Nesta Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, reproduzimos a Homilia e a meditação durante a oração do Ângelus proferidas pelo Papa Bento XVI (†2022) no dia 01 de janeiro de 2012, XLV Dia Mundial da Paz, com o tema “Educar os jovens para a justiça e a paz”.
Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus
XLV Dia Mundial da Paz
Homilia do Papa Bento XVI
Basílica Vaticana
Domingo, 1° de janeiro de 2012
Queridos irmãos e irmãs!
No primeiro dia
do ano a Liturgia faz ressoar em toda a Igreja, estendida pelo mundo inteiro, a
antiga bênção sacerdotal, que ouvimos na 1ª leitura: «O Senhor te abençoe e te
guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face, e se compadeça de ti! O
Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!» (Nm 6,24-26). Esta bênção foi dada por Deus através de Moisés, a
Aarão e aos seus filhos, ou seja, aos sacerdotes do povo de Israel. É um
tríplice voto cheio de luz que brota da repetição do nome de Deus, o Senhor, e
da imagem de seu rosto. Na verdade, para ser abençoado é necessário estar na presença
de Deus, receber sobre si o seu Nome e permanecer no feixe de luz que parte do
seu rosto, no espaço iluminado pelo seu olhar, que difunde a graça e a paz.
Esta é também a
experiência que fizeram os pastores de Belém, que aparecem de novo no Evangelho
de hoje. Eles fizeram a experiência de estar na presença de Deus, da sua
bênção, não em um salão de um Palácio majestoso, na presença de um grande
soberano, mas em um estábulo, diante de um “recém-nascido, deitado na
manjedoura” (Lc 2,16). É justamente
desse Menino que se irradia uma nova luz que brilha na escuridão da noite, como
podemos ver em muitas pinturas que representam o Nascimento de Cristo. Agora, é
d’Ele que nos vem a bênção: do seu nome - Jesus, que significa “Deus salva” - e
do seu rosto humano, no qual Deus, o Todo-poderoso, Senhor do céu e da terra,
quis se encarnar, ocultando a sua glória sob o véu da nossa carne, para nos
revelar plenamente a sua bondade (cf. Tt 3,4).
Maria, a Virgem,
esposa de José, a quem Deus escolheu desde o primeiro momento da sua existência
para ser a Mãe do seu Filho feito homem, foi a primeira a ser preenchida por
esta bênção. Ela, como a saúda Santa Isabel, é a «bendita entre as mulheres» (Lc 1,42). Toda a sua vida está na luz do
Senhor, no âmbito do nome e do rosto de Deus encarnado em Jesus, o «fruto
bendito do seu ventre». O Evangelho de Lucas nos apresenta Maria deste
modo: totalmente dedicada a conservar e meditar no seu coração tudo o que diz
respeito ao seu filho Jesus (cf. Lc
2,19.51). O mistério da sua maternidade divina, que hoje celebramos, possui de
modo superabundante aquele dom da graça que toda maternidade humana traz
consigo: de fato, a fecundidade do ventre sempre foi associada com a bênção de
Deus. A Mãe de Deus é a primeira abençoada e é aquela que traz a bênção; Ela é
a mulher que acolheu Jesus em si e o deu à luz para toda a família humana. Como
reza a Liturgia, «permanecendo virgem, deu ao mundo a luz eterna, Jesus Cristo
Senhor nosso» (Prefácio da Virgem Maria I).
Maria é Mãe e
modelo da Igreja, que acolhe na fé a Palavra divina e se oferece a Deus como “terra
fecunda” onde Ele pode continuar a cumprir o seu mistério de salvação. A
Igreja, através da pregação, que espalha pelo mundo a semente do Evangelho, e
através dos sacramentos, que transmitem aos homens graça e vida divina, também
participa do mistério da maternidade divina. A Igreja vive esta maternidade, de
modo particular, no Sacramento do Batismo, ao gerar os filhos de Deus da água e
do Espírito Santo, que em cada um deles exclama: “Abbá! Pai!” (Gl 4,6). Como Maria, a Igreja é
mediadora da bênção de Deus para o mundo: acolhendo Jesus, recebe a bênção e a
transmite levando Jesus aos demais. Ele é a misericórdia e a paz que o mundo
não pode dar para si mesmo e que o mundo precisa tanto e mais do que pão.
