No contexto da Festa do Batismo do Senhor, reproduzimos as duas meditações proferidas pelo Papa Bento XVI (†2022) no dia 08 de janeiro de 2012: a Homilia na Missa com o Batismo de algumas crianças e a meditação durante a oração do Ângelus.
Festa do Batismo do Senhor
Santa Missa e Batismo de algumas crianças
Homilia do Papa Bento XVI
Capela Sistina
Domingo, 08 de janeiro de 2012
Amados irmãos e irmãs,
É sempre uma
alegria celebrar esta Santa Missa com os Batismos das crianças, na Festa do Batismo
do Senhor. Saúdo todos vós com afeto, queridos pais, padrinhos, madrinhas e
todos vós, familiares e amigos! Viestes - disseste-lo em voz alta - para que os
vossos recém-nascidos recebam o dom da graça de Deus, a semente da vida eterna.
Vós, pais, quisestes isto. Pensastes no Batismo ainda antes que o vosso filho
ou a vossa filha nascesse. A vossa responsabilidade de pais cristãos levou-vos
a pensar imediatamente no Sacramento que marca o ingresso na vida divina, na
comunidade da sua Igreja. Podemos dizer que esta foi a vossa primeira escolha
educativa como testemunhas da fé em relação aos vossos filhos: a escolha é
fundamental!
A tarefa dos
pais, ajudados pelo padrinho e pela madrinha, consiste em educar o filho ou a
filha. Educar é algo muito exigente, às vezes árduo para as nossas capacidades
humanas, sempre limitadas. Mas educar torna-se uma missão maravilhosa, se for
levada a cabo em colaboração com Deus, que é o primeiro e autêntico educador de
cada homem.
Na 1ª Leitura
que ouvimos, tirada do Livro do Profeta Isaías (Is 55,1-11), Deus
dirige-se ao seu povo precisamente como um educador. Chama a atenção dos
israelitas para o perigo de procurar saciar a sede e a fome nas fontes erradas:
«Por que gastar o vosso dinheiro naquilo que não alimenta, e o produto do vosso
trabalho naquilo que não sacia?» (v. 2). Deus quer oferecer-nos coisas boas
para beber e para comer, coisas que nos fazem bem; enquanto às vezes utilizamos
erroneamente os nossos recursos, usamo-los para coisas que não servem, aliás,
que são até nocivas. Deus quer oferecer-nos sobretudo a Si mesmo e a sua
Palavra: sabe que, afastando-nos d’Ele, nos encontraremos depressa em
dificuldade, como o filho pródigo da parábola, e sobretudo perderemos a nossa
dignidade humana. E, por isso, assegura-nos que Ele é misericórdia infinita,
que os seus pensamentos e os seus caminhos não são como os nossos - por sorte! -
e que podemos voltar sempre para Ele, para a casa do Pai. Depois, garante-nos
que se acolhermos a sua Palavra, ela dará bons frutos na nossa vida, como a
chuva que irriga a terra (cf. vv. 10-11).
A esta palavra
que o Senhor nos dirigiu mediante o profeta Isaías, nós respondemos com o refrão
do cântico (Is 12,2-6): «Com alegria beberemos do manancial da salvação»
(v. 3). Como pessoas adultas, comprometemo-nos em haurir das fontes boas, para
o nosso bem e para o bem daqueles que são confiados à nossa responsabilidade,
em particular vós, estimados pais, padrinhos e madrinhas, para o bem destas
crianças. E quais são «as fontes da salvação»? São a Palavra de Deus e os Sacramentos.
Os adultos são os primeiros que devem alimentar-se nestas fontes, para poder
orientar os mais jovens no seu crescimento. Os pais devem dar muito, mas para
poder dar, têm necessidade, por sua vez, de receber, caso contrário
esvaziam-se, esgotam-se. Os pais não são a fonte, como também nós sacerdotes
não constituímos a fonte: somos sobretudo como canais, através dos quais deve
passar a linfa vital do amor de Deus. Se nos separássemos da nascente, nós
mesmos seríamos os primeiros a ressentir negativamente e já não seríamos
capazes de educar os outros. Foi por isso que nos comprometemos, dizendo: «Com
alegria beberemos do manancial da salvação».
E passemos agora
à 2ª Leitura e ao Evangelho. Eles dizem-nos que a primeira e principal educação
tem lugar através do testemunho. O Evangelho (Mc 1,7-11) fala-nos de
João Batista. João foi um grande educador dos seus discípulos, porque os
conduziu ao encontro com Jesus, de Quem tinha dado testemunho. Não se exaltou a
si mesmo, não quis manter os discípulos ligados a si. E, no entanto, João era
um grande profeta, e a sua fama era enorme. Quando Jesus chegou, ele retirou-se
e indicou-O: «Depois de mim virá alguém mais forte do que eu... Eu vos batizei
com água, mas Ele vos batizará com o Espírito Santo» (vv. 7-8). O verdadeiro
educador não vincula as pessoas a si mesmo, não é possessivo. Quer que o filho,
ou o discípulo, aprenda a conhecer a verdade, e estabeleça com ela uma relação
pessoal. O educador cumpre o seu dever até o fim, e não faz faltar a sua presença
atenta e fiel; mas a sua finalidade é que o educando ouça a voz da verdade
falar ao seu coração, e que a siga em um caminho pessoal.
