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quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Leitura litúrgica da Carta aos Gálatas (2)

“Porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: Abbá, ó Pai!” (Gl 4,6)

Em nossa postagem anterior, em sintonia com o tema do “Mês da Bíblia” da Igreja no Brasil neste ano de 2021, começamos o estudo da Carta de São Paulo aos Gálatas (Gl), analisando sua leitura litúrgica segundo o critério da composição harmônica - escolha do texto em sintonia com o tempo ou a festa litúrgica - na Celebração Eucarística, nos sacramentos e sacramentais.

Aqui gostaríamos de dar continuidade a esta proposta, contemplando sua leitura em composição harmônica na Liturgia das Horas, antes de analisarmos sua leitura semicontínua [1].

A "conversão" de Paulo no caminho de Damasco
(Porta da Basílica de São Paulo fora-dos-muros - Roma)

2. Leitura litúrgica de Gl: Composição harmônica

c) Liturgia das Horas

Em relação à Liturgia das Horas, é preciso distinguir dois tipos de leituras: leituras longas, proferidas no Ofício das Leituras; e leituras breves, proferidas nas demais horas (Laudes, Hora Média e Vésperas).

Começamos pelas leituras longas da Carta aos Gálatas em composição harmônica, que são quatro:

Primeiramente, na Festa da Conversão de São Paulo (25 de janeiro) lemos Gl 1,11-24 [2], onde o Apóstolo faz sua apologia pessoal e narra como Cristo “revelou-se” a ele.

Uma versão mais longa deste texto é lida na Solenidade de São Pedro e São Paulo (29 de junho): Gl 1,15–2,10 [3], centrada nos encontros entre os dois Apóstolos: após a conversão de Paulo e no “Concílio de Jerusalém”.

Na Festa da Exaltação da Santa Cruz (14 de setembro), por sua vez, a Igreja nos propõe uma perícope formada por três trechos da Carta: Gl 2,19–3,7.13-14; 6,14-16 [4], nos quais Paulo faz referência ao mistério do Crucificado.

Por fim, no Ofício do Comum de Nossa Senhora é indicada como 2ª opção de leitura para o Tempo Comum a perícope de Gl 3,22–4,7 [5], com a afirmação fundamental da Encarnação: “Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher”.

"Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher" (Gl 4,4)
(Mosaico da Basílica de Santa Sofia - Constantinopla)

As leituras breves de Gl, por sua vez, são mais numerosas, presentes nos tempos do Natal, da Quaresma e da Páscoa, assim como nas celebrações dos santos.

No Tempo do Natal lemos o célebre texto sobre a Encarnação de Gl 4,4-5, como vimos acima, lido nas I Vésperas da Solenidade do Natal do Senhor e nas I e II Vésperas da Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus [6].

Na Quaresma também há apenas uma leitura da nossa Carta, na Hora Média (15h) dos sábados da Quaresma até a IV semana: Gl 6,7b-8 [7]. Aqui o Apóstolo propõe dois caminhos: quem semeia na carne, colherá a corrupção; quem semeia no Espírito, colherá a vida eterna.

No Tempo Pascal, por sua vez, são proclamadas duas leituras de Gl:

- na Hora Média (12h) das sextas-feiras do Tempo Pascal: Gl 3,27-28 [8], o célebre refrão batismal, como vimos na postagem anterior: “Vós todos que fostes batizados de Cristo, vos revestistes de Cristo”;

- nas Vésperas da sexta-feira da VII semana da Páscoa: Gl 5,16.22a-23a.25 [9]. Nas Vésperas da última semana do Tempo Pascal, as leituras são dedicadas ao Espírito Santo. O texto de Gl recorda, pois, os seus frutos: “caridade, alegria, paz...”.

Como um “eco” da Páscoa, no domingo após o Pentecostes celebra-se a Solenidade da Santíssima Trindade. Na Hora Média (12h) deste dia lê-se Gl 4,4a.5-6 [10] em chave trinitária: filhos no Filho, pelo Espírito podemos chamar a Deus “Abbá, Pai” (v. 6).

Passando às celebrações dos Santos, lemos primeiramente na Hora Média (12h) da Solenidade de São Pedro e São Paulo o texto de Gl 1,15-16a.17b-18a [11], no qual Paulo recorda seu encontro com Pedro em Jerusalém.