Queridos amigos,
a paz, em seu sentido mais amplo e elevado, é a soma e a síntese de todas as
bênçãos. Por isso, quando dois amigos se encontram cumprimentam-se desejando
mutuamente a paz. A Igreja, no primeiro dia do ano, também invoca de maneira
especial este sumo bem e o faz, como a Virgem Maria, mostrando a todos Jesus,
porque, como afirma o Apóstolo Paulo: “Ele é a nossa paz” (Ef 2,14) e, ao mesmo tempo, é o “caminho” através do qual homens e
povos podem alcançar esta meta a que todos aspiramos. Assim, trazendo no
coração este desejo profundo, tenho o prazer de dar boas-vindas e cumprimentar
todos vós, que vos reunistes na Basílica de São Pedro neste XLV Dia Mundial da
Paz: Senhores Cardeais; embaixadores de tantos países amigos que, mais do que
nunca, nesta feliz ocasião, compartilham comigo e com a Santa Sé a vontade de
renovar o compromisso pela promoção da paz no mundo; o Presidente do Pontifício
Conselho «Justiça e Paz», que junto com o Secretário e os colaboradores
trabalham de maneira especial para este fim; os demais Bispos e Autoridades
presentes; representantes de Associações e Movimentos eclesiais e todos vós,
irmãos e irmãs, especialmente aqueles que trabalham no campo da educação da
juventude. Na verdade - como já sabeis - escolhi o tratar do tema da educação
na minha Mensagem
deste ano.
“Educar os
jovens para a justiça e a paz” é a tarefa que diz respeito a todas as gerações,
e, graças a Deus, a família humana, após as tragédias das duas grandes guerras
mundiais, tem demonstrado ser cada vez mais consciente disso, como evidencia,
por um lado, declarações e iniciativas internacionais e, por outro, a
consolidação entre os jovens, nas últimas décadas, de muitas e diferentes
formas de compromisso social neste campo. Para a comunidade eclesial, educar
para a paz é parte da missão recebida de Cristo; é parte integrante da
evangelização, porque o Evangelho de Cristo é também o Evangelho da justiça e
da paz. Mas, ultimamente, a Igreja tem se tornado intérprete de uma exigência
que abarca todas as consciências mais sensíveis e responsáveis pelo destino da
humanidade: a necessidade de responder a um desafio decisivo que é precisamente
o da educação. Por que “desafio”? Pelo menos por duas razões: em primeiro
lugar, porque na era atual, fortemente caracterizada pela mentalidade
tecnológica, a vontade de educar e
não só instruir não é um dado óbvio, mas é uma escolha; em segundo lugar,
porque a cultura relativista apresenta uma questão radical: ainda tem sentido
educar? E educar para quê?
É claro que não
podemos abordar agora estas questões básicas, as quais já tratei de responder
em outras ocasiões. Por outro lado, gostaria de salientar que, confrontados com
as sombras que hoje obscurecem o horizonte do mundo, assumir a responsabilidade
de educar os jovens para o conhecimento da verdade, para os valores e virtudes
fundamentais, significa olhar para o futuro com esperança. E esse compromisso
com uma educação integral significa também saber formar para a justiça e a paz.
Hoje, os jovens estão crescendo em um mundo que se tornou, por assim dizer,
menor, onde os contatos entre diferentes culturas e tradições, embora nem
sempre diretos, são constantes. Para eles, agora mais do que nunca, é essencial
aprender o valor e a forma da convivência pacífica, do respeito mútuo, do
diálogo e da compreensão. Os jovens são por natureza abertos a estas atitudes,
mas justamente a realidade social em que crescem pode levá-los a pensar e agir
de forma oposta, até mesmo intolerante e violenta. Somente uma sólida educação
das suas consciências pode protegê-los contra esses riscos e torná-los capazes
de lutar sempre, contando somente com a força da verdade e do bem. Esta
educação parte da família e se desenvolve na escola e demais experiências
educacionais. Basicamente, trata-se de ajudar as crianças, os jovens e os
adolescentes a desenvolver uma personalidade que combine um profundo senso de
justiça com o respeito pelo outro, com a capacidade de lidar com os conflitos
sem arrogância, com a força interior para dar testemunho do bem, mesmo quando
isso custa sacrifício, com o perdão e a reconciliação. Dessa forma, poderão
tornar-se homens e mulheres realmente pacíficos e construtores da paz.
Nesta obra
educativa das novas gerações, as comunidades religiosas também têm uma responsabilidade
especial. Todo itinerário de formação religiosa genuína deve acompanhar a
pessoa, desde a primeira infância, para ajudá-la conhecer a Deus, amá-Lo e
fazer a sua vontade. Deus é amor, é justo e pacífico, e aqueles que querem
honrá-Lo devem, em primeiro lugar, comportar-se como um filho que segue o
exemplo de seu pai. Há um Salmo que afirma: « O Senhor realiza obras de justiça
e garante o direito aos oprimidos. (...) O Senhor é indulgente, é favorável, é
paciente, é bondoso e compassivo» (Sl
102,6.8). Em Deus justiça e misericórdia convivem perfeitamente, como Jesus nos
mostrou com o testemunho de sua vida. Em Jesus «verdade e amor » se
encontraram, «justiça e paz» se abraçaram (cf. Sl 84,11). Nestes dias a Igreja celebra o grande mistério da
Encarnação: a fidelidade de Deus brotou da terra e a justiça olhou dos altos
céus, a terra deu sua colheita (cf. Sl
84,12-13). Deus nos falou no seu Filho Jesus. Escutemos o que Deus diz: “É a
paz que Ele vai anunciar” (Sl 84,9).
