VIGÍLIA DE PENTECOSTES COM
OS MOVIMENTOS ECLESIAIS
PALAVRAS DO SANTO PADRE
FRANCISCO
Praça de São Pedro
Sábado, 18 de Maio de 2013
Sábado, 18 de Maio de 2013
Boa tarde a todos!
É uma alegria para mim encontrar-vos!
Juntamo-nos, todos nós, nesta Praça [de São Pedro] para rezar, estar unidos e
esperar o dom do Espírito Santo. Eu já conhecia as vossas perguntas e pensei
nelas; não se trata, portanto, duma improvisação! A verdade, acima de tudo!
Tenho-as aqui, escritas.
A primeira – «na sua vida, como pôde
alcançar a certeza a respeito da fé; e que estrada nos indica para podermos,
cada um de nós, vencer a fragilidade da fé? – é uma pergunta de história, pois
refere-se à minha história, à história da minha vida.
Tive a graça de crescer numa família onde
se vivia a fé de forma simples e concreta; mas foi sobretudo a minha avó, mãe
do meu pai, que marcou o meu caminho de fé. Era uma mulher que nos explicava,
falava de Jesus, ensinava o Catecismo. Lembro-me sempre que, na Sexta-Feira
Santa, ela nos levava à noite à procissão de velas; no final desta procissão,
passava o «Cristo jacente», e a avó fazia-nos – a nós crianças – ajoelhar e
dizia-nos: «Olhai! Morreu, mas amanhã ressuscita». Recebi o primeiro anúncio
cristão precisamente desta mulher, da minha avó! Tudo isto é muito belo! O
primeiro anúncio em casa, com a família! Isto faz-me pensar no carinho que põem
tantas mães e tantas avós na transmissão da fé. São elas que transmitem a fé. O
mesmo acontecia nos primeiros tempos, porque São Paulo diz a Timóteo: «Recordo
a fé da tua mãe e da tua avó» (cf. 2
Tm 1, 5). Oh vós todas, mães
e avós que estais aqui, pensai nisto! A transmissão da fé… É que Deus coloca ao
nosso lado pessoas que nos ajudam no nosso caminho de fé. Não encontramos a fé
no indefinido, não! Mas há sempre uma pessoa que prega, que nos diz quem é
Jesus, nos transmite a fé, nos dá o primeiro anúncio. E assim foi a primeira
experiência de fé que tive.
Para mim, porém, há um dia muito
importante: 21 de Setembro de 1953 (tinha quase 17 anos); celebrava-se o «Dia
do Estudante», sendo, para nós, o início da Primavera, ao passo que, para vós,
é o início do Outono. Antes de ir para a festa, passei pela paróquia que
habitualmente frequentava: encontrei um padre, que não conhecia, e senti
necessidade de me confessar. Esta foi para mim uma experiência de encontro:
achei que alguém me esperava. Eu não sei o que se passou, não me lembro; não
sei sequer por que motivo estivesse lá aquele padre que eu não conhecia, não
sei porque senti aquela vontade de me confessar, mas a verdade é que alguém
estava à minha espera. Esperava-me há muito tempo. Depois da confissão, senti
que qualquer coisa tinha mudado; eu não era o mesmo. Tinha ouvido como que uma
voz, uma chamada: fiquei convencido de que devia tornar-me sacerdote. Na fé, é
importante esta experiência. Dizemos que devemos procurar Deus, ir ter com Ele
para pedir perdão… Mas, quando chegamos, já Ele está à nossa espera, Ele chega
primeiro! Em espanhol, temos uma palavra que explica bem isto: «O Senhor sempre
nosprimerea», é o primeiro, está à nossa espera! E esta é uma graça
mesmo grande: encontrar alguém que te espera. Tu vais pecador, e Ele está à tua
espera para te perdoar. Esta é a experiência que os Profetas de Israel
descreviam ao dizer que o Senhor é como a flor da amendoeira, a primeira flor
da Primavera (cf. Jr 1, 11-12). Antes da chegada das outras
flores, aparece ela: é ela que espera. O Senhor espera por nós. E, quando O
procuramos, deparamos com esta realidade: é Ele que está à nossa espera, para
nos acolher, para nos dar o seu amor. E isto infunde no teu coração uma
maravilha tal que nem acreditas, e assim vai crescendo a fé… no encontro com
uma pessoa, no encontro com o Senhor. Alguém poderá dizer: «Não, eu prefiro
estudar a fé nos livros». É importante estudá-la, mas olhai que isso não basta!
O mais importante é o encontro com Jesus, o encontro com Ele; é isto que te dá
a fé, porque é precisamente Ele quem te la dá.