Voltemos de novo
ao testemunho. Na 2ª Leitura (1Jo 5,1-9), o Apóstolo João escreve: «O
Espírito é que dá testemunho» (v. 6). Refere-se ao Espírito Santo, o Espírito
de Deus, quem dá testemunho de Jesus, atestando que Ele é Cristo, o Filho de
Deus. Isto vê-se também na cena do batismo no rio Jordão: o Espírito Santo
desce sobre Jesus como uma pomba, para revelar que Ele é o Filho Unigênito do
Pai eterno (cf. Mc 1,10). Também
no seu Evangelho João sublinha este aspecto, onde Jesus diz aos discípulos:
«Quando vier o Paráclito, que vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da
Verdade que procede do Pai, Ele dará testemunho de mim. Também vós dareis
testemunho, porque estais comigo desde o princípio» (Jo 15,26-27). Isto nos é de grande conforto no compromisso de
educar para a fé, porque sabemos que não estamos sozinhos, e que o nosso
testemunho é sustentado pelo Espírito Santo.
É muito
importante para vós, pais, e também para os padrinhos e as madrinhas, acreditar
fortemente na presença e na obra do Espírito Santo, invocá-Lo e recebê-Lo em
vós, mediante a oração e os Sacramentos. Com efeito, é Ele que ilumina a mente,
aquecendo o coração do educador a fim de que saiba transmitir o conhecimento e
o amor de Jesus. A oração é a primeira condição para educar, porque quando
oramos predispomo-nos a deixar a Deus a iniciativa, a confiar os filhos a Ele,
que os conhece antes e melhor do que nós mesmos, e sabe perfeitamente qual é o
seu bem verdadeiro. E, ao mesmo tempo, quando rezamos colocamo-nos à escuta das
inspirações de Deus para cumprir bem a nossa parte, que nos compete e devemos realizar.
Os Sacramentos, especialmente a Eucaristia e a Reconciliação, permitem-nos
cumprir a obra educativa em união com Cristo, em comunhão com Ele e
continuamente renovados pelo seu perdão. A oração e os Sacramentos fazem-nos
alcançar aquela luz de verdade, graças à qual podemos ser, ao mesmo tempo,
ternos e fortes, usar a docilidade e a firmeza, calar e falar no momento justo,
repreender e corrigir de maneira correta.
Estimados
amigos, invoquemos, portanto, todos juntos o Espírito Santo, para que desça em
abundância sobre estas crianças, as consagre à imagem de Jesus Cristo e as
acompanhe sempre ao longo do caminho da sua vida. Confiemo-las à guia materna
de Maria Santíssima, para que cresçam em idade, sabedoria e graça, tornando-se
cristãos verdadeiros, testemunhas fiéis e jubilosas do amor de Deus. Amém!
Papa Bento XVI
Ângelus
Domingo, 08 de janeiro de 2012
Queridos irmãos e irmãs,
Celebramos hoje
a Festa do Batismo do Senhor. Esta manhã conferi o Sacramento do Batismo a dezesseis
crianças, e por isso gostaria de propor uma breve reflexão acerca do nosso ser
filhos de Deus. Antes de tudo consideremos nosso ser simplesmente “filhos”:
esta é a condição fundamental que todos temos em comum. Nem todos somos pais,
mas todos certamente somos filhos. Vir ao mundo nunca é uma escolha, não nos é perguntado
se queremos nascer. Mas durante a vida podemos amadurecer uma atitude livre em
relação à própria vida: podemos acolhê-la como um dom e, em certo sentido,
«tornar-nos» o que já somos: tornar-nos filhos. Esta passagem assinala uma
mudança de maturidade no nosso ser e na nossa relação com os nossos pais, que
se enche de reconhecimento. É uma passagem que nos torna capazes de ser, por
nossa vez, pais - não biologicamente, mas moralmente.
Também em
relação a Deus todos somos filhos. Deus está na origem da existência de cada
criatura, e é Pai de modo singular de cada ser humano: tem com ele ou ela uma
relação única, pessoal. Cada um de nós é querido, é amado por Deus. E também
nesta relação com Deus nós podemos, por assim dizer, «renascer», ou seja, tornarmo-nos
aquilo que somos. Isto acontece através da fé, através de um «sim» profundo e
pessoal a Deus como origem e fundamento da minha existência. Com este «sim» eu
aceito a vida como dom do Pai que está no Céu, um Pai que não vejo, mas no qual
acredito e que sinto profundamente no coração que é Pai meu e de todos os meus
irmãos em humanidade, um Pai imensamente bom e fiel. Sobre o que se baseia esta
fé em Deus Pai? Baseia-se em Jesus Cristo: a sua pessoa e a sua história
revelam-nos o Pai, fazem com que o conheçamos, na medida do possível neste
mundo. Crer que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, permite «renascer do alto»,
ou seja, de Deus, que é Amor (cf. Jo
3,3). Diz São João a propósito de Jesus: «A todos os que o receberam...
deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus» (Jo 1,12). É este o sentido do Sacramento do Batismo: é um novo
nascimento, que se realiza graças ao Espírito Santo no seio da Igreja.
Estimados
amigos, este domingo do Batismo do Senhor conclui o tempo de Natal. Demos
graças a Deus por este grande mistério, que é fonte de regeneração para a
Igreja e para o mundo inteiro. Deus fez-se filho do homem, para que o homem se
torne filho de Deus. Por isso, renovemos a alegria de ser filhos: como homens e
como cristãos. Nascidos do amor de um pai e de uma mãe, e renascidos do amor de
Deus, mediante o Batismo. À Virgem Maria, Mãe de Cristo e de todos os que creem
n’Ele, pedimos que nos ajude a viver realmente como filhos de Deus, não com
palavras, mas com ações. Escreve ainda São João: «O seu mandamento é este: que
creiamos no nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, como
Ele nos mandou» (1Jo 3,23).
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