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sábado, 25 de maio de 2019

Liturgia na Exortação Apostólica Christus vivit

Há dois meses, no dia 25 de março de 2019, Solenidade da Anunciação do Senhor, o Papa Francisco assinou no Santuário de Nossa Senhora em Loreto a Exortação Apostólica Christus vivit (Cristo vive), fruto do Sínodo dos Bispos de 2018 com o tema “Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”.

Como fizemos com o Instrumentum laboris e com o Documento Final do Sínodo, analisaremos nesta postagem a Exortação Apostólica do Papa sob a perspectiva da Liturgia.

Embora boa parte da Exortação retome trechos do Documento Final, há nela também algumas novidades. De seus 299 parágrafos, divididos em 9 capítulos, há 12 que fazem referência à Liturgia, aos Sacramentos e à piedade popular.

Capítulo II: JESUS CRISTO SEMPRE JOVEM

A primeira referência à Liturgia aparece no II capítulo, no qual o Papa Francisco propõe a pessoa de Jesus Cristo como modelo para os jovens e para a Igreja. No parágrafo 35 o Papa pede uma Igreja jovem e indica onde ela pode encontrar esta juventude: “é jovem quando é ela mesma, quando recebe a força sempre nova da Palavra de Deus, da Eucaristia, da presença de Cristo e da força do seu Espírito em cada dia. É jovem quando consegue voltar continuamente à sua fonte”.
Vemos nesta afirmação um eco das palavras de São João Paulo II, que afirmava: “A Igreja vive da Eucaristia” (Ecclesia de Eucharistia, n. 1). Aqui Francisco continua: “A Igreja descobre sua juventude, encontra sua força na Eucaristia”.

Capítulo V: PERCURSOS DE JUVENTUDE

No capítulo V, durante o qual o Santo Padre reflete sobre a realidade da juventude hoje, há outras duas referências à importância da Eucaristia: primeiramente, no parágrafo 161, refletindo sobre o tema do crescimento e da maturidade, Francisco afirma: “Crescer quer dizer conservar e alimentar as coisas mais preciosas que te oferece a juventude, mas ao mesmo tempo significa estar disponível para purificar o que não é bom e receber novos dons de Deus, que te chama a desenvolver o que tem valor”. Por isso, aconselha, “é melhor deixares-te amar por Deus, que te ama como és, aprecia-te e respeita-te, não cessando, porém, de te cumular cada vez mais da sua amizade, fervor na oração, fome da sua Palavra, anseio de receber Cristo na Eucaristia, vontade de viver o seu Evangelho, força interior, paz e alegria espiritual”.

No n. 173, por sua vez, ao convidar os jovens a assumirem compromissos na Igreja e na sociedade, Francisco mais uma vez afirma que a Eucaristia é a fonte viva onde encontrar a força para a missão: “Como no milagre de Jesus, os pães e os peixes dos jovens podem multiplicar-se (cf. Jo 6,4-13). Como na parábola, as pequenas sementes dos jovens tornam-se árvores e frutos de colheita (cf. Mt 13,23.31-32). Tudo isto se realiza a partir da fonte viva da Eucaristia, na qual o nosso pão e o nosso vinho se transformam para nos dar a Vida eterna”.

Adoração Eucarística na JMJ 2019 (Panamá)
Capítulo VII: A PASTORAL DOS JOVENS

O capítulo VII, no qual o Pontífice apresenta propostas concretas para a Pastoral da Juventude, contém cinco referências ao tema da Liturgia. O número 224 reflete primeiramente sobre a busca dos jovens por momentos de oração, incluindo a adoração eucarística, nos quais se valorize o silêncio:
Muitos jovens são capazes de aprender a amar o silêncio e a intimidade com Deus. Aumentou também o número dos grupos que se reúnem para adorar o Santíssimo Sacramento e rezar com a Palavra de Deus. Não se subestimem os jovens como se fossem incapazes de abrir-se a propostas contemplativas; basta encontrar os estilos e modalidades adequados para os ajudar a entrar nesta experiência de tão alto valor”.

(Recentemente publicamos um texto sobre o valor do silêncio diante da ditadura do ruído)

Neste mesmo parágrafo 224 há uma citação do Documento Final do Sínodo, em seu número 51, no qual os Padre Sinodais expressaram o desejo dos jovens por uma Liturgia viva e cheia de sentido: “Relativamente aos setores do culto e da oração, «em diferentes contextos, os jovens católicos pedem propostas de oração e momentos sacramentais capazes de tocar a sua vida diária, numa Liturgia nova, autêntica e jubilosa» (Documento Final, n. 51)”.

Por fim, o parágrafo conclui com um acréscimo do Papa Francisco, no qual este aconselha valorizar a pedagogia própria do Ano Litúrgico: “É importante valorizar os momentos mais fortes do Ano Litúrgico, particularmente a Semana Santa, o Pentecostes e o Natal. Prezam muito também outros encontros de festa, que quebram a rotina e ajudam a experimentar a alegria da fé”.

Continuando nossa análise do capítulo VII, temos no parágrafo 226 uma referência à importância da música para os jovens, inclusive no contexto da Liturgia, retomando o n. 47 do Documento Final do Sínodo: «De importância muito peculiar se reveste a música, que representa um verdadeiro e próprio ambiente onde os jovens estão constantemente imersos, bem como uma cultura e uma linguagem capazes de suscitar emoções e moldar a identidade. A linguagem musical constitui também um recurso pastoral, que interpela de modo particular a Liturgia e a sua renovação» (Documento Final, n. 47)”.
O Papa Francisco acrescentou ainda uma citação de Santo Agostinho sobre a música: “O canto pode ser um grande estímulo no percurso dos jovens. Dizia Santo Agostinho: «Canta, mas caminha; cantando, alivia a fadiga, mas não te dês à preguiça; canta e caminha. (...) Tu, se progrides, caminhas. Mas progride no bem, progride na verdadeira fé, progride na vida santa. Canta e caminha» (Agostinho, Sermão 256)”.