Na pergunta, faláveis também da
fragilidade da fé: Como se pode vencê-la? O maior inimigo que tem a fragilidade
é o medo. Curioso, não é!? Mas eu digo-vos: Não tenhais medo! Somos frágeis –
bem o sabemos –, mas o Senhor é forte! Se tu caminhas com Ele, não há problema.
Uma criança – hoje vi tantas! – é fragilíssima, mas, estando com o pai, com a
mãe, sente-se segura! Com o Senhor, estamos seguros. A fé cresce com o Senhor,
precisamente a partir da mão do Senhor; isto faz-nos crescer e torna-nos
fortes. Às vezes, porém, pensamos que podemos arranjar-nos sozinhos; mas não!
Pensemos no que aconteceu a Pedro: «Senhor, eu nunca te negarei» (cf. Mt 26, 33-35), mas, quando o galo cantou,
já ele O tinha negado três vezes! (cf. vv. 69-75). Pensemos bem nisto: quando
temos demasiada confiança em nós mesmos, somos mais frágeis; sim, mais frágeis.
Sempre com o Senhor! E quando digo com o Senhor, pretendo dizer com a
Eucaristia, com a Bíblia, com a oração..., mas também em família, também com a
mãe, também com ela, porque é quem nos leva ao Senhor; é a mãe, é aquela sabe
tudo. Por conseguinte, rezar também a Nossa Senhora e pedir-lhe que, como mãe,
me faça forte. Isto é o que penso sobre a fragilidade; pelo menos, é a minha
experiência. Uma coisa que me faz forte todos os dias é rezar o Terço a Nossa
Senhora. Sinto uma força tão grande, porque vou ter com ela e sinto-me forte.
Passemos à segunda pergunta: «Penso que
todos nós aqui presentes sentimos fortemente este desafio – o desfio da
evangelização – que está no centro das nossas experiências. Por isso, gostaria
de lhe pedir, Santo Padre, que me ajudasse, a mim e a todos nós, a compreender
o modo como viver este desafio no nosso tempo. Na sua opinião, qual é a coisa
mais importante para a qual todos nós – movimentos, associações e comunidades –
devemos olhar para realizar esta tarefa a que somos chamados? Como podemos hoje
comunicar, de maneira eficaz, a fé?»
Só vou dizer três palavras. A primeira: Jesus. Qual é a coisa mais
importante? Jesus. Se pretendemos avançar com mais organização, com outras
coisas – coisas certamente boas –, mas sem Jesus, não avançamos, não resulta. O
mais importante é Jesus. Deixai-me fazer-vos aqui uma pequena advertência, mas
fraternalmente, cá entre nós. Todos vós gritastes na Praça: «Francisco,
Francisco, Papa Francisco». E Jesus, onde estava? Eu teria gostado que vós
gritásseis: «Jesus, Jesus é o Senhor, e está verdadeiramente no meio de nós».
Daqui para diante, não digais «Francisco», mas «Jesus»!
A segunda palavra é: oração. Olhar o rosto de Deus,
mas sobretudo – e isto está ligado com o que disse antes – sentir-se olhado. O
Senhor olha-nos: é o primeiro que olha. A minha experiência é aquilo que sinto
diante do Sacrário quando vou rezar, à noite, diante do Senhor. Às vezes
cabeceio um pouco, é verdade! O cansaço do dia faz adormecer. Mas Ele
compreende-me. E sinto grande consolação, ao pensar que Ele me olha. Nós
pensamos que devemos orar, falar, falar, falar... Não! Deixa-te olhar pelo
Senhor. Quando Ele olha para nós, dá-nos força e ajuda-nos a testemunhá-lo. A
pergunta era sobre o testemunho da fé, não era? Pois bem; primeiro «Jesus»,
depois «oração»: sentimos que Deus nos leva pela mão. Sublinho a importância
disto: deixar-se guiar por Ele. Isto é mais importante do que qualquer um dos
nossos cálculos. Somos verdadeiros evangelizadores, quando nos deixamos guiar
por Ele. Pensemos neste caso de Pedro: estava ele talvez a fazer a sesta,
quando teve uma visão – a visão da toalha com todos os animais – e ouviu Jesus
que lhe dizia qualquer coisa, mas ele não entendia. Naquele momento, chegaram
alguns não-judeus chamando-o para ir a certa casa; ele foi e viu como o
Espírito Santo estava lá. Pedro deixou-se guiar por Jesus para chegar àquela
primeira evangelização dos gentios, que não eram judeus; uma coisa então
impensável (cf. Act 10, 9-48). E o mesmo se deu em toda a
história… toda a história! Deixar-se guiar por Jesus. O líder é precisamente
Ele; o nosso líder é Jesus.
