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segunda-feira, 10 de abril de 2023

Homilia do Papa: Vigília Pascal 2023

Vigília Pascal na Noite Santa (Ano A)
Homilia do Papa Francisco
Basílica de São Pedro
Sábado Santo, 08 de abril de 2022

A noite está chegando ao fim e começam já a despontar os primeiros fulgores da aurora quando as mulheres saem para o túmulo de Jesus. Caminham com passo incerto, olhar perdido e o coração dilacerado de dor por aquela morte que lhes arrebatou o Amado. Mas tendo chegado lá, ao ver o túmulo vazio, invertem o rumo, mudam de estrada; abandonam o sepulcro e correm a anunciar aos discípulos um percurso novo: Jesus ressuscitou e espera-os na Galileia. Na vida destas mulheres aconteceu a Páscoa, que significa passagem: de fato, passam do caminho triste rumo ao sepulcro para uma corrida jubilosa até junto dos discípulos, a fim de lhes dizer não só que o Senhor ressuscitou, mas que há uma meta a alcançar imediatamente, a Galileia. O encontro com o Ressuscitado é lá. O renascimento dos discípulos, a ressurreição do seu coração passa pela Galileia. Entremos também nós neste caminho dos discípulos, que vai do túmulo à Galileia.


As mulheres - diz o Evangelho - «foram visitar o sepulcro» (Mt 28,1). Pensam que Jesus Se encontra no lugar da morte e que tudo está acabado para sempre. Às vezes acontece também a nós pensar que a alegria do encontro com Jesus pertença ao passado, enquanto aquilo que o presente nos dá a conhecer são sobretudo túmulos selados: os túmulos das nossas desilusões, das nossas amarguras, da nossa desconfiança, os túmulos do «não há mais nada a fazer», «as coisas não mudarão jamais», «melhor gozar o dia a dia» porque «do amanhã não estamos seguros». Também nós, se somos dominados pela dor, oprimidos pela tristeza, humilhados pelo pecado, amargurados por algum fracasso ou pressionados por alguma preocupação, experimentamos o gosto amargo do cansaço e vimos a alegria apagar-se no coração.

Às vezes notamos simplesmente o peso de levar adiante a vida quotidiana, cansados de arriscar pessoalmente contra uma espécie de muro de borracha de um mundo onde parecem prevalecer sempre as leis do mais esperto e do mais forte. Outras vezes sentimo-nos impotentes e desanimados perante o poder do mal, os conflitos que dilaceram as relações, as lógicas feitas de cálculo e indiferença que parecem governar a sociedade, o câncer da corrupção - e há tanta -, a propagação da injustiça, os ventos gélidos da guerra. Mais ainda, talvez nos tenhamos defrontado com a morte a roubar-nos a doce presença dos nossos entes queridos ou tocar-nos na doença ou nas calamidades, e facilmente caímos vítimas da desilusão e secou a fonte da esperança. Assim, por estas ou outras situações - cada um de nós conhece as suas -, os nossos caminhos detêm-se perante túmulos e nós ficamos imóveis chorando e lamentando, repetindo, sozinhos e impotentes, os nossos «porquês». Aquela cadeia de «porquês»...

As mulheres na Páscoa, ao contrário, não ficam paralisadas diante de um túmulo, mas - diz o Evangelho - «afastando-se rapidamente do sepulcro, cheias de temor e grande alegria, correram a dar a notícia aos discípulos» (Mt 28, 8). Levam a notícia que mudará para sempre a vida e a história: Cristo ressuscitou! (v. 6). E, ao mesmo tempo guardam e transmitem a recomendação do Senhor, o seu convite aos discípulos, ou seja, que partam para a Galileia, porque lá O verão (v. 7). Mas, irmãos e irmãs, perguntamo-nos hoje: que significa ir para a Galileia? Duas coisas: a primeira, sair da clausura do Cenáculo, partindo para a região habitada pelos gentios (cf. Mt 4,15), sair do escondimento para se abrir à missão, escapar do medo para caminhar rumo ao futuro. A segunda - e isto é maravilhoso -, voltar às origens, porque precisamente na Galileia é que tudo começara. Lá o Senhor encontrara e chamara pela primeira vez os discípulos. Portanto, ir para a Galileia é voltar à graça primordial, é readquirir a memória que regenera a esperança, a «memória do futuro» com que fomos marcados pelo Ressuscitado.

