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quarta-feira, 8 de julho de 2020

Liturgia na Exortação Ecclesia in Asia

Depois de analisar aqui em nosso blog as Exortações Apostólicas para a África e para a América, frutos dos Sínodos continentais em preparação para o Grande Jubileu do ano 2000, nesta postagem vamos contemplar a Exortação dirigida ao continente asiático.

A Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Ásia teve lugar em Roma de 19 de abril a 14 de maio de 1998. Teve como fruto a Exortação Apostólica Ecclesia in Asia, promulgada pelo Papa João Paulo II em 06 de novembro de 1999, durante uma viagem à Índia.

João Paulo II
Exortação Apostólica Pós-Sinodal Ecclesia in Asia
Sobre Jesus Cristo Salvador e a sua missão de amor e serviço na Ásia: «para que tenham vida e a tenham em abundância» (Jo 10,10)

Introdução

Como nos documentos anteriores, já na Introdução o Papa se refere à Liturgia, recordando as celebrações de abertura e de encerramento do Sínodo. Aqui vai além, destacando o caráter celebrativo de toda a Assembleia Sinodal, além de salientar os elementos típicos da cultura asiática nas celebrações:

O Sínodo foi uma evocação celebrativa dos caminhos asiáticos do cristianismo. Os Padres Sinodais recordaram a primeira comunidade cristã, a primitiva Igreja, pequenino rebanho de Jesus neste continente imenso (cf. Lc 12,32). Recordaram o que a Igreja recebeu e ouviu desde o início (cf. Ap 3,3), e, depois de o recordar, celebraram a «imensa bondade» (Sl 144,7) de Deus, que nunca falha. (...) Durante o Sínodo, aqueles que estiveram presentes foram testemunhas dum encontro extraordinariamente frutuoso entre as antigas e as novas culturas e civilizações da Ásia, um panorama maravilhoso na sua diversidade e convergência, especialmente quando símbolos, cânticos, danças e cores apareceram juntos, em harmoniosa combinação, à volta da Mesa do Senhor, nas Liturgias Eucarísticas de abertura e encerramento” (n. 04).

Papa Francisco celebra Missa na Terra Santa (2014)

Capítulo I: O contexto asiático

No capítulo I, ao descrever a realidade do continente asiático, o Papa recorda a diversidade dos ritos, fazendo referência às Igrejas Católicas Orientais, que aparecerão reiteradas vezes no Documento:

Uma análise das comunidades católicas na Ásia mostra uma variedade magnífica quer pela sua origem e desenvolvimento histórico, quer por causa das diferentes tradições espirituais e litúrgicas dos vários ritos. Mas, todas elas estão unidas na proclamação da Boa Nova de Jesus Cristo através do testemunho cristão e das obras de caridade e de solidariedade humana” (n. 09).

Com efeito, a maioria dos ritos orientais tem sua origem na Ásia, particularmente no Oriente Médio: o rito bizantino, originário de Constantinopla, na fronteira com a Europa (representado na Ásia pela Igreja Melquita); o rito antioqueno ou sírio-ocidental, da igreja de Antioquia (celebrado pelas igrejas Maronita e Siríaca); e o rito caldeu ou sírio-oriental, natural da Mesopotâmia (representado pela igreja caldeia).

Além do Oriente Médio, é originário ainda da Ásia o rito armênio, celebrado pela igreja de mesmo nome. Merece destaque também a Índia, com duas igrejas próprias: sírio-malankar (de rito antioqueno) e sírio-malabar (de rito caldeu).

Capítulo III: O Espírito Santo: Senhor que dá a vida

Depois de recordar no capítulo II a pessoa de Jesus Cristo e sua missão salvadora, sem referências à Liturgia, o capítulo III é dedicado à pessoa do Espírito Santo. Aqui se reflete sobre sua atuação no Batismo:


Criados à imagem de Deus, os homens tornam-se morada do Espírito duma forma nova quando são elevados à dignidade da adoção divina (cf. Gl 4,5). Renascidos pelo Batismo, experimentam a presença e o poder do Espírito, não tanto como Autor da Vida, mas como Aquele que purifica e salva, produzindo frutos de «caridade, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, temperança» (Gl 5,22-23)” (n. 15).