E terceira: testemunho. Jesus, oração – a
oração, este deixar-se guiar por Ele - e depois testemunho. Mas há mais
qualquer coisa que gostava de dizer. Este deixar-se guiar por Jesus é
abandonar-se às surpresas de Jesus. Pode-se pensar que devemos programar em
pormenor a evangelização, pensando nas estratégias, fazendo planos. Mas isto
são instrumentos, pequenos instrumentos. O importante é Jesus e deixar-se guiar
por Ele. Então podemos fazer as estratégias, mas isso é secundário.
Finalmente, o testemunho: a comunicação da fé
pode-se fazer unicamente através do testemunho; e este é o amor. Não com as
nossas ideias, mas com o Evangelho vivido na própria existência, que o Espírito
Santo faz viver no nosso íntimo. É como uma sinergia entre nós e o Espírito
Santo; e isto leva ao testemunho. Quem faz avançar a Igreja são os Santos,
porque são precisamente eles que dão este testemunho. Como disseram João Paulo
II e também Bento XVI, o mundo de hoje tem tanta necessidade de testemunhas;
precisa mais de testemunhas que de mestres. Devemos falar menos, mas falar com
a vida toda: a coerência de vida. Precisamente, a coerência de vida! Uma
coerência de vida que seja viver o cristianismo como um encontro com Jesus que
me leva aos outros, e não como um facto social. Socialmente aparecemos assim:
somos cristãos, cristãos fechados em nós mesmos. Isto não! O testemunho!
A terceira pergunta: «Deixe-me
perguntar-lhe, Santo Padre: Como podemos, eu e todos nós, viver uma Igreja
pobre e para os pobres? Como é que o doente é uma interpelação à nossa fé? Que
contribuição podemos nós todos, enquanto movimentos e associações laicais, dar
concreta e eficazmente à Igreja e à sociedade para enfrentar esta crise que
toca a ética pública» – isto é importante! – «o modelo de desenvolvimento, a
política, em suma, um novo modo de ser homens e mulheres?»
Recomeço do testemunho... Antes de mais
nada, viver o Evangelho é a principal contribuição que podemos dar. A Igreja
não é um movimento político, nem uma estrutura bem organizada. Não é isso! Não
somos uma ONG, e quando a Igreja se torna uma ONG perde o sal, não tem sabor,
não passa de uma organização vazia. Neste ponto sede sagazes, porque o diabo
nos engana; há o perigo do eficientismo. Uma coisa é pregar Jesus, outra é a
eficácia, ser eficientes. Isto, não; aquela é outro valor. Fundamentalmente, o
valor da Igreja é viver o Evangelho e dar testemunho da nossa fé. A Igreja é
sal da terra, é luz do mundo; é chamada a tornar presente na sociedade o
fermento do Reino de Deus; e fá-lo, antes de mais nada, por meio do seu
testemunho: o testemunho do amor fraterno, da solidariedade, da partilha.
Quando se ouve alguns dizerem que a solidariedade não é um valor, mas uma
«atitude primitiva» que deve desaparecer... é errado! Está-se a pensar na
eficácia apenas mundana. Quanto as momentos de crise, como este que estamos
vivendo… Antes tinhas dito que «estamos num mundo de mentiras». Atenção! A
crise actual não é apenas económica; não é uma crise cultural. É uma crise do
homem: o que está em crise é o homem! E o que pode ser destruído é o homem! Mas
o homem é a imagem de Deus! Por isso, é uma crise profunda! Neste tempo de
crise, não podemos preocupar-nos só com nós mesmos, fecharmo-nos na solidão, no
desânimo, numa sensação de impotência face aos problemas. Não se fechem, por
favor! Isto é um perigo: fecharmo-nos na paróquia, com os amigos, no movimento,
com aqueles que pensam as mesmas coisas que eu... Sabeis o que sucede? Quando a
Igreja se fecha, adoece, fica doente. Imaginai um quarto fechado durante um
ano; quando lá entras, cheira a mofo e há muitas coisas que não estão bem. A
uma Igreja fechada sucede o mesmo: é uma Igreja doente. A Igreja deve sair de
si mesma. Para onde? Para as periferias existenciais, sejam eles quais forem…,
mas sair. Jesus diz-nos: «Ide pelo mundo inteiro! Ide! Pregai! Dai testemunho
do Evangelho!» (cf.Mc 16,
15). Entretanto que acontece quando alguém sai de si mesmo? Pode suceder aquilo
a que estão sujeitos quantos saem de casa e vão pela estrada: um acidente. Mas
eu digo-vos: Prefiro mil vezes uma Igreja acidentada, caída num acidente, que
uma Igreja doente por fechamento! Ide para fora, saí! Pensai também nisto que
diz o Apocalipse (é uma coisa linda!): Jesus está à porta e chama, chama para
entrar no nosso coração (cf. Ap 3, 20). Este é o sentido do
Apocalipse. Mas fazei a vós mesmos esta pergunta: Quantas vezes Jesus está
dentro e bate à porta para sair, ir para fora, mas não O deixamos sair, por
causa das nossas seguranças, por estarmos muitas vezes fechados em estruturas
caducas, que servem apenas para nos tornar escravos, e não filhos de Deus que
são livres? Nesta «saída», é importante ir ao encontro de…; esta palavra, para
mim, é muito importante: o encontro com os outros. Porquê? Porque a fé é um
encontro com Jesus, e nós devemos fazer o mesmo que Jesus: encontrar os outros.