Vemos assim o que faz a Páscoa do Senhor: impele-nos a seguir em frente, sair da sensação de derrota, rolar a pedra dos sepulcros onde muitas vezes encerramos a esperança, olhar o futuro com confiança, porque Cristo ressuscitou e mudou a direção da história; mas, para consegui-lo, a Páscoa do Senhor leva-nos ao nosso passado de graça, faz-nos regressar à Galileia, onde teve início a nossa história de amor com Jesus, onde ocorreu o primeiro chamado. Em outras palavras, pede-nos para reviver o momento, a situação, a experiência em que encontramos o Senhor, experimentamos o seu amor e recebemos um olhar novo e luminoso sobre nós mesmos, sobre a realidade, sobre o mistério da vida. Irmãos e irmãs, para ressuscitar, recomeçar, retomar o caminho, precisamos sempre voltar à Galileia, isto é, voltar não a um Jesus abstrato, ideal, mas à memória viva, à memória concreta e palpitante do primeiro encontro com Ele. Sim, para caminhar devemos recordar; para ter esperança devemos nutrir a memória. E este é o convite: recorda e caminha! Se recuperares o primeiro amor, o deslumbramento e a alegria do encontro com Deus, seguirás para a frente. Recorda e caminha.

Recorda a tua Galileia e caminha para a tua Galileia. É o «lugar» onde conheceste pessoalmente Jesus, onde Ele deixou de ser, para ti, um personagem histórico como outros, tornando-Se a pessoa da tua vida: não um Deus distante, mas o Deus próximo, que te conhece melhor do que ninguém e te ama mais do que qualquer outra pessoa. Irmão, irmã, traz à memória a Galileia, a tua Galileia: a Galileia do teu chamado, daquela Palavra de Deus que, em um momento concreto, foi dirigida precisamente a ti; daquela forte experiência no Espírito, da grande alegria do perdão sentida depois daquela Confissão, daquele momento intenso e inesquecível de oração, daquela luz que se acendeu no teu íntimo e transformou a tua vida, daquele encontro, daquela peregrinação... Cada um de nós sabe onde se encontra a sua Galileia, cada um de nós conhece o próprio lugar da ressurreição interior, lugar inicial, fundante, que mudou as coisas. Não podemos deixá-lo no passado, o Ressuscitado convida-nos a ir até lá para celebrar a Páscoa. Recorda a tua Galileia, trá-la à memória, reaviva-a hoje mesmo. Volta àquele primeiro encontro. Interroga-te como e quando foi, reconstrói o seu contexto, tempo e lugar, repassa a emoção e as sensações, revive as suas cores e sabores. Com efeito, tu sabes, foi quando esqueceste aquele primeiro amor, quando olvidaste aquele primeiro encontro que começou a depositar-se o pó no teu coração. E experimentaste a tristeza e, como para os discípulos, tudo parecia carecido de perspectiva, com um rochedo selando a esperança. Mas hoje, irmão, irmã, a força da Páscoa convida a rolar para fora as pedras da desilusão e da desconfiança; o Senhor, perito em derrubar as pedras tumulares do pecado e do medo, quer iluminar a tua memória santa, a tua recordação mais bela, tornar atual aquele primeiro encontro com Ele. Recorda e caminha: volta para Ele, redescobre a graça da ressurreição de Deus em ti! Volta à Galileia, volta à tua Galileia.

Irmãos, irmãs, sigamos Jesus até à Galileia, encontrando-O e adorando-O lá onde Ele espera cada um de nós. Revivamos a beleza daquele momento em que, depois de tê-Lo descoberto vivo, O proclamamos Senhor da nossa vida. Voltemos à Galileia, à Galileia do primeiro amor, cada um volte à sua própria Galileia, a do primeiro encontro, e ressurjamos para uma vida nova!


Fonte: Santa Sé.

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