Páginas

domingo, 23 de dezembro de 2012

A história da Solenidade do Natal do Senhor

“Hoje nasceu para vós um Salvador, que é o Cristo Senhor!” (Lc 2,11).

Nos primeiros três séculos do Cristianismo a única celebração litúrgica era a Páscoa: a Páscoa semanal, celebrada a cada domingo, dia do Senhor; e a Páscoa anual, celebrada na primeira lua cheia da primavera (no hemisfério norte).

Podemos dizer que os próprios Evangelhos foram escritos “de trás para frente”: a primeira comunidade cristã centrou-se no anúncio da “obra” de Jesus mais do que no de sua “pessoa”, particularmente no Mistério Pascal de sua Morte e Ressurreição, que constitui o chamado querigma, isto é, a essência da mensagem cristã [1].

Será a partir do século IV, pois, que se desenvolverá uma celebração do nascimento de nosso Senhor Jesus Cristo segundo a carne, como veremos ao longo desta postagem.

Natividade - Adoração dos pastores
(Bartolomé Esteban Murillo - séc. XVII)

1. A origem da celebração do Natal

São Clemente de Alexandria (†215) em sua obra Stromata afirma que em seu tempo eram várias as hipóteses sobre o dia do nascimento de Jesus, o qual não é mencionado no Evangelho. O anônimo De Pascha Computus, escrito em torno de 243, associa o nascimento de Cristo com o dia 28 de março, por ser o “dia da criação do sol” (considerando o dia 25 de março como o início da criação, como veremos adiante).

O primeiro registro da celebração do Natal é de meados do século IV, em Roma: a Depositio Martyrum, um calendário das memórias dos mártires que integra o Cronógrafo Filocaliano, compilado por Fúrio Dionísio Filócalo em 354, começa justamente no dia 25 de dezembro com a inscrição: “Octavo Kalendas Januarii: Natus Christus in Bethleem Judeae” [2]. O Natal, porém, provavelmente era celebrado já desde o ano 336 ou mesmo antes, durante o pontificado do Papa São Silvestre I (†335).

Duas são as hipóteses principais sobre a razão da escolha dessa data, ambas relacionadas com o simbolismo do solstício de inverno no hemisfério norte, dado que a passagem das estações é um marco importante em várias culturas e tradições religiosas:

- segundo a hipótese apologética, a celebração do Natal no dia 25 de dezembro estava associada originalmente à festa do “sol invencível” (Natalis Solis Invictis) introduzida pelo Imperador Aureliano no ano de 274.

Uma vez que o solstício de inverno é o dia mais curto do ano e a partir dele os dias vão ficando gradativamente mais longos, os romanos celebravam no dia 25 de dezembro a “vitória do deus sol”. Os cristãos, portanto, teriam contraposto a esta festa a celebração do nascimento de Cristo, verdadeiro “sol nascente que nos veio visitar” (cf. Lc 1,78-79).

Representação do Sol Invictus (séc. II)

- a hipótese do cômputo, por sua vez, remete-nos a uma antiga tradição segundo a qual Jesus teria vivido um número exato de anos. Assim, sua concepção teria acontecido no mesmo dia da sua morte.

Essa mesma tradição fixa a Paixão no dia 25 de março, data associada ao início da primavera no hemisfério norte e à própria criação do mundo, ligando a Morte-Ressurreição do Senhor ao ciclo do “renascimento” da natureza, sendo uma “nova criação” [3].

Embora a festa da Anunciação do Senhor no dia 25 de março tenha sido introduzida mais tarde, foi a partir da referência a esse dia como data da Concepção de Cristo que o seu Nascimento foi fixado nove meses depois, no dia 25 de dezembro [4].

De toda forma, a instituição da celebração do Natal foi reforçada pelos quatro grandes Concílios Ecumênicos dos séculos IV e V: Niceia (325), Constantinopla (381), Éfeso (431) e Calcedônia (451). Esses Concílios aprofundaram o mistério da pessoa de Jesus Cristo, condenando as heresias cristológicas e confessando-o como verdadeiro Deus e verdadeiro homem.

