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terça-feira, 7 de julho de 2020

As mudanças na terceira edição do Missal Romano (1)

A tradução da terceira edição típica do Missal Romano encontra-se em suas etapas finais. A CETEL (Comissão Episcopal de Textos Litúrgicos) está em processo de revisão do material antes de enviá-lo à Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos para sua aprovação.

Vale lembrar que usamos no Brasil a segunda edição do Missal Romano, publicada em sua forma típica (em latim) em 1975 e traduzida para o português do Brasil em 1991. A terceira edição foi publicada em latim em 2002 e revisada em 2008, sendo esta a tradução que aguardamos.

À luz deste processo, gostaríamos de apresentar algumas das mudanças que serão trazidas por esta terceira edição. Não vamos entrar aqui em questões de tradução, nos limitando a apresentar as mudanças que dizem respeito a toda a Igreja.

Missal Romano, tradução da 3ª edição: Material de estudo (CNBB)

Nesta postagem analisaremos o chamado “Próprio do Tempo”, isto é, as celebrações dos diversos períodos do Ano Litúrgico, enquanto que dedicaremos outras duas postagens às Missas dos santos, rituais, para diversas necessidades e votivas.

1. Próprio do Tempo (Ano Litúrgico)

1.1 Solenidades da Epifania e da Ascensão: Missa da Vigília

O Calendário Romano Geral possui dez solenidades do Senhor. Cinco delas, porém, são particularmente importantes, elencadas nos números 1 e 2 da Tabela de precedência dos dias litúrgicos: Páscoa, Natal, Epifania, Ascensão e Pentecostes.

Três destas celebrações já possuem vigílias: em primeiro lugar, naturalmente, a Vigília Pascal, “mãe de todas as vigílias” e coração do Ano Litúrgico; depois a Vigília de Pentecostes, que pode ser celebrada de forma simples ou de forma solene (com várias leituras); e por fim a Vigília do Natal, que raramente é celebrada, sendo “obscurecida” pela Missa da Noite.

Com a inserção das Missas da Vigília da Epifania e da Vigília da Ascensão, as cinco grandes solenidades do Senhor passam a contar com formulários próprios de orações a serem rezadas na tarde do dia anterior [1]. As duas novas vigílias são compostas de oração do dia (também chamada de “coleta”), oração sobre as oferendas e oração após a Comunhão próprias (a chamada “eucologia menor”) [2].

A coleta da nova Vigília da Epifania é a atual oração da segunda-feira após a Epifania (Missal Romano, 2ª edição, p. 168). Portanto, foi proposta uma nova oração para este dia. Para a Solenidade da Ascensão, por sua vez, foi acrescentada também uma nova coleta alternativa para a Missa do dia.

1.2 Quaresma

a) As estações quaresmais

Antes de entrar no Tempo da Quaresma, a terceira edição do Missal aprofunda o tema das “estações quaresmais”, que são mencionadas vagamente na atual versão (p. 174). Recolhendo a contribuição do Cerimonial dos Bispos, se especifica como celebrar as estações.

b) As flores e instrumentos musicais na Quaresma

Na mesma página é especificado que durante a Quaresma proíbe-se ornar o altar com flores e os instrumentos musicais devem apenas sustentar o canto - exceto no IV Domingo (Laetare), nas solenidades e festas. Estas informações estão ausentes na atual edição do Missal, embora sejam descritas no Diretório Litúrgico.

c) Orações sobre o povo para todos os dias da Quaresma

Seguindo uma antiga tradição, que remete mais uma vez às antigas “estações quaresmais romanas”, a terceira edição do Missal traz uma oração sobre o povo para cada dia da Quaresma, desde a Quarta-feira de Cinzas até a quarta-feira da Semana Santa, as quais podem ser proferidas à escolha (ad libitum).

A oração sobre o povo é uma breve oração recitada antes da bênção final da Missa, logo após a invocação “O Senhor esteja convosco”. Atualmente é prevista uma oração sobre o povo para a Celebração da Paixão do Senhor na Sexta-feira Santa (sem a bênção em seguida), bem como uma série de 26 orações sobre o povo que podem ser usadas de maneira facultativa em qualquer Missa (pp. 531-534).

