sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Congresso Eucarístico 2024: Texto base (3)

De 08 a 15 de setembro de 2024 se celebra em Quito (Equador) o 53º Congresso Eucarístico Internacional, com o tema «Fraternidade para curar o mundo: “Todos vós sois irmãos” (Mt 23,8)».

Como fizemos com o Congresso Eucarístico de Budapeste (Hungria) em 2021, publicamos aqui no blog o texto base, dividido em três partes. Após a primeira postagem com a Introdução (nn. 1-11) e o Capítulo I (nn. 12-21) e a segunda postagem com o Capítulo II (nn. 22-39), confira o Capítulo III (nn. 40-53) e a Conclusão (nn. 54-58).

Para saber mais, confira nossa postagem sobre a história dos Congressos Eucarísticos Internacionais.

53° Congresso Eucarístico Internacional - Quito (Equador)
08-15 de setembro de 2024
Texto base: Fraternidade para curar o mundo
«Todos vós sois irmãos» (Mt 23,8)

3. Fraternidade para curar o mundo
«Dai-lhes vós mesmos de comer» (Lc 9,13)

40. No texto da multiplicação dos pães que nos oferece o evangelista Lucas, não só acontece o milagre do alimento abundante para todos, até a saciedade e mais, mas também o de uma comunidade que, constituída em assembleia em torno do seu Mestre, recebe o mandamento da caridade. Assim, partilhando o que possui e o próprio esforço físico, sai de si mesma para alimentar a multidão faminta. Sinal eucarístico profético de um povo que não se fecha no intimismo dos seus templos, mas que é enviado pelo seu Senhor a ser também ele pão partido para a vida e a fraternidade do mundo de hoje.


A reconciliação e a violência
41. A ação curadora de Cristo sobre o mundo enfrenta as dramáticas realidades da nossa história, na qual a violência generalizada nos tornou todos vítimas e verdugos ao mesmo tempo. No Equador, país de maioria católica, por exemplo, falar de fraternidade reconciliada pode conter um sabor de incredulidade ao recordar o que aconteceu nas nossas prisões e nas nossas ruas, onde inocentes e culpados, sem distinção, perderam a vida, fazendo dos últimos anos os mais violentos da nossa história recente.
Somos conscientes de que a redenção é real, mas esta tem que alcançar sua consumação definitiva. O mundo foi curado, no seu coração e no seu destino, embora descubramos realidades onde esta cura ainda não se manifestou plenamente. A indignação diante da violência e o desejo de solucioná-la nos falam da certeza da cura. Podemos comprová-lo no testemunho de muitos homens e mulheres que, a partir do testemunho de Cristo, tornando-se seus discípulos missionários [44], souberam responder de maneira evangelicamente nova à crescente violência que aflige nossa maneira “natural” de nos relacionarmos uns com os outros.

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses (3)

“Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto” (Fl 4,4-5).

Nas postagens anteriores desta série sobre a leitura litúrgica dos livros da Sagrada Escritura iniciamos um estudo sobre a presença da Carta de São Paulo aos Filipenses (Fl) nas celebrações do Rito Romano.

Após uma breve introdução, analisamos sua leitura sob o critério da composição harmônica, isto é, da sintonia com o tempo ou a festa litúrgica (cf. Elenco das Leituras da Missa, n. 66) [1] na Celebração Eucarística. Para acessar a primeira parte, clique aqui; para a segunda parte, clique aqui.

Nesta postagem concluiremos a análise sob esse critério com os demais Sacramentos, os Sacramentais e a Liturgia das Horas.

Batismo de Lídia em Filipos (At 16,11-15)

2. Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses: Composição harmônica

b) Sacramentos e Sacramentais

Além da Eucaristia, alguns textos da Carta aos Filipenses constam entre as leituras ad libitum (à escolha) dos Sacramentos da Unção dos Enfermos e do Matrimônio e de dois ritos relacionados ao Batismo.

Primeiramente, no contexto da Iniciação Cristã de adultos, quando estes recebem o Batismo, a Confirmação e a Eucaristia na Vigília Pascal, na manhã do Sábado Santo podem celebrar-se os Ritos de preparação imediata. A leitura indicada para esses ritos é Fl 3,4-15 [2], na qual Paulo exorta a lançar-se “para frente”, isto é, para Cristo.

Para o Rito da Admissão dos batizados, pelo qual são acolhidas na Igreja pessoas já batizadas em outras comunidades eclesiais, sugere-se a leitura de Fl 4,4-8 [3], com o convite à alegria e a exortação a praticar a virtude.

Na Unção dos Enfermos, por sua vez, é possível ler Fl 2,25-30 [4], sobre a doença de Epafrodito, enviado da comunidade a Paulo, e sua recuperação: “Estava às portas da morte, mas Deus compadeceu-se dele” (v. 27).

Para o Matrimônio, por fim, a leitura sugerida da nossa Carta é Fl 4,4-9 [5], com o convite à alegria e a exortação à virtude, como vimos acima.

Quanto aos Sacramentais, consideremos primeiramente aqueles que dizem respeito à consagração de pessoas, com duas ocorrências da nossa Carta dentre as opções de leituras ad libitum (à escolha):

No novo rito da Instituição de Catequistas (De Institutione Catechistarum), promulgado pelo Dicastério para o Culto Divino em dezembro de 2021, propõe-se a leitura de Fl 4,4-9, destacando-se aqui a exortação do v. 9: “Praticai o que aprendestes”.

Para a Consagração das virgens e a Profissão religiosa, celebrações que compartilham as mesmas opções de leituras, propõem-se dois textos de Filipenses [6]:
- Fl 2,1-4: a exortação do Apóstolo à unidade, fundamental na vida religiosa: “Vivei em harmonia, procurando a unidade” (v. 3);
- Fl 3,8-14: o convite a “esquecer o que ficou para trás” e a lançar-se “para frente”, isto é, para Cristo.

Deste último texto é tomada também uma das opções de aclamação ao Evangelho para essas celebrações: “Em tudo considero como perda e lixo, a fim de ganhar Cristo e ser achado n’Ele” (Fl 3,8-9) [7].