Mosaico de Cristo como o Sol Invictus (séc. III)

2. A difusão da celebração do Natal no Oriente e no Ocidente

Foi ao longo dos séculos IV e V, com efeito, que a celebração do Natal do Senhor foi se difundindo de Roma às outras igrejas ocidentais: norte da África, Espanha e outras dioceses da Itália.

Desde o início do século IV, porém, no Oriente se celebrava uma festa mais ampla tanto do nascimento quanto da manifestação do Senhor no dia 06 de janeiro: a Epifania ou Teofania. No relato da peregrina Etéria (ou Egéria), testemunho privilegiado da Liturgia da Terra Santa do final do século IV, a festa da Epifania aparece ainda ligada ao nascimento do Senhor, dada a importância de Belém no relato [5].

A partir do século V ambas as tradições foram influenciando-se mutuamente e tanto Oriente quanto Ocidente passaram a celebrar as duas festas: o Natal no dia 25 de dezembro e a Epifania no dia 06 de janeiro, cuja história veremos em uma postagem própria [6].

Santo Agostinho (†430), no início do século V, considera o Natal apenas uma comemoração (commemoratio), na mesma linha das memórias dos santos, atribuindo o caráter de celebração sacramental (sacramentum, expressão que traduz o grego mysterion) apenas à Páscoa [7].

Seria com o Papa São Leão Magno (†461) que a celebração do Natal adquiriria caráter “sacramental”. Para ele, com efeito, o Natal e a Páscoa celebram o mesmo mistério, o mistério da nossa salvação (salutis nostrae sacramentum), ainda que de modo distinto: o Natal celebra o início da salvação, a Páscoa celebra seu pleno cumprimento [8]. A Encarnação é o início da kenosis (rebaixamento, esvaziamento) de Cristo que culminará na Cruz, e à qual corresponderá sua exaltação na Ressurreição (cf. Fl 2,6-11).

São Leão Magno, Papa

Podemos dizer que São Leão Magno é o “Doctor Nativitatis”: boa parte dos textos litúrgicos dessa Solenidade refletem sua teologia, expressa sobretudo em seus dez Sermões para o Natal. Destacamos, por exemplo, o tema do addmirabile commercium, isto é, do admirável intercâmbio de dons entre o céu e a terra: Cristo assume a nossa humanidade para fazer-nos participantes da sua divindade.

3. As três Missas de Natal

Em Roma, no século IV, a única Missa de Natal era celebrada pelo Papa na Basílica de São Pedro no Vaticano à hora terça (9h) do dia 25 de dezembro, precedida de uma vigília que iniciava de madrugada, ad galli cantum (ao canto do galo).

A partir do pontificado de Papa Sisto III (†440), após a proclamação da Virgem Maria como Mãe de Deus (Theotokos) no Concílio de Éfeso, acrescentou-se uma Missa à meia-noite, in media nocte (cf. Sb 18,14-15) na Basílica de Santa Maria Maior. Após essa Missa da meia-noite se celebrava uma vigília noturna em honra da Mãe de Deus, que posteriormente seria antecipada para antes da Missa.

A Missa da meia-noite, sobretudo a partir do pontificado do Papa Teodoro I (†649), era celebrada no oratório de Sancta Maria ad Praesepe (Santa Maria do presépio), uma pequena capela que guardava as supostas relíquias da manjedoura. Devido às pequenas dimensões do oratório, porém, nessa Missa ad praesepium apenas o Papa comungava, sendo a Comunhão do clero e dos fiéis na Missa das 9h em São Pedro.

Mosaico do nascimento do Senhor
(Basílica de Santa Maria Maior)

No final do século VI, por fim, provavelmente durante o pontificado do Papa João III (†577), acrescentou-se uma Missa à aurora do dia 25 na igreja de Santa Anastácia no Palatino. Anastácia (ou Anastásia) foi martirizada no início do século IV, durante a perseguição do imperador Diocleciano (†305), em Sirmio (Sirmium), na atual Sérvia. O Papa Símaco (†514) a introduziu entre as mártires comemoradas no Cânon Romano [9].

Uma vez que a cidade de Roma foi reconquistada pelo Império Romano do Oriente (Império Bizantino) entre 553 e 774, e sendo Anastácia muito venerada entre os cristãos orientais, a celebração da mártir na aurora do Natal era também um gesto de deferência do Papa ao governador bizantino, que habitava, com efeito, junto ao monte Palatino. Inicialmente apenas uma Missa em honra da mártir, logo se tornou uma Missa em honra do mistério do Natal.

