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sábado, 4 de setembro de 2021

Congresso Eucarístico 2021: Eucaristia no Concílio Vaticano II

De 05 a 09 setembro de 2021 se celebra em Budapeste (Hungria) o 52º Congresso Eucarístico Internacional. Inicialmente programado para 2020, foi adiado devido à pandemia de Covid-19.

Nos últimos dias, após traçar um breve histórico dos Congressos, começamos a apresentar o texto-base, divulgado pelo Pontifício Comitê para os Congressos Eucarísticos Internacionais, com reflexões teológicas e pastorais a partir do tema: “‘Todas as minhas fontes estão em ti’ (Sl 86/87,7): A Eucaristia: fonte da vida e da missão cristã”.

Após o capítulo 2, com os fundamentos bíblicos do tema, e o capítulo 3, sobre a Eucaristia do Novo Testamento ao Concílio de Trento, prosseguimos a reflexão com o capítulo 4: “A Eucaristia no Concílio Vaticano II”.

Papa Paulo VI celebra a Eucaristia

A Eucaristia no Concílio Vaticano II

O primeiro impulso inovador, após os decretos do Concílio de Trento, que guiaram a reflexão teológica e a catequese nos séculos seguintes, veio do Movimento Litúrgico. Partindo de exigências pastorais, o movimento contribuiu, entre muitas outras coisas, para redescobrir a Eucaristia como presença da ação salvífica da Páscoa de Cristo e para a valorização do princípio da “participação ativa”. Assim, juntamente com a ação dos Movimentos Bíblico e Patrístico, ele preparou o terreno favorável - no contexto do regresso às fontes e à Tradição sancionado pelo Vaticano II - para uma nova síntese da doutrina eucarística. Mesmo sem produzir um texto particular sobre a Eucaristia, o Concílio Vaticano II (1962-1965) tratou o tema em muitos documentos, muito além da Constituição sobre a Liturgia (Sacrosanctum Concilium).

1. A Eucaristia é fonte e cume da vida cristã

Para o Concílio Vaticano II a celebração da Eucaristia é “fonte e ápice de toda a vida cristã” [1], “raiz e centro” da comunidade cristã [2], “fonte da vida da Igreja” [3], “fonte e ápice de toda a evangelização” [4], “centro e ápice de toda a vida da comunidade cristã” [5], da qual “a Igreja continuamente vive e cresce” [6].
A afirmação de que a Eucaristia é “fonte e ápice da vida e da missão da Igreja” radicou-se profundamente na nossa linguagem, tornando-se um lugar comum da teologia. A sua origem encontra-se na Lumen Gentium, onde, falando do “sacerdócio comum” de todos os fiéis, se diz: “Os fiéis... pela participação no sacrifício eucarístico de Cristo, fonte e ápice de toda a vida cristã, oferecem a Deus a vítima divina e se oferecem a si mesmos juntamente com ela” [7].
A Eucaristia não é só o ato de todo o povo sacerdotal dos batizados, mas é também a “forma”, isto é, o modelo, o seio da Igreja. Poderíamos dizer de outro modo, que “na santíssima Eucaristia está contido todo o tesouro espiritual da Igreja, isto é, o próprio Cristo, nossa Páscoa e Pão vivo, que com a sua carne, vivificada e vivificante pela força do Espírito Santo, dá a vida aos homens” [8].
O Concílio apresenta depois a Eucaristia em relação não só com o sacrifício da cruz, mas também com a totalidade do Mistério Pascal: “O nosso Salvador instituiu na última Ceia, na noite em que foi entregue, o sacrifício eucarístico do seu Corpo e do seu Sangue, para perpetuar o sacrifício da Cruz ao longo dos séculos até que Ele venha, e para confiar à Igreja, sua Esposa amada, o memorial da sua Morte e Ressurreição: sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade, banquete pascal em que se recebe Cristo, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da glória futura” [9].
Por isso, a Eucaristia não é só uma oração ou um canto, mas a celebração de uma Páscoa, uma ação ordenada não só a produzir ou a causar a presença real, mas a recuperar a riqueza de todo o Mistério Pascal.
Outra novidade conciliar é a correlação entre a mesa da Palavra e a mesa da Eucaristia. A Liturgia da Palavra, oportunamente relacionada com a progressão do Ano Litúrgico, é parte integrante da celebração. Cristo, na verdade, “está presente na sua Palavra, pois é Ele quem fala quando na Igreja se lê a Sagrada Escritura” [10]. Na estrutura binária da Celebração Eucarística, a Liturgia da Palavra proclama a história da salvação realizada por Deus, enquanto a Liturgia Eucarística celebra e torna presente esta história no seu momento culminante: a Morte e a Ressurreição de Jesus Cristo, a sua Páscoa gloriosa. A primeira parte da Missa proclama e torna presente a salvação; a segunda parte realiza-a em plenitude através da participação sacramental no Corpo e Sangue de Cristo. A Palavra cria na assembleia aquela atitude de fé que dá pleno sentido à celebração do sinal sacramental.
Esta realidade única é obra do Espírito Santo que suscitou a Palavra e santificou o pão e o vinho para convertê-los no Corpo e Sangue de Cristo. “Como da assídua frequência do mistério eucarístico vai crescendo a vida da Igreja, assim também é lícito esperar um novo impulso de vida espiritual se crescer a veneração pela Palavra de Deus, que ‘permanece para sempre’” [11].