Ainda em relação aos Sacramentais, contemplemos as bênçãos de pessoas, lugares e objetos, nas quais identificamos seis leituras da Carta à escolha:

- Bênção de noivos: Fl 2,1-5 [8], a exortação a viver “unidos no mesmo amor”.

- Bênção de idosos: Fl 3,20–4,1 [9], onde o Apóstolo exorta: “Permanecei firmes no Senhor”, pois “nós somos cidadãos do céu”.

Ruínas de um batistério na cidade de Filipos

- Bênção de edifício sede de comunicação: Fl 4,8-9 [10], com uma exortação à ética nas comunicações: “Irmãos, ocupai-vos com tudo que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso...” (v. 8).

- Bênção de instalações esportivas: Fl 3,12-15 [11], aqui, como na Primeira Carta aos Coríntios, Paulo usa a metáfora do esporte, afirmando: “Corro direto para a meta, rumo ao prêmio, que, do alto, Deus me chama a receber em Cristo Jesus” (v. 14).

Congresso Eucarístico 2024: Texto base (2)

De 08 a 15 de setembro de 2024 se celebra em Quito (Equador) o 53º Congresso Eucarístico Internacional, com o tema «Fraternidade para curar o mundo: “Todos vós sois irmãos” (Mt 23,8)».

Como fizemos com o Congresso Eucarístico de Budapeste (Hungria) em 2021, estamos publicando aqui no blog o texto base, dividido em três partes. Após a primeira postagem com a Introdução (nn. 1-11) e o Capítulo I (nn. 12-21), confira a seguir o Capítulo II do documento (nn. 22-39).

Para saber mais, confira nossa postagem sobre a história dos Congressos Eucarísticos Internacionais.

53° Congresso Eucarístico Internacional - Quito (Equador)
08-15 de setembro de 2024
Texto base: Fraternidade para curar o mundo
«Todos vós sois irmãos» (Mt 23,8)

2. A fraternidade realizada em Cristo
«Vede como é bom e agradável que os irmãos vivam unidos!» (Sl 132,1)

22. Já o povo de Israel na sua peregrinação cantava a alegria do caminho fraterno. É a consciência de que a união da humanidade, na riqueza da diversidade, encontra sua origem no próprio Deus. Rostos, culturas, línguas e pensamentos “caminham juntos” rumo a Deus, princípio e meta da vida [23].


A Eucaristia, recapitulação da história
23. Nosso mundo ferido não foi abandonado à sua sorte, mas mereceu uma cura infinitamente maior do que a sua ferida. «Onde abundou o pecado, superabundou a graça» (Rm 5,20). Deus nos curou e nos tornou seus filhos, assumindo nossa natureza humana, no Filho, para que possamos participar da sua natureza divina. «Admirável intercâmbio! O Criador da humanidade, assumindo corpo e alma, quis nascer de uma Virgem. Feito homem, nos doou sua própria divindade!» [24].
Precisamente, onde a ferida do pecado construiu o reino da morte, Deus fez brotar a vida da ferida do lado de Cristo (cf. Jo 19,34). As chagas abertas de Cristo Crucificado são, no seio da história, a ferida de amor que cura as outras feridas do ódio e da violência que desfiguram nossas existências, privando-nos da identidade de filhos e irmãos. Assim o Verbo, ao fazer-se homem, redimiu toda a criação, porque o ser de Deus é criar e salvar.

“Abbá!”, grito fraterno dos filhos no Filho
24. A existência de Jesus está marcada por uma relação de intimidade e confiança com Deus, a quem chama “Abbá” (cf. Mt 6,9-13; Lc 11,1-4), expressão de proximidade nunca vista na espiritualidade judaica daquele tempo. Se a serpente desfigurou a imagem bondosa de Deus no Éden, fazendo com que o pecado rompesse o diálogo de vida com Adão e Eva, agora é Jesus, o Filho amado, que cura essa ferida de desobediência, autossuficiência e rebeldia com sua vida oferecida ao Pai até o fim na Cruz.
Ao mesmo tempo, a invocação do Pai é sempre fraterna, ou seja, “nosso”. Jesus ensinou seus discípulos a chamar Deus de «Pai nosso» (Mt 6,9). Somos filhos e, portanto, irmãos. Este “nós” é a comunidade eclesial, chamada a reconhecer, amadurecer e alimentar atitudes de fraternidade.

terça-feira, 27 de agosto de 2024

Ângelus: XXI Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 25 de agosto de 2024

Amados irmãos e irmãs, bom domingo!
Hoje o Evangelho da Liturgia (Jo 6,60-69) relata-nos a famosa resposta de São Pedro, que diz a Jesus: «A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna» (v. 68). Que bela resposta! É uma linda expressão, que testemunha a amizade e a confiança que o ligam a Cristo, juntamente com os outros discípulos. « A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna». Que bonito!

Pedro pronuncia-a em um momento crítico, porque Jesus acaba de terminar um discurso no qual diz Ele que é o “pão que desceu do céu” (v. 41): é uma linguagem difícil de compreender e muitos, mesmo os discípulos que o seguiam, abandonaram-no, pois não compreendiam.

Os Doze, porém, não o fizeram: ficaram, porque n’Ele encontraram “palavras de vida eterna”. Ouviram-no pregar, viram os milagres que fez e continuaram a partilhar com Ele os momentos públicos e a intimidade da vida quotidiana (cf. Mc 3,7-19).

Os discípulos nem sempre compreendem o que o Mestre diz e faz; por vezes têm dificuldade em aceitar os paradoxos do seu amor (cf. Mt 5,38-48), as exigências extremas da sua misericórdia (cf. Mt 18,21-22), a radicalidade do seu modo de se doar a todos. Não é fácil para eles compreender, mas são fiéis. As opções de Jesus muitas vezes vão além da mentalidade comum, dos próprios cânones da religião institucional e das tradições, a ponto de criar situações provocatórias e embaraçosas (cf. Mt 15,12). Não é fácil segui-lo.

