quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Catequeses do Jubileu 2025: Infância de Jesus 1

Ao longo do Jubileu Ordinário de 2025 os Papas Francisco (até sua morte em abril) e Leão XIV (a partir da sua eleição em maio) proferiram uma série de Catequeses inspiradas no “tema ” do Ano Santo, intituladas “Jesus Cristo, nossa esperança”.

A partir desta postagem gostaríamos de repropor essas reflexões, começando com a seção dedicada à infância de Jesus. Confira nessa primeira parte, portanto, as primeiras duas meditações: sobre a genealogia de Jesus (Mt 1,1-17) e sobre a Anunciação a Maria (Lc 1,26-28).

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 18 de dezembro de 2024
Jubileu 2025: Jesus Cristo, nossa esperança
1.1. A infância de Jesus: Genealogia de Jesus (Mt 1,1-17)

Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje começamos o ciclo de Catequeses que decorrerá durante todo o Ano Jubilar. O tema é “Jesus Cristo, nossa esperança”: com efeito, Ele é a meta da nossa peregrinação e Ele mesmo é o caminho, a estrada a percorrer.

A primeira parte tratará da infância de Jesus, que nos é narrada pelos Evangelistas Mateus e Lucas (cf. Mt 1–2; Lc 1–2). Os Evangelhos da infância narram a concepção virginal de Jesus e o seu nascimento do seio de Maria; evocam as profecias messiânicas que n’Ele se cumprem e falam da paternidade legal de José, que enxerta o Filho de Deus no “tronco” da dinastia davídica. Jesus nos é apresentado recém-nascido, menino e adolescente, submisso aos seus pais e, ao mesmo tempo, consciente de ser totalmente dedicado ao Pai e ao seu Reino. A diferença entre os dois Evangelistas é que, enquanto Lucas narra os acontecimentos com os olhos de Maria, Mateus o faz com os olhos de José, insistindo sobre uma paternidade realmente inédita.

Antepassados de Jesus (Michael Willmann)

Mateus começa o seu Evangelho e todo o cânon do Novo Testamento com a «origem de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão» (Mt 1,1). Trata-se de uma lista de nomes já presente nas Escrituras hebraicas, para mostrar a verdade da história e a verdade da vida humana. Com efeito, «a genealogia do Senhor é constituída a partir da história verdadeira, onde se encontram nomes no mínimo problemáticos e se sublinha o pecado do rei Davi (cf. Mt 1,6). Tudo, porém, se conclui e floresce em Maria e em Cristo (v. 16)» (Carta sobre a renovação do estudo da História da Igreja, 21 de novembro de 2024). Depois manifesta-se a verdade da vida humana que passa de geração em geração, confiando três elementos: um nome que encerra uma identidade e uma missão únicas; a pertença a uma família e a um povo; e, por último, a adesão de fé ao Deus de Israel.

A genealogia é um gênero literário, ou seja, uma forma adequada para transmitir uma mensagem muito importante: ninguém dá a vida a si mesmo, mas recebe-a como dom de outros; neste caso, trata-se do povo eleito, e quem herda o depósito da fé dos pais, transmitindo a vida aos filhos, confia-lhes também a fé em Deus.

No entanto, contrariamente às genealogias do Antigo Testamento, onde só aparecem nomes masculinos - porque em Israel é o pai que impõe o nome ao filho -, na lista de Mateus aparecem também mulheres entre os antepassados de Jesus. Encontramos cinco: Tamar, a nora de Judá que, tendo ficado viúva, se finge prostituta para assegurar uma descendência ao seu marido (cf. Gn 38); Raab, a prostituta de Jericó, que permite aos exploradores judeus entrar na terra prometida e conquistá-la (cf. Js 2); Rute, a moabita que, no Livro de mesmo nome, permanece fiel à sogra, cuida dela e se tornará a bisavó do rei Davi; Betsabeia, com quem Davi comete adultério e, depois de ter mandado matar o marido, gera Salomão (cf. 2Sm 11); e finalmente Maria de Nazaré, esposa de José, da casa de Davi: dela nasce o Messias, Jesus.

As primeiras quatro mulheres estão unidas não por serem pecadoras, como às vezes se diz, mas por serem estrangeiras em relação ao povo de Israel. O que Mateus salienta é que, como escreveu Bento XVI, «por intermédio delas, entra na genealogia de Jesus o mundo dos gentios: torna-se visível que a sua missão se destina a judeus e pagãos» (A infância de Jesus, 2012, 15).

Enquanto as quatro mulheres precedentes são mencionadas ao lado do homem que delas nasceu ou de quem o gerou, Maria, ao contrário, adquire um destaque particular: marca um novo início, ela mesma é um novo começo, pois na sua vicissitude já não é a criatura humana protagonista da geração, mas o próprio Deus. Isto vê-se bem no verbo «nasceu»: «Jacó gerou José, o esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que é chamado o Cristo» (Mt 1,16). Jesus é filho de Davi, enxertado por José nessa dinastia e destinado a ser o Messias de Israel, mas é também filho de Abraão e de mulheres estrangeiras, portanto destinado a ser a «Luz dos gentios» (cf. Lc 2,32) e o «Salvador do mundo» (Jo 4,42).

O Filho de Deus, consagrado ao Pai com a missão de revelar o seu rosto (cf. Jo 1,18; 14,9), entra no mundo como todos os filhos do homem, a tal ponto que em Nazaré será chamado «filho de José» (Jo 6,42) ou «filho do carpinteiro» (Mt 13,55). Verdadeiro Deus e verdadeiro homem!

Irmãos e irmãs, despertemos em nós a memória grata em relação aos nossos antepassados. E, sobretudo, demos graças a Deus que, mediante a mãe Igreja, nos gerou para a vida eterna, a vida de Jesus, nossa esperança.

Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 22 de janeiro de 2025
Jubileu 2025: Jesus Cristo, nossa esperança
1.2. A infância de Jesus: O anúncio a Maria (Lc 1,26-38)

Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Retomamos hoje as Catequeses do ciclo jubilar sobre Jesus Cristo, nossa esperança.
No início do seu Evangelho Lucas mostra os efeitos do poder transformador da Palavra de Deus, que chega não apenas aos átrios do Templo, mas também à pobre morada de uma jovem, Maria, que, noiva de José, ainda vive com a família.

Depois de Jerusalém, o mensageiro dos grandes anúncios divinos, Gabriel, que em seu nome celebra a “força de Deus”, é enviado a uma aldeia nunca mencionada na Bíblia hebraica: Nazaré. Naquela época era um pequeno povoado da Galileia, na periferia de Israel, área de fronteira com os pagãos e com as suas contaminações.

É precisamente aí que o anjo leva uma mensagem com uma forma e um conteúdo totalmente inauditos, de modo que abala e perturba o coração de Maria.  Em vez da clássica saudação “a paz esteja contigo” [shalom], Gabriel dirige-se à Virgem com o convite “alegra-te!”, rejubila!” [kaire], um apelo caro à história sagrada, porque os profetas o utilizam quando anunciam a vinda do Messias (cf. Sf 3,14; Gl 2,21-23; Zc 9,9). É o convite à alegria que Deus dirige ao seu povo quando termina o exílio e o Senhor faz sentir a sua presença viva e ativa.

Além disso, Deus chama Maria com um nome de amor desconhecido na história bíblica: kecharitoméne, que significa «cheia da graça divina». Maria está cheia da graça divina. Este nome diz que o amor de Deus há tempos habitou e continua habitando no coração de Maria. Diz como ela é “graciosa” e, sobretudo, como a graça de Deus realizou nela um aperfeiçoamento interior, tornando-a sua obra-prima: cheia de graça!

Este apelativo amoroso, que Deus atribui só a Maria, é imediatamente acompanhado por uma garantia: “Não tenhas medo!”. “Não tenhas medo!”, a presença do Senhor concede-nos sempre essa graça de não temer e, por isso, diz a Maria: “Não tenhas medo!”. “Não tenhas medo”, diz Deus a Abraão, a Isaac, a Moisés na história: “Não tenhas medo!” (cf. Gn 15,1; 26,24; Dt 31,8).  E o diz também a nós: “Não tenhas medo, ide. Não tenhas medo!”. (...) Por favor, não tenhas medo! Não tenhas medo! Não tenhas medo! “Eu sou o teu companheiro de viagem”: é isto que Deus diz a Maria. O «Todo-Poderoso», o Deus do «impossível» (Lc 1,37) está com Maria, está ao seu lado, é o seu companheiro, o seu principal aliado, o eterno «Eu-contigo» (cf. Gn 28,15; Ex 3,12; Jz 6,12).

Em seguida Gabriel anuncia à Virgem a sua missão, fazendo ressoar no seu coração numerosas passagens bíblicas que se referem à realeza e à messianidade do menino que deverá nascer dela e que será apresentado como o cumprimento das antigas profecias. A Palavra que vem do Alto chama Maria a ser a mãe do Messias, o Messias davídico tão esperado. É a mãe do Messias. Ele será rei não à maneira humana e carnal, mas no sentido divino e espiritual. O seu nome será “Jesus”, que significa “Deus salva” (cf. Lc 1,31; Mt 1,21), recordando a todos e para sempre que não é o homem que salva, mas só Deus. Jesus é Aquele que cumpre estas palavras do profeta Isaías: «Não foi um enviado ou mensageiro que os salvou, mas sim Ele em pessoa; foi Ele que por amor e compaixão os resgatou» (Is 63,9).

Esta maternidade abala Maria nos seus alicerces. E como mulher inteligente que é, ou seja, capaz de ler no íntimo dos acontecimentos (cf. Lc 2,19.51), procura compreender, discernir o que acontece. Maria não procura fora, mas dentro, pois como ensina Santo Agostinho, «in interiore homine habitat veritas» [no interior do homem habita a verdade] (De vera religione 39, 72). E ali, no fundo do seu coração aberto, sensível, ouve o convite a confiar em Deus, que preparou para ela um especial “Pentecostes”. Tal como no início da Criação (cf. Gn 1,2), Deus quer “incubar” Maria com o seu Espírito, uma força capaz de abrir o que está fechado sem violá-lo, sem impedir a liberdade humana; quer envolvê-la na «nuvem» da sua presença (cf. 1Cor 10,1-2), para que o Filho viva nela e ela n’Ele.

E Maria ilumina-se de confiança: é «uma lâmpada com muitas luzes», como diz Teófanes no seu Cânon da Anunciação. Abandona-se, obedece, abre espaço: é «uma sala nupcial feita por Deus» (ibid.). Maria recebe o Verbo na própria carne e empreende assim a maior missão confiada a uma mulher, a uma criatura humana. Põe-se a serviço: é plena de tudo, não como escrava, mas como colaboradora de Deus Pai, cheia de dignidade e autoridade para administrar, como fará em Caná, os dons do tesouro divino, a fim de que muitos possam haurir dele com abundância.

Irmãos, irmãs, aprendamos de Maria, Mãe do Salvador e nossa Mãe, a permitir que nossos ouvidos se abram à Palavra divina e a acolhê-la e preservá-la, para que transforme o nosso coração em tabernáculo da sua presença, em casa hospitaleira onde fazer crescer a esperança.

Anunciação (Fra Angelico)


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