Vivemos numa cultura do desencontro, uma cultura da fragmentação, uma cultura
na qual o que não me serve deito fora, a cultura das escórias. A propósito,
convido-vos a pensar – e é parte da crise – nos idosos, que são a sabedoria de
um povo, nas crianças... a cultura das escórias. Nós, pelo contrário, devemos
ir ao encontro e devemos criar, com a nossa fé, uma «cultura do encontro», uma
cultura da amizade, uma cultura onde encontramos irmãos, onde podemos conversar
mesmo com aqueles que pensam diversamente de nós, mesmo com quantos possuem
outra crença, que não têm a mesma fé. Todos têm algo em comum connosco: são
imagens de Deus, são filhos de Deus. Ir ao encontro de todos, sem negociar a
nossa filiação eclesial.
Outro ponto importante são os pobres. Se
sairmos de nós mesmos, encontramos a pobreza. Hoje… – dizê-lo faz doer o
coração - hoje encontrar um sem-tecto morto de frio não é notícia. Hoje é
notícia, talvez, um escândalo. Um escândalo: ah, isso é notícia! Hoje pensar
que muitas crianças não terão que comer não é notícia. Isto é grave; sim,
grave! Não podemos ficar tranquilos! Bem! As coisas estão assim. Não podemos
tornar-nos cristãos engomados, aqueles cristãos demasiado educados que falam de
coisas teológicas enquanto tomam o chá, tranquilos. Isto não! Devemos
tornar-nos cristãos corajosos e ir à procura daqueles que são precisamente a
carne de Cristo, aqueles que são a carne de Cristo! Quando vou confessar – não
aqui; aqui ainda não posso, porque sair para confessar... daqui não se pode sair,
mas isso é outro problema – quando, na diocese anterior, ia confessar, vinham
as pessoas e eu sempre lhes fazia esta pergunta: «Dá esmolas?» «Sim, padre!»
«Muito bem!» Mas fazia-lhe mais duas: «Diga-me, quando dá esmola, fixa nos
olhos aquele ou aquela a quem dá a esmola?» «Bem, não sei, não me dou conta».
Segunda pergunta: «E quando dá esmola, toca a mão da pessoa a quem dá a esmola
ou lança-lhe a moeda?» Este é o problema: a carne de Cristo, tocar a carne de
Cristo, assumir este sofrimento pelos pobres. A pobreza, para nós cristãos, não
é uma categoria sociológico, filosófica ou cultural. Não! É uma categoria
teologal. Diria que esta é talvez a primeira categoria, porque aquele Deus, o
Filho de Deus, humilhou-se, fez-se pobre para caminhar connosco ao longo da
estrada. E esta é a nossa pobreza: a pobreza da carne de Cristo, a pobreza que
nos trouxe o Filho de Deus com a sua Encarnação. A Igreja pobre para os pobres
começa pelo dirigir-se à carne de Cristo. Se nos fixarmos na carne de Cristo,
começamos a compreender qualquer coisa, a compreender o que é esta pobreza, a
pobreza do Senhor. E isso não é fácil! Mas aos cristãos apresenta-se-lhes um
problema que não lhes faz bem: o espírito do mundo, o espírito mundano, a
mundanidade espiritual. Isto faz-nos sentir autónomos, viver o espírito do
mundo, e não o de Jesus.
