Após refletir sobre as quatro virtudes cardeais em sua série de Catequeses sobre os vícios e as virtudes, que estamos publicando nesta Quaresma do Ano Jubilar de 2025, e antes de falar das três virtudes teologais, o Papa Francisco dedicou uma meditação à vida da graça segundo o Espírito:
Papa Francisco
Audiência Geral
Quarta-feira, 24 de abril de 2024
Os vícios e as virtudes (16): A vida da graça segundo o Espírito
Estimados irmãos e irmãs, bom dia!
Nas últimas semanas refletimos sobre as virtudes
cardeais: prudência, justiça, fortaleza e temperança. São estas as quatro
virtudes cardeais. Como já salientamos várias vezes, estas quatro virtudes
pertencem a uma sabedoria muito antiga, precedente até ao Cristianismo. Já
antes de Cristo a honestidade era preconizada como dever cívico, a sabedoria
como regra das ações, a coragem como ingrediente fundamental para uma vida que
tende para o bem e a moderação como medida necessária para não se deixar
dominar pelos excessos. Esta herança tão antiga, legado da humanidade, não foi
substituída pelo Cristianismo, mas esclarecida, valorizada, purificada e
integrada na fé.
Portanto, no coração de cada homem e mulher existe a
capacidade de procurar o bem. O Espírito Santo é concedido para que aqueles que
o recebem possam distinguir claramente o bem do mal, ter a força de aderir ao
bem evitando o mal e, agindo assim, alcançar a plena realização pessoal.
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O Espírito Santo, fonte das virtudes |
Mas no caminho que todos percorremos rumo à plenitude
da vida, que pertence ao destino de cada pessoa - o destino de cada pessoa é a
plenitude, ser cheia de vida -, o cristão conta com uma ajuda especial do
Espírito Santo, o Espírito de Jesus. Ela é implementada com o dom de
outras três virtudes, distintamente cristãs, que nos escritos do
Novo Testamento são frequentemente mencionadas juntas. Estas atitudes
fundamentais, que distinguem a vida do cristão, são três virtudes que agora
diremos juntos: fé, esperança e caridade. Digamo-las juntos: fé,
esperança e caridade. Os escritores cristãos logo as chamaram virtudes
“teologais”, pois são recebidas e vividas na relação com Deus, para diferenciá-las
das outras quatro virtudes chamadas “cardeais”, uma vez que constituem as “dobradiças”
de uma vida boa. Essas três são recebidas no Batismo e derivam do Espírito
Santo. Todas, tanto as virtudes teologais como as cardeais, confrontadas em
muitas reflexões sistemáticas, compuseram assim um maravilhoso setenário, que
muitas vezes é oposto ao elenco dos sete vícios capitais. É assim que o Catecismo
da Igreja Católica define a ação das virtudes teologais: «Fundamentam,
animam e caracterizam o agir moral do cristão. Informam e vivificam todas as
virtudes morais. São infundidas por Deus na alma dos fiéis para torná-los
capazes de proceder como seus filhos e assim merecerem a vida eterna. São o
penhor da presença e da ação do Espírito Santo nas faculdades do ser humano»
(n. 1813).
Enquanto o risco das virtudes cardeais consiste em
gerar homens e mulheres heroicos na prática do bem, mas em última análise
sozinhos, isolados, o grande dom das virtudes teologais é a existência vivida
no Espírito Santo. O cristão nunca está sozinho. Pratica o bem não por um
esforço titânico de empenho pessoal, mas porque, como discípulo humilde,
caminha atrás do Mestre Jesus. Ele vai à frente ao longo do caminho. O cristão
possui as virtudes teologais que são o grande antídoto contra a
autossuficiência. Quantas vezes homens e mulheres moralmente irrepreensíveis
correm o risco de se tornarem presunçosos e arrogantes aos olhos de quem os
conhece! É um perigo contra o qual bem nos alerta o Evangelho, onde Jesus
recomenda aos discípulos: «Também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi
ordenado, dizei: “Somos servos inúteis, fizemos o que devíamos fazer”» (Lc 17,10).
A soberba é um veneno, um veneno poderoso: basta uma gota para estragar toda
uma vida marcada pelo bem. Uma pessoa pode ter praticado uma montanha de boas
ações, pode ter recebido reconhecimentos e louvores, mas se fez tudo isto
apenas para si mesma, para se exaltar, ainda pode dizer-se uma pessoa virtuosa?
Não!
O bem não é apenas um fim, mas também um modo. O bem
precisa de muita discrição, de muita gentileza. O bem tem necessidade sobretudo
de despojar-se dessa presença às vezes demasiado incômoda que é o nosso “eu”.
Quando o nosso “eu” está no centro de tudo, estraga tudo. Se cada ação que
realizarmos na vida for apenas para nós mesmos, é realmente tão importante esta
motivação? O pobre “eu” apodera-se de tudo e assim nasce a soberba.
Para corrigir todas estas situações, que às vezes se
tornam penosas, as virtudes teologais são de grande ajuda. Sobretudo nos
momentos de queda, pois às vezes até aqueles que têm bons propósitos morais
caem. Na vida todos caímos, porque todos somos pecadores. Até os que praticam
diariamente a virtude às vezes erram - todos erramos na vida -: a inteligência
nem sempre é lúcida, a vontade nem sempre é firme, as paixões nem sempre são
governadas, a coragem nem sempre vence o medo. Mas se abrirmos o coração ao Espírito
Santo - Mestre interior - Ele reaviva em nós as virtudes teologais: assim, se
perdemos a confiança, Deus reabre-nos à fé - com a força do Espírito; se
estamos desanimados, Deus reabre-nos à fé, se estamos desencorajados Deus
desperta em nós a esperança; e se o nosso coração está empedernido, Deus
suaviza-o com o seu amor.
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As sete virtudes fundamentais: cardeais e teologais (Pieter de Kempeneer) |
Fonte: Santa Sé.
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