Estamos aproximadamente na metade do Tempo da Quaresma deste
ano de 2024. Assim, após propor as meditações da Via Sacra no Coliseu na Sexta-feira Santa de 2004,
nesta postagem destacamos as meditações da Via Sacra presidida pelo Papa Francisco há 10 anos, na Sexta-feira Santa de 2014.
Para saber mais, confira nossas postagens sobre a Via Sacra e sobre a Via Sacra presidida pelo Papa no Coliseu.
As meditações foram preparadas
por Dom Giancarlo Maria Bregantini, Arcebispo de Campobasso-Boiano, na região
italiana de Molise (Arcebispo Emérito desde dezembro de 2023).
Como ilustrações, propomos a Via Sacra realizada por Giandomenico
Tiepolo (ou Giovanni Domenico Tiepolo) entre 1747 e 1749 para a igreja
de São Paulo em Veneza (Chiesa di San Polo).
Ofício das Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice
Via Sacra no Coliseu presidida pelo Papa Francisco
Sexta-feira Santa, 18 de abril de 2014
Meditações de Dom Giancarlo Maria Bregantini
Arcebispo de Campobasso-Boiano:
«Rosto de Cristo, rosto do homem»
Canto inicial:
Adoramus te, Chiste,
et benedicimus tibi,
quia per sanctam
crucem tuam redemisti mundum.
Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. R. Amém.
«Aquele que viu, dá testemunho e seu testemunho é
verdadeiro; e ele sabe que fala a verdade, para que vós também acrediteis. Isso
aconteceu para que se cumprisse a Escritura, que diz: “Não quebrarão nenhum dos
seus ossos”. E outra Escritura ainda diz: “Olharão para aquele que
transpassaram”» (Jo 19,35-37).
Crucificação - Giandomenico Tiepolo (Museum Boijmans Van Beuningen, Rotterdam) |
Amável Jesus, subistes ao Gólgota sem hesitar, obrigação de
amor, e vos deixastes crucificar sem lamento. Humilde Filho de Maria, tomastes
o peso da nossa noite para nos mostrar com quanta luz quereis dilatar-nos o coração.
Nas vossas dores, está a nossa redenção, nas vossas lágrimas se desenha «a
Hora» da revelação do Amor gratuito de Deus. Sete vezes perdoados, nos vossos
últimos suspiros de Homem entre os homens, a todos nos levais de volta ao
coração do Pai, para nos indicar, nas vossas últimas palavras, o caminho da
redenção para toda a nossa dor. Vós, o Todo Encarnado, vos aniquilais na Cruz,
compreendido apenas por aquela, a Mãe, que fielmente «estava» ao pé daquele
patíbulo. A vossa sede é fonte de esperança sempre acesa, mão estendida mesmo
para o malfeitor arrependido, que hoje, graças a Vós, doce Jesus, entra no
paraíso. A todos nós, Senhor Jesus Crucificado, concedei a vossa infinita
Misericórdia, perfume de Betânia sobre o mundo, gemido de vida para a humanidade.
E no fim, abandonados nas mãos do vosso Pai, abri-nos a porta da Vida que não
morre. Amém.
I Estação: Jesus condenado à morte
O dedo em riste que acusa
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 23,21-25)
Pilatos falou outra vez à multidão, pois queria libertar
Jesus. Mas eles gritavam: “Crucifica-o! Crucifica-o!”. E Pilatos falou pela
terceira vez: “Que mal fez este homem? Não encontrei nele nenhum crime que
mereça a morte. Portanto, vou castigá-lo e o soltarei”. Eles, porém, continuaram
a gritar com toda a força, pedindo que fosse crucificado. E a gritaria deles
aumentava sempre mais. Então Pilatos decidiu que fosse feito o que eles pediam.
Soltou o homem que eles queriam - aquele que fora preso por revolta e homicídio
- e entregou Jesus à vontade deles.
Um Pilatos amedrontado que não procura a verdade, o dedo em
riste que acusa e o clamor crescente da multidão enfurecida são os primeiros
passos do morrer de Jesus. Inocente, como um cordeiro, cujo sangue salva o seu
povo. Aquele Jesus que passou pelo meio de nós, curando e abençoando, agora é
condenado à pena capital. Nenhuma palavra de agradecimento da multidão, que, em
vez d’Ele, escolhe Barrabás. Para Pilatos, torna-se um caso embaraçoso. Abandona-o
à multidão e lava as mãos, todo apegado ao seu poder. Entrega-o para ser
crucificado. Não quer mais saber d’Ele para nada. Para ele, o caso está
encerrado.
A condenação apressada de Jesus reúne assim as acusações
fáceis, os juízos superficiais entre o povo, as insinuações e os preconceitos
que fecham o coração e se tornam cultura racista, de exclusão e de descarte,
juntamente com as cartas anônimas e as calúnias horríveis. Acusados,
imediatamente são atirados para a primeira página; declarados inocentes,
acaba-se na última!
E nós? Saberemos ter uma consciência reta e responsável,
transparente, que nunca volte as costas ao inocente, mas se posicione, com
coragem, em defesa dos fracos, resistindo à injustiça e defendendo em todo o
lado a verdade violada?
