quinta-feira, 13 de março de 2025

Homilia do Papa: I Domingo da Quaresma - Ano C (2025)

Jubileu do Mundo do Voluntariado
Santa Missa
Homilia do Papa Francisco
Praça de São Pedro
Domingo, 09 de março de 2025

A homilia preparada pelo Papa Francisco foi lida pelo Cardeal Michael Czerny, Prefeito do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, que presidiu a celebração.

Jesus é conduzido pelo Espírito ao deserto (cf. Lc 4,1). Todos os anos o nosso caminho quaresmal começa seguindo o Senhor neste local, que Ele atravessa e transforma para nós. Na verdade, quando Jesus entra no deserto, ocorre uma mudança decisiva: o lugar do silêncio torna-se um ambiente de escuta. Uma escuta que é posta à prova, porque é necessário escolher entre duas vozes completamente opostas. Ao propor-nos este exercício, o Evangelho testemunha que o caminho de Jesus começa com um ato de obediência: é o Espírito Santo, a própria força de Deus, que o conduz aonde nada de bom cresce da terra nem cai do céu. No deserto, o homem experimenta a própria miséria material e espiritual, a necessidade de pão e de palavra.


Também Jesus, verdadeiro homem, sente fome (v. 2) e, durante quarenta dias, é tentado por uma palavra que não vem do Espírito Santo, mas do espírito maligno, do diabo. Logo após entrar nos quarenta dias da Quaresma, reflitamos sobre a certeza de que também nós somos tentados, mas não estamos sós: conosco está Jesus, que abre para nós o caminho através do deserto. O Filho de Deus feito homem não se limita a oferecer-nos um modelo na luta contra o mal. É muito mais do que isso: dá-nos a força para resistir às suas investidas e perseverar no caminho.

Consideremos então três características da tentação de Jesus e também da nossa: o início, o modo e o resultado. Comparando estas duas experiências, encontraremos ajuda para o nosso próprio caminho de conversão.

Antes de tudo, no seu início, a tentação de Jesus é voluntária: o Senhor vai ao deserto não por arrogância, para mostrar como é forte, mas por sua disponibilidade filial ao Espírito do Pai, a cuja orientação responde prontamente. Nós, pelo contrário, sofremos a tentação: o mal precede a nossa liberdade, corrompe-a a partir de dentro como uma sombra interior e uma ameaça constante. Enquanto pedimos a Deus que não nos abandone na tentação (cf. Mt 6,13), recordemos que Ele já atendeu esta prece através de Jesus, o Verbo que se fez carne para permanecer sempre conosco. O Senhor está perto e cuida de nós, especialmente no local da provação e da dúvida, ou seja, quando o tentador levanta a sua voz. Ele é o pai da mentira (cf. Jo 8,44), corrupto e corruptor, porque conhece a palavra de Deus, mas não a compreende. Aliás, distorce-a: como fez no tempo de Adão, no Jardim do Éden (cf. Gn 3,1-5), assim faz agora contra Jesus, o novo Adão, no deserto.

Entendemos aqui o singular modo com o qual Cristo é tentado, ou seja, na sua relação com Deus, seu Pai. O diabo é aquele que separa, o divisor; enquanto Jesus é aquele que une Deus e o homem, o mediador. Na sua perversão, o demônio quer destruir esta união, fazendo de Jesus um privilegiado: «Se és Filho de Deus, manda que esta pedra se mude em pão» (Lc 4,3). E depois, desde o pináculo do Templo: «Se és Filho de Deus, atira-te daqui abaixo!» (v. 9). Perante estas tentações, Jesus, o Filho de Deus, decide como ser filho. No Espírito que o guia, a sua escolha revela como quer viver a sua relação filial com o Pai. Eis o que o Senhor decide: esta relação única e exclusiva com Deus de quem é Filho Unigênito torna-se uma relação que envolve todos, sem excluir ninguém. A relação com o Pai é o dom que Jesus comunica ao mundo para a nossa salvação, e não uma usurpação (cf. Fl 2,6) da qual se pode valer para obter sucesso e atrair seguidores.

Também nós somos tentados na nossa relação com Deus, mas de forma oposta. Com efeito, o diabo sussurra-nos ao ouvido que Deus não é verdadeiramente o nosso Pai, e que, na realidade, nos abandonou. Satanás pretende convencer-nos de que para os famintos não há pão, muito menos proveniente das pedras, de que nem na desgraça os anjos vêm em nosso auxílio. Quando muito, o mundo está nas mãos de forças malignas, que esmagam os povos com a arrogância dos seus planos e a violência da guerra. Enquanto o diabo quer nos fazer crer que o Senhor está longe de nós, levando-nos ao desespero, Deus aproxima-se ainda mais, dando a sua vida pela redenção do mundo.

E chegamos ao terceiro ponto: o resultado das tentações. Jesus, o Cristo de Deus, vence o mal, afasta o diabo, que, no entanto, voltará a tentá-lo «no tempo oportuno» (Lc 4,13). É o que diz o Evangelho, e o recordaremos quando, no Gólgota, voltarmos a ouvir dizer a Jesus: «Se és Filho de Deus, desce da cruz» (Mt 27,40; cf. Lc 23,35). No deserto, o tentador é derrotado, mas a vitória de Cristo ainda não é definitiva: o será na sua Páscoa de Morte e Ressurreição.

Enquanto nos preparamos para celebrar o Mistério central da fé, reconhecemos que o resultado da nossa provação é diferente. Perante a tentação, por vezes caímos: somos todos pecadores. No entanto, a derrota não é definitiva, pois Deus levanta-nos de cada queda com o seu perdão, que é infinitamente grande em amor. A nossa provação, portanto, não termina com um fracasso, porque em Cristo somos redimidos do mal. Atravessando com Ele o deserto, percorremos um caminho onde não havia nenhuma indicação: o próprio Jesus abre-nos este novo caminho de libertação e redenção. Seguindo o Senhor com fé, de errantes passamos a peregrinos.

Queridos irmãos e irmãs, convido-vos a iniciar assim o nosso percurso quaresmal. E porque, ao longo do caminho, temos necessidade daquela boa vontade que o Espírito Santo sempre fomenta, é com alegria que saúdo todos os voluntários que hoje se encontram em Roma para a sua peregrinação jubilar. Muito obrigado, caríssimos, porque, a exemplo de Jesus, servis o próximo sem vos servirdes dele. Nas ruas e nas casas, ao lado dos doentes, dos que sofrem, dos encarcerados, com os jovens e os idosos, a vossa dedicação infunde esperança em toda a sociedade. Nos desertos da pobreza e da solidão, tantos pequenos gestos de serviço gratuito fazem florescer rebentos de uma nova humanidade: aquele jardim que Deus sonhou e continua a sonhar para todos nós.


Fonte: Santa Sé.

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