Santa Anastácia (ou Anastásia), Mártir

Ficou assim fixada a tríplice celebração do Natal: a primeira Missa, à meia-noite, no oratório do praesepe de Santa Maria Maior; a segunda, à aurora, na igreja de Santa Anastácia; e a terceira, às 9h, na Basílica de São Pedro, posteriormente transferida para o altar principal da Basílica de Santa Maria Maior, que ficava mais próxima da residência do Papa (junto à Basílica do Latrão, a Catedral de Roma).

Com efeito, ao chegar o Papa à sua residência, os Cardeais e o coro cantavam as Laudes regiae (Louvores reais) em honra do Papa, entoadas pela primeira vez no dia de Natal do ano 800, por ocasião da coroação do imperador Carlos Magno (†814).

Os liturgistas do final da Idade Média, como Guilherme Durando (†1296) em seu Rationale Divinorum Officiorum, tentaram dar uma explicação alegórica às três celebrações, associando-as ao “tríplice nascimento de Cristo”: seu nascimento eterno segundo a divindade no seio do Pai; seu nascimento temporal segundo a carne da Virgem Maria em Belém; e seu nascimento místico no coração de cada fiel (ou ainda sua última vinda no fim dos tempos).

Porém, trata-se aqui de “alegorese” ou “alegorismo”, isto é, de um “simbolismo forçado”, uma vez que os textos litúrgicos das Missas não fazem referência a esse tríplice nascimento [10]. A origem das três Missas de Natal, portanto, é mais “pastoral” que “teológica”, sendo simplesmente expressão dos costumes da igreja romana.

Com efeito, a praxe das três Missas, já consolidada no tempo do Papa São Gregório Magno (†604), permaneceu como “privilégio” do Bispo de Roma até o século X, quando foram permitidas em todas as igrejas, desde que cada Missa fosse presidida por um sacerdote distinto. Apenas a partir do século XVI, como testemunha o Abade Pedro de Cluny (†1556), foi permitido que o mesmo sacerdote presidisse as três Missas.

Nascimento de Cristo entre os profetas Isaías e Ezequiel
(Duccio di Buoninsegna - séc. XIV)

4. Particularidades litúrgicas da celebração do Natal

O Liber Pontificalis, compilado no século VI, atribui ao Papa São Telésforo (†137) a inserção do hino “Gloria in excelsis Deo” (cf. Lc 2,14) na Missa da Noite de Natal, embora o próprio hino remonte aos séculos IV-V. O Papa Símaco (†514) teria estendido o Gloria aos domingos e festas, porém apenas na Missa presidida pelo Bispo.

Até o século XI, com efeito, os presbíteros só podiam entoar o Gloria na Vigília Pascal e em sua primeira Missa. No final do mesmo século o canto desse hino é permitido aos presbíteros na Missa da Noite de Natal e logo estendido a todas as Missas festivas [11].

Entre os séculos X e XI a Solenidade do Natal é enriquecida por sequências. No Liber Sequentiarum de Notker Balbulus (†912) são compiladas três: Grates nunc omnes para a Missa da Noite; Eia recolamus para a Missa da Aurora; e Natus ante saecula para a Missa do Dia.

No século XI popularizou-se a sequência Laetabundus exsultet fidelis chorus, logo estendida a todo o Tempo do Natal, até a Festa da Apresentação do Senhor (02 de fevereiro). Em Roma essa sequência não se cantava na Missa, mas sim na refeição que o Papa partilhava no dia de Natal com os Cardeais.

Também fora da Missa se interpretavam na Idade Média os “mistérios” ou “autos de Natal”, momentos de devoção popular marcados pelos cânticos natalinos, que representavam a “busca” dos pastores pela gruta de Belém (Officium pastorum).

Adoração dos pastores
(Gerard van Honthorst - séc. XVII)

A partir da iniciativa de São Francisco de Assis (†1226) na noite de Natal de 1223 em Greccio (Itália), começa a difundir-se também a montagem do presépio, entendido aqui como a representação da cena do nascimento de Jesus com pequenas esculturas.