Oração
Senhor Jesus, há mãos que dão apoio e há mãos que assinam
sentenças injustas. Fazei que, sustentados pela vossa graça, não descartemos
ninguém. Defendei-nos das calúnias e da mentira. Ajudai-nos a procurar sempre a
verdade e a estar da parte dos fracos, capazes de acompanhar o seu caminho. E
dai a vossa luz a quem deve, por missão, julgar em tribunal, para que pronuncie
sempre sentenças justas e verdadeiras. Amém.
Pai nosso...
II Estação: Jesus é carregado com a Cruz
O madeiro pesado da crise
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Da Primeira Carta de São Pedro (1Pd 2,24-25)
Sobre a cruz, [Jesus] carregou nossos pecados em seu próprio
corpo, a fim de que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça. Por suas
feridas fostes curados. Andáveis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes
ao Pastor e Guarda de vossas vidas.
Aquele madeiro da cruz pesa, porque nele Jesus leva os
pecados de todos nós. Cambaleia sob aquele peso, grande demais para um homem só
(Jo 19,17).
Nele está também o peso de todas as injustiças que
produziram a crise econômica, com as suas graves consequências sociais:
precariedade, desemprego, demissões, dinheiro que governa em vez de servir,
especulação financeira, suicídios de empresários, corrupção e usura, juntamente
com empresas que deixam os países.
Esta é a cruz pesada do mundo do trabalho, a injustiça
colocada sobre os ombros dos trabalhadores. Jesus toma-a sobre os seus ombros e
ensina-nos a viver, não mais na injustiça, mas capazes, com sua ajuda, de criar
pontes de solidariedade e esperança, para não sermos ovelhas errantes nem
extraviadas nesta crise.
Portanto voltemos para Cristo, Pastor e Guarda das nossas
almas. Lutemos juntos pelo trabalho na reciprocidade, vencendo o medo e o
isolamento, recuperando a estima pela política e procurando juntos a saída para
os problemas.
Então, a cruz se tornará mais leve, se levada com Jesus e
sustentada conjuntamente por todos, porque «pelas suas feridas - transformadas
em frestas - fomos curados» (1Pd 2,24).
Oração
Senhor Jesus, a nossa noite é cada vez mais densa! A pobreza
assume o aspecto da miséria. Não temos pão para dar aos filhos e as nossas
redes estão vazias. O nosso futuro é incerto. Provede ao trabalho que falta. Suscitai
em nós o ardor pela justiça, para que não levemos uma vida arrastada, mas
vivida com dignidade! Amém.
Pai nosso...
Cuius ánimam geméntem, /
contristátam et doléntem, / pertransívit gládius.
III Estação: Jesus cai pela primeira vez
A fragilidade que nos abre ao acolhimento
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Livro do Profeta Isaías (Is 53,4-5)
A verdade é que ele tomava sobre si nossas enfermidades e
sofria, ele mesmo, nossas dores; e nós pensávamos fosse um chagado, golpeado
por Deus e humilhado! Mas ele foi ferido por causa de nossos pecados, esmagado
por causa de nossos crimes; a punição a ele imposta era o preço da nossa paz, e
suas feridas, o preço da nossa cura.
É um Jesus frágil, humaníssimo, Aquele que contemplamos,
maravilhados, nesta estação de grande sofrimento. Precisamente esta sua queda,
no pó, revela-nos ainda mais o seu amor imenso. É empurrado pela multidão, atordoado
pelos gritos dos soldados, sofre a ardência das chagas da flagelação, cheio de
amargura interior pela imensa ingratidão humana. E cai. Cai por terra.
Mas nesta queda, cedendo ao peso e à fadiga, uma vez mais
Jesus faz-se Mestre de vida. Ensina-nos a aceitar as nossas fragilidades, a não
desanimar com os nossos fracassos, a reconhecer com lealdade as nossas
limitações: «Tenho capacidade de querer o bem, mas não de realizá-lo», diz São
Paulo (Rm 7,18).
Com esta força interior, que lhe vem do Pai, Jesus ajuda-nos
a acolher também as fragilidades dos outros; a não atacar quem está caído, a
não ficar indiferente perante os que caem. E dá-nos a força para não fechar a
porta a quem bate às nossas casas, pedindo asilo, dignidade e pátria. Cientes
da nossa fragilidade, acolheremos no nosso meio a fragilidade dos migrantes,
para que encontrem apoio e esperança.
De fato, é na água suja da bacia do Cenáculo, isto é, na
nossa fraqueza, que se reflete o verdadeiro rosto do nosso Deus! Por isso,
«todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne mortal é de Deus»
(1Jo 4,2).
Oração
Senhor Jesus, que vos fizestes humilde para resgatar as
nossas fragilidades, tornai-nos capazes de entrar em verdadeira comunhão com os
nossos irmãos mais pobres. Arrancai do nosso coração toda a raiz de medo e de cômoda
indiferença, que nos impede de vos reconhecer nos migrantes, para testemunhar
que a vossa Igreja é sem fronteiras, verdadeira mãe de todos! Amém.