Mas, entre os muitos mestres daquele tempo, Pedro e os outros Apóstolos encontram só n’Ele a resposta à sede de vida, à sede de alegria, à sede de amor que os anima; só graças a Ele experimentam a plenitude de vida que procuram, para além dos limites do pecado e até da morte. Por isso não se vão embora: pelo contrário, todos, exceto um, mesmo entre muitas quedas e arrependimentos, permanecerão com Ele até ao fim (cf. Jo 17,12).

E, irmãos e irmãs, isto diz respeito igualmente a nós: também para nós não é fácil seguir o Senhor, compreender o seu modo de agir, fazer nossos os seus critérios e os seus exemplos. Também para nós não é fácil. No entanto, quanto mais nos aproximarmos d’Ele - quanto mais aderirmos ao seu Evangelho, recebermos a sua graça nos sacramentos, permanecermos na sua companhia na oração, o imitarmos na humildade e na caridade - tanto mais experimentaremos a beleza de tê-lo como Amigo, e compreenderemos que só Ele tem “palavras de vida eterna”.

Então perguntemo-nos: até que ponto Jesus está presente na minha vida? Até que ponto me deixo tocar e provocar pelas suas palavras? Posso dizer que elas são também para mim “palavras de vida eterna”? A ti, irmão, irmã, pergunto: as palavras de Jesus são para ti - também para mim - palavras de vida eterna

Maria, que acolheu Jesus, o Verbo de Deus, na sua carne, nos ajude a escutá-lo e a nunca o deixar.

Jesus e Pedro no discurso de Cafarnaum
(Cristóbal de Villalpando) 

Fonte: Santa Sé.

segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Congresso Eucarístico 2024: Texto base (1)

De 08 a 15 de setembro de 2024 se celebra em Quito (Equador) o 53º Congresso Eucarístico Internacional, com o tema «Fraternidade para curar o mundo: “Todos vós sois irmãos” (Mt 23,8)».

Como fizemos com o Congresso Eucarístico de Budapeste (Hungria) em 2021, nos próximos dias publicaremos o texto base do Congresso, dividido em três partes. Nesta primeira postagem trazemos a Introdução (nn. 1-11) e o Capítulo I (nn. 12-21).

Para saber mais, confira nossa postagem sobre a história dos Congressos Eucarísticos Internacionais.

53° Congresso Eucarístico Internacional - Quito (Equador)
08-15 de setembro de 2024
Texto base: Fraternidade para curar o mundo
«Todos vós sois irmãos» (Mt 23,8)

Introdução: Um sonho de fraternidade
«Todos vós sois irmãos» (Mt 23,8)

1. Com estas palavras de Jesus no Evangelho de São Mateus, o Papa Francisco quis iluminar este 53º Congresso Eucarístico Internacional que vai se realizar na cidade de Quito, Equador [1]. É uma frase do Mestre exortando seus discípulos a tomar consciência da sua relação fraternal enquanto filhos de um mesmo Pai. A comunidade dos fiéis, por vocação divina, é chamada a fundamentar suas relações humanas no amor fraterno, relações de fraternidade que devem ser sinal de esperança para um mundo fragmentado, um bálsamo necessário para sarar as feridas. Através da sua Igreja, que peregrina entre tantos povos, o Mestre recorda à sociedade contemporânea: «Todos vós sois irmãos» (Mt 23,8).


2. O contexto deste Congresso Eucarístico expressa a urgência da fraternidade para curar o mundo. Vários países da América Latina e de outros continentes sofrem internamente com a instabilidade sociopolítica. Permanecem ainda resquícios de um colonialismo histórico, violento e silencioso, que responde a interesses transnacionais de características imperialistas [2]. Sucedem constantemente manifestações populares que rejeitam um sistema econômico cada vez mais injusto, onde crescem a pobreza e a injustiça. «A pobreza e a desigualdade na América Latina são uma chaga que se aprofunda em vez de diminuir. A pandemia e suas consequências, o agravamento do contexto mundial nas esferas política, econômica e militar, assim como a polarização ideológica, parecem fechar as portas aos esforços de desenvolvimento e aos anseios de libertação» [3]. A Europa encontra-se abalada por uma guerra às suas portas, recordando o horror vivido no século XX com as grandes guerras mundiais e a divisão do Ocidente em dois grandes blocos com visões distintas da sociedade. Do Oriente Médio chegam notícias de crescente tensão e constante violência. Da África, oprimida pela pobreza endêmica, continuam a zarpar barcos cheios de migrantes que buscam refúgio em um “mundo” melhor. “Mundo” que muitas vezes é inalcançável, porque não se chega a porto seguro, morrendo nas águas do Mediterrâneo.

3. Não se trata apenas de curar as relações entre os diversos povos que habitam a face da terra, mas também de curar as feridas do coração humano que dificultam a paz e a reconciliação. É preciso que «demo-nos conta que estamos no mesmo barco, todos frágeis e desorientados, mas, ao mesmo tempo, importantes e necessários: todos chamados a remar juntos, todos necessitados de mútuo encorajamento. E, neste barco, estamos todos» [4]. Este momento de graça, como é um Congresso Eucarístico, nos permite reavivar o dom de Deus e reconhecer que todos os povos, abraçados pelo amor eucarístico que brota do Coração de Cristo, são irmãos, filhos de um mesmo Pai, construtores de fraternidade. Fraternidade entre os homens e fraternidade com a criação.

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Festa de Santo Estêvão da Hungria em Budapeste (2024)

No dia 20 de agosto de 2024 o Cardeal Péter Erdő, Arcebispo de Esztergom-Budapeste (Hungria), presidiu a Santa Missa da Solenidade de Santo Estêvão, Rei da Hungria (Szent István), padroeiro do país, na Basílica Co-Catedral de Santo Estêvão em Budapeste [1].

A homilia, por sua vez, ficou a cargo de Dom Aurel Percă, Arcebispo de Bucareste (Romênia).

