreja. Não gostaria de ser batizado
nesta água, mas o símbolo de passar pela água para que todos sejamos lavados
dos nossos pecados, das nossas fraquezas, e assim poder entrar no grande
mistério da Igreja, é algo que vivemos também hoje. No início da Missa rezamos
pela conversão, a nossa conversão. Gostaria de acrescentar que devemos rezar
pela conversão de tantas pessoas, dentro e fora da Igreja, que ainda não
reconhecem a urgência de cuidar da nossa casa comum.
Inúmeros
desastres naturais que ainda vemos no mundo quase todos os dias em muitos
lugares e em muitos países são em parte causados pelos excessos do ser humano,
com o seu estilo de vida. Por isso, devemos nos perguntar se nós mesmos estamos
vivendo ou não essa conversão: quanto ela é necessária!
Tendo dito
tudo isto, tenham um pouco mais de paciência, pois tenho também uma homilia que
preparei e que vou partilhar: há alguns elementos que realmente ajudam a
continuar a reflexão desta manhã, compartilhando este momento familiar e
sereno, em um mundo em chamas, tanto pelo aquecimento global quanto pelos
conflitos armados, que tornam tão atual a mensagem do Papa
Francisco nas suas Encíclicas Laudato si’ e Fratelli
tutti. Podemos reconhecer-nos exatamente neste Evangelho que acabamos de
ouvir (Mt 8,23-27), observando o medo dos discípulos no meio da
tempestade, o mesmo medo de grande parte da humanidade. Todavia, no coração do Ano
do Jubileu, nós confessamos, e podemos repeti-lo várias vezes: há esperança!
Encontramo-la em Jesus. Mais uma vez, Ele acalma a tempestade. O seu poder não
traz agitação, mas cria algo; não destrói, mas faz ser, dando nova vida. E
também nós nos perguntamos: «Quem é este homem, que até os ventos e o mar lhe obedecem?»
(v. 27).
A admiração
que esta pergunta exprime é o primeiro passo que nos faz sair do medo. Jesus
tinha vivido e rezado nos arredores do lago da Galileia. Ali, nos seus locais
de vida e de trabalho, chamou os primeiros discípulos. As parábolas com que
anunciava o Reino de Deus revelam uma profunda ligação com aquela terra e com
aquelas águas, com o ritmo das estações e com a vida das criaturas.
O evangelista
Mateus descreve a tempestade como uma “agitação da terra” (a palavra seismos):
ele usará a mesma palavra para o terremoto no momento da Morte de Jesus e ao
amanhecer da sua Ressurreição. Cristo se eleva, de pé, sobre esta agitação: já
aqui o Evangelho nos faz perceber o Ressuscitado, presente na nossa história às
avessas. A repreensão que Jesus dirige ao vento e ao mar manifesta o seu poder
de vida e salvação, que supera aquelas forças diante das quais as criaturas se
sentem perdidas.
Assim,
voltemos a nos perguntar: « Quem é este homem, que até os ventos e o mar lhe obedecem?»
(Mt 8,27). O hino que ouvimos da Carta aos Colossenses (Cl
1,15-20) parece responder precisamente a esta pergunta: Ele «é a imagem do Deus
invisível, o primogênito de toda a criação, pois por causa d’Ele foram criadas
todas as coisas no céu e na terra» (vv. 15-16). Naquele dia, os seus
discípulos, à mercê da tempestade e dominados pelo medo, ainda não podiam
professar este conhecimento sobre Jesus. Hoje, na fé que nos foi transmitida,
podemos continuar: «Ele é a Cabeça do corpo, isto é, da Igreja. Ele é o
princípio, o primogênito dentre os mortos; de sorte que em tudo Ele tem a
primazia» (v. 18). Essas são palavras que nos comprometem ao longo da história,
que fazem de nós um corpo vivo, o corpo do qual Cristo é cabeça. A nossa missão
de cuidar a criação, de levar-lhe paz e reconciliação, é a sua própria missão:
a missão que o Senhor nos confiou. Nós ouvimos o clamor da terra, nós ouvimos o
clamor dos pobres porque esse clamor chegou ao coração de Deus. A nossa
indignação é a sua indignação e o nosso trabalho é o seu trabalho.
O canto do
salmista inspira-nos a este respeito: «Eis a voz do Senhor sobre as águas, sua
voz sobre as águas imensas! Eis a voz do Senhor com poder! Eis a voz do Senhor
majestosa, sua voz no trovão reboando!» (Sl 28,3-4). Esta voz
compromete a Igreja com a profecia, mesmo quando exige a audácia de nos opormos
ao poder destrutivo dos príncipes deste mundo. Com efeito, a aliança
indestrutível entre o Criador e as criaturas move a nossa inteligência e os
nossos esforços para que o mal se transforme em bem, a injustiça em justiça e a
ganância em comunhão.
O único Deus
criou todas as coisas com amor infinito e deu-nos a vida: por esta razão, São
Francisco de Assis chama as criaturas de irmão, irmã e mãe. Somente um olhar
contemplativo pode mudar a nossa relação com as coisas criadas e tirar-nos da
crise ecológica que, devido ao pecado, tem como causa a ruptura das relações
com Deus, com o próximo e com a terra (cf. Laudato si’, n. 66).
Caríssimos
irmãos e irmãs, o Borgo Laudato si’, onde nos encontramos, pretende
ser, por intuição do Papa Francisco, um “laboratório” onde é possível
viver aquela harmonia com a criação que é cura e reconciliação para nós,
elaborando novas e eficazes formas de cuidar da natureza que nos foi confiada.
Portanto, a todos vós, que vos dedicais com empenho à realização deste projeto,
asseguro a minha oração e o meu encorajamento.
A Eucaristia
que estamos celebrando dá sentido e sustenta o nosso trabalho. Assim, como
escreve o Papa Francisco, «a criação encontra a sua maior elevação na
Eucaristia. A graça, que tende a manifestar-se de modo sensível, atinge uma
expressão maravilhosa quando o próprio Deus, feito homem, chega ao ponto de
fazer-se comer pela sua criatura. No apogeu do mistério da Encarnação, o Senhor
quer chegar ao nosso íntimo através de um pedaço de matéria. Não o faz de cima,
mas de dentro, para podermos encontrá-lo no nosso próprio mundo» (Laudato
si’, n. 236). Sendo assim, a partir deste lugar, desejo concluir estes
pensamentos confiando-vos as palavras com que Santo Agostinho, nas últimas
páginas das suas Confissões, associa as coisas criadas e o homem em
um louvor cósmico: ó Senhor, «tuas obras te louvam para que te amemos. E nós te
amamos para que tuas obras te louvem» (Confissões, XIII, 33,48). Que
seja esta a harmonia que transmitimos ao mundo.
Fonte: Santa Sé.
[1] A leitura (Cl 1,15-20) e o Evangelho (Mt 8,23-27) foram citados pelo Papa em sua homilia O salmo (Sl 103), por sua vez, consta em um breve vídeo divulgado pela Santa Sé. O outro salmo proposto (Sl 18), ademais, foi adaptado como canto de entrada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário