terça-feira, 9 de março de 2021

Homilia do Papa: Missa em Erbil

Viagem Apostólica do Papa Francisco ao Iraque
Santa Missa do III Domingo da Quaresma (Ano B)
Homilia do Santo Padre
Estádio Franso Hariri, Erbil
Domingo, 07 de março de 2021

São Paulo lembrou-nos que «Cristo é poder e sabedoria de Deus» (1Cor 1,24). Jesus revelou este poder e esta sabedoria sobretudo através da misericórdia e do perdão. Não o quis fazer com demonstrações de força ou impondo do alto a sua voz, nem com longos discursos ou exibições de ciência incomparável. Fê-lo dando a sua vida na cruz. Revelou a sua sabedoria e poder divino mostrando-nos, até ao fim, a fidelidade do amor do Pai; a fidelidade do Deus da Aliança, que fez sair o seu povo da escravidão e guiou-o pelo caminho da liberdade (cfEx 20,1-2).

Como é fácil cair na armadilha de pensar que temos de demonstrar aos outros que somos fortes, que somos sábios; na armadilha de construirmos imagens falsas de Deus, que nos deem segurança (cfEx 20,4-5)! Na realidade, é o contrário. Todos nós precisamos do poder e da sabedoria de Deus revelada por Jesus na cruz. No Calvário, ofereceu ao Pai as feridas pelas quais fomos curados (cf1Pd 2,24). Aqui, no Iraque, quantos dos vossos irmãos e irmãs, amigos e concidadãos carregam as feridas da guerra e da violência, feridas visíveis e invisíveis! A tentação é responder a estes e outros fatos dolorosos com uma força humana, com uma sabedoria humana. Jesus, ao contrário, mostra-nos o caminho de Deus, aquele que Ele mesmo percorreu e por onde nos chama a segui-Lo.

No Evangelho que acabamos de escutar (Jo 2,13-25) vemos como Jesus expulsou do Templo de Jerusalém os cambistas e todos os que compravam e vendiam. Porque é que Jesus realizou este ato tão forte, tão provocador? Fê-lo porque o Pai O enviou para purificar o templo: não só aquele de pedra, mas sobretudo o do nosso coração. Como Jesus não tolerou que a casa de seu Pai se tornasse um mercado (cfJo 2,16), assim deseja que o nosso coração não seja um lugar de turbulência, desordem e confusão. O coração deve ser limpo, posto em ordem, purificado. De quê? Das falsidades que o sujam, das simulações da hipocrisia. Todos nós as temos. São doenças que fazem mal ao coração, que mancham a vida, tornam-na hipócrita. Precisamos ser purificados das nossas seguranças falaciosas, que trocam a fé em Deus pelas coisas que passam, pelas conveniências do momento. Precisamos que sejam varridas do nosso coração e da Igreja as nefastas sugestões do poder e do dinheiro. Para limpar o coração, precisamos sujar as mãos: sentirmo-nos responsáveis e não ficarmos parados enquanto sofrem o irmão e a irmã. Mas como purificar o coração? Sozinhos, não somos capazes; temos necessidade de Jesus. Ele tem o poder de vencer os nossos males, curar as nossas doenças, restaurar o templo do nosso coração.

Para confirmação disto mesmo e como sinal da sua autoridade, disse: «Destruí este templo, e em três dias Eu o levantarei» (Jo 2,19). Jesus Cristo, e só Ele, pode purificar-nos das obras do mal, Ele que morreu e ressuscitou, Ele que é o Senhor! Queridos irmãos e irmãs, Deus não nos deixa morrer no nosso pecado. Mesmo quando Lhe voltamos as costas, nunca nos abandona a nós próprios. Procura-nos, vai atrás de nós para nos chamar ao arrependimento e purificar. «Por minha vida - diz o Senhor pela boca de Ezequiel -, não tenho prazer na morte do ímpio, mas sim na sua conversão a fim de que tenha a vida» (Ez 33,11). O Senhor quer que sejamos salvos e nos tornemos templo vivo do seu amor, na fraternidade, no serviço e na misericórdia.

Jesus não só nos purifica dos nossos pecados, mas torna-nos também participantes do seu próprio poder e sabedoria. Liberta-nos de um modo de entender a fé, a família, a comunidade que divide, contrapõe e exclui, para podermos construir uma Igreja e uma sociedade abertas a todos e solícitas pelos nossos irmãos e irmãs mais necessitados. E ao mesmo tempo revigora-nos para sabermos resistir à tentação de procurar vingança, que nos mergulha numa espiral de retaliações sem fim. Com a força do Espírito Santo, envia-nos, não para fazer proselitismo, mas como seus discípulos missionários, homens e mulheres chamados a testemunhar que o Evangelho tem o poder de mudar a vida. O Ressuscitado torna-nos instrumentos da paz de Deus e da sua misericórdia, artífices pacientes e corajosos de uma nova ordem social. Assim, pela força de Cristo e do seu Espírito, acontece o que o Apóstolo Paulo profetiza aos coríntios: «O que é tido como loucura de Deus, é mais sábio que os homens e, o que é tido como fraqueza de Deus, é mais forte que os homens» (1Cor 1,25). Comunidades cristãs formadas por pessoas humildes e simples tornam-se sinal do Reino que vem, Reino de amor, justiça e paz.