Na ocasião foi exposta à veneração a relíquia da mão direita do santo (Szent Jobb), grande promotor da evangelização dos húngaros em torno ao ano 1000. Contudo, devido às condições climáticas, não foi possível realizar a tradicional procissão com a relíquia pelas ruas da cidade.

Relíquia da mão de Santo Estêvão
Procissão de entrada
Incensação
Ritos iniciais
Evangelho

quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses (2)

“Só uma coisa importa: vivei à altura do Evangelho” (Fl 1,27).

Em nossa postagem anterior desta série sobre a leitura litúrgica dos livros da Sagrada Escritura iniciamos o estudo da presença da Carta de São Paulo aos Filipenses (Fl) nas celebrações do Rito Romano.

Após uma breve introdução, começamos a analisar sua leitura sob o critério da composição harmônica, isto é, da sintonia com o tempo ou a festa litúrgica (cf. Elenco das Leituras da Missa, n. 66) [1] na Celebração Eucarística. Para acessar a primeira parte, clique aqui.

Tendo considerado os diversos tempos do Ano Litúrgico, nesta postagem prosseguiremos com as Missas dos santos, para diversas necessidades e votivas.

“Ao nome de Jesus todo joelho se dobre” (Fl 2,10)

2. Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses: Composição harmônica

a) Celebração Eucarística

Iniciamos esta segunda parte da nossa pesquisa com o Próprio dos Santos, que inclui as celebrações do Senhor, da Virgem Maria e dos Santos com data fixa no calendário.

Encontramos a Carta aos Filipenses antes de tudo na Memória facultativa do Santíssimo Nome de Jesus (03 de janeiro), suprimida pela reforma litúrgica e resgatada na 3ª edição do Missal Romano. Nesta celebração o célebre “hino” da Carta está presente na leitura (Fl 2,6-11) e na antífona de entrada: “Ao nome de Jesus todo joelho se dobre no céu, na terra e nos abismos, e toda língua proclame, para a glória de Deus Pai, que Jesus Cristo é o Senhor” (Fl 2,10-11).

A mesma antífona é proferida na Memória de Santo Inácio de Loyola, Presbítero (31 de julho), remetendo ao lema da Congregação fundada por Santo Inácio, a Companhia de Jesus: “Ad maiorem Dei gloriam” (Para maior glória de Deus) [2].

A leitura do “hino cristológico” de Fl 2,6-11 é indicada também na Festa da Exaltação da Santa Cruz (14 de setembro), como 2ª leitura quando a Festa cai em um domingo e como leitura à escolha quando cai em um dia de semana [3], destacando-se aqui a referência explícita à cruz, que se considera um acréscimo de Paulo ao hino: “Fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz” (v. 8).

Quanto às celebrações dos santos, vale destacar a antífona da Comunhão da Festa de Santa Rosa de Lima, Virgem (23 de agosto), padroeira da América Latina: “Considero perda todas as coisas, comparadas com o valor insuperável do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor...” (Fl 3,8-9) [4].

Na Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos (02 de novembro), por sua vez, dentre as várias opções de leituras ad libitum (à escolha), consta Fl 3,20-21 [5]. Aqui o Apóstolo Paulo atesta: “Nós somos cidadãos do céu” (v. 20), recordando que Cristo glorificará o nosso corpo, isto é, nos ressuscitará. As leituras dessa celebração são indicadas também para o sacramental das Exéquias.

Dessa leitura é tomada uma das opções de aclamação ao Evangelho: “A nossa cidade é nos céus, de onde também esperamos o Cristo Jesus, Senhor nosso” (cf. Fl 3,20) [6]; e uma das opções de antífona da Comunhão para as Missas dos defuntos: “Esperamos como Salvador o Senhor Jesus Cristo; Ele transformará o nosso corpo mortal num corpo glorioso como o seu” (Fl 3,20-21) [7].

Na sequência consideremos o Comum dos Santos, com formulários para as várias “categorias” de santos. No Comum dos Santos propriamente dito há duas opções de leituras à escolha da nossa Carta:
- Fl 3,8-14, com a “definição” de santidade como “correr para alcançar Cristo” (v. 12);
- Fl 4,4-9, com a exortação a praticar a virtude, isto é, “tudo que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso...” [8].

São Paulo e seus discípulos
(Com as Cartas aos Romanos, Coríntios e Filipenses)

Prosseguimos com as Missas para diversas necessidades, igualmente com várias opções de leituras ad libitum (à escolha), incluindo os seguintes textos da nossa Carta:

- Missa por um Concílio ou Sínodo: Fl 2,1-4 [9], com a exortação do Apóstolo à unidade: “Aspirai à mesma coisa, unidos no mesmo amor; vivei em harmonia, procurando a unidade” (v. 3).

- Missa pelos religiosos: O mesmo texto acima, Fl 2,1-4, com a exortação à unidade, fundamental na vida comunitária [10].

terça-feira, 20 de agosto de 2024

Assunção de Maria no Santuário de Kalwaria (2024)

No Santuário de Kalwaria Zebrzydowska (Sanktuarium w Kalwarii Zebrzydowskiej), na Arquidiocese de Cracóvia (Polônia), a Solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria é celebrada na sexta-feira e no domingo após o dia 15 de agosto como uma espécie de “Páscoa mariana”:

Na sexta-feira, dia 16 de agosto de 2024, foram celebradas as Vésperas, a procissão e a Santa Missa em honra da Dormição de Maria, presididas pelo Arcebispo de Cracóvia, Dom Marek Jędraszewski.

No domingo, dia 18 de agosto, por sua vez, teve lugar a Santa Missa em honra da Assunção de Maria, igualmente presidida por Dom Marek.

Sexta-feira, 16 de agosto:
Vésperas, procissão e Missa em honra da Dormição de Maria

Imagem de Maria morta
Oração das Vésperas

Bênção
Procissão

Ângelus: XX Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 18 de agosto de 2024

Queridos irmãos e irmãs, bom domingo!
Hoje o Evangelho fala-nos de Jesus, que afirma com simplicidade: «Eu sou o pão vivo, que desceu do céu» (Jo 6,51). Perante a multidão, o Filho de Deus identifica-se com o alimento mais comum e quotidiano, o pão: “Eu sou o pão”. Entre os ouvintes, alguns começam a discutir: como pode Jesus dar-nos a comer a sua própria carne? (v. 52). Também nós hoje fazemos esta pergunta, mas com admiração e gratidão. Eis duas atitudes sobre as quais refletir: a admiração e a gratidão, diante do milagre da Eucaristia.

Primeiro: a admiração, porque as palavras de Jesus nos surpreendem. Mas Jesus surpreende-nos sempre, sempre. Ainda hoje, na nossa vida, Jesus surpreende-nos sempre. O pão do céu é um dom que supera qualquer expectativa. Aqueles que não compreendem o estilo de Jesus permanecem desconfiados: parece impossível, até desumano, comer a carne de outro (v. 54). A carne e o sangue, ao contrário, são a humanidade do Salvador, a sua própria vida oferecida como alimento para a nossa.

E isto leva-nos à segunda atitude: gratidão. Primeiro a admiração, agora a gratidão, porque reconhecemos Jesus ali onde Ele se faz presente para nós e conosco. Ele se faz pão para nós. “Quem comer a minha carne permanece em mim e Eu nele” (v. 56). O Cristo, verdadeiro homem, sabe bem que é preciso comer para viver. Mas sabe também que isto não é suficiente. Depois de ter multiplicado o pão terreno (cf. Jo 6,1-14), prepara um dom ainda maior: Ele mesmo se torna verdadeira comida e verdadeira bebida (v. 55). Obrigado, Senhor Jesus! Com o coração, podemos dizer: obrigado, obrigado.

O pão celeste, que vem do Pai, é precisamente o Filho feito carne para nós. Este alimento é mais do que necessário para nós, porque sacia a fome de esperança, a fome de verdade, a fome de salvação que todos nós sentimos não no estômago, mas no coração. A Eucaristia é necessária, para todos.

Jesus cuida da maior necessidade: salva-nos, alimentando a nossa vida com a sua, e isto para sempre. E, graças a Ele, podemos viver em comunhão com Deus e uns com os outros. O pão vivo e verdadeiro não é, portanto, algo mágico, não, não é algo que, de repente, resolve todos os problemas, mas é o próprio Corpo de Cristo, que dá esperança aos pobres e vence a arrogância daqueles que se empanturram em detrimento deles.

Perguntemo-nos então, irmãos e irmãs: tenho fome e sede de salvação, não só para mim, mas para todos os meus irmãos e irmãs? Quando recebo a Eucaristia, que é o milagre da misericórdia, sei admirar-me com o Corpo do Senhor, que morreu e ressuscitou por nós?

Rezemos juntos à Virgem Maria, para que nos ajude a receber o dom do céu no sinal do pão.

Cristo, pão da vida
(Josep Vergara)

Fonte: Santa Sé.

(Observação: Neste domingo celebramos no Brasil a Solenidade da Assunção de Maria, transferida do dia 15 de agosto).

segunda-feira, 19 de agosto de 2024

Solenidade da Assunção de Maria em Budapeste (2024)

O Cardeal Péter Erdő, Arcebispo de Esztergom-Budapeste (Hungria), presidiu no dia 15 de agosto de 2024 a Santa Missa da Solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria na Catedral Basílica da Assunção de Maria e Santo Adalberto em Esztergom:

Procissão de entrada
Incensação

Homilia
Apresentação das oferendas

Solenidade da Assunção de Maria em Cracóvia (2024)

No dia 15 de agosto de 2024 o Arcebispo de Cracóvia (Polônia), Dom Marek Jędraszewski, presidiu as Missas da Solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria: pela manhã junto ao Santuário de Nossa Senhora de Ludźmierz, próximo à cidade de Nowy Targ, e à tarde na Basílica de Santa Maria em Cracóvia.

Nas duas celebrações, como de costume, o Arcebispo abençoou as flores e ervas medicinais, tradição que remonta à Idade Média e que se conserva em alguns lugares.

15 de agosto: Missa no Santuário de Ludźmierz

Procissão de entrada


Incensação do altar

Homilia

sábado, 17 de agosto de 2024

Solenidade da Assunção de Maria em Jerusalém (2024)

Entre os dias 14 e 15 de agosto de 2024 o Custódio da Terra Santa, Padre Francesco Patton, presidiu as celebrações da Solenidade da Assunção da Virgem Maria no Monte das Oliveiras, em Jerusalém.

Na noite do dia 14 teve lugar a Vigília da Assunção e a procissão com a imagem de Maria morta do Horto das Oliveiras até a Basílica da Agonia do Senhor no Getsêmani, a Basílica das Nações.

No dia 15, por sua vez, o Custódio presidiu a Santa Missa na Basílica das Nações, seguida da procissão com a imagem de Maria assunta, concluindo com uma súplica pela paz na Terra Santa e em todo o mundo.

À tarde, por fim, teve lugar a oração das II Vésperas da Solenidade na Gruta dos Apóstolos, próxima à Basílica, seguida da visita à igreja da Tumba de Maria, sob responsabilidade dos ortodoxos.

14 de agosto: Vigília da Assunção

Imagem de Maria morta
Procissão de entrada

Incensação da imagem
Vigília da Assunção

Ângelus: Solenidade da Assunção de Maria (2024)

Solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria
Papa Francisco
Ângelus
Quinta-feira, 15 de agosto de 2024


Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje celebramos a Solenidade da Assunção da Virgem Maria e, no Evangelho da Liturgia (Lc 1,39-56), contemplamos a jovem de Nazaré que, logo que recebeu o anúncio do Anjo, pôs-se a caminho para visitar a sua prima.

É bela esta expressão do Evangelho: “pôs-se a caminho” (v. 39). Significa que Maria não considera um privilégio a notícia que recebeu do Anjo, mas, pelo contrário, sai de casa e põe-se a caminho, com a pressa de quem quer anunciar aos outros aquela alegria e com a ânsia de se pôr ao serviço da prima. Esta primeira viagem, na realidade, é uma metáfora de toda a sua vida, porque a partir daquele momento, Maria estará sempre a caminho: estará sempre a caminho no seguimento de Jesus, como discípula do Reino. E, no fim, a sua peregrinação terrena termina com a Assunção ao Céu, onde, juntamente com o seu Filho, goza para sempre da alegria da vida eterna.

Irmãos e irmãs, não devemos imaginar Maria «como uma estátua de cera imóvel», mas nela podemos ver uma «irmã... com as sandálias gastas... e com tanto cansaço» (C. Carretto, Beata te che hai creduto, Roma, 1983, p. 13), por ter caminhado seguindo o Senhor e ao encontro dos irmãos, concluindo a sua viagem na glória do Céu. Deste modo, a Virgem Santíssima é aquela que nos precede no caminho - ela nos precede -, recordando a todos que também a nossa vida é um caminho, um caminho contínuo até a horizonte do encontro definitivo. Peçamos à Virgem Maria que nos ajude neste caminho rumo ao encontro com o Senhor.

Assunção de Maria (Giuseppe Craffonara)

Fonte: Santa Sé.

quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Homilia do Papa João Paulo II: Assunção de Maria (2004)

Há 20 anos, no dia 15 de agosto de 2004, o Papa São João Paulo II celebrou a Missa da Solenidade da Assunção da Bem-aventurada Virgem Maria no Santuário de Lourdes (França).

Esta foi sua última Viagem Apostólica fora da Itália, realizada no contexto dos 150 anos da proclamação do dogma da Imaculada Conceição de Maria (1854).

Reproduzimos a seguir sua homilia na ocasião e a oração proferida na véspera, dia 14, no final da oração do terço do rosário:

Peregrinação a Lourdes por ocasião dos 150 anos do dogma da Imaculada Conceição
Homilia do Papa João Paulo II
Santuário de Nossa Senhora de Lourdes
15 de agosto de 2004

1.Que soy era Immaculada Councepciou”. As palavras que Maria dirigiu a Bernadete, no dia 25 de março de 1858, ressoam com uma intensidade totalmente particular neste ano, durante o qual a Igreja celebra o 150º aniversário da solene definição do dogma proclamado pelo Beato Pio IX na Constituição Apostólica Ineffabilis Deus.

Desejei ardentemente realizar esta peregrinação a Lourdes para recordar um acontecimento que continua a glorificar a Trindade una e indivisa. A Imaculada Conceição de Maria constitui o sinal do amor gratuito do Pai, a expressão perfeita da redenção realizada pelo Filho, o ponto de partida de uma vida totalmente disponível à ação do Espírito.

São João Paulo II preside a Missa em Lourdes
(15 de agosto de 2004)

2. Sob o olhar maternal da Virgem, saúdo cordialmente todos vós, queridos irmãos e irmãs que viestes à Gruta de Massabielle para entoar os louvores daquela que todas as gerações proclamam bem-aventurada (cf. Lc 1,48).

Saúdo os Cardeais, os Bispos e os sacerdotes. Obrigado pela vossa presença. Saúdo de modo particular os peregrinos franceses e os seus Bispos, nomeadamente Dom Jacques Perrier, Bispo de Tarbes e Lourdes, a quem agradeço as amáveis palavras que me dirigiu no início desta celebração.

Saúdo também o Metropolita Emanuel, Presidente da Assembleia dos Bispos Ortodoxos da França. Saúdo o Senhor Ministro do Interior, que representa aqui o Governo francês, assim como as demais pessoas que fazem parte do grupo das autoridades civis e militares presentes.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 57

A 85ª e última Catequese do Papa São João Paulo II sobre Jesus Cristo foi dedicada aos frutos da Ascensão do Senhor.

Para acessar a postagem com a introdução e os links para todas as Catequeses, clique aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

85. Os frutos da Ascensão
João Paulo II - 19 de abril de 1989

1. O anúncio de Pedro no primeiro discurso pentecostal em Jerusalém é eloquente e solene: “A esse Jesus, Deus o ressuscitou, e disso nós todos somos testemunhas. E agora, exaltado à direita de Deus, Ele recebeu o Espírito Santo que fora prometido pelo Pai e o derramou” (At 2,32-33); “Portanto, que toda a casa de Israel reconheça com plena certeza: a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o constituiu Senhor e Cristo” (v. 36). Essas palavras, dirigidas à multidão composta pelos habitantes daquela cidade e pelos peregrinos vindos de diversas partes para a festa, proclamam a elevação de Cristo, Crucificado e Ressuscitado, “à direita de Deus”. A “elevação”, ou seja, a Ascensão ao céu, significa a participação de Cristo homem no poder e autoridade do próprio Deus. Tal participação no poder e autoridade de Deus Uno e Trino se manifesta no “envio” do Consolador, o Espírito da verdade, o qual, “recebendo” (cf. Jo 16,14) da redenção realizada por Cristo, opera a conversão dos corações humanos. Tanto é verdade que já naquele dia, em Jerusalém, “quando ouviram isso, ficaram com o coração comovido” (At 2,37). E sabe-se que em poucos dias ocorreram milhares de conversões.

O Ressuscitado é glorificado pelos anjos no céu
(Fra Angelico)

2. Com o conjunto dos eventos pascais, aos quais se refere o Apóstolo Pedro no discurso de Pentecostes, Jesus é revelado definitivamente como Messias enviado pelo Pai e como Senhor.
A consciência de que Ele é “o Senhor” entrou de alguma forma na mente dos Apóstolos já durante a atividade pré-pascal de Cristo. Ele mesmo alude a este fato na Última Ceia: “Vós me chamais de Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque Eu o sou” (Jo 13,13). Isto explica porque os evangelistas falam de Cristo “Senhor” como um dado comumente admitido nas comunidades cristãs. Lucas, em particular, põe esse termo já na boca do anjo que anuncia o nascimento de Jesus aos pastores: “Nasceu para vós o Salvador, que é o Cristo Senhor!” (Lc 2,11), e em vários outros lugares usa o mesmo apelativo (cf. Lc 7,13; 10,1.41; 11,39; 12,42; 13,15; 17,6; 22,61). Mas é certo que o conjunto dos eventos pascais consolidou definitivamente essa consciência. À luz desses eventos, a palavra “Senhor” deve ser lida também em referência à vida e atividade anterior do Messias. No entanto, é preciso aprofundar sobretudo o conteúdo e o significado que a palavra possui no contexto da elevação e da glorificação de Cristo Ressuscitado, na sua Ascensão ao céu.

quarta-feira, 14 de agosto de 2024

Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses (1)

“Tende em vós os mesmos sentimentos de Cristo Jesus” (Fl 2,5).