Inclusive algumas das orações próprias para os dias da Quaresma na terceira edição são tomadas desta série do atual Missal, a qual permanecerá na nova edição, sendo enriquecida de alguns formulários, substituindo os que foram transladados à Quaresma.

Apesar da inserção da série de orações sobre o povo para a Quaresma, esperamos (e aqui é a opinião do autor deste blog) que a tradução do novo Missal conserve a bênção solene própria para este tempo (cf. Missal Romano, 2ª edição, p. 521), dada a riqueza do seu texto.

Papa Francisco abençoa na Missa da Quarta-feira de Cinzas (2020)

d) Coleta alternativa para a sexta-feira da V semana da Quaresma

Para a sexta-feira da V semana da Quaresma, a última sexta-feira deste tempo, é proposta uma segunda opção de oração do dia ou “coleta”, que pode ser proferida à escolha, a qual recorda a participação da Virgem Maria no Mistério Pascal do seu Filho.

Na edição de 1962 do Missale Romanum já havia neste dia uma Missa votiva às “Sete Dores de Nossa Senhora” (“Septem Dolorum Beatae Mariae Virginis”). Tal tradição é conservada na Terra Santa, onde se celebra a Missa na última sexta-feira da Quaresma no pequeno altar de Nossa Senhora das Dores junto ao Calvário na Basílica do Santo Sepulcro.

1.3 Semana Santa

a) O sinal da cruz no Domingo de Ramos, na Vigília Pascal [e na Festa da Apresentação do Senhor]

Embora seja uma questão menor, esta ainda gera dúvidas, sobretudo em relação aos dois primeiros casos a seguir. Na atual edição do Missal Romano, no início da Missa do Domingo de Ramos, da Vigília Pascal e da Festa da Apresentação do Senhor é dito somente: “o sacerdote saúda o povo como de costume” (pp. 220.271.547).

No novo Missal é esclarecido que nessas três celebrações, antes da saudação inicial, faz-se o sinal da cruz normalmente, como o Cerimonial dos Bispos já havia indicado.

b) A Missa Crismal

Esta também é uma questão menor, mas a apresentamos aqui como curiosidade. Provavelmente na nova edição do Missal não serão mais impressas as orações para a Bênção dos Óleos dos Enfermos e dos Catecúmenos e para a Consagração do Crisma na Missa Crismal, celebrada na manhã da quinta-feira da Semana Santa (atualmente estas orações encontram-se às pp. 237-244).

A escolha segue um critério prático: de um lado economiza-se espaço (pois, como veremos na próxima postagem, o novo Missal será enriquecido por várias celebrações dos santos) e evita-se uma duplicação dos textos, uma vez que estes já se encontram no Pontifical Romano (pp. 525-533)

1.4 Tríduo Pascal

Nas celebrações do Tríduo Pascal, as mais importantes do Ano Litúrgico, não há grandes novidades. Apenas alguns esclarecimentos sobre questões obscuras na segunda edição do Missal, que depois foram resolvidas pelo Cerimonial dos Bispos e pela Carta Circular Paschalis Sollemnitatis.

a) Missa da Ceia do Senhor:

Recorda-se que o altar deve ser ornado com flores “moderadamente” (de modo a não antecipar o júbilo da Vigília Pascal).

Sobre o Lava-pés, embora a terceira edição do Missal determine que dela participem apenas homens (“viri selecti”), a partir do Decreto de janeiro de 2016 é permitida também a participação de mulheres, mudando-se o texto para “Qui selecti sunt ex populo Dei” (“Aqueles que são escolhidos entre o povo de Deus”).

b) Celebração da Paixão do Senhor:

Antes das orientações da celebração propriamente dita, à frase “Hoje e amanhã, segundo antiquíssima tradição, a Igreja não celebra os sacramentos” (p. 254), o novo Missal acrescenta, esclarecendo: “exceto a Penitência e a Unção dos Enfermos”.

Sobre a Oração Universal a nova edição esclarece que, na ausência de diácono, as intenções são proferidas por um ministro leigo, do ambão. Embora na prática isto já venha sendo feito, a informação está ausente no atual Missal.

Na segunda forma da adoração da cruz, na qual se entoa a aclamação “Eis o lenho da cruz...” junto à porta, no meio da igreja e junto ao altar [3], permite-se que a cruz seja conduzida, na ausência do diácono, por um ministro leigo. Na atual versão do Missal apenas o sacerdote ou o diácono são autorizados a conduzir a cruz nesta segunda forma.