Papa Francisco celebra Missa na Coreia do Sul (2014)

Capítulo IV: Jesus Salvador: O dom a anunciar

No capítulo IV, sobre o anúncio de Jesus Cristo na Ásia, a Liturgia é compreendida a partir do conceito da inculturação. No n. 21 este tema é introduzido, com a Liturgia definida entre as grandes áreas de inculturação (junto com a catequese e a espiritualidade). No parágrafo seguinte este tema será aprofundado:

Liturgia é a fonte e o vértice de toda a vida e missão cristã (cf. Sacrosanctum concilium, 10). É decisivamente um meio de evangelização, sobretudo na Ásia, onde os seguidores das diferentes religiões são muito sensíveis ao culto, festas religiosas e devoções populares. Na sua maior parte, a Liturgia das Igrejas Orientais tem sido inculturada com bom êxito ao longo de séculos de interação com a cultura circundante, mas as Igrejas de formação mais recente precisam assegurar que a Liturgia se torne uma fonte ainda maior de nutrimento para os seus povos, através de um uso claro e efetivo de elementos tirados das culturas locais. Mas, para a inculturação litúrgica, não basta fixar a atenção sobre os valores, símbolos e rituais da cultura tradicional; é preciso atender também às mudanças causadas na consciência e nos comportamentos pelas culturas secularistas e consumistas emergentes, que estão a afetar o sentido asiático do culto e da oração. Nem se podem descuidar, numa inculturação litúrgica genuinamente asiática, as necessidades específicas dos pobres, migrantes, refugiados, jovens e mulheres” (n. 22).

Neste mesmo parágrafo motiva-se a colaboração entre as Conferências Episcopais asiáticas e a Congregação para o Culto Divino, a fim de estudar com seriedade o tema:

As Conferências Nacionais e Regionais dos Bispos têm necessidade de trabalhar de forma mais estreita com a Congregação do Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos na busca de meios efetivos para fomentar formas de culto apropriadas ao contexto asiático. Tal cooperação é essencial porque a Liturgia sagrada exprime e celebra a única fé professada por todos e, sendo herança de toda a Igreja, não pode ser determinada pelas Igrejas locais isoladamente da Igreja universal” (n. 22).

Ainda neste capítulo aparecem os sacramentos, sobretudo a Eucaristia, como elemento fundamental da espiritualidade cristã, sem a qual, por sua vez, não é possível a evangelização:

Quanto mais a comunidade cristã estiver arraigada na experiência de Deus que brota duma fé viva, tanto mais será capaz de anunciar credivelmente aos outros a realização do Reino de Deus em Cristo. Isso será o resultado da escuta fiel da palavra de Deus, da oração e contemplação, da celebração do mistério de Jesus nos sacramentos, sobretudo na Eucaristia, e do exemplo dado de verdadeira comunhão de vida e integridade de amor” (n. 23).

Capítulo V: Comunhão e diálogo ao serviço da missão

O capítulo V está centrado no tema do diálogo, tanto ad extra - com as outras igrejas cristãs e com as outras religiões, muito presentes na Ásia-, quanto ad intra, isto é, dentro da própria Igreja.

Primeiramente, já no início do capítulo, recorda-se que o fundamento deste diálogo ad intra é a comunhão instaurada pelo sacramento do Batismo:

O mistério do desígnio amoroso de Deus torna-se presente e ativo na comunidade de homens e mulheres que, pelo Batismo, foram sepultados com Cristo na morte, para que, como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, assim eles pudessem caminhar numa vida nova (cf. Rom 6, 4). No âmago do mistério da Igreja, está o vínculo de comunhão que une Cristo Esposo a todos os batizados” (n. 24).