Em nossa série sobre a leitura litúrgica dos livros da Sagrada Escritura já contemplamos seis dos treze escritos atribuídos ao Apóstolo Paulo: as duas Cartas aos Tessalonicenses e as quatro “grandes Cartas” (a Carta aos Gálatas, as duas Cartas aos Coríntios e a Carta aos Romanos).

Dando continuidade à proposta, iniciaremos uma análise das três “Cartas do cativeiro”, com importantes reflexões sobre Cristo e a Igreja: Filipenses, Colossenses e Efésios. Começaremos pela Carta aos Filipenses (Fl), Πρὸς Φιλιππησίους.

São Paulo na prisão escrevendo suas Cartas
(Rembrandt)

1. Breve introdução à Carta aos Filipenses

Segundo os Atos dos Apóstolos, a cidade de Filipos, na Macedônia, foi visitada por Paulo em sua “segunda viagem missionária” (anos 50-52), sendo a primeira comunidade fundada pelo Apóstolo na Europa (At 16,11-40).

A Carta teria sido escrita da prisão (cf. Fl 1,7.12-13); porém, não está claro de qual se trata. Nos Atos são relatadas duas prisões de Paulo: Cesareia entre 58 e 60 (At 23–26) e Roma entre 61 e 63 (At 28). Sugere-se ainda uma prisão em Éfeso entre os anos 54 e 56. Na Segunda Carta aos Coríntios escrita em torno do ano 57, Paulo já fala de “prisões” no plural (2Cor 11,23).

Embora a autoria paulina não seja questionada, discute-se acerca da unidade da Carta. O texto é marcado por um tom bastante afetuoso, familiar; porém há uma mudança brusca no início do capítulo 3, dedicado a correções e polêmicas. Assim, alguns estudiosos postulam a existência de duas ou até mesmo três cartas dentro de Filipenses.

Não obstante estas questões, a Carta pode ser estruturada em seis partes, “emolduradas” por uma introdução e uma conclusão:
a) Fl 1,1-11: Introdução, com a saudação (vv. 1-2) e a ação de graças (vv. 3-11);
b) Fl 1,12-26: Situação de Paulo na prisão;
c) Fl 1,27–2,18: Exortação a seguir o exemplo de Cristo;
d) Fl 2,19–3,1a: Projeto de enviar Timóteo e Epafrodito a Filipos;
e) Fl 3,1b–4,1: Advertência contra os “falsos mestres”;
f) Fl 4,2-9: Exortação à unidade e à alegria;
g) Fl 4,10-20: Agradecimento pelo auxílio enviado pelos filipenses;
h) Fl 4,21-23: Conclusão, com as saudações finais.

Merece destaque a segunda seção (Fl 1,27–2,18), com a exortação a seguir o exemplo de Cristo, na qual se encontra o importantíssimo hino cristológico, que poderíamos chamar de “hino ao Mistério Pascal” (Fl 2,6-11). Este é o mais antigo hino em honra a Cristo que foi conservado, tendo sido provavelmente entoado na Liturgia da comunidade cristã primitiva e adaptado pelo Apóstolo em sua Carta.

O hino estrutura-se em dois movimentos: a katabasis (rebaixamento) ou kenosis (esvaziamento) de Cristo nos vv. 6-8 e a sua anabasis (exaltação) nos vv. 9-11. Trata-se de uma síntese histórico-salvífica do mistério de Cristo celebrado na Liturgia: Encarnação, Paixão e Ressurreição (expressa no hino como “exaltação”).

Alguns estudiosos veem na kenosis de Cristo um paralelo com Adão (imagem presente na Primeira Carta aos Coríntios e na Carta aos Romanos): enquanto Adão, sendo homem, quis se tornar igual a Deus, Jesus, sendo Deus, se fez homem.

Quanto ao tema dos “falsos mestres” no capítulo 3, chamados por Paulo de “maus operários” (v. 2) e “inimigos da cruz” (v. 18), parecem ser grupos de judaizantes (como na Carta aos Gálatas), uma vez que Paulo apresenta suas “credenciais” judaicas, afirmando que o mais importante é o conhecimento e o amor de Cristo (vv. 7-11).

Além disso, podemos supor que havia divisões internas na própria comunidade, dado que o Apóstolo insiste diversas vezes na importância da unidade e da humildade, recorrendo ao exemplo de Cristo, como vimos acima.

Para saber mais, confira a bibliografia indicada no final da postagem.

Restos arqueológicos da cidade de Filipos

2. Leitura litúrgica da Carta aos Filipenses: Composição harmônica

Como fizemos com as demais Cartas Paulinas, analisaremos a leitura litúrgica de Filipenses a partir dos dois critérios de seleção dos textos indicados no n. 66 do Elenco das Leituras da Missa (ELM): a composição harmônica e a leitura semicontínua [1].

Iniciamos nosso percurso com o critério da composição harmônica, isto é, a escolha do texto por sua sintonia com o tempo ou a festa litúrgica.

terça-feira, 13 de agosto de 2024

Ângelus: XIX Domingo do Tempo Comum - Ano B

Papa Francisco
Ângelus
Domingo, 11 de agosto de 2024

Queridos irmãos e irmãs, bom domingo!
O Evangelho da Liturgia de hoje (Jo 6,41-51) fala-nos da reação dos judeus à afirmação de Jesus que diz: «Eu desci do céu» (v. 38). Ficam escandalizados.

