CELEBRAÇÃO
DAS VÉSPERAS
NA SOLENIDADE DA CONVERSÃO DE SÃO PAULO APÓSTOLO
NA SOLENIDADE DA CONVERSÃO DE SÃO PAULO APÓSTOLO
HOMILIA
DO PAPA FRANCISCO
Basílica
de São Paulo Extra-Muros
Sábado, 25 de Janeiro de 2014
Sábado, 25 de Janeiro de 2014
«Estará Cristo dividido?» (1 Cor 1, 13). Este repto forte,
que São Paulo lança quase ao início da sua Primeira Carta aos Coríntios e que
ressoou na liturgia desta tarde, foi escolhido por um grupo de irmãos cristãos
do Canadá como linha de fundo para a nossa meditação durante a Semana de Oração
deste ano.
Com grande tristeza, o Apóstolo soube que os cristãos de Corinto estão
divididos em várias facções. Uns afirmam: «Eu sou de Paulo»; outros dizem: «Eu
sou de Apolo»; e outros: «Eu sou de Cefas»; e há ainda quem sustente: «Eu sou
de Cristo» (cf. 1 Cor 1, 12). Nem sequer estes que pretendem
apelar-se a Cristo podem ser elogiados por Paulo, porque usam o nome do único
Salvador para se distanciarem dos outros irmãos dentro da comunidade. Por
outras palavras, a experiência particular de cada um, o referimento a algumas
pessoas significativas da comunidade tornam-se a norma para julgar a fé dos
outros.
Nesta situação de divisão Paulo, «em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo»,
exorta os cristãos de Corinto a serem todos unânimes no falar, para que não
haja, entre eles, divisões mas perfeita união de pensar e sentir (cf. 1
Cor 1, 10). Mas a comunhão, a que chama o Apóstolo, não poderá ser
fruto de estratégias humanas. De facto, a perfeita união entre os irmãos só é
possível referida ao pensamento e aos sentimentos de Cristo (cf. Fil 2,
5). Nesta tarde, encontrando-nos aqui reunidos em oração, sentimos que Cristo –
que não pode ser dividido – quer atrair-nos a Si, aos sentimentos do seu
coração, ao seu abandono total e íntimo nas mãos do Pai, ao seu esvaziar-se
radicalmente por amor da humanidade. Só Ele pode ser o princípio, a causa, o
motor da nossa unidade.
Encontrando-nos na sua presença, tornamo-nos ainda mais conscientes de
que não podemos considerar as divisões na Igreja como um fenómeno de certo modo
natural, inevitável em toda a forma de vida associativa. As nossas divisões
ferem o corpo de Cristo, ferem o testemunho que somos chamados a prestar-Lhe no
mundo. O Decreto do Vaticano II sobre o ecumenismo,
fazendo apelo ao texto de São Paulo que estamos a meditar, afirma
significativamente: «Cristo Senhor fundou uma só e única Igreja. Todavia, são
numerosas as Comunhões cristãs que se apresentam aos homens como a verdadeira
herança de Jesus Cristo. Todos, na verdade, se professam discípulos do Senhor,
mas têm pareceres diversos e caminham por rumos diferentes, como se o próprio
Cristo estivesse dividido». E, depois, acrescenta: «Esta divisão, porém,
contradiz abertamente a vontade de Cristo, e é escândalo para o mundo, como
também prejudica a santíssima causa da pregação do Evangelho a toda a criatura»
(Unitatis redintegratio, 1). Todos nós
fomos prejudicados pelas divisões. Nenhum de nós quer tornar-se um escândalo. E
por isso todos nós caminhamos juntos, fraternalmente, pela estrada que leva à
unidade, fazendo unidade com o próprio caminhar, aquela unidade que vem do
Espírito Santo e conduz-nos a uma singularidade tão especial que só o Espírito
Santo pode fazer: a diversidade reconciliada. O Senhor espera-nos a todos,
acompanha-nos a todos, está com todos nós neste caminho da unidade.
Queridos amigos, Cristo não pode estar dividido! Esta certeza deve
incentivar-nos e suster-nos a continuar, com humildade e confiança, o caminho
para o restabelecimento da plena unidade visível entre todos os crentes em
Cristo. Apraz-me pensar, neste momento, na obra de dois grandes Papas: os
Beatos João XXIII e João Paulo II. Em ambos foi amadurecendo,
ao longo do percurso de suas vidas, a consciência de como era urgente a causa
da unidade e, uma vez eleitos Bispos de Roma, guiaram decididamente todo o
rebanho católico pelas estradas do caminho ecuménico: o Papa João, abrindo
caminhos novos e quase impensáveis antes; o Papa João Paulo, propondo o diálogo
ecuménico como dimensão ordinária e imprescindível da vida de cada Igreja
particular. A eles associo também o Papa Paulo VI, outro grande protagonista do
diálogo: justamente nestes dias, recordamos o cinquentenário daquele seu abraço
histórico, em Jerusalém, ao Patriarca de Constantinopla Atenágoras.
O obra destes meus antecessores fez com que a dimensão do diálogo
ecuménico se tivesse tornado um aspecto de tal modo essencial do ministério do
Bispo de Roma, que hoje não se compreenderia plenamente o serviço petrino sem
incluir nele esta abertura ao diálogo com todos os crentes em Cristo. Podemos
afirmar também que o caminho ecuménico permitiu aprofundar a compreensão do
ministério do Sucessor de Pedro e devemos ter confiança de que vai continuar a
fazê-lo também no futuro. Ao mesmo tempo que olhamos com gratidão para os
passos que o Senhor nos concedeu realizar, mas sem ignorarmos as dificuldades
que o diálogo ecuménico atravessa actualmente, peçamos a graça de sermos todos
revestidos dos sentimentos de Cristo, para podermos caminhar para a unidade
querida por Ele. E caminhar juntos já é fazer unidade!
Neste clima de oração pelo dom da unidade, quero dirigir as minhas
cordiais e fraternas saudações a Sua Eminência o Metropolita Gennadios,
representante do Patriarcado Ecuménico, a Sua Graça David Moxon, representante
em Roma do Arcebispo de Cantuária, e a todos os representantes das diversas
Igrejas e Comunidades eclesiais, aqui reunidos nesta tarde. Com estes dois
irmãos, em representação de todos, rezámos no Sepulcro de Paulo e dissemos
entre nós: «Rezemos para que ele nos ajude nesta estrada, nesta estrada da
unidade, do amor, fazendo estrada de unidade». É que a unidade não virá como um
milagre no fim: a unidade vem no caminho, fá-la o Espírito Santo no caminho. Se
não caminharmos juntos, se não rezarmos uns pelos outros, se não colaborarmos
em tantas coisas que podemos fazer neste mundo pelo Povo de Deus, a unidade não
virá! A unidade faz-se neste caminho, em cada passo, e não somos nós que a
fazemos: fá-la o Espírito Santo, que vê a nossa boa vontade.
Amados irmãos e irmãs, ao Senhor Jesus, que nos
tornou membros vivos do seu Corpo, peçamos que nos conserve profundamente
unidos a Ele, nos ajude a superarmos os nossos conflitos, as nossas divisões,
os nossos egoísmos; e lembremo-nos de que a unidade é sempre superior ao
conflito! E nos ajude a vivermos unidos uns aos outros por uma única força, a
do amor, que o Espírito Santo derrama nos nossos corações (cf. Rm 5,
5). Amen.
Fonte: Santa Sé
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