Pai nosso...
O quam tristis et afflícta
/ fuit illa benedícta / Mater Unigéniti!
IV Estação: Jesus encontra a Mãe
As lágrimas solidárias
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 2,34-35)
Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe de Jesus: “Este
menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para muitos em Israel.
Ele será um sinal de contradição. (...) Quanto a ti, uma espada te traspassará
a alma”.
Da Carta de São Paulo aos Romanos (Rm 12,15-16)
“Chorai com os que choram. Mantende um bom entendimento uns
com os outros”.
Carregado de emoção e de lágrimas pungentes é este encontro
de Jesus com sua Mãe, Maria. Exprime-se nele a força invencível do amor
materno, que supera todo o obstáculo e sabe abrir qualquer estrada. Mas ainda
mais vivo é o olhar solidário de Maria, que se solidariza e dá força ao Filho.
Assim o nosso coração enche-se de maravilha, ao contemplar a grandeza de Maria
precisamente no fato de, sendo ela criatura, se fazer o «próximo» do seu Deus e
Senhor.
Nas suas lágrimas reúnem-se todas as lágrimas de cada mãe
pelos seus filhos distantes, pelos jovens condenados à morte, trucidados ou
enviados à guerra, especialmente as crianças-soldado. Aqui ouvimos o lamento
desolador das mães pelos seus filhos, que morrem por causa dos tumores
produzidos pela incineração dos resíduos tóxicos.
Lágrimas amarguíssimas! Partilha solidária da angústia dos
filhos! Mães de vigia na noite, com as lâmpadas acesas, temendo pelos jovens
vítimas da precariedade ou engolidos pela droga e pelo álcool, especialmente
nas noites de sábado.
Ao redor de Maria, nunca seremos um povo órfão! Também a
nós, como a São Juan Diego, Maria oferece a carícia da sua consolação materna e
diz-nos: «Não se perturbe o teu coração. (...) Não estou eu aqui, que sou tua
Mãe?» (Exortação Apostólica Evangelii
gaudium, n. 286).
Oração
Ave, minha Mãe, dá-me a tua santa bênção. Abençoa-me, a mim
e a toda a minha casa. Digna-te oferecer a Deus tudo o que hoje tenho de fazer
e sofrer, em união com os teus méritos e os do teu santíssimo Filho. Eu te
ofereço tudo o que sou e dedico tudo o que tenho ao teu serviço, colocando-me
completamente sob o teu manto. Alcança-me, ó minha Senhora, pureza de mente e
de corpo e faz que, neste dia, nada faça que possa desagradar a Deus. Peço-te
pela tua Imaculada Conceição e pela tua ilibada virgindade. Amém (São Gaspar
Bertoni).
Pai nosso...
Quae maerébat et dolébat
/ pia Mater, cum vidébat / Nati poenas íncliti.
V Estação: Simão de Cirene ajuda Jesus a levar a Cruz
A mão amiga que levanta
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Marcos (Mc 15,21)
Os soldados obrigaram certo Simão de Cirene, pai de
Alexandre e de Rufo, que voltava do campo, a carregar a cruz.
Simão de Cirene passa por acaso. Mas torna-se um encontro
decisivo na sua vida. Voltava dos campos. Homem de fadiga e de vigor. Por isso,
foi forçado a levar a cruz de Jesus, condenado a uma morte infame (cf. Fl
2,8).
Mas, aquele encontro se transformará, de casual, em um
decisivo e vital seguimento atrás de Jesus, carregando dia a dia a sua cruz,
renegando-se a si mesmo (cf. Mt 16,24-25). Com efeito, Simão é
recordado por Marcos como o pai de dois cristãos conhecidos na comunidade de
Roma: Alexandre e Rufo. Um pai que, de certeza, imprimiu no coração dos filhos
a força da cruz de Jesus. É que a vida, se a guardas demasiado para ti,
torna-se bolorenta e árida. Mas, se a ofereces, floresce tornando-se espiga de
trigo para ti e para toda a comunidade.
Aqui está a verdadeira cura do nosso egoísmo, sempre à
espreita. A relação com os outros nos cura e gera uma fraternidade mística,
contemplativa, que sabe ver a grandeza sagrada do próximo, que sabe descobrir
Deus em cada ser humano, que sabe suportar as moléstias da existência,
agarrando-se ao amor de Deus. Só abrindo o coração ao amor divino sou impelido
a procurar a felicidade dos outros nos variados gestos de voluntariado: uma
noite no hospital, um empréstimo sem juros, uma lágrima enxugada em família, a
gratuidade sincera, o compromisso clarividente do bem comum, a partilha do pão
e do trabalho, vencendo toda e qualquer forma de ciúmes e de inveja.
É o próprio Jesus que no-lo recorda: «Todas as vezes que
fizestes isso a um dos menores de meus irmãos, foi a Mim que o fizestes!» (Mt
25,40).