Confira nossa postagem sobre a história e o simbolismo do presépio clicando aqui.

Em Roma era muito popular a dupla vigília ou “ofício noturno” em preparação à Missa: na Basílica de São Pedro antes da Missa do Dia e na Basílica de Santa Maria Maior antes da Missa da Noite, como vimos anteriormente. Com o tempo, porém, essas duas vigílias foram unidas em uma só.

A vigília ou “ofício noturno” era marcada pelo canto dos salmos messiânicos, por leituras do profeta Isaías e por responsórios que repreendiam o povo de Israel por não ter acolhido o Messias e que davam voz às sibilas, antigas profetisas pagãs que supostamente também teriam anunciado o nascimento de Cristo.

5. A celebração do Natal do Senhor hoje

“A Igreja nada considera mais venerável, após a celebração anual do mistério da Páscoa, do que comemorar o Natal do Senhor...”. Assim as Normas Universais sobre o Ano Litúrgico e o Calendário (n. 32) destacam a importância dessa Solenidade. Com efeito, na Tabela de precedência dos dias litúrgicos, o Natal do Senhor ocupa o segundo lugar, atrás apenas do Tríduo Pascal [12].

A reforma litúrgica do Concílio Vaticano II conservou praticamente intacta a celebração dessa Solenidade. As orações remontam aos antigos Sacramentários: Veronense ou Leoniano (séc. VI), Gelasiano Gregoriano (séc. VII). Como vimos, essas orações refletem muito da teologia de São Leão Magno [13]. Destacam-se também os três Prefácios próprios do Tempo do Natal [14].

Quanto à Liturgia da Palavra, foi acrescentada a 2ª leitura para cada uma das três Missas, que se caracterizam pelas perícopes evangélicas:
- o nascimento de Cristo e o anúncio aos pastores na Missa da Noite (Lc 1,2-14);
- o encontro dos pastores com o Menino e sua Mãe na Missa da aurora (Lc 2,15-20);
- e o Prólogo do Evangelho de João na Missa do Dia (Jo 1,1-18) [15].

Natividade (Vassily Nesterenko - séc. XX)

A maior diferença diz respeito à Missa da Vigília do Natal, celebrada na tarde do dia 24, antes ou depois das I Vésperas (18h). Não confundir com a Missa da Noite, conhecida popularmente como “Missa do Galo”, que deve ser celebrada sempre após o pôr-do-sol.

Antes da reforma litúrgica essa Missa da Vigília era celebrada ainda com os paramentos roxos do Advento. Atualmente, porém, possui um caráter mais festivo, já com os paramentos brancos do Natal e o Evangelho da genealogia de Jesus (Mt 1,1-25) [16].

O Cerimonial dos Bispos (n. 328), além disso, recomenda vivamente que antes da Missa da Noite os fiéis se reúnam para um momento de oração, recordando o antigo “ofício noturno” celebrado em Roma, como vimos acima. Esse momento de oração preferencialmente seja o próprio Ofício das Leituras da Solenidade do Natal, conforme indicado no livro da Liturgia das Horas [17].

No final dessa preparação para a Missa da Noite nos últimos anos tem se resgatado a “proclamação do Natal” ou “Kalenda, indicada no Martirológio Romano.

Uma vez mencionada a Liturgia das Horas, vale destacar os três hinos próprios, entoados até a Solenidade da Epifania (salvo nas celebrações com hinos próprios):
Vésperas: Christe, redémptor ómnium, ex Patre (Ó Redentor do mundo) [18];
Ofício das Leituras: Candor aetérnae Deitátis alme (Eterno esplendor da beleza divina);
Laudes: A solis ortus cárdine (Do sol nascente ao poente).

Cabe recordar, por fim, que o Natal do Senhor é a única solenidade do Ano Litúrgico além da Páscoa a conservar a oitava, isto é, a celebração prolongada por oito dias (número que remete à “nova criação” realizada em Cristo), culminando no dia 01 de janeiro: início do ano civil, Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, e comemoração da Circuncisão do Senhor (cf. Lc 2,21).

