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quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Amanhã Eu virei: Uma reflexão sobre as Antífonas do Ó

Já publicamos em nosso blog uma postagem apresentando as Antífonas do Ó, rezadas pela Igreja de 17 a 23 de dezembro como preparação próxima para o Natal do Senhor.

Aqui publicamos uma reflexão sobre cada uma das sete antífonas feita por Dom Henrique Soares da Costa (†2020), Bispo de Palmares (PE), destacando sobretudo seus fundamentos bíblicos:

Dom Henrique preside a Missa do Domingo Gaudete (III do Advento)

Ó Sabedoria! (17/12)
Ó Sabedoria, que saístes da boca do Altíssimo, atingindo de uma a outra extremidade e tudo dispondo com força e suavidade; vinde ensinar-nos o caminho da prudência!

São Paulo afirma que Jesus é a Sabedoria de Deus (cf. 1Cor 1,24) e o próprio Jesus chegou a Se apresentar como a Sabedoria que é reconhecida pelos Seus filhos (cf. Lc 7,35). De fato, toda esta antífona, de profunda teologia, parte desta certeza.
Depois, desenvolve o tema inspirando-se nos livros sapienciais, que nos apresentam a Sabedoria criadora.
Para os cristãos, Jesus é esta Sabedoria, através da qual desde o princípio tudo foi criado e tudo é conduzido. Eis alguns textos da Escritura que serviram de inspiração para a nossa antífona. São textos referentes à Sabedoria que, para nós, cristãos, é o Cristo Jesus:
“O Senhor me formou, primícias de Sua obra, de Seus feitos mais antigos. Desde a eternidade fui estabelecida, desde o princípio, antes da origem da terra. Quando os abismos não existiam, eu fui gerada, quando não existiam os mananciais de água. Antes que as montanhas fossem implantadas, antes das colinas, eu fui gerada; Ele ainda não havia feito a terra e a erva, nem os primeiros elementos do mundo. Quando firmava os céus, lá eu estava, quando traçava a abóbada sobre a face do abismo... Eu estava junto com Ele como o mestre-de-obras, eu era o Seu encanto todos os dias, todo o tempo brincava em Sua presença: brincava na superfície da terra, e me alegrava com os homens” (Pr 8,22-31).
“A Sabedoria faz seu próprio elogio: ‘Saí da boca do Altíssimo e como neblina cobria a terra. Só eu rodeei a abóbada celeste, eu percorri a profundeza dos abismos’” (Eclo 24,1-5).
“Os ingênuos venham aqui; quero falar aos sem juízo: Vinde comer do meu pão e beber do vinho que misturei. Deixai a ingenuidade e vivereis, segui o caminho da inteligência” (Pr 9,4-6).
Pois bem, eis a surpresa! Eis o inesperado: esta Sabedoria infinita, inesgotável e eterna nasceria de Maria Virgem como uma criancinha que sequer pode falar!
É por Ela que a Igreja hoje suplica humildemente. Quem se abre para acolhê-La descobre o sentido da vida e vive uma existência na verdadeira prudência, sabendo chamar o certo de certo e o errado de errado, porque adquire a capacidade de ver e avaliar tudo com os olhos da Sabedoria de Deus, o Cristo Jesus!


Ó Senhor-Adonai! (18/12)
Ó Adonai, Guia da Casa de Israel, que aparecestes a Moisés na chama de fogo, no meio da sarça ardente e lhe destes a Lei no Sinai; vinde resgatar-nos pelo poder do Vosso braço!

Nesta Antífona de hoje, 18 de dezembro, toda atenção se volta para o Êxodo. Vejamos bem como a Liturgia recolhe contemplativamente a Sagrada Escritura, relida toda ela em Cristo:
Adonai” é o nome com o qual os judeus chamam o Deus de Israel, evitando pronunciar “IAHWEH”, o Nome santíssimo revelado a Moisés no Sinai.
Chamar Jesus de Adonai (Senhor) é chamá-Lo de Deus, o Deus Libertador de Israel, que arrancou Seu povo das trevas da escravidão no Egito e o guiou pelo deserto áspero e pavoroso por quarenta anos. Pois bem, o Adonai, Guia da Casa de Israel fazia-Se presente no meio do Seu povo de modo misterioso pelo Filho eterno: Ele foi a Rocha da qual brotou a água do Espírito no deserto, Ele foi o maná que alimentou o povo, prenunciando a Eucaristia, Ele guiou o Seu povo pela nuvem luminosa, também ela símbolo do Espírito... Foi Ele também que falou a Moisés no meio da sarça ardente e lhe deu a Lei sobre o Monte Sinai.
Para os Santos Padres dos primeiros séculos cristãos tudo isso era muito claro. O Filho é a eterna revelação do Pai. Sendo assim, deste o Antigo Testamento, de modo velado, o Pai vai falando à humanidade por Sua Palavra única e eterna: o Filho amado, que um dia haveria de fazer-Se carne de Maria, a Virgem.
Por isso, a Igreja, unida à Virgem Maria, cheia de admiração suplica que Ele venha para resgatar o Seu povo pela Sua potência, do mesmo modo que fez ao abrir o Mar Vermelho, com mão forte e braço estendido.