Oração
Senhor Jesus, no amigo Cireneu vibra o coração da vossa
Igreja, que se fez teto de amor para quantos têm sede de Vós. A ajuda fraterna
é a chave para cruzarmos, juntos, a porta da Vida. Não permitais que o nosso
egoísmo nos faça passar ao largo, mas ajudai-nos a derramar o óleo da
consolação nas feridas alheias, para nos tornarmos companheiros de estrada
leais, sem fugas e sem nunca nos cansarmos de optar pela fraternidade. Amém.
Pai nosso...
Quis est homo qui non
fleret, / Matrem Christi si vidéret / in
tanto supplício?
VI Estação: A Verônica limpa o rosto de Jesus
A ternura feminina
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Livro dos Salmos (Sl 26,8-9)
Meu coração fala convosco confiante, e os meus olhos vos
procuram. Senhor, é vossa face que eu procuro; não me escondais a vossa face!
Não afasteis em vossa ira o vosso servo, sois vós o meu
auxílio! Não me esqueçais nem me deixeis abandonado, meu Deus e Salvador!
Jesus vai se arrastando com dificuldade, ofegante. Mas a luz
no seu rosto permanece intacta. Não há ofensa que possa sobrepor-se à sua
beleza. Os escarros não a obscureceram. As bofetadas não conseguiram apagá-la.
Aquele rosto apresenta-se como uma sarça ardente: quanto mais é ultrajado, mais
consegue emanar uma luz de salvação. Caem lágrimas silenciosas dos olhos do
Mestre. Carrega o peso do abandono. E, no entanto, Jesus avança, não para, não
volta atrás. Enfrenta a opressão. Perturba-o a crueldade, mas Ele sabe que o
seu morrer não será em vão.
Jesus então para diante de uma mulher que vem ao seu
encontro, sem qualquer hesitação. É a Verônica, verdadeira imagem feminina da
ternura.
Aqui o Senhor encarna a nossa necessidade de amorosa
gratuidade, de nos sentirmos amados e protegidos por gestos de carinho e
cuidado. As carícias desta criatura ficam banhadas pelo sangue precioso de
Jesus e parecem cancelar os atos de profanação que Ele recebeu naquelas horas
de tortura. A Verônica consegue tocar o doce Jesus, roçar a sua candura. Não só
para aliviar, mas também para participar no seu sofrimento. Em Jesus, reconhece
todo o próximo que deve consolar com um toque de ternura, querendo chegar aos
gemidos de dor de quantos, hoje, não recebem assistência nem calor de compaixão.
E morrem de solidão.
Oração
Senhor Jesus, como pesa o afastamento de quem julgávamos
estar ao nosso lado nos dias da desolação! Mas, Vós, envolvei-nos com aquele
pano que traz impresso o vosso sangue precioso, derramado ao longo do caminho
do abandono, que, também Vós, sofrestes injustamente. Sem Vós, não temos nem
podemos dar qualquer alívio. Amém.
Pai nosso...
Quis non posset
contristári, / Christi Matrem contemplári, / doléntem
cum Filio?
VII Estação: Jesus cai pela segunda vez
A angústia da prisão e da tortura
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Livro dos Salmos (Sl 117,11.12-13.18)
Eles me cercaram... Como um enxame de abelhas me atacaram, como
um fogo de espinhos me queimaram, mas em nome do Senhor os derrotei.
Empurraram-me, tentando derrubar-me, mas veio o Senhor em
meu socorro.
O Senhor severamente me provou, mas não me abandonou às mãos
da morte.
Em Jesus cumprem-se verdadeiramente as antigas profecias do
Servo humilde e obediente, que toma sobre os seus ombros toda a nossa história
de sofrimento. E assim Jesus, empurrado para a frente à força, cai sob a fadiga
e a opressão, rodeado, circundado pela violência, já sem forças. Cada vez mais
só, sempre mais nas trevas. Dilacerado na carne, debilitado nos ossos.
N’Ele reconhecemos a amarga experiência dos encarcerados de
cada prisão, com todas as suas desumanas contradições. Rodeados e cercados,
«empurrados violentamente para cair». Hoje, a prisão continua a ser demasiado
distante, esquecida, repudiada pela sociedade civil. Existem os absurdos da
burocracia, a lentidão da justiça. Dupla pena é ainda a superlotação: é um
sofrimento agravado, uma opressão injusta, que consome a carne e os ossos.
Alguns - demasiados! - não conseguem resistir... E mesmo quando um irmão nosso
sai, ainda o consideramos um «ex-presidiário», fechando-lhe deste modo as
portas do resgate social e laboral.
Mais grave, porém, é a prática da tortura, infelizmente
ainda espalhada em várias partes da terra e sob variadas formas. Tal como
sucedeu com Jesus: também Ele foi espancado, humilhado pelos soldados,
torturado com a coroa de espinhos, flagelado cruelmente.
Hoje, à vista desta queda, como sentimos verdadeiras as
palavras de Jesus: «Eu estava na prisão e fostes me visitar» (Mt 25,36).