O encontro entre Pedro e Paulo
(Porta da Basílica de São Paulo fora-dos-muros - Roma)

Os célebres versículos de Gl 4,4-5, em chave mariana, são indicados em quatro ocasiões:
- nas Vésperas do Comum de Nossa Senhora [12];
- nas Laudes da Memória de Santa Maria no sábado (celebração votiva para o Tempo Comum) como 1ª opção de leitura breve [13];
- nas Vésperas da Memória de Nossa Senhora do Rosário (07 de outubro) e, no Brasil, nas I Vésperas da Solenidade de Nossa Senhora da Conceição Aparecida (12 de outubro) [14].

Por fim, a última leitura breve de Gl em composição harmônica encontra-se na Hora Média (9h) dos Comuns dos Santos Homens e das Santas Mulheres: Gl 6,7b-8 [15], com a advertência sobre semear na carne ou no Espírito, como vimos acima.

3. Leitura litúrgica de Gl: Leitura semicontínua

Concluído o percurso pela leitura da Carta aos Gálatas em composição harmônica, analisaremos agora sua leitura semicontínua, isto é, a proclamação dos principais textos do livro na sequência, oferecendo aos fiéis um maior contato com a Palavra de Deus.

a) Celebração Eucarística

A leitura semicontínua das Cartas Paulinas é realizada primeiramente como 2ª leitura dos domingos do Tempo Comum [16].

Aqui nossa Carta é lida entre o IX e o XIV Domingos do Tempo Comum do ano C, após a Primeira Carta aos Coríntios (cap. 12–15) e antes da Carta aos Colossenses.

As seis perícopes selecionadas são:
IX Domingo: Gl 1,1-2.6-10;
X Domingo: Gl 1,11-19;
XI Domingo: Gl 2,16.19-21;
XII Domingo: Gl 3,26-29;
XIII Domingo: Gl 5,1.13-18;
XIV Domingo: Gl 6,14-18 [17].

"O fruto do Espírito é: caridade, alegria, paz..." (Gl 5,22)

Também nos dias de semana do Tempo Comum leem-se de maneira semicontínua os livros do Antigo e do Novo Testamento, várias semanas cada um, conforme sua extensão, em um ciclo bienal (ano par e ano ímpar) [18].

Aqui a Carta aos Gálatas é lida entre a XXVII e a XXVIII semanas do Tempo Comum no ano par, antecedida pelo texto sapiencial do Livro de Jó e sucedida por outro texto paulino: a Carta aos Efésios.

As nove perícopes da nossa Carta indicadas aqui são:

XXVII semana do Tempo Comum (ano par):
Segunda-feira: Gl 1,6-12;
Terça-feira: Gl 1,13-24;
Quarta-feira: Gl 2,1-2.7-14;
Quinta-feira: Gl 3,1-5;
Sexta-feira: Gl 3,7-14;
Sábado: Gl 3,22-29 [19].

XXVIII semana do Tempo Comum (ano par):
Segunda-feira: Gl 4,22-24.26-27.31–5,1;
Terça-feira: Gl 5,1-6;
Quarta-feira: Gl 5,18-25 [20].

b) Liturgia das Horas

Na Liturgia das Horas a Carta é lida na íntegra no Ofício das Leituras da V semana do Tempo Comum, desta vez após outro escrito paulino (as duas Cartas aos Tessalonicenses, lidas na IV semana) e antes de um texto sapiencial (o Livro dos Provérbios, lido na VI semana).

As sete perícopes aqui são:

Ofício das Leituras da V semana do Tempo Comum
Domingo: Gl 1,1-12: O Evangelho de Paulo;
Segunda-feira: Gl 1,13–2,10: Vocação e apostolado de Paulo;
Terça-feira: Gl 2,11–3,14: O justo vive da fé;
Quarta-feira: Gl 3,15–4,7: A função da lei;
Quinta-feira: Gl 4,8-31: Herança divina e liberdade da nova aliança;
Sexta-feira: Gl 5,1-25: A liberdade na vida dos fiéis;
Sábado: Gl 5,25–6,18: Conselhos sobre a caridade e o zelo [21].

"É para a liberdade que Cristo nos libertou" (Gl 5,1)
(O Ressuscitado liberta os justos do Antigo Testamento do Hades - Fra Angelico)

No ciclo bienal do Ofício das Leituras, que ainda não foi traduzido para o Brasil, a Carta também é lida por sete dias, porém na IX semana do Tempo Comum no ano par, entre a Segunda Carta aos Coríntios e a Carta aos Filipenses.

Tanto no ciclo anual quanto no ciclo bienal a 2ª leitura do Ofício nesses dias é tomada de diversos textos patrísticos, destacando-se o Comentário sobre a Carta aos Gálatas de Santo Agostinho, Bispo (séc. V), lido em duas ocasiões.