Murmuram entre eles: «Não é este Jesus, o filho de José? Não conhecemos seu pai e sua mãe? Como então pode dizer que desceu do céu?» (v. 42). E assim murmuram. Prestemos atenção ao que dizem. Estão convencidos de que Jesus não pode vir do céu, porque é filho de um carpinteiro e porque a sua mãe e os seus parentes são pessoas comuns, conhecidas, normais, como tantas outras. «Como Deus pode se manifestar de uma forma tão vulgar?», dizem. São bloqueados na sua fé por preconceitos sobre a sua origem humilde e também bloqueados pela presunção, portanto, de que não têm nada a aprender com Ele. Preconceitos e presunção, como nos fazem mal! Impedem o diálogo sincero, o encontro entre irmãos: cuidado com os preconceitos e a presunção! Têm os seus esquemas rígidos, e não há lugar no seu coração para o que não se enquadra neles, para o que não conseguem catalogar e arquivar nas prateleiras poeirentas da sua segurança. E isto é verdade: muitas vezes as nossas seguranças estão fechadas, empoeiradas, como livros velhos.

No entanto, trata-se de pessoas que cumprem a lei, dão esmolas, respeitam jejuns e tempos de oração. De fato, Cristo já realizou vários milagres (cf. Jo 2,1-11; 4,43-54; 5,1-9; 6,1-25). Por que tudo isto não os ajuda a reconhecer que Ele é o Messias? Porque não os ajuda? Porque realizam as suas práticas religiosas não tanto para escutar o Senhor, mas para encontrar nelas uma confirmação do que pensam. Estão fechados à Palavra do Senhor e procuram a confirmação dos seus pensamentos. Demonstra-o o fato de nem sequer se darem ao trabalho de pedir explicações a Jesus: limitam-se a murmurar entre si contra Ele (cf. Jo 6,41), como que para se tranquilizarem mutuamente daquilo de que estão convencidos, e fecham-se em si mesmos, encerrados em uma fortaleza impenetrável. E assim não conseguem acreditar. O fechamento do coração: como dói, como dói!

Prestemos atenção a tudo isto, porque às vezes pode acontecer o mesmo conosco, na nossa vida e na nossa oração: pode acontecer-nos, isto é, em vez de escutarmos verdadeiramente o que o Senhor tem para nos dizer, procurarmos dele e dos outros apenas uma confirmação daquilo que pensamos, uma confirmação das nossas convicções, dos nossos juízos, que são pré-juízos. Mas esta maneira de nos dirigirmos a Deus não nos ajuda a encontrá-lo, a encontrá-lo verdadeiramente, nem a abrirmo-nos ao dom da sua luz e da sua graça, a crescer no bem, a fazer a sua vontade e a superar fechamentos e dificuldades. Irmãos e irmãs, a fé e a oração, quando são verdadeiras, abrem a mente e o coração, não os fecham. Quando se encontra uma pessoa que é fechada na mente, na oração, essa fé e essa oração não são verdadeiras.

Perguntemo-nos então: na minha vida de fé, sou capaz de fazer verdadeiramente silêncio dentro de mim e de escutar Deus? Estou disposto a acolher a sua voz para além dos meus esquemas e também, com a sua ajuda, a superar os meus temores?
Maria nos ajude a escutar com fé a voz do Senhor e a fazer a sua vontade com coragem.

Jesus prega junto à sinagoga de Cafarnaum
(Wilhelm Kotarbinski)

Fonte: Santa Sé.

quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio: Jesus Cristo 56

A última seção das Catequeses do Papa São João Paulo II sobre Jesus Cristo foi dedicada à Ascensão do Senhor (nn. 83-85). Reproduzimos a seguir as primeiras duas meditações, sobre a Ascensão como mistério anunciado e realizado.

Confira a Introdução e o índice de todas as Catequeses clicando aqui.

Catequeses do Papa João Paulo II sobre o Creio
CREIO EM JESUS CRISTO

VI. Ascensão de Cristo

83. Ascensão: Mistério anunciado
João Paulo II - 05 de abril de 1989

1. Os mais antigos Símbolos da fé põem após o artigo sobre a Ressurreição de Cristo aquele sobre sua Ascensão. A este respeito os textos evangélicos relatam que Jesus Ressuscitado, depois de ter permanecido com seus discípulos por quarenta dias, com várias aparições e em lugares diversos, subtraiu-se plena e definitivamente às leis do tempo e do espaço para subir ao céu, completando assim o “retorno ao Pai” iniciado já com a Ressurreição dos mortos.

Nesta Catequese veremos como Jesus anunciou sua Ascensão (ou retorno ao Pai), falando dela com a Madalena e com os discípulos nos dias pascais e pré-pascais.

2. Encontrando a Madalena depois da Ressurreição, Jesus lhe disse “Não me segures! Eu ainda não subi para junto do Pai; mas vai dizer aos meus irmãos que Eu subo para junto do meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” (Jo 20,17).

Ascensão, detalhe (Benjamin West)

Esse mesmo anúncio Jesus o fez várias vezes aos seus discípulos no período pascal, especialmente durante a Última Ceia, “sabendo que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai... sabendo que o Pai tinha entregue tudo em suas mãos e que saíra de junto de Deus e para Deus voltava” (Jo 13,1-3). Jesus certamente tinha em mente a sua morte já próxima e, no entanto, olhava mais além e disse essas palavras na perspectiva da sua próxima partida, do seu retorno ao Pai mediante a Ascensão ao céu: “Vou para Aquele que me enviou” (Jo 16,5); “Vou para o Pai e não mais me vereis” (v. 10). Os discípulos não compreenderam bem, na ocasião, o que Jesus tinha em mente, muito menos quando Ele disse de forma misteriosa: “Vou, mas voltarei a vós”, e acrescentou: “Se me amásseis, ficaríeis alegres porque vou para o Pai, pois o Pai é maior do que Eu” (Jo 14,28). Após a Ressurreição, essas palavras se tornaram mais compreensíveis e transparentes para os discípulos, como anúncio da sua Ascensão ao céu.