Em cada prisão, junto de cada torturado, está sempre Ele, o Cristo sofredor,
preso e torturado. Quando provados, mesmo duramente, é Ele o nosso auxílio,
para não se apoderar de nós o pavor. Só juntos nos levantamos, acompanhados por
válidos agentes sociais, apoiados pela mão fraterna dos voluntários e erguidos
por uma sociedade civil que faz suas as inúmeras injustiças dentro dos muros de
uma prisão.
Oração
Senhor Jesus, uma comoção sem fim se apodera de mim ao ver-vos
caído no chão por mim. Nenhum mérito tenho, só uma multidão de pecados,
incoerências, fragilidades. Por resposta, um grande Amor de predileção!
Expulsos da sociedade, mortos pelo julgamento, Vós nos abençoastes para sempre.
Felizes de nós, se hoje estamos contigo, aqui no chão, resgatados da
condenação. Concedei-nos que não fujamos das nossas responsabilidades; dai-nos
a graça de habitar na vossa humilhação, a salvo de qualquer pretensão de
onipotência, para renascer para uma vida nova como criaturas feitas para o Céu.
Amém.
Pai nosso...
Pro peccátis suae
gentis / vidit Iesum in torméntis / et
flagéllis súbditum.
VIII Estação: Jesus encontra as mulheres de Jerusalém
Partilha e não comiseração
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Lucas (Lc 23,28)
“Filhas de Jerusalém, não choreis por Mim! Chorai por vós
mesmas e por vossos filhos!”.
Como tochas acesas, aparecem as figuras femininas ao longo
da via dolorosa. Mulheres de fidelidade e coragem, que não se deixam intimidar
pelos guardas nem escandalizar pelas chagas do Bom Mestre. Estão prontas a
encontrá-lo e a consolá-lo. Jesus está ali na frente delas. Há quem o espezinhe
no momento em que cai por terra exausto. Mas as mulheres estão ali, prontas a
oferecer-lhe aquele palpitar caloroso que o coração já não consegue conter.
Primeiro, olham-no de longe, mas depois aproximam-se d’Ele como faz todo o
amigo, todo o irmão ou irmã, quando percebe a dificuldade que vive a pessoa
amada.
Jesus é sensível às suas lágrimas amargas, mas exorta-as a
não consumirem o coração vendo-o assim maltratado, a não serem mais mulheres
lacrimantes, mas crentes! Pede uma dor compartilhada e não uma comiseração
estéril e lacrimosa. Não mais lamentações, mas vontade de renascer, olhar em
frente, avançar com fé e esperança para aquela aurora de luz que surgirá ainda
mais deslumbrante sobre a cabeça de quantos caminham rumo a Deus. Choremos
sobre nós mesmos, se ainda não acreditamos naquele Jesus que nos anunciou o Reino
da salvação. Choremos pelos nossos pecados não confessados.
Mais, choremos por aqueles homens que descarregam sobre as
mulheres a violência que têm dentro. Choremos pelas mulheres escravizadas pelo
medo e a exploração. Mas não basta bater no peito e sentir comiseração. Jesus é
mais exigente. As mulheres devem ser tranquilizadas como Ele fez, devem ser
amadas como um dom inviolável para toda a humanidade. Para o crescimento dos
nossos filhos, em dignidade e esperança.
Oração
Senhor Jesus, detém a mão de quem espanca as mulheres!
Levanta o coração delas do abismo do desespero quando se tornam presa de
violência. Visita o seu choro, quando se encontram sozinhas. E abre o nosso
coração à partilha de cada dor, com sinceridade e fidelidade, ultrapassando a compaixão
natural, para nos tornarmos instrumentos de verdadeira libertação. Amém.
Pai nosso...
Eia, mater, fons amóris,
/ me sentíre vim dolóris / fac, ut tecum lúgeam.
IX Estação: Jesus cai pela terceira vez
Vencer a má nostalgia
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Da Carta de São Paulo aos Romanos (Rm 8,35.37)
“Quem nos separará do amor de Cristo? Tribulação? Angústia? Perseguição?
Fome? Nudez? Perigo? Espada? (...) Em tudo isso, somos mais que vencedores,
graças Àquele que nos amou!”.
São Paulo enumera as suas provações, mas sabe que, antes
dele, Jesus passou por elas, o qual, no caminho para o Gólgota, cai uma, duas, três
vezes. Destroçado pelas tribulações, a perseguição, a espada, oprimido pelo
madeiro da cruz. Exausto! Parece dizer, como nós em muitos momentos sombrios:
Não aguento mais!
É o grito dos perseguidos, dos moribundos, dos doentes terminais,
dos oprimidos sob o jugo.
Mas, em Jesus, é visível também sua força: «Embora [Deus]
aflija, tem compaixão» (Lm 3,32). Indica-nos que, na aflição, há sempre
a sua consolação, um “mais além” a vislumbrar na esperança. Como se faz na poda
das árvores, com igual sabedoria procede o Pai Celeste precisamente com os ramos
que produzem fruto (cf. Jo 15,8). Nunca o faz pela amputação em si, mas
sempre em prol de um reflorescimento. Como uma mãe, quando chega a sua hora:
está aflita, geme, sofre no parto. Mas sabe que são as dores do parto de uma
vida nova, da primavera em flor, precisamente como na referida poda.