Natividade (Mosteiro de São Bento, SP)

Confira também:



Notas:

[1] Por isso o Evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito, não traz os relatos da infância de Jesus, que sim estão presentes nos Evangelhos de Mateus e de Lucas (cap. 1–2). O Evangelho de João vai além e traz em seu Prólogo (Jo 1,1-18) uma reflexão sobre a preexistência de Cristo, o Verbo de Deus.

[2] No calendário romano, os últimos dias do mês eram contados de maneira regressiva em relação às kalendas, nome do primeiro dia do mês. Portanto, 25 de dezembro corresponde ao oitavo dia antes das kalendas de janeiro, como se evidencia no célebre texto da proclamação do Natal do Martirológio Romano. Sobressai aqui o simbolismo do número “oito”: se o “sete” é associado com a criação (cf. Gn 1,1–2,4a), o “oito” indica que com o nascimento de Cristo começa uma “nova criação”.

[3] Essa tradição é atestada, por exemplo, por Santo Agostinho em sua obra De Trinitate (Livro 4, cap. 5): “Existe a crença de que Ele [Cristo] foi concebido a 25 de março e no mesmo dia sofreu a Paixão” (AGOSTINHO. A Trindade. São Paulo: Paulus, 1995, p. 158; Coleção: Patrística, vol. 7).
A tradição da Morte do Senhor no dia 25 de março é corroborada pelo Martirológio Romano, que comemora nessa data o ladrão penitente, chamado Dimas.

[4] A associação do mistério da Encarnação com o simbolismo das quatro estações foi depois completada com a Solenidade da Natividade de São João Batista seis meses antes do Natal (cf. Lc 1,26.36), junto ao solstício de verão do hemisfério norte (24 de junho); e a comemoração da Concepção de João seis meses antes da Anunciação, junto ao equinócio de outono (24 de setembro).
Santo Agostinho alude ao simbolismo solar ligado aos nascimentos de Jesus e João Batista em seu Comentário ao Salmo 132 (n. 11): “João Batista, conforme a tradição da Igreja, nasceu a 24 de junho, quando os dias começam a diminuir [no hemisfério norte]. O Senhor, porém, nasceu a 25 de dezembro, quando os dias começam a crescer” (AGOSTINHO. Comentário aos Salmos: Salmos 101-150. São Paulo: Paulus, 1998, p. 775; Coleção: Patrística, vol. 9/3).

[5] Infelizmente o “diário de viagem” de Etéria (Itinerarium ad loca sancta) chegou até nós incompleto: a página que descreveria a vigília da Epifania em Belém se perdeu. O trecho que foi conservado narra uma procissão que retorna de madrugada até Jerusalém, ao canto da antífona “Bendito o que vem em nome do Senhor” (Mt 21,9). A procissão chega à Basílica do Santo Sepulcro (Anástasis) ao nascer-do-sol, quando o Bispo abençoa os presentes.
Etéria enaltece a decoração das igrejas, particularmente solene nesses dias, e descreve a celebração da “oitava” da Epifania: o Bispo celebra a Missa cada dia em uma das igrejas de Jerusalém, enquanto os monges que residem em Belém aí celebram a Missa e as vigílias (cf. CORDEIRO, José de Leão [org.]. Antologia Litúrgica: Textos Litúrgicos, Patrísticos e Canónicos do Primeiro Milénio. Fátima: Secretariado Nacional de Liturgia, 2003, pp. 450-451).

[6] Cabe recordar, porém, que a maioria das Igrejas Orientais, tanto Católicas quanto Ortodoxas, utiliza o calendário juliano, com uma diferença de 13 dias em relação ao gregoriano. Assim, o dia 25 de dezembro no calendário juliano corresponde ao dia 07 de janeiro no calendário gregoriano, e o dia 06 de janeiro corresponde ao dia 19.

[7] cf. AGOSTINHO, Carta 55; in: CORDEIRO, op. cit., p. 822.

[8] Os próprios relatos evangélicos da Natividade traçam diversos paralelos com o Mistério Pascal: a madeira da manjedoura aponta para o lenho da cruz; a gruta de Belém prefigura o sepulcro; as faixas que envolvem o Menino são retomadas em seu sepultamento e Ressurreição; os pastores que correm e os magos que trazem presentes recordam as mulheres com perfumes e os Apóstolos que correm ao túmulo na manhã da Páscoa... (cf. BERGAMINI, Augusto. Cristo, festa da Igreja: O Ano Litúrgico. São Paulo: Paulinas, 2004, pp. 215-216: “O Natal na perspectiva da Páscoa”).