Ó Raiz de Jessé! (19/12)
Ó Raiz de Jessé, erguida como estandarte dos povos, em cuja presença os reis se calarão e a quem as nações invocarão; vinde libertar-nos, não tardeis mais!

Hoje, Aquele que vem é saudado e invocado como Raiz de Jessé, aquela mesma de que fala Is 11,1, o Descendente prometido a Davi, o Rei eterno de Israel de Quem tanto falaram os salmos e os profetas.
“Naquele dia, a raiz de Jessé, que se ergue como um sinal para os povos, será procurada pelas nações, e a sua morada se cobrirá de glória. Ele erguerá um sinal para as nações” (Is 11,10.12a).
Mas, misteriosamente, de modo profundo e cheio de sentido das coisas de Deus, a antífona mistura esse Messias Rei glorioso com o Servo Sofredor, humilhado e morto por nós pela salvação do mundo:
“Eis que o Meu Servo há de prosperar, ele se elevará, será exaltado, será posto nas alturas. Exatamente como multidões ficaram pasmadas à vista d'Ele - tão desfigurado estava o Seu aspecto - e a Sua forma não parecei a de um homem - assim agora nações numerosas ficarão estupefatas a Seu respeito, reis permanecerão silenciosos, ao verem coisas que não lhes haviam sido contadas e ao tomarem consciência de coisas que não tinham ouvido” (Is 52,13-15).
Eis o misterioso plano de Deus, a misteriosa lógica do Evangelho: o esperado Descendente de Davi não viria coberto de glória, mas pobre e humilde Servo sofredor, que reinaria pela cruz e, por um ato de amor total e puro, até o fim, libertaria toda a humanidade que o acolhesse e triunfaria na glória por toda a eternidade.
Este era o sonho de Deus, isto foi o que o nosso Salvador, Rei-Messias realizou, esta é a realidade da nossa fé e a causa da nossa esperança.
Bendita seja a Raiz de Jessé, o Cristo nosso Deus!


Ó Chave de Davi! (20/12)
Ó Chave de Davi, e cetro da Casa de Israel, que abris e ninguém fecha, fechais e ninguém abre: vinde e libertai da prisão o cativo assentado nas trevas e à sombra da morte!

“Chave da Casa de Davi”. Este título dado ao Cristo que vem é inspirado em Is 22,22s, que se refere a Eliaquim, guardião da Casa de Davi como mordomo do palácio real: “Porei sobre os seus ombros a chave da Casa de Davi: quando ele abrir, ninguém fechará; quando ele fechar, ninguém abrirá. Cravá-lo-ei como uma cavilha em lugar firme: ele virá a ser um trono de glória para a cada de seu pai”.
Jesus é o verdadeiro Messias, descendente de Davi por excelência, honra da Casa de Davi. Seu reino é eterno sem fim, seu poder jamais passará. A imagem de abrir e fechar são termos para indicar o poder de absolver e condenar, realçando a missão de juiz que o Rei-Messias possui.
No Apocalipse esta imagem volta com toda a força: aí Jesus é apresentado como “o Santo, o Verdadeiro, Aquele que tem a chave de Davi, o que abre e ninguém mais fecha, e fechando, ninguém mais abre” (Ap 3,7). Em outras palavras: Ele é o Juiz definitivo e absoluto; sendo o Santo e Verdadeiro - títulos reservado de modo exclusivo e absolutamente para o Deus de Israel - o Senhor nosso é apresentado como Deus bendito. Ele não somente é o Juiz, mas também é o Critério do julgamento! Ele é tudo, é o Tudo!
Por isso a súplica final, quase desesperada, mas cheia de esperança: que Ele, Vivente e Vivificante, nos absolva e liberte a nós, pecadores cativos, sentados à sombra da morte!
Uma observação: recorde que o Senhor nosso entrega a Pedro (cf. Mt 16,19) e aos Doze (cf. Mt 18,18) o poder das chaves da Casa de Davi, ou seja, da Sua Igreja neste mundo! Pedro e os Doze não são detentores absolutos dessa autoridade impressionante; devem exercita-la sempre em Nome de Jesus, em referência a Jesus e debaixo da absoluta e divina autoridade de Jesus, o Sento Messias, o Filho de Davi, o Senhor e Esposo da Igreja!


Ó Oriente - Sol nascente! (21/12)
Ó Oriente, esplendor da Luz eterna e Sol de Justiça! Vinde e iluminai os que estão sentados nas trevas e à sombra da morte!