Concluindo a série de propostas pastorais iniciadas no n. 224, no parágrafo 229 o Papa sintetiza recordando a importância da Palavra e dos sacramentos: há dons de Deus que são sempre atuais e contêm uma força que transcende todos os tempos e circunstâncias: a Palavra do Senhor sempre viva e eficaz, a presença de Cristo na Eucaristia que nos alimenta e o Sacramento do Perdão que nos liberta e fortalece”.

Papa Francisco atende confissões durante a JMJ 2019 (Panamá)
No n. 238 da Exortação, Francisco recorda um tema abordado reiteradas vezes em seu pontificado: a piedade popular. Neste parágrafo há inclusive duas citações da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium:
As várias manifestações de piedade popular, especialmente as peregrinações, atraem jovens que não se inserem facilmente nas estruturas eclesiais e são uma expressão concreta da confiança em Deus. Estas formas de busca de Deus, presentes particularmente nos jovens mais pobres mas também nos outros setores da sociedade, não devem ser desprezadas, mas encorajadas e estimuladas. Porque a piedade popular «é uma maneira legítima de viver a fé» (Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, n. 124) e é «expressão da atividade missionária espontânea do povo de Deus» (ibid., n. 122)”.

Por fim, o último parágrafo do capítulo VII sobre o tema da Liturgia, versa sobre o tema do sacramento do Matrimônio. Ao falar sobre o acompanhamento dos jovens pelos adultos, o Papa Francisco afirma no n. 242 da Exortação que a Pastoral da Juventude, unida à Pastoral Familiar, deve ajudar os jovens na preparação para o Matrimônio:
A pastoral juvenil propõe um projeto de vida baseado em Cristo: a edificação duma casa, duma família construída sobre a rocha (cf. Mt 7,24-25). Para a maioria deles, esta família, este projeto concretizar-se-á no Matrimônio e na caridade conjugal. Por isso, é necessário que a pastoral juvenil e a pastoral familiar tenham uma continuidade natural, trabalhando de maneira coordenada e integrada para poder acompanhar adequadamente o processo vocacional”.

Capítulo VIII: A VOCAÇÃO

O tema da preparação para o Matrimônio, já referido acima, é retomado no Capítulo VIII, que versa sobre o tema da vocação, especificamente no bloco de parágrafos que trata do amor e da família (nn. 259-267).

Primeiramente no n. 260 o Papa Francisco recorda seu discurso aos jovens durante sua visita à Assis em 2013: “Apraz-me pensar que «dois cristãos que casam reconheceram na sua história de amor a chamada do Senhor, a vocação a formar de duas pessoas, varão e mulher, uma só carne, uma só vida. E o sacramento do Matrimônio corrobora este amor com a graça de Deus, arraigando-o no próprio Deus. Com este dom, com a certeza desta vocação, é possível começar com segurança, sem medo de nada, para juntos enfrentar tudo!»”.

O n. 264, por sua vez, retoma o discurso do Papa aos voluntários da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro em 2013, quando encoraja os jovens ao Matrimônio em oposição à “cultura do provisório”:
Reina hoje a cultura do provisório, que é uma ilusão. Julgar que nada pode ser definitivo é um engano e uma mentira. Muitas vezes ouvis dizer que «hoje o casamento está ‘fora de moda’ (…). Na cultura do provisório, do relativo, muitos pregam que o importante é ‘curtir’ o momento, que não vale a pena comprometer-se por toda a vida, fazer escolhas definitivas (…). Em vez disso, peço-vos para serdes revolucionários, peço-vos para irdes contracorrente; sim, nisto, peço que vos rebeleis: que vos rebeleis contra esta cultura do provisório que, no fundo, crê que vós não sois capazes de assumir responsabilidades, crê que vós não sois capazes de amar de verdade». Ao contrário, eu tenho confiança em vós e, por isso, vos encorajo a optar pelo Matrimônio”.

Por fim, no n. 265, o Papa exorta à preparação para o Matrimônio pela educação para as virtudes: “É necessário preparar-se para o Matrimônio; isto requer educar-se a si mesmo, desenvolver as melhores virtudes, sobretudo o amor, a paciência, a capacidade de diálogo e de serviço. Implica também educar a própria sexualidade, para que seja sempre menos um instrumento para usar os outros, e cada vez mais uma capacidade de se doar plenamente a uma pessoa, de maneira exclusiva e generosa”.

Capítulo IX: O DISCERNIMENTO

A última referência à Liturgia na Exortação é justamente no parágrafo final, n. 299, no qual o Papa retoma um trecho do seu discurso aos jovens italianos durante um encontro de oração em preparação ao Sínodo em agosto de 2018. Neste discurso Francisco menciona mais uma vez a importância da presença de Cristo na Eucaristia, exortando aos jovens: Correi «atraídos por aquele Rosto tão amado, que adoramos na sagrada Eucaristia e reconhecemos na carne do irmão que sofre. O Espírito Santo vos impulsione nesta corrida para a frente. A Igreja precisa do vosso ímpeto, das vossas intuições, da vossa fé. Nós temos necessidade disto! E quando chegardes aonde nós ainda não chegamos, tende a paciência de esperar por nós»”.

Missa de encerramento da JMJ 2019 (Panamá)

Confira a Exortação na íntegra no site da Santa Sé.

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