Quanto à pergunta que me fazíeis: como se
deve viver para enfrentar esta crise que toca a ética pública, o modelo de
desenvolvimento, a política? Pensar que esta é uma crise do homem, uma crise que
destrói o homem, uma crise que despoja o homem da ética. Na vida pública, na
política, se não houver a ética, uma ética de referimento, tudo é possível e
tudo se pode fazer. E, quando lemos os jornais, vemos como a falta de ética na
vida pública causa tanto dano à humanidade inteira.
Gostaria de contar-vos uma história. Já o
fiz duas vezes esta semana, mas farei uma terceira convosco. É a história que
narra um midrash bíblico de um rabino do século XII. Ao
contar a história da construção da Torre de Babel, diz ele que, para construir
a Torre de Babel, era necessário fazer os tijolos. Que significa isto? Ir,
empastar o barro, trazer a palha, misturar tudo, e depois… forno. E quando o
tijolo estava pronto tinha de ser carregado lá para cima, para a construção da
Torre de Babel. Enfim, o tijolo era um tesouro, considerando todo o trabalho
que se requeria para o fazer. Quando caía um tijolo, era uma tragédia nacional
e o trabalhador culpado era punido; era tão precioso um tijolo que, se caísse,
era um drama. Mas, se caía um trabalhador, não sucedia nada; era um caso
completamente diverso. O mesmo sucede hoje: se os investimentos em bancos caem
um pouco, é uma tragédia! Que havemos de fazer? Mas, se as pessoas morrem de
fome, se não têm que comer, se não têm saúde, isso não importa! Esta é a nossa
crise de hoje! E o testemunho de uma Igreja pobre para os pobres vai contra
essa mentalidade.
A quarta pergunta: «Vendo estas situações,
parece-me que a minha confissão, o meu testemunho seja tímido e desajeitado.
Gostaria de fazer mais, mas o quê? E como ajudar estes nossos irmãos? Como
aliviar o seu sofrimento, não tendo possibilidade de fazer nada, ou pelo menos
muito pouco, para mudar o seu contexto político e social?»
Para anunciar o Evangelho, são necessárias
duas virtudes: a coragem e a paciência. Eles [os cristãos que sofrem] estão na
Igreja da paciência. Eles sofrem e há mais mártires hoje do que nos primeiros
séculos da Igreja. Sim, mais mártires! Irmãos e irmãs nossos, que sofrem! Levam
a fé até ao martírio. Mas o martírio nunca é uma derrota; o martírio é o grau
mais alto do testemunho que devemos dar. Nós estamos a caminho do martírio, de
pequenos martírios: ao renunciar a isto, ao fazer aquilo... vamos a caminho. E
eles, coitados, dão a vida, mas dão-na – acabámos de ouvir a situação no
Paquistão – por amor de Jesus, testemunhando Jesus. Um cristão deve ter sempre
esta atitude de mansidão, de humildade; precisamente a atitude que têm eles,
confiando em Jesus, confiando-se a Jesus. É preciso notar que, muitas vezes,
estes conflitos não têm uma origem religiosa; frequentemente há outras causas
de tipo social e político, e infelizmente as filiações religiosas acabam por
ser utilizadas como gasolina sobre o fogo. Um cristão sempre deve ser capaz de
responder ao mal com o bem, ainda que muitas vezes seja difícil. A estes irmãos
e irmãs, procuremos fazer-lhes sentir que estamos profundamente unidos à sua
situação, que sabemos que são cristãos «entrados na paciência». Quando Jesus
vai ao encontro da Paixão, entra na paciência. Eles entraram na paciência: há
que fazê-lo saber a eles, mas também fazê-lo saber ao Senhor. Deixai que vos
faça uma pergunta: Rezais por estes irmãos e estas irmãs? Rezais por eles, na
oração de todos os dias? Eu não vou pedir agora que levantem a mão aqueles que
rezam. Não o pedirei... Mas tende-o bem em conta. Na oração de cada dia,
digamos a Jesus: «Senhor, olha este irmão, olha esta irmã que sofre tanto, tanto!»
Eles fazem a experiência do limite, precisamente do limite entre a vida e a
morte. E esta experiência deve levar-nos também a promover a liberdade
religiosa para todos, para todos! Cada homem, cada mulher deve ser livre na sua
própria confissão religiosa, seja ela qual for. Porquê? Porque aquele homem e
aquela mulher são filhos de Deus.
E, assim, creio ter respondido de algum
modo às vossas perguntas. Peço desculpas se fui demasiado longo. Muito
obrigado! Obrigado a todos vós! E não esqueçais: não queremos uma Igreja
fechada, mas uma Igreja que sai, que vai às periferias da existência. Que o
Senhor nos guie nelas! Obrigado!
Fonte: Santa Sé
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