Memória da Bem-aventurada Virgem Maria de Guadalupe
Homilia do Papa Leão XIV
Basílica de São Pedro
Sexta-feira, 12 de dezembro de 2025
Leituras: Eclo 24,23-31 NV; Sl 66; Lc 1,39-47 [1].
Queridos irmãos e irmãs,
Na leitura do Sirácida [Eclesiástico] nos é apresentada uma descrição poética da Sabedoria, uma imagem que
encontra a sua plena identidade em Cristo, «sabedoria de Deus» (1Cor 1,24)
que, chegada a plenitude dos tempos, se fez carne, nascendo de uma mulher (cf. Gl 4,4). A tradição cristã interpretou essa passagem
também em chave mariana, pois faz pensar na mulher preparada por Deus para
receber Cristo. Com efeito, quem, a não ser Maria, pode dizer «em mim está toda
a graça do caminho e da verdade, em mim toda esperança de vida e de virtude» (Eclo 24,25)?
Por isso, a tradição cristã não hesita em reconhecê-la como «a mãe do belo amor»
(v. 24).
No Evangelho (Lc 1,39-47), ouvimos como
Maria vive a dinâmica própria de quem deixa que a Palavra de Deus entre na sua
vida e a transforme. Como fogo ardente que não pode ser contido, a Palavra nos
impele a comunicar a alegria do dom recebido (cf. Jr 20,9; Lc 24,32).
Feliz com o anúncio do anjo, ela compreende que a alegria de Deus se realiza na
caridade e, então, parte às pressas rumo à casa de Isabel.
Na verdade, as palavras da «Cheia de graça»
são «mais doces que o mel» (Eclo 24,27). Basta a sua saudação para
fazer saltar o menino no ventre de Isabel que, cheia do Espírito Santo, se
interroga: «Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar?» (Lc 1,43).
Este júbilo leva ao Magnificat, onde Maria reconhece que a sua
alegria provém do Deus fiel, que dirigiu o olhar para o seu povo, abençoando-o
(cf. Sl 66,2), com uma herança mais doce do que o mel nos
favos (cf. Eclo 24,27): a própria
presença do seu Filho!
Ao longo de toda a sua existência, Maria
leva este júbilo onde a alegria humana não é suficiente, onde o vinho acabou (cf. Jo 2,3). Assim acontece em Guadalupe! Em Tepeyac, ela
desperta nos habitantes da América a alegria de saber que são amados por Deus.
Nas aparições de 1531, falando a São Juan Diego na sua língua materna, declara
que «deseja ardentemente» que se construa uma «pequena casa sagrada» da qual
exaltará Deus e o manifestará (cf. Nican mopohua, 26-27). Em meio aos
conflitos que não cessam, em meio às injustiças e às dores que buscam alívio,
Maria de Guadalupe proclama o cerne da sua mensagem: «Não estou aqui, eu que
sou a tua mãe?» (ibid., 119). É a voz que faz ressoar a promessa da
fidelidade divina, a presença que sustenta quando a vida se torna insuportável.
A maternidade que ela declara faz-nos
descobrir que somos filhos. Quem ouve «sou a tua mãe» lembra-se de que, da
cruz, ao «eis a tua mãe» corresponde o «eis o teu filho» (cf. Jo 19,26-27). E, como filhos, dirigimo-nos a ela,
perguntando-lhe: «Mãe, o que devemos fazer para ser os filhos que o teu coração
deseja?». Fiel à sua missão, ela nos dirá com ternura: «Fazei o que Ele vos
disser» (Jo 2,5). Sim, Mãe, queremos ser teus filhos autênticos;
diz-nos como proceder na fé, quando as forças nos abandonam e as sombras
aumentam. Faz-nos compreender que contigo até o inverno se torna tempo de
rosas!