A contemplação de Jesus, caído, mas capaz de levantar-se,
nos ajude a saber vencer os isolamentos que o medo do amanhã imprime no nosso
coração, sobretudo neste tempo de crise. Superemos a má nostalgia do passado, a
comodidade do imobilismo, do «sempre se fez assim»! Aquele Jesus que cambaleia
e cai, mas depois se levanta, é a certeza de uma esperança que, nutrida pela
oração intensa, nasce precisamente dentro da provação e não depois da provação
nem sem a provação. Seremos mais do que vencedores, graças ao seu amor.
Oração
Senhor Jesus, nós vos pedimos, erguei do pó o miserável,
levantai os pobres da miséria, fazei-os sentar com os chefes do povo e
atribuí-lhes um trono de glória. Quebrai o arco dos fortes e revesti de vigor
os fracos, porque só Vós nos fazeis ricos precisamente com a vossa pobreza. Amém
(cf. 1Sm 2,4-8; 2Cor 8,9).
Pai nosso...
Fac ut árdeat cor meum / in amándo Christum Deum, / ut sibi compláceam.
X Estação: Jesus é despojado das vestes
A unidade e a dignidade
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo João (Jo 19,23-24)
Depois que crucificaram Jesus, os soldados repartiram a sua
roupa em quatro partes, uma parte para cada soldado. Quanto à túnica, esta era
tecida sem costura, em peça única de alto a baixo. Disseram então entre si: “Não
vamos dividir a túnica. Tiremos a sorte para ver de quem será”. Assim se
cumpria a Escritura que diz: “Repartiram entre si as minhas vestes e lançaram
sorte sobre a minha túnica”.
Nem sequer um pedaço de pano deixaram a cobrir o corpo de
Jesus. Desnudaram-no. Não tinha manto nem túnica, não tinha veste alguma. Desnudaram-no
como ato de extrema humilhação. Só o cobria o sangue, que brotava das suas
inúmeras feridas.
A túnica fica intacta: símbolo da unidade da Igreja, uma
unidade a ser reencontrada em um caminho paciente, em uma paz artesanal,
construída cada dia, em um tecido composto com os fios de ouro da fraternidade,
na reconciliação e no perdão recíproco.
Em Jesus inocente, desnudado e torturado, reconhecemos a
dignidade violada de todos os inocentes, especialmente dos humildes. Deus não
impediu que o seu corpo, nu, fosse exposto na cruz. Fê-lo para resgatar todo o
abuso, injustamente coberto, e demonstrar que Ele, Deus, está irrevogavelmente
e sem meios termos da parte das vítimas.
Oração
Senhor Jesus, queremos voltar a ser inocentes como crianças,
para podermos entrar no Reino dos céus, purificados das nossas imundícies e dos
nossos ídolos. Tirai do nosso peito o coração de pedra das divisões, que tornam
pouco credível a vossa Igreja. Dai-nos um coração novo e um espírito novo, para
vivermos segundo os vossos preceitos e observarmos e pormos em prática as
vossas leis. Amém.
Pai nosso...
Sancta Mater, istud
agas, / Crucifíxi fige plagas / cordi
meo válide.
XI Estação: Jesus é pregado na Cruz
No leito dos doentes
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Marcos (Mc 15,24-28)
Então o crucificaram e repartiram as suas roupas, tirando a
sorte, para ver que parte caberia a cada um. Eram nove horas da manhã quando o
crucificaram. E ali estava uma inscrição com o motivo de sua condenação: “O Rei
dos Judeus”. Com Jesus foram crucificados dois ladrões, um à direita e outro à
esquerda. Deste modo, cumpriu-se a passagem da Escritura que diz: “Foi contado
entre os malfeitores”.
E crucificaram-no! A punição dos infames, dos traidores, dos
escravos rebeldes. Esta é a condenação reservada a Jesus, nosso Senhor: cravos
ásperos, dores pungentes, a angústia da Mãe, a vergonha de ser agregado a dois
bandidos, as vestes divididas como despojo entre os soldados, as zombarias
cruéis dos transeuntes: « A outros salvou, a si mesmo não pode salvar! (...)
Desça agora da cruz, e acreditaremos» (Mt 27,42).
E crucificaram-no! Jesus não desce, não abandona a cruz.
Permanece, profundamente obediente à vontade do Pai. Ama e perdoa.
Também hoje, como Jesus, muitos dos nossos irmãos e irmãs
estão cravados em um leito de sofrimento, nos hospitais, nas casas de repouso,
nas nossas famílias. É o tempo da provação, com dias amargos de solidão e mesmo
de desespero: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt 27,46).
A nossa mão nunca se levante para transpassar, mas sempre
para aproximar, consolar e acompanhar os doentes, levantando-os do seu leito de
sofrimento. A doença não pede licença. Chega sempre inesperada. Às vezes transtorna,
limita os horizontes, põe à dura prova a esperança. Amargo é o seu fel. Só se
encontrarmos junto de nós alguém que nos ouça, esteja ao nosso lado, se sente
no nosso leito, só então a doença pode tornar-se uma grande escola de
sabedoria, encontro com o Deus Paciente. Quando alguém toma sobre si as nossas
enfermidades, por amor, a própria noite do sofrimento abre-se à luz pascal de
Cristo Crucificado e Ressuscitado. E aquilo que humanamente é uma condenação,
pode transformar-se em uma oblação redentora, para bem das nossas comunidade e
famílias. A exemplo dos Santos.