«Destruí este templo, e em três dias Eu o levantarei» (Jo 2,19). Falava do templo do seu corpo e, por conseguinte, também da sua Igreja. O Senhor promete que pode, com o poder da sua Ressurreição, fazer-nos ressurgir a nós e às nossas comunidades das ruínas causadas pela injustiça, a divisão e o ódio. É a promessa que celebramos nesta Eucaristia. Com os olhos da fé, reconhecemos a presença do Senhor crucificado e ressuscitado no meio de nós, aprendemos a acolher a sua sabedoria libertadora, a repousar nas suas chagas e a encontrar cura e força para servir o seu Reino que vem ao nosso mundo. Pelas suas feridas, fomos curados (cf1Pd 2,24); nas suas chagas, amados irmãos e irmãs, encontramos o bálsamo do seu amor misericordioso; porque Ele, Bom Samaritano da humanidade, deseja ungir cada ferida, curar cada recordação dolorosa e inspirar um futuro de paz e fraternidade nesta terra.

A Igreja no Iraque, com a graça de Deus, fez e continua a fazer muito para proclamar esta sabedoria maravilhosa da cruz, espalhando a misericórdia e o perdão de Cristo especialmente junto dos mais necessitados. Mesmo no meio de grande pobreza e tantas dificuldades, muitos de vós oferecestes generosamente ajuda concreta e solidariedade aos pobres e atribulados. Este é um dos motivos que me impeliu a vir em peregrinação até junto de vós, ou seja, para vos agradecer e confirmar na fé e no testemunho. Hoje, posso ver e tocar com a mão que a Igreja no Iraque está viva, que Cristo vive e age neste seu povo santo e fiel.

Amados irmãos e irmãs, confio cada um de vós, as vossas famílias e as vossas comunidades à proteção materna da Virgem Maria, que foi associada à paixão e à morte do seu Filho e participou na alegria da sua ressurreição. Interceda por nós e nos conduza até Ele, poder e sabedoria de Deus.

Saudação no final da Eucaristia:
Saúdo com afeto Sua Santidade Mar Gewargis III, Catholicos-Patriarca da Igreja Assíria do Oriente, que reside nesta cidade e nos honra com a sua presença. Obrigado! Obrigado, querido Irmão! Juntamente com ele, abraço os cristãos das várias Confissões: muitos dos seus membros derramaram o sangue aqui sobre a mesma terra! Mas os nossos mártires resplandecem juntos, estrelas no mesmo céu! Lá de cima pedem-nos para caminharmos juntos, decididamente, rumo à plenitude da unidade.

No final desta celebração, agradeço ao Arcebispo D. Bashar Matti Warda, bem como a D. Nizar Semaan e aos outros meus irmãos Bispos, que tanto trabalharam para esta viagem. Agradeço a todos vós que a preparastes, acompanhastes com a oração e me acolhestes com afeto. Saúdo particularmente a querida população curda. Expresso o meu vivo reconhecimento ao governo e às autoridades civis pela sua contribuição indispensável; e agradeço a todos aqueles que colaboraram das mais variadas formas para a organização de toda a viagem no Iraque, às autoridades iraquianas - todas - e aos inúmeros voluntários. Obrigado a todos!

Nestes dias que passei no vosso meio, ouvi vozes de sofrimento e angústia, mas ouvi também vozes de esperança e consolação. E isto se fica a dever, em grande parte, àquela incansável obra de bem-fazer que se tornou possível graças às instituições religiosas das várias Confissões, graças às vossas Igrejas locais e às várias organizações caritativas, que assistem o povo deste país na obra de reconstrução e renascimento social. Em particular, agradeço aos membros da ROACO e às agências que representam.

Agora, aproxima-se o momento de voltar para Roma. Mas o Iraque ficará sempre comigo, no meu coração. Peço a todos vós, queridos irmãos e irmãs, que trabalheis juntos e unidos por um futuro de paz e prosperidade que não deixe ninguém para trás nem discrimine ninguém. Asseguro-vos as minhas orações por este amado país. De modo particular, rezo para que os membros das várias comunidades religiosas, juntamente com todos os homens e mulheres de boa vontade, cooperem para forjar laços de fraternidade e solidariedade ao serviço do bem e da paz. Salam, salam, salam! Shukrán [Paz, paz, paz! Obrigado]! Deus abençoe a todos! Deus abençoe o Iraque! Allah ma’akum [Ficai com Deus]!


Fonte: Santa Sé.

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