Por fim, temos ainda sete pequenos trechos do nosso escrito como leituras breves, distribuídas ao longo das quatro semanas do Saltério:

- na Hora Média do domingo da I semana leem-se dois textos:
12h: Gl 6,7b-8 - a advertência sobre semear na carne ou no Espírito;
15h: Gl 6,9-10 - exortação a nunca se cansar de fazer o bem [22];

- na Hora Média da quinta-feira da II semana são três textos:
9h: Gl 5,13-14 - a liberdade é um dom que não nos deve levar ao pecado, mas ao amor;
12h: Gl 5,16-17 - exortação a agir segundo o Espírito, e não segundo a carne;
15h: Gl 5,22.23a.25 - elenco dos frutos do Espírito [23];

- na Hora Média (12h) do sábado da III semana lê-se Gl 5,26; 6,2 [24], uma exortação a não buscar a vanglória e a ajudarmo-nos uns aos outros;

- nas Laudes da sexta-feira da IV semana, por fim, a Igreja põe em nossos lábios e em nossos ouvidos Gl 2,19b-20 [25], a afirmação de Paulo sobre sua comunhão com o Senhor: “Eu vivo, mas não eu, é Cristo que vive em mim”.

Vale lembrar, porém, que essas leituras são proferidas apenas no Tempo Comum, uma vez que os Tempos do Advento, Natal, Quaresma e Páscoa possuem leituras próprias.

"É Cristo que vive em mim" (Gl 2,20)
(Ícone de Paulo e Cristo)

Notas:
[1] Para os dois critérios de seleção dos textos, cf. Elenco das Leituras da Missa, n. 66. ALDAZÁBAL, José. A Mesa da Palavra I: Elenco das Leituras da Missa - Texto e Comentário. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 76.
[2] OFÍCIO DIVINO. Liturgia das Horas segundo o Rito Romano. Tradução para o Brasil da segunda edição típica. São Paulo: Paulus, 1999, v. III, p. 1207.
[3] ibid., v. III, p. 1390. Como vimos na postagem anterior, no Brasil esta Solenidade é transferida para o domingo.
[4] ibid., v. IV, p. 1268.
[5] ibid., v. III, p. 1512; v. IV, p. 1524. A 1ª opção de leitura é do Antigo Testamento (Is 7,10-14; 8,10c; 11,1-9). No Advento, Natal, Quaresma e Páscoa são indicadas outras leituras, a fim de oferecer uma maior diversidade de textos.
[6] ibid., v. I, pp. 355.429.442.
[7] ibid., v. II, pp. 69.126.183.240.300. A V semana da Quaresma possui textos próprios, já entrando no mistério da Paixão.
[8] ibid., v. II, pp. 552.613.666.722.775.854.907.
[9] ibid., v. II, p. 907.
[10] ibid., v. III, p. 534.
[11] ibid., v. III, p. 1398.
[12] ibid., v. I, pp. 1146.1166; v. II, pp. 1666.1690; v. III, pp. 1504.1527; v. IV, pp. 1516.1539. Nas solenidades a leitura é proferida nas I e II Vésperas.
[13] ibid., v. III, p. 1541; v. IV, p. 1553. As outras opções são Is 61,10 e Ap 12,1.
[14] ibid., v. IV, pp. 1357-1365.
[15] ibid., v. I, pp. 1321.1345; v. II, pp. 1874.1899; v. III, pp. 1697.1723; v. IV, pp. 1709.1735.
[16] cf. ALDAZÁBAL, op. cit., p. 104.
[17] LECIONÁRIO I: Dominical A-B-C. Tradução portuguesa da 2ª edição típica para o Brasil. São Paulo: Paulus, 1994, pp. x-x.
[18] cf. ALDAZÁBAL, op. cit., p. 105.
[19] LECIONÁRIO II: Semanal. Tradução portuguesa da 2ª edição típica para o Brasil. São Paulo: Paulus, 1995, pp. x-x.
[20] ibid., pp. x-x.
[21] OFÍCIO DIVINO, v. III, pp. 145.149.153.157.160.164.168.
[22] ibid., v. III, p. 633; v. IV, p. 587.
[23] ibid., v. III, pp. 849-850; v. IV, pp. 803-804.
[24] ibid., v. III, p. 1025; v. IV, p. 979.
[25] ibid., v. III, p. 1135; v. IV, p. 1089.

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