Solenidade da Dedicação da Basílica do Latrão
Homilia do Papa Leão XIV
Basílica de São João do Latrão
Domingo, 09 de novembro de 2025
Leituras: Ez 47,1-2.8-9.12; Sl 45; 1Cor 3,9c-11.16-17; Lc 19,1-10.
Queridos irmãos e irmãs,
Celebramos hoje a Solenidade da Dedicação da Basílica do Latrão - desta Basílica, Catedral de Roma -, que teve
lugar no século IV por obra do Papa Silvestre I. A construção foi realizada por
vontade do Imperador Constantino, depois de ter concedido aos cristãos, no ano
313, a liberdade de professar sua fé e de exercer o culto.
Lembramos este evento até o dia de hoje. Por
quê? Certamente para recordar, com alegria e gratidão, um acontecimento
histórico muito importante para a vida da Igreja, mas não só. Com efeito, esta
Basílica, “mãe de todas as igrejas”, é muito mais do que um monumento e uma
memória histórica: é sinal da Igreja «de pedras vivas, edificada sobre o
alicerce dos Apóstolos, tendo Cristo Jesus como pedra angular» (Pontifical
Romano, Dedicação da igreja e do altar), e como tal lembra-nos que
também nós, formando um templo espiritual, «somos edificados aqui na terra como
pedras vivas (cf. 1Pd 2,5)» (Concílio Vaticano
II, Constituição Dogmática Lumen gentium, n. 6). Por esta razão,
como observava São Paulo VI, surgiu desde muito cedo na comunidade cristã o uso
de atribuir o «nome de igreja, que significa a assembleia dos fiéis, ao templo
que os reúne» (Ângelus, 09 de novembro de 1969). É a comunidade
eclesial, «a Igreja, sociedade dos fiéis, [que] demonstra no Latrão a sua mais
sólida e evidente estrutura exterior» (ibid.). Portanto, ao olharmos
para este edifício, reflitamos com a ajuda da Palavra de Deus sobre o nosso ser
Igreja.
Em primeiro lugar, podemos pensar nos
seus alicerces. A sua importância é evidente, de tal forma que, em
certos aspectos, chega a ser inquietante. Se quem a construiu não tivesse
escavado bem fundo até encontrar uma base suficientemente sólida sobre a qual
erguer tudo o resto, há muito que toda a construção teria ruído ou a qualquer
momento correria o risco de ceder, de tal forma que também nós, estando aqui,
nos exporíamos a sério perigo. Felizmente, aqueles que nos precederam deram à
nossa Catedral bases sólidas, escavando profundamente, com esforço, antes de
começarem a erguer as paredes que nos acolhem, e isso faz-nos sentir muito mais
tranquilos.
Contudo, isso também nos ajuda a refletir.
De igual modo nós, operários da Igreja viva, antes de podermos erguer
estruturas imponentes, devemos escavar em nós mesmos e à nossa volta, para
eliminar todo o material instável que possa nos impedir de alcançar a
verdadeira rocha de Cristo (cf. Mt 7,24-27). São Paulo
fala-nos explicitamente disso na 2ª leitura, quando diz que «ninguém pode pôr
um alicerce diferente do que já foi posto: Jesus Cristo» (1Cor 3,11),
o que significa voltar constantemente a Ele e ao seu Evangelho, dóceis à ação
do Espírito Santo. Caso contrário, o risco seria sobrecarregar com estruturas
pesadas um edifício com bases frágeis.
Por isso, queridos irmãos e irmãs, ao
trabalharmos com todo o empenho a serviço do Reino de Deus, não sejamos nem
precipitados nem superficiais: escavemos profundamente, livres dos critérios do
mundo, que demasiadas vezes exige resultados imediatos, porque desconhece a
sabedoria da espera. A história milenar da Igreja ensina-nos que só com
humildade e paciência se pode construir, com a ajuda de Deus, uma verdadeira comunidade
de fé, capaz de difundir a caridade, de favorecer a missão, de anunciar,
celebrar e servir o Magistério apostólico, do qual este templo é a primeira
sede (cf. São Paulo VI, Ângelus, 09 de
novembro de 1969).
