quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Homilia do Papa: Vésperas no encerramento do ano de 2023

I Vésperas da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus
Te Deum em ação de graças pelo encerramento do ano
Homilia do Papa Francisco
Basílica de São Pedro
Domingo, 31 de dezembro de 2023

A fé nos permite viver esta hora de modo diferente em relação a uma mentalidade mundana. A fé em Jesus Cristo, Deus encarnado, nascido da Virgem Maria, dá um modo novo de perceber o tempo e a vida. Eu o resumiria em duas palavras: gratidão e esperança.

Alguém poderia dizer: “Mas não é o que fazem todos nesta última noite do ano? Todos agradecem, todos esperam, crentes ou não crentes”. Talvez possa parecer assim, e talvez o seja! Mas, na realidade, a gratidão mundana, a esperança mundana, são aparentes; carecem da dimensão essencial que é aquela da relação com o Outro e com os outros, com Deus e com os irmãos. Estão focados no eu, nos seus interesses e assim têm o fôlego curto, não vão além da satisfação e do otimismo.

Nesta Liturgia, ao contrário, respira-se uma atmosfera completamente diferente: aquela do louvor, da admiração, da gratidão. E isto acontece não pela grandiosidade da Basílica, não pelas luzes e pelos cantos - estas coisas são antes a consequência -, mas pelo Mistério que a antífona do primeiro salmo assim expressou: «Admirável intercâmbio! O Criador da humanidade, assumindo corpo e alma, quis nascer de uma Virgem. Feito homem, nos doou sua própria divindade!”. Este admirável intercâmbio!


A Liturgia nos faz entrar nos sentimentos da Igreja; e a Igreja, por assim dizer, os aprende da Virgem Mãe.
Pensemos em qual teria sido a gratidão no coração de Maria enquanto olhava para Jesus recém-nascido. É uma experiência que somente uma mãe pode fazer, e que nela, na Mãe de Deus, tem uma profundidade única, incomparável. Maria sabe, ela sozinha junto com José, de onde vem aquele Menino. No entanto, está ali, respira, chora, tem necessidade de comer, de ser coberto, de ser cuidado. O Mistério dá espaço à gratidão, que aflora na contemplação do dom, na gratuidade, enquanto sufoca na ansiedade de ter e de aparecer.

A Igreja aprende da Virgem Mãe a gratidão. E aprende também a esperança. Poderíamos pensar que Deus a escolheu, Maria de Nazaré, porque no seu coração viu refletida a própria esperança, que Ele mesmo havia infundido nela com o seu Espírito. Maria foi sempre cheia de amor, cheia de graça, e por isso é também cheia de confiança e de esperança.

O de Maria e da Igreja não é otimismo, é outra coisa: é fé no Deus fiel às suas promessas (cf. Lc 1,55); e esta fé assume a forma da esperança na dimensão do tempo, poderíamos dizer “em caminho”. O cristão, como Maria, é um peregrino de esperança. E precisamente este será o tema do Jubileu de 2025: “Peregrinos de esperança”.

Caros irmãos e irmãs, podemos nos perguntar: Roma está se preparando para tornar-se no Ano Santo uma “cidade de esperança”? Todos sabemos que a organização do Jubileu já está em curso há algum tempo. Mas compreendemos bem que, na perspectiva que aqui assumimos, não se trata principalmente disso; trata-se antes do testemunho da comunidade eclesial e civil; testemunho que, mais do que nos eventos, consiste no estilo de vida, na qualidade ética e espiritual da convivência. E então a pergunta pode ser formulada assim: estamos trabalhando, cada um no próprio âmbito, para que esta cidade seja um sinal de esperança para quem nela vive e para quantos a visitam?

Um exemplo. Entrar na Praça de São Pedro e ver que, no abraço da Colunata, circulam livre e serenamente pessoas de todas as nacionalidades, de todas as culturas e religiões, é uma experiência que infunde esperança; mas é importante que ela seja confirmada por uma boa acolhida na visita à Basílica, bem como nos serviços de informação. Outro exemplo: o fascínio do centro histórico de Roma é perene e universal; mas é preciso que possam desfrutá-lo também as pessoas idosas ou com alguma deficiência motora; é preciso que à “grande beleza” correspondam o simples decoro e a normal funcionalidade nos lugares e nas situações da vida ordinária, quotidiana. Porque uma cidade mais habitável para os seus cidadãos é também mais acolhedora para todos.

Caros irmãos e irmãs, uma peregrinação, especialmente se cansativa, requer uma boa preparação. Por isso o próximo ano, que precede o Jubileu, será dedicado à oração. E que melhor mestra poderíamos ter do que a nossa Santa Mãe? Coloquemo-nos na sua escola: aprendamos dela a viver cada dia, cada momento, cada ocupação, com o olhar interior voltado para Jesus. Alegrias e tristezas, satisfações e problemas. Tudo na presença e com a graça de Jesus, o Senhor. Tudo com gratidão e esperança.


Tradução nossa a partir do original italiano. Fonte: Santa Sé.

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