Jesus é o caminho que podemos seguir, aberto para todos. É o caminho da paz.
Hoje, a Virgem Mãe, nos indica, nos mostra o caminho: sigamo-la! E tu, Santa
Mãe de Deus, acompanha-nos com a tua proteção. Amém.
Papa Bento XVI
Ângelus
Domingo, 1° de janeiro de 2012
Prezados irmãos e irmãs!
Na Liturgia
deste primeiro dia do ano ressoa a tríplice bênção bíblica: « O Senhor te
abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face, e se compadeça
de ti! O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!» (Nm 6, 24-26). Podemos contemplar o rosto de Deus, que se fez
visível e se revelou em Jesus: Ele é a imagem visível do Deus invisível. E isto
graças também à Virgem Maria, de quem hoje celebramos o maior título, aquele
com que ela participa de modo único na história da salvação: ser Mãe de Deus.
No seu seio, o Filho do Altíssimo assumiu a nossa carne, e nós podemos
contemplar a sua glória (cf. Jo 1,14),
sentir a sua presença de Deus conosco.
Assim, comecemos
o novo ano de 2012 fixando o olhar no Rosto de Deus que se revela no Menino de
Belém, e na sua Mãe, Maria, que acolheu o desígnio divino com abandono humilde.
Graças ao seu generoso «sim» apareceu no mundo a luz verdadeira que ilumina
todo o homem (cf. Jo 1,9) e
foi-nos reaberto o caminho da paz.
Caros irmãos e
irmãs, como é já feliz tradição, hoje celebramos o Dia Mundial da Paz, na sua 45ª
edição. Na Mensagem
que dirigi aos Chefes de Estado, aos Representantes das Nações e a todos os
homens de boa vontade, e que tem como tema: «Educar os jovens para a justiça e
a paz», desejei evocar a necessidade e a urgência de oferecer às novas gerações
percursos educativos adequados para uma formação integral da pessoa, que inclua
a dimensão moral e espiritual (n. 3). Quis ressaltar, de modo particular, a
importância de educar para os valores da justiça e da paz. Hoje, os jovens
olham para o futuro com uma certa apreensão, manifestando aspectos da sua vida
que merecem atenção, como «o desejo de receber uma formação que os prepare de
maneira mais profunda para enfrentar a realidade, a dificuldade de formar uma
família e encontrar um emprego estável, a capacidade efetiva de intervir no
mundo da política, da cultura e da economia contribuindo para a construção de uma
sociedade de rosto mais humano e solidário» (n. 1). Convido todos a ter a
paciência e a constância de promover a justiça e a paz, de cultivar o gosto por
aquilo que é justo e verdadeiro (n. 5). A paz nunca é um bem que se alcança plenamente,
mas constitui uma meta à qual todos devemos aspirar e pela qual todos temos o
dever de trabalhar.
Oremos para que,
não obstante as dificuldades que às vezes tornam árduo o caminho, esta profunda
aspiração se traduza em gestos concretos de reconciliação, de justiça e de paz.
Rezemos também para que os Responsáveis das Nações renovem a disponibilidade e
o compromisso a acolher e favorecer este anseio insuprimível da humanidade.
Confiemos estes bons votos à intercessão da Mãe do «Rei da Paz», a fim de que o
ano que agora tem início seja um tempo de esperança e de convivência pacífica
para o mundo inteiro.
Caríssimo André,
ResponderExcluirBom dia!
Li em algum lugar que na liturgia deste dia rezar o hino "Veni Creator" é devido e concede indulgências, assim como, ontem, deveria ser rezado publicamente o "Te Deum". É verdade essa afirmação que li?
O senhor sabe dizer se há alguma versão oficial da Igreja para o hino "Veni Creator"? Encontrei versões diferentes pela internet e no meu manual "Adoremus" não o encontrei.
Obrigado pelos textos e já sou um sincero admirador.
Diogo Malgueiro
Está correto. Essa informação está no Diretório sobre Piedade Popular e Liturgia (nn. 114.116) e no Manual das Indulgências (n. 26).
ExcluirO texto oficial tanto do Te Deum quanto do Veni Creator encontram-se em dois livros litúrgicos: a Liturgia das Horas e o Pontifical Romano.
Aqui no blog foram publicados os dois textos, além de demais orientações sobre a Solenidade da Santa Mãe de Deus:
https://pilulasliturgicas.blogspot.com/2012/12/a-celebracao-da-santa-mae-de-deus-e-o.html
https://pilulasliturgicas.blogspot.com/2020/12/o-hino-te-deum.html
https://pilulasliturgicas.blogspot.com/2012/05/o-hino-veni-creator.html