E como filho, peço-te: Mãe, ensina às nações
que querem ser tuas filhas a não dividir o mundo em fações irreconciliáveis, a
não permitir que o ódio marque a sua história, nem que a mentira escreva a sua
memória. Mostra-lhes que a autoridade deve ser exercida como serviço, não como
domínio. Instrui os seus governantes no seu dever de preservar a dignidade de
cada pessoa em todas as fases da sua vida. Faz destes povos, teus filhos,
lugares onde cada pessoa possa sentir-se acolhida!
Acompanha, Mãe, os mais jovens, a fim de que
obtenham de Cristo a força para escolher o bem e a coragem para se manter
firmes na fé, ainda que o mundo os empurre em outra direção. Mostra-lhes que o
teu Filho caminha ao seu lado. Que nada aflige o seu coração, para que possam
acolher sem medo os desígnios de Deus. Afasta deles as ameaças do crime, das
dependências e do perigo de uma vida sem sentido.
Procura, Mãe, aqueles que se afastaram da
santa Igreja: que o teu olhar os alcance onde o nosso não chega, derrubando as
barreiras que nos separam, reconduzindo-os para casa com a força do teu amor.
Mãe, suplico-te que inclines o coração daqueles que semeiam discórdia para o
desejo do teu Filho de que «todos sejam um» (Jo 17,21),
devolvendo-os à caridade que torna possível a comunhão, pois dentro da Igreja,
Mãe, nós, teus filhos, não podemos viver divididos!
Fortalece as famílias: que, seguindo o teu
exemplo, os pais eduquem com ternura e firmeza, para que cada casa seja escola
de fé. Inspira, Mãe, quantos formam mentes e corações, para que transmitam a
verdade com aquela doçura, precisão e clareza que brotam do Evangelho. Encoraja
aqueles que o teu Filho chamou para segui-lo mais de perto: sustenta o clero e
a vida consagrada na fidelidade quotidiana e renova o seu primeiro amor.
Preserva a sua interioridade na oração, ampara-os na tentação, encoraja-os no
cansaço e socorre quem está abatido.
Virgem Santa, que como tu também nós
guardemos o Evangelho no coração (cf. Lc 2,19.51). Ajuda-nos a
compreender que, embora sejamos os destinatários, não somos os donos desta
mensagem, mas que, como São Juan Diego, somos seus simples servos. Que vivamos
convencidos de que, onde chega a Boa Nova, tudo se torna bom, tudo recupera a
saúde, tudo se renova. «Os que se deixam guiar por ti, não pecarão» (cf. Eclo 24,30); ajuda-nos a não ofuscar com o pecado e a
miséria a santidade da Igreja que, como tu, é mãe!
Mãe «do verdadeiro Deus, por quem vivemos»,
vem em auxílio do Sucessor de Pedro, para que ele confirme no único caminho que
conduz ao «Fruto abençoado do teu ventre» quantos lhe foram confiados.
Lembra-te deste teu filho, «a quem Cristo confiou as chaves do Reino
dos céus para o bem de todos»: que estas chaves sirvam «para ligar
e desligar e para a redenção de toda a miséria humana» (São João Paulo
II, Homilia em Siracusa, 06 de novembro de 1994). E faz com que,
confiando na tua proteção, progridamos cada dia mais unidos, com Jesus e entre
nós, rumo à morada eterna que Ele nos preparou e na qual tu nos esperas. Amém!
Fonte: Santa Sé.
Nota:
[1] No Brasil, onde a Virgem de Guadalupe é
celebrada com o grau de Festa, há leituras fixas (Gl 4,4-7; Sl
95; Lc 1,39-47). No Vaticano, onde essa celebração é uma Memória
facultativa, escolhem-se as leituras dentre as opções do Comum da Virgem Maria. Por isso neste ano de 2025 a leitura e o
salmo foram distintos daqueles proclamados no Brasil: Eclo 24,23-31, seguindo a numeração da Nova Vulgata (NV), e Sl 66.


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