Santa Missa com Ordenações Presbiterais
Homilia do Papa Leão XIV
Basílica de São Pedro
Sábado, 31 de maio de 2025
Foi celebrada a Missa Ritual das Ordenações, com leituras próprias (At 20,17-18a.28-32.36; Sl 109; 2Cor 5,14-20; Jo 17,6.14-19).
Amados irmãos e irmãs!
Hoje é um dia de grande alegria para a
Igreja e para cada um de vós, ordenandos presbíteros, com os vossos familiares,
amigos e companheiros de caminho durante os anos de formação. Como o Rito da
Ordenação realça em várias passagens, a relação entre o que hoje celebramos e o
povo de Deus é fundamental. A profundidade, a amplitude e até a duração do
júbilo divino que agora partilhamos são diretamente proporcionais aos vínculos
que existem e crescerão entre vós, ordenandos, e o povo do qual provindes, do
qual permaneceis parte e ao qual sois enviados. Meditarei sobre este aspecto,
tendo sempre presente que a identidade do sacerdote depende da união com
Cristo, sumo e eterno sacerdote.
Somos povo de Deus. O Concílio Vaticano
II tornou mais viva esta consciência, praticamente antecipando um tempo em
que a pertença se tornaria mais frágil e o sentido de Deus mais rarefeito. Sois
testemunhas de que Deus não se cansou de reunir os seus filhos, por mais
diversos que sejam, e de constituí-los em uma unidade dinâmica. Não se trata de
uma ação impetuosa, mas daquela brisa suave que devolveu a esperança ao profeta
Elias na hora do desânimo (cf. 1Rs 19,12). A alegria de
Deus não é ruidosa, mas muda verdadeiramente a história, aproximando-nos uns
dos outros. Um ícone disto é o mistério da Visitação, que a Igreja contempla no
último dia de maio. Do encontro entre a Virgem Maria e a prima Isabel vemos brotar
o Magnificat, cântico de um povo visitado pela graça.
As leituras recém proclamadas ajudam-nos a
interpretar o que acontece também entre nós. Em primeiro lugar, no Evangelho,
Jesus não nos aparece esmagado pela morte iminente, nem pela desilusão de laços
interrompidos ou inacabados. Pelo contrário, o Espírito Santo intensifica estes
laços ameaçados. Na oração, eles tornam-se mais fortes do que a morte. Em vez
de pensar no seu destino pessoal, Jesus coloca nas mãos do Pai os vínculos que
construiu aqui na terra. Nós fazemos parte deles! Com efeito, o Evangelho
chegou até nós através de laços que o mundo pode desgastar, mas não destruir.
Prezados ordenandos, concebei-vos a vós
mesmos, portanto, à maneira de Jesus! Ser de Deus - servos de Deus, povo de
Deus - liga-nos à terra: não a um mundo ideal, mas ao real. Como Jesus, são
pessoas de carne e osso que o Pai coloca no vosso caminho. Consagrai-vos a
elas, sem vos separar delas, sem vos isolardes, sem fazer do dom recebido uma
espécie de privilégio. O Papa Francisco advertiu-nos muitas vezes contra isso,
pois a autorreferencialidade extingue o fogo do espírito missionário.
A Igreja é constitutivamente extrovertida,
como extrovertidas são a vida, a Paixão, a Morte e a Ressurreição de Jesus.
Fareis vossas as suas palavras em cada Eucaristia: é «por vós e por todos». Ninguém
jamais viu a Deus. Ele veio ao nosso encontro, saiu de si mesmo. O Filho
tornou-se a exegese, a narração viva. E concedeu-nos o poder de nos tornarmos
filhos de Deus. Não procureis, não procuremos outro poder!
O gesto da imposição das mãos, com o qual
Jesus acolhia as crianças e curava os doentes, renove em vós o poder libertador
do seu ministério messiânico. Nos Atos
dos Apóstolos, aquele gesto que em
breve repetiremos é a transmissão do Espírito criador. Assim, o Reino de Deus
põe agora em comunhão as vossas liberdades pessoais, dispostas a sair de si
mesmas, enxertando as vossas inteligências e as vossas forças jovens na missão
jubilar que Jesus transmitiu à sua Igreja.
Na sua saudação aos anciãos da comunidade de
Éfeso, da qual ouvimos alguns fragmentos na 1ª Leitura, Paulo transmite-lhes o
segredo de cada missão: «O Espírito Santo vos constituiu como guardiões» (At 20,28).
Não senhores, mas guardiões! A missão é de Jesus! Ele ressuscitou: portanto,
está vivo e precede-nos. Nenhum de nós é chamado a substituí-lo. O dia da
Ascensão educa-nos para a sua presença invisível. Ele confia em nós,
concede-nos espaço; chegou a dizer: «É bom para vós que Eu parta» (Jo 16,7).
Estimados ordenandos, também nós Bispos, envolvendo-vos hoje na missão, vos
concedemos espaço. E vós, dai espaço aos fiéis e a cada criatura, de quem o
Ressuscitado está próximo e em quem gosta de nos visitar e surpreender. O povo
de Deus é mais numeroso do que vemos. Não definamos os seus confins!
De São Paulo, daquele seu comovente discurso
de despedida, gostaria de frisar uma segunda palavra. Na realidade, ela precede
todas as outras. Ele pode dizer: «Vós bem sabeis de que modo me comportei em
relação a vós durante todo o
tempo» (At 20,18). Conservemos esta expressão bem gravada no
coração e na mente! «Vós bem sabeis de que modo me comportei»: a transparência
da vida. Vidas conhecidas, vidas legíveis, vidas credíveis! Permaneçamos no
seio do povo de Deus para poder estar diante dele com testemunho credível.
Juntos, portanto, reconstruiremos a
credibilidade de uma Igreja ferida, enviada a uma humanidade ferida, no seio de
uma criação ferida. Ainda não somos perfeitos, mas é preciso ser credível!
Jesus Ressuscitado mostra-nos as suas
feridas e, embora elas sejam sinal de rejeição por parte da humanidade,
perdoa-nos e envia-nos. Não nos esqueçamos disto! Hoje Ele sopra também sobre
nós (cf. Jo 20,22), tornando-nos
ministros de esperança. «Doravante não conhecemos ninguém conforme a natureza
humana» (2Cor 5,16): tudo o que, aos nossos olhos, está quebrado e
perdido aparece-nos agora no sinal da reconciliação.
«Porque o amor de Cristo nos possui» (cf. 2Cor 5,14), caros irmãos e irmãs! É uma posse que liberta e que nos permite
não possuir ninguém. Libertar, não possuir! Somos de Deus: não há maior riqueza
a apreciar e partilhar! É a única riqueza que, compartilhada, se multiplica.
Queremos levá-la, juntos, ao mundo que Deus amou de tal modo que deu o seu
Filho único (cf. Jo 3,16).
Assim, está cheia de sentido a vida
oferecida por estes irmãos, que em breve serão ordenados presbíteros.
Agradeçamos-lhes e demos graças a Deus que os chamou ao serviço de um povo
inteiramente sacerdotal. Com efeito, juntos unimos o céu e a terra. Em Maria,
Mãe da Igreja, resplandece este sacerdócio comum que eleva os humildes, une as
gerações e nos faz chamar bem-aventurados (cf. Lc 1,48.52).
Que ela, Nossa Senhora da Confiança, Mãe da Esperança, interceda por nós!
Fonte: Santa Sé.
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