Papa Francisco venera a cruz apresentada pelo diácono (2019)

c) Vigília Pascal:

Sobre o sinal da cruz no início da Vigília já nos referimos acima. Além disso, o novo Missal reforça que na procissão com o círio não se levam nem a cruz nem os castiçais processionais, apenas o turíbulo com naveta do incenso que precedem o círio pascal.

Ainda sobre a procissão, na nova edição do Missal está claro que o círio pascal, na ausência do diácono, é conduzido por um ministro leigo e não pelo sacerdote, que caminha atrás com a sua vela.

Sobre a Liturgia da Palavra, ao recordar a possibilidade de omitir algumas leituras, é dito que devem ser proferidas ao menos três, tiradas “da Lei e dos Profetas”. Daqui pode se deduzir que deve ser escolhida ao menos uma leitura dentre as três primeiras, do Pentateuco (sendo que a leitura do Êxodo nunca pode ser omitida), e ao menos uma dentre as quatro últimas, dos Profetas.

1.5 Tempo Pascal

a) Novas orações

O Tempo Pascal é enriquecido por várias novas orações na terceira edição do Missal Romano, uma vez que muitas das orações deste tempo, particularmente as coletas (oração do dia), são repetidas em outras ocasiões.

Por exemplo, a oração do dia do V Domingo da Páscoa (p. 308) é a mesma do XXIII Domingo do Tempo Comum (p. 367). Assim, mantendo a oração no Tempo Comum, é proposto um novo texto para a Páscoa.

Os outros dias que recebem novos textos são:

Segunda-feira da II semana da Páscoa (p. 321): mesma oração do XIX Domingo do Tempo Comum (p. 363);

Quinta-feira da II semana da Páscoa (p. 325): mesma oração da segunda-feira da VI semana da Páscoa (p. 321);

Sexta-feira da II semana (p. 327): praticamente a mesma oração da quarta-feira da Semana Santa (p. 234), apenas invertida a ordem das frases;

Sábado da II semana (p. 328): praticamente a mesma oração do V Domingo da Páscoa, sobre a qual já falamos acima. Para este dia o novo Missal apresenta duas opções de oração do dia;

Segunda-feira da III semana (p. 331): mesma oração do XV Domingo do Tempo Comum (p. 359);

Segunda-feira da IV semana (p. 321): mesma oração do XIV Domingo do Tempo Comum (p. 358);

Sábado da IV semana (p. 329): a coleta deste dia se torna a nova oração do V Domingo da Páscoa. Portanto, é proposta outra oração para este sábado;

Segunda-feira da V semana (p. 331): mesma oração do XXI Domingo do Tempo Comum (p. 365);

Terça-feira da VI semana (p. 323): praticamente a mesma oração do III Domingo da Páscoa (p. 305).

b) Memória de “Maria, Mãe da Igreja” na segunda-feira depois de Pentecostes

Por fim, esta última mudança não se encontra na terceira edição do Missal, uma vez que foi realizada após sua impressão. Trata-se da inserção da memória de “Maria, Mãe da Igreja” na segunda-feira após o Pentecostes pelo Decreto divulgado em março de 2018, como um “eco” do Tempo Pascal.

As orações desta celebração, porém, já se encontram no Missal, como Missa votiva (p. 952), assim como na Coletânea de Missas de Nossa Senhora (p. 139).

Maria, Mãe da Igreja

Concluímos assim a primeira parte da nossa análise de algumas mudanças na terceira edição do Missal Romano. Na segunda parte traremos as Missas dos santos, enquanto que na terceira e última parte desta série analisaremos as Missas rituais, para diversas necessidades e votivas.

Notas:
[1] Também possuem uma Missa da Vigília as solenidades da Assunção de Maria (15 de agosto), da Natividade de São João Batista (24 de junho) e de São Pedro e São Paulo, Apóstolos (29 de junho).

[2] As três orações - oração do dia, sobre as oferendas e após a Comunhão - formam a eucologia “menor” em comparação à eucologia “maior”, que é a Oração Eucarística. A palavra “eucologia” significa “conjunto de orações”.

[3] Na primeira forma as três invocações são feitas junto ao altar pelo sacerdote.

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