Oração
Senhor Jesus, não estejais longe de mim, sentai-vos no meu
leito de sofrimento e fazei-me companhia. Não me deixeis sozinho, estendei a
vossa mão e erguei-me. Eu creio que Vós sois o Amor, e creio que a vossa vontade
é a expressão do vosso Amor; por isso me entrego à vossa vontade, pois confio
no vosso Amor. Amém.
Pai nosso...
Tui Nati vulneráti, / tam
dignáti pro me pati, / poenas mecum dívide.
XII Estação: Jesus morre na Cruz
O gemido das sete palavras
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo João (Jo 19,28-30)
Jesus, sabendo que tudo estava consumado, e para que a
Escritura se cumprisse até o fim, disse: “Tenho sede”. Havia ali uma jarra
cheia de vinagre. Amarraram numa vara uma esponja embebida de vinagre e
levaram-na à boca de Jesus. Ele tomou o vinagre e disse: “Tudo está consumado”.
E, inclinando a cabeça, entregou o espírito.
As sete palavras de Jesus na cruz são uma obra-prima de
esperança. Jesus, lentamente, com passos que também são os nossos, atravessa
toda a escuridão da noite, para abandonar-se, confiadamente, nos braços do Pai.
É o gemido dos moribundos, o grito dos desesperados, a prece dos falidos. É
Jesus!
«Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt
27,46). É o grito de Jó, de todo o homem atingido pela desventura. E Deus cala-se.
Cala-se, porque a sua resposta está ali, na cruz: é Ele, Jesus, a resposta de
Deus, Palavra eterna encarnada por amor.
«Lembra-te de mim...» (Lc 23,42). A prece fraterna do
malfeitor, feito companheiro de dor, penetra no coração de Jesus, que nela
sente o eco da sua própria dor. E Jesus ouve aquela súplica: «Hoje estarás
comigo no Paraíso». Sempre redime a dor do outro, porque faz-nos sair de
nós mesmos.
«Mulher, eis aí o teu filho!» (Jo 19, 6).
Trata-se de sua Mãe, Maria, que se encontrava, juntamente com João, ao pé da
cruz, para afastar o pavor. Enche-o de ternura e de esperança. Jesus já não se
sente sozinho. Como sucede conosco, quando, junto ao leito do sofrimento, temos
quem nos ame! Fielmente. Até ao fim.
«Tenho sede» (Jo 19,28). Como a criança pede
de beber à mãe; como faz o doente ardendo de febre... A de Jesus é a sede de todos
os sedentos de vida, de liberdade, de justiça. E é a sede do maior sedento -
Deus -, o qual, infinitamente mais do que nós, tem sede da nossa salvação.
«Está consumado!» (Jo 19,30). Tudo: cada
palavra, cada gesto, cada profecia, cada instante da vida de Jesus. A tapeçaria
está completa. As mil e uma cores do amor agora reluzem de beleza. Nada se
perdeu. Nada foi desperdiçado. Tudo se tornou amor. Tudo consumado para mim e
para ti! E, então, o próprio morrer tem um sentido.
«Pai, perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem» (Lc
23,34). Agora, heroicamente, Jesus sai do pavor da morte. Porque, se vivemos no
amor gratuito, tudo é vida. O perdão renova, cura, transforma e consola! Cria
um povo novo. Põe fim às guerras.
«Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito» (Lc
23,46). Já não há o desespero do nada. Mas confiança plena nas suas mãos de
Pai, reclinando-se no seu coração. Porque, em Deus, cada fração se compõe,
finalmente, em unidade!
Oração
Ó Deus, que, na Paixão de Cristo, nosso Senhor, nos
libertastes da morte, legado do antigo pecado transmitido a todo o gênero
humano, renovai-nos à imagem do vosso Filho; e, assim como levamos em nós, pelo
nosso nascimento, a imagem do homem terrestre, assim também, pela ação do vosso
Espírito, fazei que levemos a imagem do homem celeste. Por Cristo, nosso
Senhor. Amém.
Pai nosso...
Vidit suum dulcem
Natum / moriéntem desolátum, / cum
emísit spíritum.
XIII Estação: O corpo de Jesus é descido da Cruz
O amor é mais forte do que a morte
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo Mateus (Mt 27,57-58)
Ao entardecer, veio um homem rico de Arimateia, chamado
José, que também se tornara discípulo de Jesus. Ele foi procurar Pilatos e
pediu o corpo de Jesus. Então Pilatos mandou que lhe entregassem o corpo.