O Livro da Palavra de Deus, no centro das sessões do Concílio

2. A Eucaristia faz a Igreja

No Concílio, a Eucaristia atinge a sua plena dimensão eclesial segundo a expressão do jesuíta francês Henri de Lubac (1896-1991), “a Eucaristia faz a Igreja”, que ratifica a recuperação do modelo eucarístico desenvolvido pelos Padres da Igreja. A Celebração Eucarística é um acontecimento dinâmico no qual a Igreja recebe os dons do pão e do vinho transformados para se transformar, por sua vez, no Corpo de Cristo. A assembleia cristã é convidada a receber o Corpo eucarístico de Cristo para se tornar o seu corpo eclesial.

Esta dimensão “comunional” da Igreja baseada na Eucaristia foi desenvolvida sobretudo na Lumen Gentium. Percorrendo rapidamente o documento conciliar, desde o início encontramos afirmações importantes: “Pelo sacramento do pão eucarístico, ao mesmo tempo é representada e se realiza a unidade dos fiéis, que constituem um só Corpo em Cristo” [12], referência direta ao texto paulino de 1Cor 10,17. A mesma declaração é retomada pouco depois: “Ao participar realmente do Corpo do Senhor no pão eucarístico, somos elevados à comunhão com Ele e uns com os outros: ‘Porque há um só pão, nós, que somos muitos, formamos um único corpo, visto participarmos todos do único pão’ (1Cor 10,17). E deste modo nos tornamos todos membros desse corpo (1Cor 12,27), sendo individualmente membros uns dos outros (Rm 12,5)” [13]. A Eucaristia não só indica a unidade da Igreja, mas realiza-a: “Alimentando-se do Corpo de Cristo na santa Comunhão, (os fiéis) mostram concretamente a unidade do povo de Deus, que por este augustíssimo sacramento é adequadamente significado e maravilhosamente efetuado” [14].
Encontramos a declaração mais importante sobre esse tema, no entanto, na seção que se refere à função episcopal. Depois de deixar claro que a eclesiologia eucarística leva a uma nova avaliação teológica da Igreja particular, afirma-se: “Em qualquer comunidade que participa do altar, sob a sagrada presidência do Bispo, é manifestado o símbolo do amor e da ‘unidade do Corpo místico, sem a qual não pode haver salvação’. Nestas comunidades, embora muitas vezes pequenas e pobres ou dispersas, está presente Cristo, por cujo poder se unifica a Igreja una, santa, católica e apostólica pois ‘outra coisa não faz a participação no Corpo e Sangue de Cristo, do que transformar-nos naquilo que recebemos’” [15].
No período pós-conciliar, o renascimento da eclesiologia eucarística de comunhão veio da Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos de 1985, que colocou no centro dos seus trabalhos a Igreja como Comunhão: “A eclesiologia de comunhão é a ideia central e fundamental nos documentos do Concílio (...). Trata-se, fundamentalmente, da comunhão com Deus por meio de Jesus Cristo, no Espírito Santo. Esta comunhão acontece na Palavra de Deus e nos sacramentos. O Batismo é a porta e o fundamento da comunhão na Igreja. A Eucaristia é a fonte e o ápice de toda a vida cristã. A comunhão do Corpo eucarístico de Cristo significa e produz, ou seja, edifica, a íntima comunhão de todos os fiéis no Corpo de Cristo que é a Igreja” [16].
Por isso João Paulo II poderá afirmar que “há um influxo causal da Eucaristia nas próprias origens da Igreja” [17].

Uma das sessões do Concílio Vaticano II

Notas:
[1] CONCÍLIO VATICANO II, Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, 1964, n. 11.
[2] Decreto Presbyterorum Ordinis sobre o ministério e a vida dos sacerdotes, n. 06.
[3] Decreto Unitatis Redintegratio sobre o ecumenismo, 1964, n. 15.
[4] Presbyterorum Ordinis, n. 05.
[5] Decreto Christus Dominus sobre a missão pastoral dos Bispos na Igreja, 1965, n. 30.
[6] Lumen Gentium, n. 26.
[7] Esta definição da Lumen Gentium, n. 11 volta também em: Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia, 1963, n. 10; Christus Dominus, n. 30; Decreto Ad Gentes sobre a atividade missionária da Igreja, 1965, nn. 9.39; Unitatis Redintegratio, n. 15; Presbyterorum Ordinis, nn. 05.14; Decreto Apostolicam Actuositatem sobre o apostolado dos leigos, 1965, n. 03; Constituição Pastoral Gaudium et Spes sobre a Igreja no mundo contemporâneo, 1965, n. 38; cf. R. FALSINI, La Liturgia “come culmen et fons”: Genesi e sviluppo di un tema conciliare, in: VV. AA., Liturgia e spiritualità, Roma, 1992, 27–49.
[8] Presbyterorum Ordinis, n. 05.
[9] Sacrosanctum Concilium, n. 47.
[10] ibid., 07. O mesmo número apresenta a visão geral dos diferentes modos da presença de Cristo na celebração e representa uma das afirmações conciliares mais novas em relação à piedade eucarística medieval.
[11] Constituição Dogmática Dei Verbum sobre a Revelação Divina, 1965, n. 26.
[12] Lumen Gentium, n. 03.
[13] ibid., n. 07.
[14] ibid., n. 11.
[15] ibid., n. 26.
[16] Relatório Final, II C 1; in: ENCHIRIDION VATICANUM 9, Bologna, 1987 p. 1761.
[17] JOÃO PAULO II, Carta Encíclica Ecclesia de Eucharistia, 2003, n. 21.


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