[9] MISSAL ROMANO, Tradução portuguesa da 2ª edição típica para o Brasil. São Paulo: Paulus, 1991, p. 475.

[10] Sobre a alegorese ou alegorismo, confira:
BERGER, Rupert. Alegoria. in: Dicionário de Liturgia Pastoral: Obra de consulta sobre todas as questões referentes à Liturgia. São Paulo: Loyola, 2010, pp. 13-14.
JUNGMANN, Josef Andreas. Missarum Sollemnia: Origens, liturgia, história e teologia da Missa romana. São Paulo: Paulus, 2009, pp. 102-107.

[11] cf. JUNGMANN, op. cit., pp. 344-355.

[12] Normas universais sobre o Ano Litúrgico e o Calendário. in: MISSAL ROMANO, pp. 105.111.

[13] ibid., pp. 152-154.

[14] ibid., pp. 411-413.

[15] Na verdade foi acrescentada a 1ª leitura, uma vez que antes da reforma litúrgica a leitura nas três Missas do Natal era tomada das epístolas do Novo Testamento, sendo as leituras do Antigo Testamento, como vimos, proferidas no “ofício noturno”. A atual distribuição das leituras é a seguinte:
Missa da Noite: Is 9,1-6; Sl 95; Tt 2,11-14; Lc 2,1-14;
Missa da Aurora: Is 62,11-12; Sl 96; Tt 3,4-7; Lc 2,15-20;
Missa do Dia: Is 52,7-10; Sl 97; Hb 1,1-6; Jo 1,1-18 (forma breve: Jo 1,1-5.9-14).

[16] Atualmente além da Vigília Pascal, “mãe de todas as vigílias” e do Natal, outras seis solenidades possuem uma Missa da vigília própria: Pentecostes, Epifania, Ascensão do Senhor, Assunção de Maria, Natividade de São João Batista e São Pedro e São Paulo. As Vigílias da Epifania e da Ascensão foram inseridas na 3ª edição típica do Missal Romano (2002), ainda sem tradução para o Brasil.

[17] O mesmo é indicado pela Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas (n. 215) e pelo Diretório sobre piedade Popular e Liturgia (n. 110):
ALDAZÁBAL, José. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas - Texto e Comentário. São Paulo: Paulinas, 2010, p. 101.
CONGREGAÇÃO PARA O CULTO DIVINO E A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS. Diretório sobre Piedade Popular e Liturgia. São Paulo: Paulinas, 2003, p. 102.

[18] Não confundir com o hino “Christe, redémptor ómnium, consérva tuos fámulos”, das Vésperas da Solenidade de Todos os Santos.

Referências:

ADAM, Adolf. O Ano Litúrgico: Sua história e seu significado segundo a renovação litúrgica. São Paulo: Loyola, 2019, pp. 87-93.

AUGÉ, Matias. Ano Litúrgico: É o próprio Cristo presente na sua Igreja. São Paulo: Paulinas, 2019, pp. 203-210.

BERGAMINI, Augusto. Cristo, festa da Igreja: O Ano Litúrgico. São Paulo: Paulinas, 2004, pp. 195-209.

MARTINDALE, Cyril Charles. Christmas. in: The Catholic Encyclopedia, vol. 3, 1908. Disponível em: New Advent.

RIGHETTI, Mario. Historia de la Liturgia, v. I: Introducción general; El año litúrgico; El Breviario. Madrid: BAC, 1955, pp. 687-703.

SCHUSTER, Cardeal Alfredo Ildefonso. Liber sacramentorum: Note storiche e liturgiche sul Messale Romano, v. II: L’inaugurazione del Regno Messianico (La Sacra Liturgia dall’Avvento alla Settuagesima). Torino-Roma: Marietti, 1933, pp. 152-168.

Imagens: Wikimedia Commons.

Postagem publicada em 23 de dezembro de 2012. Revista e ampliada em 18 de novembro de 2021.

Nenhum comentário:

Postar um comentário