Antes de ser posto na tumba, Jesus é entregue finalmente à
sua Mãe. É o ícone de um coração destroçado, que nos diz como a morte não
impede o último beijo da mãe a seu filho. Prostrada ante o corpo de Jesus,
Maria se une a Ele em um abraço total. Este ícone se chama simplesmente «Pietà»,
«Piedade». É doloroso, mas demonstra que a morte não quebra o amor. Porque o
amor é mais forte do que a morte (cf. Ct 8,6). O amor puro é duradouro. Chegou
a tarde. A batalha está vencida. O amor não foi vencido. Quem está disposto a
sacrificar sua vida por Cristo, a encontrará. Transfigurada mais além da morte.
Nesta trágica entrega, se mesclam lágrimas e sangue. Como na
vida de nossas famílias, atribuladas as vezes por perdas imprevistas e
dolorosas, criando um vazio insuperável, sobretudo quando morre uma criança.
«Piedade», então, significa fazer-se próximos dos irmãos em
luto e que não se resignam. É uma caridade muito grande cuidar de quem está
sofrendo no corpo chagado, na mente deprimida, no ânimo desesperado. Amar até o
fim é o supremo ensinamento que nos deixaram Jesus e Maria. E a missão fraterna
diária de consolo, que se nos entrega neste abraço fiel entre Jesus morto e sua
Mãe Dolorosa.
Oração
Ó Virgem das Dores, que em nossos santuários nos mostras teu
rosto de luz, enquanto com os olhos para o céu e as mãos abertas ofereces ao
Pai um sinal de oferenda sacerdotal, a vítima redentora de teu Filho Jesus. Mostra-nos
a doçura do último fiel abraço e dá-nos teu maternal consolo, para que a dor quotidiana
nunca apague a esperança de vida mais além da morte. Amém.
Pai nosso...
Fac me vere tecum
flere, / Crucifíxo condolére, / donec
ego víxero.
XIV Estação: O corpo de Jesus é depositado no sepulcro
O jardim novo
Nós vos adoramos,
Senhor Jesus Cristo, e vos bendizemos.
R. Porque pela vossa
Santa Cruz remistes o mundo.
Do Evangelho segundo João (Jo 19,41-42)
No lugar onde Jesus foi crucificado, havia um jardim e, no
jardim, um túmulo novo, onde ainda ninguém tinha sido sepultado. (...) foi ali
que colocaram Jesus.
Aquele jardim no qual se encontra o túmulo onde Jesus é
sepultado, lembra outro jardim: o do Éden. Um jardim que, por causa da
desobediência, perdeu a sua beleza e tornou-se uma desolação, lugar de morte e
já não de vida.
Os ramos selvagens que nos impedem de respirar a vontade de
Deus, como o apego ao dinheiro, à soberba, ao desperdício da vida, devem ser
cortados e enxertados agora no madeiro da Cruz. É este o novo jardim: a cruz
plantada na terra!
Agora, lá de cima, Jesus poderá voltar a trazer tudo à vida.
Uma vez regressado dos abismos infernais, onde Satanás encerrou um grande
número de almas, terá início a renovação de todas as coisas. Aquele sepulcro
representa o fim do homem velho. E também para nós, como fez para Jesus, Deus
não permitiu que os seus filhos fossem castigados pela morte definitiva.
Na morte de Cristo, ruíram todos os tronos do mal, fundados
sobre a ganância e a dureza do coração. A morte desarma-nos, faz-nos
compreender que estamos sujeitos a uma existência terrena que tem um fim. Mas é
diante daquele corpo de Jesus, depositado no sepulcro, que tomamos consciência
de quem somos: criaturas que, para não morrer, precisam do seu Criador.
O silêncio que envolve aquele jardim permite-nos ouvir o
sussurro de uma brisa suave: «Eu sou o Vivente, e estou convosco» (cf. Ex
3,14). O véu do templo rasgou-se. Finalmente vemos o rosto de nosso Senhor. E
conhecemos em plenitude o seu nome: misericórdia e fidelidade, para nunca mais
ficarmos confundidos, nem mesmo diante da morte, porque o Filho de Deus caminha
livre no meio dos mortos (cf. Sl 87,6 Vulgata).
Oração
Protegei-me, ó Deus, em vós me refugio! Vós sois a minha
parte na herança e o meu cálice, nas vossas mãos está a minha vida. Tenho-vos
sempre diante dos olhos, como meu Senhor, estais à minha direita, não poderei
vacilar. Por isso, se alegra o meu coração e exulta a minha alma, e também o
meu corpo repousa em segurança. Não abandoneis a minha vida na morada dos
mortos nem deixeis que o vosso servo conheça a sepultura. Mostra-me o caminho
da vida, alegria plena na vossa presença, doçura sem fim à vossa direita. Amém (cf.
Sl 15).
Pai nosso...
Quando corpus moriétur
/ fac ut ánimae donétur / paradísi glória. Amen.
Bênção Apostólica / Canto final: Crux fidelis
Papa Francisco e Dom Dom Giancarlo Bregantini, autor das meditações |
Fonte: Santa Sé / Imagens: Wikimedia Commons.
Confira outros modelos de meditações em nossa postagem sobre a história da Via Sacra presidida pelo Papa no Coliseu.
Nenhum comentário:
Postar um comentário