Na sequência, ao apresentar as instâncias de vivência desta comunhão, como a paróquia, destaca-se a atuação dos movimentos eclesiais e sua vivência mais profunda dos sacramentos:

O Sínodo reconheceu também o contributo dos movimentos de renovação para a construção da comunhão, criando oportunidades para uma experiência mais íntima de Deus, através da fé e dos sacramentos, e fomentando a conversão da vida. É responsabilidade dos Pastores orientar, acompanhar e estimular estes grupos, de maneira que estejam bem integrados na vida e missão da paróquia e da diocese” (n. 25).

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Os parágrafos seguintes retomam e aprofundam o tema das Igrejas Católicas Orientais. Enquanto o n. 26 recorda as relações por vezes difíceis entre as igrejas de diferentes tradições litúrgicas, no n. 27 convida a reconhecer sua identidade própria:

A situação das Igrejas Católicas Orientais, sobretudo no Oriente Médio e na Índia, merece particular atenção. Desde os tempos apostólicos, aquelas têm sido guardiães de uma preciosa herança espiritual, litúrgica e teológica. As suas tradições e ritos, nascidos de uma profunda inculturação da fé no território de muitos países asiáticos, merecem o maior respeito. Com os Padres Sinodais, convido cada um a reconhecer os legítimos costumes e a legítima liberdade destas Igrejas em matéria disciplinar e litúrgica, como estipulado pelo Código dos Cânones das Igrejas Orientais” (n. 27).

Capítulo VII: Testemunhas do Evangelho

Por fim, após o capítulo VI, centrado na dimensão social da Igreja, sem referências à Liturgia, o capítulo VII recorda alguns sujeitos da ação evangelizadora na Ásia. Primeiramente, antes de falar dos pastores (Bispos e presbíteros), recorda-se a missão de todos os cristãos, recebida no Batismo:

(...) todos os batizados, pela graça do sacramento do Batismo, ficam incumbidos de tomar parte na missão salvadora de Cristo, sendo habilitados para isso mesmo pelo amor de Deus que foi derramado nos seus corações pelo Espírito Santo que lhes foi concedido (cf. Rm 5,5)” (n. 43).

No mesmo parágrafo aparece a missão de santificar exercida pelos Bispos e presbíteros através da celebração dos sacramentos:

Em virtude da Ordenação Episcopal e da comunhão hierárquica com a Cabeça do Colégio Episcopal, os Bispos recebem o mandato e a autoridade para ensinar, governar e santificar o Povo de Deus.
Associados aos Bispos no trabalho de proclamar o Evangelho, os presbíteros são chamados pela Ordenação a serem pastores do rebanho, pregadores da Boa Nova da salvação e ministros dos sacramentos” (n. 43).

Depois dos pastores, reitera-se o compromisso dos cristãos leigos, fundamentado nos sacramentos do Batismo e da Confirmação:

Como foi claramente indicado pelo Concílio Vaticano II, a vocação dos leigos situa-os no mundo, onde realizam as mais diversas tarefas, para aí difundirem o Evangelho de Jesus Cristo (cf. Lumen gentium, 31). Por graça e missão recebida no Batismo e na Confirmação, todos os leigos são missionários” (n. 45).

Por fim, a última referência à Liturgia no Documento diz respeito à família, convidando-a à participação nos sacramentos e a cultivar uma vida de oração:

(...) a família deve tomar parte ativa na vida paroquial, participando nos Sacramentos, especialmente na Eucaristia e no sacramento da Penitência, e comprometendo-se ao serviço dos outros. Mas significa também que os pais se devem esforçar por fazer, dos momentos em que a família está reunida, uma ocasião para rezar, para ler e meditar a Bíblia, para celebrações especiais presididas por eles próprios e para uma saudável recreação. Isto ajudará a família cristã a tornar-se um centro de evangelização, onde cada membro experimenta o amor de Deus e comunica-o aos outros” (n. 46).

Imagem da Virgem Maria com traços do Extremo Oriente

Nos próximos meses analisaremos as Exortações para a Oceania e a Europa, respectivamente no início de setembro e novembro. Acompanhe-nos!

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