A esse respeito, é elucidativa a cena que
nos é apresentada no Evangelho há pouco proclamado (Lc 19,1-10):
Zaqueu, homem rico e poderoso, sente a necessidade de encontrar Jesus. No
entanto, percebe que é baixo demais para poder vê-lo e, por isso, sobre em uma
árvore, um gesto invulgar e impróprio para uma pessoa do seu status social,
habituada a receber o que queria de bandeja, no banco dos impostos, como um
tributo devido. Porém, aqui o caminho revela-se mais longo e subir nos ramos de
uma árvore significa para Zaqueu reconhecer os seus limites e superar os freios
inibidores do orgulho. Desta forma, ele pode encontrar Jesus, que lhe diz:
«Hoje devo ficar na tua casa» (v. 5). A partir daí, a partir deste encontro,
começa para ele uma nova vida (cf. v. 8).
Jesus nos transforma e nos convida a
trabalhar no grande canteiro de obras de Deus, moldando-nos sabiamente segundo
os seus desígnios de salvação. Nos últimos anos, a imagem do «canteiro de obras»
foi frequentemente utilizada para descrever o nosso caminho eclesial. É uma
imagem bonita, que fala de atividade, criatividade, empenho, mas também de
esforço, de problemas - por vezes, complexos - a resolver. Ela expressa o
esforço real, palpável, com que as nossas comunidades crescem todos os dias, na
partilha dos carismas e sob a orientação dos Pastores. Em particular, a Igreja
de Roma é testemunha disso nesta fase da implementação do Sínodo, na qual o que
amadureceu ao longo de anos de trabalho pede para passar através do confronto e
da verificação “na prática”. Isto implica um caminho íngreme, mas não devemos
desanimar. Pelo contrário, é bom continuar a trabalhar, com confiança, para
crescermos juntos.
Na história do edifício majestoso em que nos
encontramos não faltaram momentos críticos, pausas, correções de projetos em
andamento. No entanto, graças à tenacidade de quem nos precedeu, podemos nos reunir
neste lugar maravilhoso. Em Roma, ainda que com muito esforço, há um grande bem
em crescimento. Para alimentar e renovar o nosso entusiasmo, não permitamos que
o cansaço nos impeça de reconhecê-lo e celebrá-lo. Afinal, a caridade vivida
também molda o nosso rosto de Igreja, para que se manifeste cada vez mais
claramente a todos que ela é «mãe», «mãe de todas as Igrejas», ou antes «mamãe»,
como disse São João Paulo II ao falar às crianças, precisamente nesta festa (cf. Discurso na Festa da Dedicação da Basílica do Latrão, 09
de novembro de 1986).
Por fim, gostaria de mencionar um aspecto
essencial da missão de uma Catedral: a Liturgia. Ela é «a meta para a qual se
encaminha a ação da Igreja e a fonte de onde promana toda a sua força» (Concílio
Vaticano II, Constituição Sacrosanctum Concilium, n. 10). Nela
podemos encontrar todos os temas que mencionamos: somos edificados como templo
de Deus, como sua morada no Espírito, e recebemos força para pregar Cristo no
mundo (cf. n. 2). Por isso, o cuidado na
celebração da Liturgia no lugar da Sé de Pedro deve ser tal que possa servir de
exemplo para todo o povo de Deus, no respeito pelas normas, na atenção às
diversas sensibilidades de quem participa, segundo o princípio de uma sábia
inculturação (cf. nn. 37-38), e, ao mesmo tempo, na
fidelidade ao estilo de solene sobriedade típico da tradição romana, que tanto
bem pode fazer às almas de quantos nela participam ativamente (cf. n. 14). Preste-se muita atenção para que aqui a beleza simples dos
ritos expresse o valor do culto em prol do crescimento harmonioso do inteiro
Corpo do Senhor. Santo Agostinho dizia que «a beleza não é senão amor, e o amor
é a vida» (Discurso 365, 1). A Liturgia é um âmbito onde essa verdade se
realiza de forma eminente; e desejo que quem se aproxima do Altar da Catedral
de Roma possa depois partir cheio daquela graça com a qual o Senhor deseja
inundar o mundo (cf. Ez 47,1-2.8-9.12).
Fonte: Santa Sé.


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