Toda esta Antífona deste dia 21 de dezembro é inspirada no Benedictus, o Cântico de Zacarias (Lc 1,68-79). Aí está dito que o Messias é o Astro das alturas que vem “iluminar os que jazem nas trevas e na sombra da morte”.
É muito belo o título de Oriente dado a Cristo. O oriente é a direção na qual nasce a luz, é o lado, o berço da luz, do início de um novo dia. Chamar Cristo de Oriente é chamá-lo de novo Dia, nova Luz.
De fato, Ele é o Dia sem fim, aquele que inicia um novo tempo, quando já não mais haverá trevas. Por isso mesmo, os primeiros cristãos tinham o costume de rezar voltados para o Oriente. Na Missa, tanto o sacerdote quanto o povo celebravam todos voltados para o Oriente como quem vai ao encontro do Cristo que vem como Sol de justiça, como Dia da glória sem fim, quando o tempo entrará na eternidade, as trevas cederão à luz e a história desembocará na glória. Caminhar ao encontro de Cristo Sol nascente, é “orientar-se” na vida!
A antífona, inspirada em Hb 1,1ss, proclama também que Cristo é o esplendor da Luz eterna. A Luz sem origem, Luz fonte da Luz é o Pai; Jesus é o Verbo Eterno, o Filho Unigênito, Deus vindo de Deus, Luz gerada da Luz, Esplendor da Luz que é o Pai. Eis um modo poético e belíssimo de afirmar a divindade Daquele que a Virgem concebeu!
Abramos o coração para acolhê-Lo!


Ó Rei das Nações! (22/12)
Ó Rei das nações e objeto de seus desejos, Pedra angular que reunis em Vós judeus e gentios: vinde e salvai o homem que do limo formastes!

Rei das Nações, Rei das Gentes - assim a Antífona deste dia 22 aclama o Messias que virá. Várias vezes os profetas anunciaram que o Messias seria rei descendente de Davi. Mas, sobretudo com o Profeta Isaías (cf. Is 11,10) e com os Salmos (cf. Sl 71/72) firmou-se profundamente a convicção de que o Seu reinado não se limitaria somente a Israel: Ele reinaria sobre todas as nações e Nele toda a humanidade seria salva; Ele seria luz para iluminar as nações e glória do povo de Deus, Israel (cf. Lc 2,29-32)!
Assim, Aquele que o ventre da Virgem gerou não somente realiza as profecias de Israel, mas é também o Desejado dos povos, Aquele que satisfaz os melhores desejos e sonhos da humanidade toda. A Ele todos os povos virão! São Mateus diz isso com a narrativa dos Magos, que vêm de longe seguindo a estrela do Rei dos judeus (cf. Mt 2,1-12); São João exprime essa mesma ideia com os gregos que pedem para ver Jesus (cf. Jo 12,20ss); e São Paulo fala do mistério escondido nos séculos e agora revelado (cf. Ef 3,1ss): em Cristo, os pagãos também são chamados à salvação. Por isso mesmo, o Apóstolo chama Jesus de pedra angular - a pedra que une as duas colunas do arco e as sustenta. Cristo é pedra angular porque une judeus e gentios num só novo povo, a Igreja, Israel da nova e eterna Aliança, cumprimento das profecias de Israel e dos desejos dos pagãos (cf. Ef 2,11ss).
Finalmente, ante tão grande Messias, a Antífona termina com uma súplica surpreendente, bela e profunda: “Vinde e salvai o homem que do limo formastes”. Que significa isso? Que esse Rei dos povos é também o criador e o modelo de todo homem: Ele nos formou do pó da terra, de modo que trazemos em nós a Sua imagem e quanto mais parecermos com Ele, mais seremos nós mesmos! Sim: “Através d'Ele e para Ele tudo foi criado no céu e na terra; n'Ele tudo subsiste; Ele é o Princípio, o Primogênito de toda criatura; Ele é o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim!” (cf. Cl 1,15-16; Ap 1,8)


Ó Emanuel! (23/12)
Ó Emanuel, nosso Rei e Legislador, esperança e Salvador das nações; vinde salvar-nos, Senhor nosso Deus!

Esta última das Antífonas do Ó é inspirada em Isaías e tem o sabor do Evangelho segundo Mateus, os dois livros da Escritura nos quais aparece o título de Emanuel para Jesus.
Ele é Rei porque é o Messias filho de Davi prometido pelo Senhor Deus e anunciado pelos profetas de Israel; Ele é o Legislador porque é o novo Moisés, o verdadeiro Moisés, tema muito presente no Evangelho de Mateus (aí Jesus faz cinco discursos, como Moisés é o "autor" dos cinco livros da Torá; Jesus fala no monte, como Moisés, no monte recebeu a Lei).
Mas, sobretudo, coroando todos os títulos dados ao Senhor que vem, a Antífona refere-se ao Cristo como “Senhor nosso Deus”. Eis o que Ele é para nós, eis o motivo da esperança que Nele temos e da alegria pelo Seu nascimento! “Esperança e Salvador das Nações” - esperança e Salvador de toda a humanidade: é isto, essencialmente, que Aquele que a Virgem concebeu é para a fé cristã!


Que fique no nosso coração a certeza expressa na frase formada pela primeira letra de cada antífona, tomada de trás para frente:
E-manuel,
R-ei das Nações,
O-riente,
C-have de Davi,
R-aiz de Jessé,
A-donai,
S-abedoria
ERO CRAS, isto é “Amanhã Eu virei”!
Vem, vem com Tua luz, ó Senhor Jesus, Santo Messias, doce Emanuel!

Fonte: Dom Henrique Soares da Costa, via Facebook.

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